A Banda B da opinião pública

Na discussão pública, até agora, existia uma Banda A (a opinião média midiática refletida na cobertura da grande imprensa). Agora, já ganhou corpo e influência a Banda B, esse imenso e, por enquanto, caótico universo de opiniões que emerge da Internet através dos comentários dos blogs.

São fascinantes as transformações pelas quais está passando a Internet no Brasil, refletindo o movimento mundial. Sugiro aos estudiosos uma análise das mensagens postadas na nota sobre o programa econômico de Geraldo Alckmin.

Percebe-se ali enorme diversidade, do motorista de táxi e micro empresário ao homem de mercado. Não tenho dados sobre os resultados do programa “PC Conectado”, mas é evidente que existe uma enorme massa de neo-incluídos no mercado de opinião através da Internet e dos blogs.

É curioso o contraste com outros ambientes que ainda não se deram conta desse fenômeno.

Nos jornais, é possível ler o ex-Ministro Pedro Malan anunciando a vitória final das idéias que defendia. Nos seminários técnicos, discursos reiterados de novas reformas da previdência e enxugamento do Estado. No Conselho de Economia da FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), o lado real da economia propondo cortes de gastos e redução do estado. É uma celebração de quem ainda não entendeu o novo mundo.

Quando se cai de cabeça no mundo da blogosfera se vê o reverso da medalha, uma opinião pública nova encarando com enorme suspeição esse discurso. Têm-se dois países, e não apenas o da Paulista e o dos grotões.

Já existe um conjunto sistematizado de posições consolidando o papel da Banda B como agente político. Ela também se move em torno de clichês (como o de que toda reforma do estado é por definição maléfica) da mesma maneira que os clichês da Banda A (a de que qualquer corte de despesa pública é virtuoso). Mas é assim que a opinião pública consegue influenciar a política.

E, aí, se percebem diferenças fundamentais entre Fernando Henrique Cardoso e Lula. FHC logrou recuperar o know-how de governabilidade de Campos Salles e sua política dos governadores. Montou um pacto político de craque, que garantiu a governabilidade. Mas não entendeu o novo que vinha por aí, e nem preparou o país para ele. Desmoralizou idéias legítimas, jamais dando atenção à gestão, não procurando legitimar o modelo de privatização, afastando-se da classe média por atos mas, sobretudo, por palavras, inebriado por sua entrada triunfal nos salões do poder -um deslumbramento que acomete alguns intelectuais que entraram na política brasileira, de Rui Barbosa e San Tiago Dantas aos economistas do Real.

Na inauguração do Instituto Fernando Henrique Cardoso, a maioria dos convidados estrangeiros, especialmente o guru espanhol Manoel Castels, falava sobre a emergência desses novos tempos. Mas FHC esteve no olho do furacão, pretendeu modificar os centros de pensamento mundial, e, enquanto ainda era ator relevante, não acordou para um dos maiores fenômenos sociológicos da história. É o que faz a diferença entre o intelectual e o estadista.

Por sua vez, Lula entrou totalmente inexperiente em termos de tecnologia do poder. Em vez de seguir os ensinamentos de FHC, de fechar com grandes partidos, resolveu partir para a cooptação individual de parlamentares, financiando partidos de fachada para esvaziar os grandes. Deu no que deu.

Mas, por outro lado, entendeu como ninguém a emergência da Banda B. E nem se venha com a idéia de que sua popularidade esteja apoiada apenas nos grotões. É só conferir os comentários no blog. Os ensaios de participação popular em alguns ministérios, ainda que por enquanto apenas retóricos, casaram com valores fundamentais dos novos tempos internéticos. O anacrônico tornou-se moderno. O assembleísmo, tenha o nome de concertação ou outro qualquer, é um dos pilares da nova ordem, e terá que ser aprimorado.

Esse país tão carente de déspotas esclarecidos, vai ter que aprender a conviver com a pluralidade ainda um tanto caótica da Banda B. Vai ser um desafio e tanto. Mas, enfim, viva a diversidade! E bem vindos à aldeia global.

Luis Nassif

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