A Semana Nacional de Trânsito e a grave doença social dos acidentes

Estamos em plena Semana Nacional de Trânsito, comemorada, em todo território nacional, entre 18 e 25 de setembro, cujo tema escolhido este ano, dentro da Década Mundial de Ações para a Segurança de Trânsito-2011/20, foi “JUNTOS PODEMOS SALVAR MILHÕES DE VIDAS’. Um bom momento para reflexão e nada a comemorar. Basta observar dois recentes relatos de imprudência e de acidentes. Um deles resultou no atropelamento e morte de uma senhora de 82 anos, em São Carlos,  a 229 km da capital de São Paulo. Um estudante do Centro Universitário de Araraquara (Uniara), de 23 anos, acabou preso na manhã do último sábado acusado de atropelar e matar a idosa. De acordo com a PolíciaMilitar, ele dirigia embriagado e admitiu que voltava da Taça Universitária de São Carlos (Tusca), tradicional evento esportivo com alunos da Universidade de São Paulo (USP) e Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

O universitário fugiu sem prestar socorro à vítima, mas foi reconhecido e preso pela PM logo depois, porque mora próximo ao local do acidente. No carro dele foram encontradas marcas de sangue; o para-brisa estava danificado. No banco da frente foi encontrado uma caneca da Tusca, usada para servir bebida. O acidente ocorreu por volta das 06h30m, em frente a uma padaria, em São Carlos. A vítima, Rosa Buzzo, foi atingida enquanto andava pelo meio fio para desviar de um poste. Ela não resistiu aos ferimentos e morreu no local. As  9h30m, o estudante prestou depoimento na delegacia, pagou R$ 19 mil de fiança e foi liberado, Diga-se de passagem não é qualquer um que dispõe  de tal quantia para se ver solto. Pela demonstração de poder econômico, com uma boa defesa e a indulgência da lei, é mais um homicida do volante a não ser recolhido ao cárcere.

No Rio de Janeiro, na madrugada de domingo, 18/09.-parece cena de filme americano- em razão da  mistura álcool, drogas e direção, por pouco um jovem não provocou uma tragédia. Após furtar um ônibus sem passageiros no Terminal Alvorada, na Barra da Tijuca, Zona Oeste, o dirigiu ( pasmem) cerca de 20 quilômetros até a Rua Voluntários da Pátria, em Botafogo. Provocou pelo menos três acidentes no caminho. De acordo com informações da polícia, Pedro Henrique Garcia de Souza Correa dos Santos, 24 anos, tinha acabado de sair de uma festa à fantasia e aproveitou que o coletivo estava com a chave na ignição e vazio.Trajado com uma calça camuflada e uma camisa que dizia “operações especiais”, o rapaz, que é estudante de direito, estava aparentemente sob efeito de entorpecentes. De acordo com a Rádio CBN, ele teria admitido aos policiais o uso de drogas e álcool. 
 

A jornalista Ruth de Aquino, num artigo de sua autoria, publicado dias atrás na Revista Época, que analisava a violência e a barbárie do trânsito brasileiro, em poucas palavras disse tudo: “Temos um exército de homicidas e suicidas em potencial ao volante dos carros. Pilotam estimulados por álcool, deprimidos por drogas ou excitados pela sensação de onipotência”. As palavras da ilustre jornalista podem ser retratadas em recentes números do seguro obrigatório DPVAT (Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores em Vias Terrestres) que, no primeiro semestre deste ano pagou 107. 403 indenizações por invalidez. Os dados se referem a acidentes ocorridos até  três anos atrás no país. No total, incluindo mortos e feridos, as indenizações, nos primeiros seis meses de 2011 chegaram a R$ 1,1 bilhão.
       

O crescimento da frota de motocicletas é tida por especialistas pela puxada das estatísticas  de acidentes, onde as lesões que mais matam são fraturas no crânio (falta do capacete de segurança), trauma de tórax ( falta do uso do cinto nos carros), bacia e ossos longos.O trânsito é a principal causa de morte de jovens no país, numa faixa etária de 15 aos 24 anos..Mais de 70% são do sexo masculino. Segundo a ONU o Brasil é o quinto país em acidentes de trânsito no mundo. O trânsito brasileiro mata 2,5 vezes mais que nos Estados Unidos e 3,7 vezes mais que na Europa. Cerca de 100 pessoas, em média, por dia, perdem a vida na barbárie do trânsito brasileiro que ceifa a vida de 36 mil anualmente ( quase a capacidade total do Estádio do Engenhão no Rio), sem falar nos que adquirem graves sequelas. A Espanha, cita em seu artigo a jornalista Ruth de Aquino, reduziu em 57% as mortes em estradas. “Não basta educar, é preciso vigiar e punir. As campanhas devem ser duras e realistas. Acidente de trânsito não é maldição divina e deve ser combatido como doença grave”, diz Navarro Olivella, um espanhol estudioso do tema.
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 A semana de trânsito deve servir, portanto,  para que nos mobilizemos por um trânsito mais humano. Os acidentes de trajeto são uma grave doença social  e parecemos  impotentes para conter tamanha tragédia, onde carros retorcidos, vítimas ensanguentadas, dor, sofrimento, desespero e famílias enlutadas são  fatos  rotineiros. Acresce-se o fato de que boa parte de nossas estradas e vias urbanas apresentam-se em estado precário no que tange à pavimentação e à sinalização. A cada dia o carro vem se transformando, pois, numa arma mais mortífera e a impunidade dos crimes de trânsito é flagrante. Apesar do advento da Lei Seca, muitos motoristas continuam bebendo e dirigindo. Matando, morrendo e mutilando e as leis acabam protegendo os homicidas do trânsito. .

Fica evidenciado que o perfil do motorista brasileiro, em sua maioria, é de imprudência, desrespeito as leis de trânsito e acentuado grau de estresse e deseducação. Não há disciplina consciente no trânsito. É problema cultural e de carência de  rigorosa punição. Precisamos frear o ímpeto dos imprudentes e assassinos em potencial do volante. Antes que sejamos a próxima vítima. Quem mata no trânsito por direção alcoolizada ou por excesso de velocidade comete homicídio doloso. É preciso incluir, urgentemente, no Código de Trânsito Brasileiro, no capíulo dos Crimes em Espécie, tal modalidade de delito, onde o dolo eventual fica plenamante evidenciado na assunção do risco do resultado danoso. Trânsito é meio de vida, não de morte e destruição humana. Com a palavra o Congresso Nacional. Juntos podemos salvar vidas. Só depende de nós.
 
           Milton Corrêa da Costa é coronel da reserva da PM do Rio e estudioso em segurança de trânsito              

Redação

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