Andre Motta Araujo
Advogado, foi dirigente do Sindicato Nacional da Indústria Elétrica, presidente da Emplasa-Empresa de Planejamento Urbano do Estado de S. Paulo
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A maldição das grifes de moda, por André Araújo

Por André Araújo

A MALDIÇÃO DAS GRIFES – Há um livro clássico sobre o ciclo das grifes de moda, chama-se THE FASHION CONSPIRACY, de Nicholas Coleridge,  edição inglesa da Harper & Row, 1980. O livro narra a história das grifes de moda e seus ciclos naturais de nascimento, vida e morte. Uma grife exclusiva vira símbolo de classe e elegância, uma classe endinheirada se identifica com a marca que, pela sua exclusividade,  torna-se emblema de status e riqueza. A grife, antes pequena e exclusiva, cresce e prospera, atrai a atenção de grandes corporações ou fundos de investimento, que a compram pagando aos donos originais um valor extraordinário. Para remunerar o investimento, a grife precisa se expandir pelo mundo, mas aí surge um dilema, com a expansão em múltiplas lojas por todos os continentes a grife deixa de ser exclusiva, passa a banalizar-se e aqueles que procuravam se identificar pelo status de exclusividade caem fora dessa grife, que se disseminou e  virou coisa acessível à classe média, a grife rapidamente perde seu timbre de exclusiva, vira banal e a marca perde valor.

Grifes famosas dos anos 60 saíram de lojas luxuosas em Paris e Milão para serem vendidas em butiques de navio e algumas até na calçada, caíram na vida. Quando uma grã fina de alto bordo vê uma perua vulgar usando a bolsa outrora exclusiva, cai fora da marca e vai procurar outra que só existe em cidades do circuito europeu da moda e em Nova York, como Celine, Balenciaga, Chopard ou Loewe. Lembro nos anos 60 da loja da Ferragamo em Florença, nos baixos do palazzo onde morava a família, hoje as lojas existem pelo mundo afora. Marcas exclusivas como Pierre Cardin se popularizaram, outras estão a caminho, como Ralph Lauren. Logo a Prada, comprada por um bilhão de dólares e Valentino, por 1,6 bilhões seguirão o mesmo caminho inexorável.  Revlon e Max Factor já foram marcas caras de cosméticos, hoje estão em drogarias, os ciclos de vida das marcas são estórias de ascensão e queda no altar do luxo.

O comprador de grife exclusiva não quer ver acessórios similares aos seus por todo lugar e foge da expansão da grife.

Para uma camada ainda mais alta da sociedade, mais culta e refinada, a simples exibição de grifes é, por conceito, um ato de vulgaridade. Paga-se caro pelas grifes da moda, como Prada, Chanel, Vuitton,  porque elas dão identidade a pessoas que precisam mostrar status porque se sentem inferiores. Pessoas refinadas e intelectualizadas se sentem superiores pelo espírito e não precisam da muleta das grifes, consideram que a verdadeira elegância está nos gestos, nas atitudes, na personalidae. O Duque de Windsor, ex-Rei Eduardo VIII, foi considerado o homem mais elegante do Século XX e só usava roupas velhas de 40 anos, tudo o que usava virava moda instantanemanete, o nó grosso da gravata, o tecido Príncipe de Gales, o sapato Church, era elegante dormindo.  Os verdadeiramente elegantes não precisam se preocupar em ser elegantes porque neles tudo é natural , as grifes são aquilo que o brega acha que é fino, mas essa finesse não é inerente à sua personalidade, é uma montagem artificial, por isso é tão importante a bolsa Prada, é o artifício que a perua acha que a faz fina, na falta de outra qualidade a bolsa serve de embalagem à sua alma vazia.

Vimos, nos escrachos das faturas de cartão de crédito de mulheres e filhas de políticos investigados, a verdadeira obsessão por compras de grifes caras, gastos absurdos para tentar mostrar como são finas através de bolsas e sapatos, coisa tão primitiva como os os antigos sobas africanos do século XVI, que andavam descalços de fraque e cartola porque achavam que aquilo os fazia parecer europeus.

As sucessivas ondas de novos ricos nos países emergentes a partir do pós guerra fizeram a festa das grifes, o mercado das grifes é formado  por novos ricos à procura de identidade, ricos velhos geralmente não precisam desse caro artíficio, seu status é de berço, são elegantes mesmo com roupas baratas, aliás o ultra chic é não usar nada de grife.

Se essas mulheres e filhas de políticos, ao invés de torrar dinheiro em grifes, ajudassem um orfanato ou uma creche seriam muito mais finas, dariam algum troco à sociedade, mesmo sendo seus maridos e pais corruptos, mas ao que se saiba jamais deram a mão para um cego atravessar a rua, por aí se vê que não são finas. No passado esposas de políticos faziam grandes obras sociais, dona Leonor Mendes de Barros, esposa de Adhemar de Barros, construiu sanatórios para tuberculosos em Campos do Jordão, dona Sarah Kubtschek se dedicou a hospitais, dona Darcy Vargas fez a casa do Pequeno Jornaleiro para os meninos que vendiam jornais,  eram senhoras de berço social elevado que sabiam quais eram suas obrigações, as de hoje se realizam em tours forçados de compras, uma delas tem oito faturas altíssimas em um só dia de esbórnia nas lojas de grifes e ainda pretendem ser elegantes.

