Afastado do Denarc, policial defende legalização

Enviado por André STK

Do Sul 21

Polícia é “fantoche” em guerra contra as drogas, diz policial afastado do Denarc 

Débora Fogliatto

O policial civil Diego Souza Ferreira cumpria suas funções de investigação no Departamento de Investigações do Narcotráfico (Denarc), que muitas vezes levavam à apreensão de drogas e prisão de traficantes e consumidores, quando percebeu que estava “enxugando gelo”. Com estudos desenvolvidos na pós-graduação que cursou na UFRGS, indo a eventos — especialmente ao Congresso Nacional e a um seminário no Rio de Janeiro — ele se tornou uma das principais vozes policiais a favor da legalização das drogas no Rio Grande do Sul.

A partir da pesquisa, conheceu a Law Enforcement Agains Prohibition (Leap), organização internacional formada por policiais e profissionais jurídicos que defende a legalização de todas as drogas. Agora, é o primeiro policial civil gaúcho a tornar-se porta-voz da entidade. “O interessante de ter tido contato com a Leap foi entender o que era a tal guerra às drogas, porque é uma coisa meio subjetiva. É uma política de enfrentamento militar para determinadas substâncias, que foram escolhidas politicamente, de forma arbitrária, para serem proibidas”, reflete.

Nesta entrevista ao Sul21, ele conta sua trajetória de mudança de opiniões, constata que os policiais fazem o que podem com as leis e a instrução que lhes são dadas, reflete sobre os motivos do proibicionismo e o que poderia ser diferente caso as drogas fossem liberadas. O policial também opina sobre o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF), que acontece na próxima quarta-feira (19). Ele reflete, porém, que na prática a questão não é tão simples, especialmente para os policiais. “A lei diz que é crime, mas o STF diz que não é, então vai ficar complicado, para a polícia, na aplicação da lei”, aponta.

Sul21 – Bom, tu foste afastado do Denarc, mas na prática isso significa uma demissão? Que cargo exerces agora?

Diego Souza Ferreira – É, eu fui afastado, hoje estou na DP de Guaíba. Eu trabalhava no Departamento de Inteligência, ali no Palácio da Polícia. Em 2012, eu resolvi reformular um pouco a minha vida e saí da área operacional e fui para uma área administrativa. Aí nisso eu fui num Fórum Brasileiro de Segurança Pública na Ufrgs em 2012 e tinha um painel sobre drogas. Foi bem interessante porque foi a primeira vez que eu ouvi falar sobre legalização das drogas, e eu pensei “esse pessoal tá maluco”.

Sul21 – Tu agora é porta-voz da Leap (Law Enforcement Agains Prohibition), uma entidade composta por policiais e profissionais jurídicas a favor da legalização das drogas, que aparentemente foi o que te causou problemas no Denarc. Como foi que tu entraste em contato com eles?

Diego – A partir disso comecei a pesquisar, fui atrás e descobri a Leap. O Roland Zaconi é um policial civil que é porta-voz da Leap e em contato com ele, me convidaram para ir ao Rio de Janeiro, em um seminário que teve na Academia de Polícia Civil de lá. Eu já havia feito a minha pesquisa de pós e nesse seminário tinha um policial norte-americano que me convidou para participar. Tem mais de 50 mil membros no mundo todo, no Brasil começou em 2012 com a juíza Maria Lúcia Karam e o delegado Zaconi. E aqui já somos mais de 170 policiais que são integrantes. É uma organização formada por forças policiais e área criminal. E eu me tornei o primeiro policial civil porta-voz da Leap aqui no Rio Grande do Sul.

E isso deu destaque dentro da polícia, saiu até na comunicação interna da polícia, Intranet. E eu fiquei até lisonjeado, pessoal fez um artigo no jornal interno. Ano passado, antes de eu ir para o Rio de Janeiro, fui falar com o chefe de polícia e com o secretário de Segurança, levei exemplares da minha pesquisa da Pós-Graduação para eles, então achei que estava tudo bem. Eu fui estudando cada vez mais até que, quando voltei de férias neste ano, me disseram que eu tinha sido afastado e redirecionado pra Guaíba. Eu poderia ter discutido, mas não quis me desgastar.

