Recuperar a democracia requer o mínimo de reforma política, por Oscar Vilhena Vieira

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
[email protected]

Jornal GGN – Em meio à crise política, com os agravantes da Lava Jato e uma guerra entre interesses políticos difusos, o caminho da Constituinte exclusiva para a reforma política como solução para o mal vigente parece cada vez mais distante. Diante disso, faz-se urgente a imposição ao Congresso – mesmo que forçado pela sociedade movida pelo trator da Lava Jato – da aprovação de uma “agenda mínima”, que inclui o fim das coligações partidárias, para melhorar a representatividade popular, e adoção de uma cláusula de barreiras, a fim de controlar a proliferação danosa de legendas. Essa é a visão exposta pelo articulista da Folha, Oscar Vilhena Vieira, em edição publicada neste sábado (25).

Por Oscar Vilhena Vieira

Na Folha

Como sair do pântano?

Em uma de suas cavalgadas, o incrível barão de Munchausen caiu com sua parelha num pântano. Ao perceber que lentamente submergia e que não havia nada e ninguém que pudesse socorrê-lo, teve a genial ideia de puxar-se pelo próprio cabelo, salvando a si e a sua montaria.

As dificuldades de reformar um sistema político imerso num pântano de corrupção e dominado por quadrilhas e clãs que se apropriam de recursos públicos para se perpetuarem no poder são semelhantes às agruras do barão de Munchausen.

Assim, como sair do atoleiro? Como resgatar a democracia do pântano em que foi metida? A resposta intuitiva é que precisamos contar com um elemento externo à política parlamentar para resgatar a democracia para os cidadãos. A Justiça vem fazendo a sua parte, desestabilizando o que aí está. Isso, porém, não será suficiente. É preciso que a própria política seja capaz de reformar os sistemas eleitoral e partidário, que estão na raiz de práticas predatórias e extrativistas de nossas instituições.

Uma solução, proposta por alguns, seria a convocação de uma constituinte exclusiva, limitada à reforma política, e composta por pessoas que não poderiam, terminado o trabalho, concorrer a cargos públicos. Dessa forma, conseguiríamos a imparcialidade desejável para levar a cabo a necessárias mudanças.

Essa solução, embora sedutora, apresenta uma série de dificuldades. A primeira é que depende da disposição do Congresso para cometer uma espécie de haraquiri político. Em segundo lugar, exige a obtenção de algum consenso sobre regras de convocação e deliberação, o que, no ambiente de profunda divisão que vivemos, também não parece plausível. Por fim, há uma dificuldade adicional. O resultado de uma constituinte exclusiva, descolada das reais forças políticas, por melhor que seja, corre o risco de ser boicotado por aqueles que ficaram de fora, gerando mais instabilidade e oportunismo.

Nesse contexto, o caminho mais prudente ainda parece ser o das reformas incrementais. Se o Supremo, com o auxílio das diversas operações anticorrupção, for capaz de levar a cabo a interdição das lideranças ligadas ao regime de corrupção multipartidária hoje vigente, abre-se espaço para que a sociedade imponha ao Congresso uma agenda básica de reforma, que dê seguimento a mudanças positivas já aprovadas nos últimos anos, como a Lei da Ficha Limpa e a limitação de doações empresariais para campanhas.

Esta agenda mínima, a ser aprovada até outubro de 2017, teria por objetivo a realização de uma eleição mais limpa e representativa em 2018. Seus pontos centrais seriam o fim das coligações e a adoção de uma cláusula de barreira. Com o fim das coligações para eleições parlamentares, reduziríamos esse perverso sistema pelo qual o eleitor vota em um candidato e elege outro, que nem sequer sabe quem é. Com a adoção de uma cláusula de barreira para as eleições congressuais, ao menos em âmbito nacional, seria criado um limite para proliferação disfuncional de partidos, que tem feito da corrupção uma ferramenta de governo.

Pode não ser tão incrível quanto a ideia do barão, mas certamente nos ajudará a começar tirar o pé do pântano.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

3 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. recuperar democracia….

    Para recuperar algo, você deve ter a consciência que um dia teve este algo. Quando tivemos democracia? Ainda temos uma elite dita intelectualizada e fingindo não ser abastada, que crê que os criminosos em que ela confiava e a iludiu com o discurso de transformação da sociedade, continua sendo a saída para o país. Democracia sem povo não é democracia. Democracia sem a total liberdade não é democracia. Aceitar a opinião da sociedade (vejam os ingleses), seja ela qual for é a base da democracia. Aqui temos uma aberração de uma elite burocrática, hipocrita, parasita e esquerdopata. “Hipocrita, tire a trave dos seus olhos antes de querer guiar seu irmão. Como um cego irá conseguir guiar outro cego?”

    1. recuperar…

      Nem uma única linha sobre o voto ser livre e optativo. O que deve ser obrigatório são as eleições e não o voto. Ainda não temos a mínima consciência do que seja democracia. É por isto que não saimos do pantano. Nem mesmo depois dele secar.

  2. A CRISE POLÍTICA E O HISTÓRICO ADVENTO DO NOVO

    Diante da crise de legitimidade dos partidos políticos, salta à vista a evidência de que cláusulas de barreira colidem com a necessidade de permitir a renovação indispensável.

    Por outro lado, proibir coligações partidárias é menos eficaz do que difundir a exata noção de que é necessário e urgente substituir as práticas fisiológicas dos mecanismos de coligação pela dinâmica de sistemas de coalizão, regidos por compromissos relativos a programas de governo transparentes e a um projeto de nação inclusivo e plural.

    A evolução da superestrutura social e do arcabouço legal democrático deve ter por base a compreensão do fato de que as soluções para os problemas criados pela política devem ser construídas através do aprimoramento da política.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador