O caso Rodrigo Vianna

É má fé acusar o repórter Rodrigo Vianna de oportunista, por ter divulgado o e-mail contra a Globo após ser comunicado de sua demissão.

A resposta do chefe de jornalismo em São Paulo não convence. Não desmente o episódio relatado por Vianna em sua carta, de que, ainda durante a campanha, teria procurado a chefia de jornalismo com outros colegas, para solicitar isonomia na cobertura das eleições.

Se isso é verdade, comprova duas coisas: a coragem do jornalista, de se insurgir contra abusos contra o jornalismo; e o início de uma caça às bruxas, com sua demissão, que poderá se intensificar se não houver bom senso por parte das chefias de redação.

A tentativa de desqualificação de Vianna, por parte de alguns setores, é componente intrínseca desses tempos de paixão política e do uso indiscriminado da ofensa, da injúria contra os “inimigos”. E “inimigos” não são apenas os que comungam com as idéias do adversário, mas aqueles que não aceitam os métodos utilizados por “nós”.

Vianna deu publicidade a um sentimento que está presente em muitas redações. Em geral há um pacto entre empresas e jornalistas. A linha política é dada pela empresa, mas há um acordo tácito em torno dos fundamentos do bom jornalismo. Quando se força demasiadamente a barra, passa-se a atropelar a chamada qualidade intrínseca da notícia, destrói-se a cultura interna da redação. E aí, não há mais controle. É questão de tempo para apareçam os bastidores de outras redações.

Como se explica essa cegueira coletiva, colocando em risco o ativo mais importante das publicações, que é sua credibilidade? A razão é que, pela primeira vez desde a campanha do impeachment de Collor, houve uma unanimidade exasperante na mídia. A “Folha”, que sempre optou por andar na frente e na contramão -o que se constituía no grande fator de diferenciação— com o advento da era Otávio Frias Filho rendeu-se ao culto da unanimidade. No início do ano, se não me engano, Otávio deu uma entrevista à revista da Varig, dizendo que o jornalismo tinha, finalmente, descoberto a “jurisprudência”. Ou seja, a mesma maneira de cobrir qualquer fato que fosse noticiado. Era uma constatação que atropelava uma das qualidades intrínsecas da notícia jornalística: a diferenciação, a busca do enfoque original, do ângulo novo. Essa diferenciação era garantia não apenas de bom jornalismo, mas funcionava como uma espécie de pesos e contrapesos na cobertura. Antes de cometer uma loucura, o jornal pensava duas vezes porque o concorrente iria explorar o seu erro.

Com a unanimidade, a mídia ganhou uma sensação de onipotência fatal. Para que se preocupar, se as reações aos abusos vinham de setores isolados, sem um milésimo do poder de fogo das grandes publicações? Só que, virando a esquina, havia a Internet, os blogs, as redes de informação que estavam sendo maturadas há tempo.

Na época, quando falei em “suicídio da mídia”, não queria dizer que a grande mídia vai desaparecer. É evidente que não. O que queria dizer é que ela tinha tratado com desdém valores fundamentais do jornalismo, credibilidade, discernimento. Em um período com muito menos diversidade de fontes de informação, a Globo penou anos e anos para se livrar da pecha que ganhou na campanha das diretas — a mesma campanha das diretas que consagrou o jornalismo da “Folha”. Grande parte desse esforço foi jogado fora.

E para quê?

Luis Nassif

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