“Os policiais entendiam que estamos enxugando gelo, que não estava tendo uma resposta eficiente, mas não tinham uma perspectiva”.

Sul21 – Como foi tua pesquisa da pós-graduação?

Diego – Foi por meio de formulários com policiais civis, mandei pelo sistema de correio eletrônico algumas perguntas e tive mais de 300 respostas. Dividi por órgãos policiais do Estado. E os policiais entendiam que estamos enxugando gelo, que não estava tendo uma resposta eficiente, mas não tinham uma perspectiva, não entendiam a questão da legalização. E eu mostrava o modelo de Portugal, Estados Unidos, Holanda e Uruguai e alguns diziam ‘ah, se for assim até vai’, enquanto outros defendiam a dureza total e até a criminalização do álcool e do cigarro.

E já temos um precedente histórico disso que não foi bom, como a Lei Seca americana. No caso do tabaco, é mais antigo, no século 17 foi criminalizado na Europa e na Ásia, pessoas inclusive eram mortas pelo Estado por consumir cigarros. Que hoje é uma droga legal que todo mundo sabe o que causa, mas quem é adulto e quiser consumir, cada um sabe da sua vida.

 

Diego recebeu a reportagem em sua casa, em Canoas, onde mostrou os materiais que estuda sobre drogas | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Sul21 – E na tua percepção, quais os motivos que levam determinadas drogas a serem consideradas ilegais?

Diego – O interessante de ter tido contato com a Leap foi entender o que era a tal guerra às drogas, porque é uma coisa meio subjetiva. É uma política de enfrentamento militar para determinadas substâncias, que foram escolhidas politicamente, de forma arbitrária, para serem proibidas. E os motivos dessa criminalização não é de saúde, é de geopolítica, economia e de soberania dos países. Porque quando criminaliza uma planta que é produzida em um país, criminaliza um país inteiro, que é o caso da Colômbia e da Bolívia com a coca. E dos países asiáticos a planta da papoula, que faz heroína e morfina. Mas esse entendimento de que as drogas ilegais… pensamos que deve ter um motivo relevante, que devem fazer um mal reparável à saúde humana. O que me ajudou também a entender é que eu tenho familiares médicos, então comecei a buscar informação dessas outras áreas, e aí fui clarear a minha consciência.

E a minha grande dúvida era uma dúvida médica, que é o que eu acho que as pessoas têm. E elas não têm consciência das drogas legais, do mal que faz, principalmente o álcool. Porque não temos campanhas públicas sobre drogas no sentido horizontal, sobre todas as drogas. Na história tudo é volátil, tudo por questões políticas, de conveniência, nunca porque fazia mal.

Sul21 – Vai acontecer esse julgamento da descriminalização no Supremo Tribunal Federal (STF).  O que vai mudar com isso, caso seja descriminalizado?*

Diego – A tendência é que se descriminalize juridicamente, mas faticamente, para nós da polícia isso vai ficar complicado. Porque o STF é o guardião da Constituição, mas isso é no mundo jurídico, até chegar no mundo dos fatos, da vida real, não é bem assim. O STF vai descriminalizar porque isso aconteceu na Colômbia e na Argentina, porque ele trabalha com direito, e o direito penal não admite a criminalização de algo que não causa dano a terceiros. A dúvida é se vai estipular quantidade, dizer que até tantos gramas não é mais crime.

Sul21 – Mas no momento que descriminaliza, a compra e venda continua sendo crime, certo?

Diego – Sim, isso que é o complicado. Porque a lei diz que é crime, o STF diz que não é, vai ficar complicado, para a polícia, na aplicação da lei. Porque por exemplo, se tem um cara consumindo crack na esquina, o STF disse que não é mais crime, então o policial não sabe se detém ou não. Em Portugal, houve a descriminalização, mas foi feita pelo Estado, que regularizou isso. Embora não tenha legalizado o comércio, eu não tenho como adquirir a substância de forma legal. Mas não pode mais entrar na minha casa se eu tiver um pé de maconha, por exemplo, como pode hoje no Brasil.

