Pacificação dos morros pode retroceder

Por wilson yoshio.b…

Do Sul 21

Brasil busca no Japão modelo de policiamento comunitário

 

Inspetor da polícia nacional do Japão, Koichi Marauyama, explicou porque o modelo comunitário de segurança conseguiu reduzir homicídios | Foto: Ramiro Furquim/Sul21

Rachel Duarte

Renovada no final de 2010 pelo Ministério da Justiça, a cooperação técnica entre o Brasil e o Japão está ampliando o alcance de uma nova filosofia de policiamento nos Estados brasileiros. O sistema Koban, doutrina de policiamento comunitário aplicada nas províncias japonesas, é aplicado em 11 Estados da federação. O modelo é novo, mas experiências de polícia de proximidade já ocorrem no Brasil há mais tempo. O exemplo mais consolidado são as Unidades de Policia Pacificadora (UPPs) nas favelas do Rio de Janeiro. No entanto, para o secretário geral do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, os avanços já alcançados com a pacificação dos morros cariocas podem retroceder. “Temos que pensar como a ordem pública é constituída. Nos aglomerados e favelas, ou outro nome que dão para estas áreas no país, não se trata apenas de polícia”, alerta.

Para ampliar o conhecimento sobre este método e orientar os Estados que já desenvolvem um trabalho de polícia de proximidade, os governos federal e estadual promoveram, na semana passada, o III Seminário Nacional de Policiamento Comunitário.

O inspetor da polícia nacional do Japão, Koichi Marauyama, explicou porque o modelo existente há 140 anos no Japão conseguiu reduzir os homicídios para apenas 20 casos em um ano na província de Kyoto. “A visita comunitária dos policiais nas casas das pessoas possibilita a coleta de informações sobre o bairro e a região, o que auxilia na resolução de muitos casos de criminalidade. É a principal atividade do Koban”, salientou o inspetor japonês.

Os “Kobans” são postos de polícia com pouco efetivo e construídos em meio aos bairros de 47 províncias. Com arquitetura similar a de uma residência, as unidades substituem a imagem das delegacias e aproximam os moradores. “A diferença é uma luz vermelha na frente do Koban e a presença de dois policiais 24 horas em frente ao posto fazendo vigília”, disse Marauyama.

Outra característica do sistema japonês é a participação de voluntários da comunidade que ajudam no trabalho da polícia. Sem remuneração, eles promovem o cuidado com a segurança de crianças em escolas, orientam jovens e identificam alertas de furtos em bicicletas – meio de transporte muito utilizado no Japão. Os estabelecimentos comerciais também são parceiros no trabalho da segurança pública japonesa. “Eles exibem placas dos serviços da polícia e divulgam comunicados importantes sobre algum crime que queremos alertar”, falou.

Na atenção às crianças, existe uma Casa da Criança em que moradores podem contatar um serviço telefônico similar ao190 da polícia brasileira. Os voluntários têm placas de identificação em suas residências. “Aqui no Brasil não é uma atividade muito adequada porque as casas todas têm grades”, comparou o inspetor japonês. Outra ação do sistema Koban que Marauyama não recomendou aos brasileiros foi o método de combater os pequenos furtos. “Quando os voluntários da polícia encontram alguém levando alguma coisa eles arremessam bolinhas de tinta para identificá-los à polícia. Se vocês fizerem isso aqui no Brasil, sei que é possível receberem um tiro de volta”, brincou com a realidade brasileira.

Segundo o coronel Álvaro Camilo, São Paulo reduziu em 70% o número de homicídios na última década | Foto: George Cereca/Divulgação

Polícia Comunitária no Brasil

A filosofia de polícia comunitária aplicada no Brasil existe há mais tempo do que o acordo de cooperação técnica com o Japão. Estados como Santa Catarina, Pernambuco e Bahia expuseram suas experiências no III Seminário Nacional de Polícia Comunitária.

Segundo o comandante geral da Polícia Militar de Santa Catarina, coronel Nazareno Marcineiro, o trabalho dos policiais catarinenses começou a mudar em 1996. Depois de uma quebra, por questões de falta de continuidade no modelo com a mudança no governo estadual, o policiamento comunitário foi retomado. “Experiências recentes em 26 municípios da região do Estado trouxeram uma redução de 34% da criminalidade”, afirmou.

