As mudanças na progressão continuada

Da Folha

Alckmin muda progressão continuada

Modelo mais provável a ser adotado é aumentar de dois para três o número de séries em que aluno pode repetir

Hoje, escolas podem reter aluno em só dois ciclos do fundamental; mudança deverá ser implementada em 2012

FÁBIO TAKAHASHI
DE SÃO PAULO

O governo Geraldo Alckmin (PSDB) decidiu alterar a progressão continuada na rede estadual de ensino. A principal mudança deverá ocorrer no sistema de reprovação dos estudantes.

Hoje, o aluno do fundamental só pode repetir ao final do quinto e do nono ano. A ideia é que a retenção ocorra também no terceiro ano. Assim, o número de ciclos sobe de dois para três.

A antecipação da reprovação permite que o aluno com sérias dificuldades seja recuperado mais rapidamente (em vez de demorar cinco anos para refazer uma série, passe a ser depois de três).

OproO provável efeito colateral será o aumento da repetência. Estudos mostram que o repetente tende a piorar de notas e tem mais chances de abandonar a escola.

A Folha apurou que já está finalizado estudo com o novo desenho do programa. “Pessoalmente, acho que vamos ficar mesmo com três ciclos”, afirmou o novo secretário-adjunto da Educação, João Cardoso Palma Filho, ao ser indagado pela reportagem.

Ele ressaltou, porém, que o assunto ainda está em análise na secretaria.

CONSULTA

Deverá haver também consulta aos professores sobre a mudança, que deve entrar em vigor em 2012.

Segundo Palma Filho, outro ponto analisado é o modelo de reforço escolar.

O novo titular da Educação, Herman Voorwald, disse que irá se pronunciar amanhã. Logo após ser anunciado por Alckmin, ele disse que o sistema “é fundamental”, mas precisa de revisão.

A mesma posição foi apontada pelo governador na campanha eleitoral.

Implementado no governo Mario Covas (PSDB), o sistema sofreu ataques durante a última disputa ao Palácio dos Bandeirantes.

Além das críticas eleitorais e de educadores, outro fator considerado é a mudança da regulamentação federal para o ensino fundamental.

No ano passado, o Conselho Nacional de Educação recomendou que no início da etapa haja um ciclo de três anos para evitar a reprovação de crianças com seis ou sete anos. Para o órgão, o aluno precisa de ao menos três para se alfabetizar e não faz sentido reprová-lo antes. 

Implantação do sistema de ciclos pulou etapas

No papel, o modelo faz sentido, pois se há algo de estranho no mundo da pedagogia, está na noção de reprovação

POR QUE DIABOS UM ALUNO QUE TENHA IDO MAL EM LÍNGUA PORTUGUESA PRECISA REFAZER TODOS OS CONTEÚDOS DE MATEMÁTICA?

HÉLIO SCHWARTSMAN
ARTICULISTA DA FOLHA

Ciclos devem ter três, quatro ou cinco anos? Ou dois, como já se havia proposto? A discussão tem algo de bizantino e não vai ao cerne dos problemas enfrentados pela progressão continuada.

No papel, o sistema faz sentido. Se há algo de estranho no mundo da pedagogia, ele está na noção de reprovação.

Por que diabos um aluno que tenha ido mal em, digamos, língua portuguesa precisa refazer todos os conteúdos de matemática e ciências? Por que alguém que domine 50% da matéria é considerado apto a seguir com os estudos e a pessoa que responde a 49% das questões é reprovada? O que há de tão transcendental nesse 1%?

As perguntas se tornam mais candentes quando se considera o estrago que a repetência provoca na vida do aluno.Quando o jovem recebe a pecha de repetente, tende a desempenhar o papel por toda a vida acadêmica.

Com a redução da reprovação possibilitada pelos ciclos, caiu o índice de evasão escolar no ensino fundamental paulista. Entre 1998 e 2008, ele baixou de 4,6% para 1,4%, redução de 70%.

É muito mais razoável, como prevê a teoria da progressão continuada, que a escola identifique tão rapidamente quanto possível os alunos que não estão assimilando os conteúdos e procure corrigir a situação.

Isso envolve toda uma estrutura de avaliação fina, aulas de reforço e apoio psicopedagógico com o qual a rede pública não conta.

Pior até, a implantação do sistema de ciclos, iniciada em 1997, foi feita de forma desastrosa. A mudança foi ditada de cima para baixo sem explicar a alunos, pais e professores o que se pretendia.

Mestres boicotaram a reforma -com o fim da repetência, perderam uma poderosa ferramenta disciplinar. Pais não compreenderam nada ao verem seus filhos “passando de ano” sem saber ler.

Na prática, a progressão virou uma aprovação automática que, embora não explique as deficiências do ensino, ajuda a perenizá-las.

Mas não há mágica. Não é aumentando o número de ciclos que a situação vai mudar. Será preciso criar estruturas que a escola não tem e trazer melhores professores. 

Luis Nassif

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