“Esse caminho só do STF descriminalizar não resolve o problema, complica mais, porque já teria que vir uma lei já regulamentando”.

Sul21 – Essa questão de, por exemplo, ter um pé de maconha em casa? Vai poder?

Diego – Vai ser difícil. Vai ser um passo talvez assim pra sociedade ter uma consciência de que isso não precisa mais ser crime. Vai ser só um caminho, mas esse caminho só do STF descriminalizar não resolve o problema, complica mais, porque já teria que vir uma lei já regulamentando. Seria a lei do deputado Jean Wyllys, que ele regulamenta todo o processo de maconha. Parte industrial, medicinal e recreativa, que é no caso ter lojas que vendem para o adulto que quiser consumir, como existe hoje no Colorado.

 

 Sul21 –  O projeto dele não é regularizado pelo Estado como do Uruguai, é comércio federal?

Diego – É, o Estado controla um pouco. No Uruguai, as lojas são concessões públicas, é diferente. Para abrir uma farmácia, precisa de uma licença do estado. Então quando é privado, vou na junta comercial, abro uma loja e vendo o que eu quiser. Se está regulamentado, eu posso vender.  E se eu tiver umas terras e quiser plantar maconha e eu só vou fornecer para determinado laboratório, lá [no Uruguai] não é assim. É só o Estado que planta e ele que fornece para o laboratório. Mas eu sou a favor até de que se legalize da forma de que se possa plantar e fornecer para laboratórios.

Sul21 – Além disso, a maconha pode ser usada para confecção de produtos, né?

Diego – Exato. Na Suíça, já tem a 19ª edição de uma feira internacional de Cannabis, que é uma feira de maconha, como se fosse uma FIERGS de Cannabis. Então lá na Suíça, vão empresários de Cannabis do mundo todo mostrar seus produtos. Tênis da Adidas, camisinha, cerveja, artes plásticas, leite de maconha, partes internas de veículos, ao invés de usar plástico tu usa a fibra da maconha, construção civil, blocos de cânhamo. O cânhamo é uma maconha para fins industriais, com isso se faz até blocos pra construírem casas.

E é a fibra mais resistente do mundo, tanto que em uma época, antes da colonização, era usada por toda a frota naval do mundo. Então teve essa guerra comercial do algodão e da questão do petróleo também, quando criaram o nylon tiveram que trocar todas as cordas dos navios e fizeram com cordas de nylon. A historia do algodão é legal, porque a fibra da maconha é, como eu já disse, a fibra mais resistente do mundo e ela não mofa. O algodão mofa. Quando tu descobre isso, percebe que é muito interesse comercial.

Alimentação também, a semente da maconha é como se fosse uma de soja. Tudo que tu faz com a soja, tu faz com o maconha.  Aqui no livro diz que em 1941, a Ford chegou a fazer a estrutura de cânhamo mais resistente que o aço.

“Não tem como fazer uma concorrência no mercado organizado, vai ser na base da bala, cada um vai comprar uma metralhadora”.

Sul21 – Que benefícios a legalização traria, na prática?

Diego – O que melhoria com os países que regularizam: redução da violência, geração de emprego, geração de impostos, redução de danos, respeito aos direitos humanos e liberdades civis. Essas políticas públicas acontecem na Holanda, Espanha, Portugal e Alemanha. Diminuiu inclusive o número de DSTs, no caso dos locais onde se consome heroína por seringas. As salas de consumo seguro acabam com isso, como no Canadá, em que há uma sala dessas que fornece heroína, com a presença de médico, enfermeiro e psicólogo, e ensina a usar para as pessoas que já são viciadas. Em Portugal, zeraram mortes por overdose. Porque as overdoses acontecem quando uma pessoa compra determinado dia de um traficante, e vamos supor que a cocaína tenha 5% de princípio ativo. Depois, vai lá e compra de outro, e tem uma porcentagem muito maior, daí que dá a overdose. Com a regularização, isso não acontece mais.