Em São Paulo, o método utilizado é o Koban, que ganhou reforço com as capacitações em policiamento comunitário promovidas pela Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), a partir do convênio com o Japão. Desde o início do acordo, em novembro de 2008, foram habilitados 359 policiais do Brasil. Depois da renovação do convênio, a criminalidade em São Paulo começou a cair. De 2000 para cá, houve uma redução de 70% no número de homicídios na cidade. A Polícia Comunitária foi um dos fatores decisivos, porque vai além da atividade policial, envolve o cidadão.

No Rio Grande do Sul, a Brigada Militar desenvolve algumas ações similares a filosofia da polícia de proximidade. Ainda de forma tímida e com certa resistência nas corporações, o governo pretende ampliar a capacitação dos futuros soldados dentro da metodologia de policiamento comunitário. “Existe no RS há 10 anos, mas estamos reestruturando o modelo, com uma renovação dos recursos humanos. O modelo Koban tem bons resultados e está avançando no país”, falou o coordenador de Polícia Comunitária no RS, coronel Jorge Luiz Agostini.

Segundo Agostini, existem mil profissionais de segurança pública (Policia Civil, Brigada Militar, Susepe e Instituto Geral de Perícias) aptos a desenvolverem a metodologia de policiamento comunitário. “Vamos ter mais 300 novos profissionais formados este ano, sendo que 56 policiais já foram formados no modelo Koban, em São Paulo”, garantiu.

Agência Brasil

Complexo do Alemão foi ocupado pelo Exército, mas UPP ainda não foi instalada| Foto: Agência Brasil

UPPs consolidam modelo brasileiro

A prática mais consolidada desta nova conduta das polícias está no Rio de Janeiro, com a instalação das UPPs. O programa começou em dezembro de 2008, quando o Morro Dona Marta, na Zona Sul do Rio, foi ocupado pela polícia. Atualmente são 17 unidades pacificadas, nos principais morros cariocas onde o crime organizado comandava.

“Os principais comandantes estão presos, os que escapam são obrigados a se ressocializar na favela pacificada que tem a presença de policiais 24 horas ou migram para uma nova área. Em outros locais eles tem problemas com as facções dominantes daquele território, além do que, mais cedo ou mais tarde iremos chegar nestes locais”, explicou o major da Coordenadoria de Polícia Pacificadora do RJ, Eliézer de Oliveira Farias.

Segundo o major, o governo carioca está preparando a implantação de novas UPPs, inclusive as adiadas na última semana e que seriam para o Complexo do Alemão, Penha e Zona Norte. “Estamos em um momento de oxigenação e preparação das bases. Só vamos implantar as próximas UPPs quando estiver tudo pronto. Nossa formação é continuada e não podemos atropelar o processo de capacitação dos profissionais que atuarão nas unidades, independente de qualquer onda ou pressão externa ou mesmo se há uma data já estabelecida”, afirmou.

A escola de formação de policiais comunitários para instalar as UPPs e manter as favelas pacificadas, dialogando com a comunidade e atuando de forma preventiva à violência, ainda não foi erguida, mas, Farias garante que a formação está sendo eficiente. “Como nossa ênfase é que o profissional que egressa da formação dê o suporte para as instalações das unidades, não podemos nos precipitar. Mas, formaremos até 2016, 12 mil novos homens para instalação de 40 UPPs”, garantiu o major que é coordenador de Gestão, Ensino e Pesquisa da Policia Militar do RJ.

Só UPPs não bastam

 A ocupação do Complexo do Alemão, em novembro de 2010, resultou na redução de roubos, assaltos e homicídios. Por outro lado, com a presença da polícia no convívio comunitário, moradores acabam revelando outros problemas sociais existentes nas periferias, como casos de violência doméstica, lesões corporais ou apreensão de drogas.

Por ser o maior complexo de favelas do Rio de Janeiro, este território contará com o maior efetivo de homens para a instalação da Unidade de Polícia Pacificadora. São estimados dois mil policiais. Porém, desde a ocupação do complexo, a UPP não foi instalada e hoje o Exército ainda permanece na área. A presença das forças armadas no Alemão foi autorizada pelo Ministério da Defesa até julho de 2012. Neste domingo, um incidente entre soldados e moradores resultou em reações repressivas do exército para com a comunidade.

Luis Nassif

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