No âmbito da saúde, seria feita a redução de danos com investimento na Rede de Atendimento Psicossocial, onde estariam os indivíduos que por ventura desenvolvessem problemas com alguma substância, nos moldes da Suíça, Canadá, Holanda, Portugal, Colômbia, entre outros.

Além disso, diminui o encarceramento, a violência e os homicídios. Porque o homicídio no tráfico de drogas é uma disputa comercial, é quando algum consumidor está devendo, mas não tem como cobrar no fórum, mandar ação de cobrança, então paga com a vida. E a outra questão é por disputa, quando duas pessoas vendem no mesmo bairro e são concorrentes. Não tem como fazer uma concorrência no mercado organizado, vai ser na base da bala, cada um vai comprar uma metralhadora.

Sul21 – Sim, a maior parte das mortes acontece não pela droga em si, mas por esses motivos.

Diego – Exato, as mortes acontecem por causa da ilegalidade. As drogas sempre existiram, as pessoas sempre consumiram. É um comércio, e o que o Estado fez? Botou na ilegalidade, lavou as mãos. E ainda criou uma força estatal policial para reprimir isso, o que hoje percebemos que não tem necessidade.

Com a legalização, é possível que a polícia se volte para os crimes realmente graves, como latrocínio, homicídio, violência contra a mulher, roubos. Gera também mais confiança da sociedade na polícia, porque hoje como a pessoa vai gostar da polícia se ela tem um pé de maconha em casa e eu entro metendo o pé na porta, quebro tudo, e prendo o filho dela? Ela vai odiar a polícia.

Com a legalização, há o fim da guerra às drogas. E no âmbito social, pode se criar um Estado de guerra à pobreza, à corrupção, à discriminação e à violência. Essas guerras que temos que fazer, não essa que foi criada.

“[Em Portgual] além de descriminalizar, eles trataram como uma questão de saúde, uma questão civil-administrativa”.

Sul21 – Como funciona especificamente em cada país?

Diego – No Uruguai, legalizaram todo o processo da cannabis em 2013, regulamentou para fins industriais em 2014. Mas desde 1976 já havia descriminalizado a posse e o consumo de todas as drogas, em plena ditadura militar. Não podia adquiri-la, mas podia consumir na minha casa. Após a legalização da maconha, lançaram uma campanha na TV sobre a nova legislação, explicando os benefícios e riscos da cannabis.

Em Portugal, todas as drogas foram descriminalizadas em 2001, criou um sistema de acolhimento aos consumidores problemáticos e investiu em política de redução de danos e na inteligência da polícia. Inclusive o secretário [José Mariano] Beltrame, de Segurança do RJ, foi para Portugal no ano passado e disse que agora é a favor da legalização. Ele era totalmente contra até então, mas foi lá, viu a situação, conversou com as autoridades e mudou de ideia completamente. Então além de descriminalizar, eles trataram como uma questão de saúde, uma questão civil-administrativa. Se alguém está andando na rua com um pouco de cocaína no bolso e é abordado por um policial, é levado para um centro de dissuasão do uso de drogas, onde vai ter uma equipe médica e de assistência social. Então passa longe da delegacia de polícia.

A Holanda regulamentou, na prática, em 1976, apesar de ainda ser crime na legislação. Não é liberado totalmente como as pessoas acham. Mas há uma política de tolerância, com a premissa básica de que as pessoas irão consumir de qualquer forma. Então preferem que isso ocorra em um local aberto e seguro, esse é o entendimento do governo holandês. Há uma política para os policiais não prenderem, mesmo que seja crime, e há tolerância administrativa de porte, além de que os adultos podem consumir nos famosos coffee shops. Então é uma coisa meio esquizofrênica, porque não é realmente legalizado, pode vender maconha no coffee shop, mas daonde eu compro essa maconha?

Nos Estados Unidos tem cinco estados em que é legalizado, e lá é diferente do Uruguai, onde é controlado pelo Estado. Tem livre comércio de maconha, em Seattle tem até uma máquina tipo de self-service, que tu escolhes ali o tipo que quer, quanto de cada substância e compra. Lá, é legalizado no Colorado, Washington, Oregon, Alasca e Washington DC, tanto para uso medicinal quanto recreativo.

“Com toda essa questão medicinal existe um mercado negro de remédios à base de maconha líquida no Brasil”.

Sul21 – A maconha também tem propriedades medicinais reconhecidas cientificamente, mas nem isso é permitido no Brasil, certo?

Diego – É, eu até escrevi um artigo chamado “A política esquizofrênica do Brasil em relação à maconha”. Tem uma menina em Minas Gerais que tem uma doença degenerativa e a única droga que tira a dor dela é a maconha, porque é analgésica. Ela conseguiu na Justiça um remédio que vem do Canadá feito de maconha, é a planta botada dentro de um vidro. Chama-se Sativex, que vem de “cannabis sativa”, ele tem 25% de CBD (canabidiol) e 25% THC (princípio ativo da maconha, que é o que “dá o barato), é um spray que se coloca na boca. Eu pensei “só um pouquinho, se é proibida a planta, como ela pode consumir uma droga que tem THC?”.

 Guilherme Santos/Sul21

Carl Hart (D) estudou as reações de dependentes de drogas nos EUA | Foto: Guilherme Santos/Sul21

O canabidiol é uma molécula da planta, só que nos Estados Unidos é extrato em natura da planta, é pegar a planta e botar em um vidro, isso é o que chamam de maconha medicinal. E é isso que as crianças com epilepsia usam, que zera a epilepsia. Tem outro caso de um médico, que saiu na revista Crescer, que o filho dele tem síndrome de Dravê, ele só fica bem tomando essa maconha líquida. E saiu na imprensa, eu até escrevi um texto dizendo que ele admitiu que tem um negócio ilegal em casa, então na teoria a polícia deveria ter ido prender ele imediatamente. Ele até disse que se não se regulamentasse no Brasil, ele imigraria para o Uruguai para o filho poder se tratar. Cada seringa que ele compra custa cerca de 450 dólares e dura seis meses, se fosse legal no Brasil ela poderia inclusive ter os pés em casa e cultivar seu próprio remédio. E ele cometeu tráfico de drogas, trouxe ilegalmente dos Estados Unidos.

Tem ainda um psiquiatra em São Paulo que sintetizou e quer vender o canabidiol, mas com toda essa questão medicinal existe um mercado negro de remédios à base de maconha líquida no Brasil. As pessoas estão produzindo em casa e fazendo chá, remédios e vendendo para quem precisa. Isso é tráfico de drogas atualmente pela lei brasileira, as pessoas estão cometendo um crime e podem ser presas por isso.

“Não tem nenhuma justificativa científica, médica para se criminalizar as drogas, de se proibir drogas, seja ela qual for”.

Sul21 – E tem muito aquele discurso, por parte inclusive de médicos, de que ser viciado em drogas deixa a pessoa sem poder de escolha. 

Diego – Pois é, na verdade em geral apenas de 10 a 20% da população vão ter algum problema de dependência com a substância, isso de qualquer droga. Tem um estudo feito por um neurocientista chamado Carl Hart, que era patrocinado pelo governo norte-americano para fazer testes fornecendo drogas para as pessoas, então ele fornecia desde a nicotina, o álcool, o crack, a heroína, todas as drogas. Eles pegavam as pessoas na rua que eram usuárias compulsivas, faziam testes sanguíneos pra ver se elas eram mesmo e convidavam a pessoa pra fazer a pesquisa. Então eles forneciam para a pessoa a droga, no caso cocaína ou qualquer outra que fosse, pura e um valor em dinheiro, que começou com 5 dólares.

Aí a cada momento que eles aumentavam a quantidade do dinheiro, que chegou até a 50 dólares, a pessoa deixava de pegar a droga. Aí temaquele argumento: ‘Ah, a pessoa vai pegar o dinheiro para ir comprar droga’, mas aí por que ela vai pegar o dinheiro pra comprar droga se ela estaria recebendo a droga que ela tem problema de forma pura ali? Ali acabou o argumento também de que a pessoa que tem algum problema com a substância não tem poder de decisão, porque eles tinham, eles escolhiam. Mesmo viciados, que tinham mais problemas, ao invés de eles pegarem a substância, eles pegavam o dinheiro, para comprar comida, para fazer outras coisas com a família. Etão ele provou isso aí, dizendo que não tem nenhuma justificativa científica, médica para se criminalizar as drogas, de se proibir drogas, seja ela qual for.

 

O problema do vicio é um problema social, é um problema de relação. Quem tem uma vida social, tem uma vida boa, vai poder experimentar ou usar, que não vai ter problema. Claro, não é assim ‘’preto no branco’’, porque certas pessoas vão ter problema com uma droga, por exemplo: eu posso beber whisky ou beber cerveja e ter problema com álcool. Tu pode beber e não ter, então depende.

 Sul21 –  Eu já ouvi muita gente dizer: ‘’É, porque se experimentar Crack uma vez, viciou’’. 

Diego – É, algumas pessoas falam que tocaram no crack e ficaram viciados. Claro, porque teve toda uma campanha de mídia e do governo federal de forma burra, né!? Foi o ‘Crack nem pensar’ da RBS e o “Crack, é possível vencer” do governo federal. Quando o Cal Hart veio pro Brasil, ele fez uma fala chamada: ‘’Crack, é possível entender’’, porque toda a abordagem é de propaganda. O governo federal gastou R$4 bilhões nesse programa ‘Crack, é possível vencer’. O que era esse programa: investia dinheiro nas comunidades terapêuticas, investia na polícia, em curso de formação de policiais. Eu fiz vários desses cursos da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), da Secretaria Nacional Anti-Drogas. Então vinha um psicólogo dar aula, psiquiatra ou outros policiais até, só que tudo gerado pra entender que a gente não tinha que ser muito grosseiro quando fosse prender o crackeiro ou quando se fosse prender o maconheiro, mas era tudo uma questão para meio que tratar pra que o policial parecesse mais bonzinho, mas não tem como ser “bonzinho” ou “malzinho” com a lei que temos. Então era jogar dinheiro fora.

Hoje eu tenho essa consciência, de que nós policiais não temos como fazer diferente. Eu não estou mais nessa área final, mas na investigação, tu vai investigar e vai prender. Não tem como fazer diferente com essa lei que nós temos hoje. Porque os policiais são como fantoches, na verdade a gente é usado, a força policial é usada para reprimir algumas drogas e não reprimir outras.

“Qual a diferença do psiquiatra que está me receitando para o cara da boca lá?”

 Guilherme Santos/Sul21

Diego critica “epidemia de Rivotril” e uso generalizado de medicamentos | Foto: Guilherme Santos/Sul21

 Sul21 – Ao mesmo tempo, alguns medicamentos bem fortes são amplamente usados. 

Diego – Sim, hoje temos uma epidemia de Rivotril no Brasil, que é uma droga tão pesada quanto cocaína. E as pessoas tomam para dormir, tomam para acordar. E ainda tem a Ritalina, que os pais drogam seus filhos, que nada mais é do que anfetamina, é muito forte. Uma criança fica dopada quando dá isso. Isso é a hipocrisia no caso da questão de drogas, quem é rico pode pagar um psiquiatra e pedir uma receita de Rivotril. Qual a diferença do psiquiatra que está me receitando para o cara da boca lá? Agora, se eu sou pobre, não tenho condições de pagar e comprar um Rivotril, mas posso conseguir maconha com meu vizinho, que vai me deixar tranquilo e ajudar a dormir. Mas essa é a hipocrisia, é de classe social.

Redação

4 Comentários

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  1. Prender homicida também é

    Prender homicida também é enxugar gelo…rs

    Liberação das drogas não é algo factivel pois para que o estado libere algo este “algo ” deve ser obrigatoriamente regulamentado.

    Ou seja tera que ter o comercio legalizado e auditado pelo poder publico , devido a natureza da substancia sua compra e uso devera ser regulada e sua quantidade comprada controlada pois o estado terá o dever legal de zelar pela ” segurança” da saúde de que usa e da “saúde ” dos que estão ao alcance desse usuário.

    Obvio que isso será inviavel e havera um comercio e um fornecedor “pirata ” que ira vender para quem queira coomprar na quantidade , na hora e no local que esse alguem queira usar, para não falar do preço que será mais baixo seja pq nao paga imposto seja porque tem baixa qualidade mas desde quanto nóia liga para isso?

    e se for legalizada a cocaina o crack será tambem?

    São drogas mas de ação notoriamente diferente em todos os aspectos e se liberar uma não faz sentido proibir outra pq dai toda a cadeia que se propõe anular ficaria inteira ( isso para não falar do contexto ja citado sobre os fornecedors piratas rs )

    Enfim parece bom mas é uma utopia….

  2. A diferença é que nossa

    A diferença é que nossa polícia é militar e NÃO PERMITE manifestações políticas.

    Ao contrário das polícias do exterior  em sua maioria.

     

    Leônidas, sua comparação é ridúcula! Parece coisa de criança birrenta que não quer debater o assunto.

    1. ????

      ????

      Tem certeza que você postou esse comentario no texto certo?

      Não há nele nenhuma relação com meu post…rs

      Na verdade debater o assunto é a base do meu comentario.

      Caso voce não tenha percebido o viés dele é como impedir que uma vez regulada ainda exista  o trafico ilegal e não de formato de policia…rsrsrsrsr

       

  3. DROGAS

    É um grande paradigma, mas tudo está ligado diretamente, o trafico o usuário bandidinho que te rouba e troca por crack qualquer coisa serve de moeda de troca, por causa da falta de controle da fissura (pois não é um comércio legal), o grande traficante que nunca vai preso mas tem armas e capital forte e contatos políticos e policiais ambos corruptos (a polícia deveria estar atrás de criminosos de verdade ou seja eles mesmos políticos que ficam empatando a parte da polícia honesta de resolver realmente crimes desviando a atenção, matando usuário, mini traficantes armados até os dentes, até polícia morrendo e inocentes nessa guerra burra) e que os grandes maus nunca caem na linha de frente como os ponteira no tráfico ou só usuário que vão preso, e entram outro ou outros no mesmo lugar dos mini traficantes para venda, e os que vão preso depois já saem formado na escola do crime (cadeia), deveríamos colocar a maconha para uso como qualquer droga licita como cigarro e álcool que porem são mais prejudiciais que a maconha já comprovado, e fins medicinais e todos fins que se pode usar que são muitos (reorganizando a economia dando empregos também consequentemente) não caberia todos benefícios se colocasse aqui, até um remédio que cura vícios de outras também. E as outras drogas deveriam ficar no âmbito da medicina vendido com receita na farmácia perante tratamento do vicio com indução a parar pelo médico assim podendo estudar mais profundamente a droga e o usuário, cuidando dos doentes certo, arrecadando impostos tirando dinheiro do tráfico e investindo em informação para diminuir o consumo igual Portugal mostrou e outros países, o restante para população e no que precisa que a receita é muito mais muito alta! Pense!!!!! Quanto mais proibir mais cara fica droga e mais interessados em vende-las e mais curiosos os jovens ficam para conhecer e sem informação coerente acham que as outras é igual maconha ao experimentar que não faz nada perto do crack e cocaína que tem a mesma proibição, aí experimentam e já é tarde acorda Brasil!!!!!! Descriminalizar é só o começo da evolução!!! Vamos esvaziar as cadeias tirar os inocentes doentes e quebrar as pernas dos traficantes e corruptos!! Assim ninguém iria comprar drogas de mal qualidade no trafico ilícito!

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