Nas faturas investigadas não há uma única compra de livro ou de gravura em loja de museu, tampouco há uma única compra de entrada para uma ópera, um ballet ou um concerto sinfônico, não aproveitaram o dinheiro da propina nem para civilizar-se.

Andre Motta Araujo

Advogado, foi dirigente do Sindicato Nacional da Indústria Elétrica, presidente da Emplasa-Empresa de Planejamento Urbano do Estado de S. Paulo

20 Comentários

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  1. Mais um artigo sensacional

    Prezado André, é um prazer ler seus artigos

    Desta vez você queimou até o solo, pareceu um viking arrastando a espada e destruindo tudo.

    O que você diz observo em outros setores da sociedade, pessoas (que também considero que têm um sentimento recalcado de inferioridade) mimetizam o comportamento dos ricos (cuja maioria não é exemplo de nada para ninguém, porque praticam o “consumo conspícuo”, torram dinheiro para mostrar que têm dinheiro. Se você enlatar merda e vender a US$ 10.000 a lata, vão comprar).

    E ainda considero válida uma tese sobre isso tudo: de que o neoliberalismo, com sua ganância, egoísmo e individuALISMO feroz; levou a este desastre que virou nossa sociedade (que é uma cópia da sociedade nortre-americana)

    De novo, post muito bom; estou sempre apredendo

  2. Na última sexta-feira no

    Na última sexta-feira no Brás, comprei duas calças jeans por R$70,00, duas camisas de gola polo por R$50,00 e um tênis por R$150,00,  todos de primeira qualidade.

    1. Roberto, eu quase choro

      Roberto, eu quase choro quando tenho que pagar mais de 15 dolares por uma calca!  E nunca tive um Nike porque nao quero ter.

      *******

      Andre, em termos estritamente teoricos voce expoe com maestria o que eu sinto a respeito de assistir televisao(!).  Ta todo mundo falando do novo show como ta todo mundo falando da “ultima” moda, me entra por um ouvido e sai pelo outro…  desde crianca.

      A vulgarizacao da “alta moda” eh o dia que um show chega na tv e comeca a ser assistido, dai pra frente eh todo mundo falando as mesmas coisas, repetindo as mesmas sentencas, pensando que isso os aproxima de uma “vida” artificial que eu nao cogito levar!

    2. Tô morrendo de dó aqui!

      Em agosto minha filha mais nova faz 15 anos e vou mandar fazer um paletó pra festa. Tô morrendo de dó que vou gastar uma grana aqui. Mas me consolo que não compro paletó há uns 5 anos – e último foi comprado na promoção da Colombo, tipo “terno + calça por 179 reais”…

      Se tem um negócio que eu definitivamente não gasto dinheiro é com roupa. Quando fui a Lisboa fiquei extasiado por ir a um outlet e comprar camisa social manga longa a 4 euros!

  3. Grifes

    É raro ler alguma crítica “social” ao uso de grifes, mas acho esse assunto interessante e na maioria das vezes engraçado. Gosto de ver as entrevistas dos estilistas no SP Fashion Week. Quase sempre, anos após ano, os estilistas vestem calça jeans e camista preta e ficam falando das tendências de moda. Porra, de onde tiram essas coisas. É muita capacidade de falar bobagem.

    Neste fim de semana assisti a uma conversa de 3 adolescentes querendo comprar o novo Iphone, por R$ 6mil. A venda antecipada é por R$ 15mil, por um telefone.

  4. O descaso com cultura é a

    O descaso com cultura é a marca da nossa elite. Ela deve lamentar que cultura não é algo que possa ser engarrafado é vendido numa loja de grife rs  

  5. AA, banho de cultura, Brasilia banho de …

    AA sempre a me lembrar dos detalhes que identificam gostos e tendências.

    Num dos seus desfiles de “alta moda” Yves Saint Laurent foi fotografado usando sem ostentação um relógio Panerai até então ferramenta de uso da marinha militar da Itália e de pouco valor frente aos Rolex da vida, este se transformou imediatamente em objeto cult procurado e valorizado.

    A procura da grife quando afirmada no mercado é uma precária exibição de status, o status sempre procura a exclusividade até nos simples gestos. Giovani Agnelli o senhor fiat usava o relógio por cima dos pulsos da manga da camisa era ele no começo em seguida era uma farsa generalizada e de mau gosto.

  6. Noblesse oblige!

    Noblesse oblige!

    No passado havia uma certa discriminação dos chamados nouveaux riches, pois as pessoas eram conhecidas pelo qualidade do aprendido durante a sua infância, por exemplo, eu e mais 99,99% da população do mundo na verdade nem sabem quando estão bebendo um vinho de alta qualidade ao menos que olharem para o rótulo e já tiverem decorado os melhores em cursinhos de degustação, uma verdadeira frescura.

    Por coincidências que acontecem na vida das pessoas passei o primeiro do ano de 1972 num bistrô em Paris com a nobreza francesa, um conde e uma arquiduquesa e mais alguns pé de chinelos como eu. Eles ficaram admirados porque eu gostava de escargot enquanto outros do povo negavam o prato, eles me viam como um cachorrinho amestrado que conseguia fazer piruetas.

    Como o bistrô estava fechado ao público em geral, dançamos e tive o desprazer de dançar com a arquiduquesa que como toda a boa nobre francesa da época, fedia como um bode. Era patético, eu com 18 anos dançando com uma senhora de mais de 60 anos (naquele tempo para mim era uma velha, hoje estaria no ponto). A minha sorte é que a arquiduquesa estava acompanhada por seu “valet de chambre”, que devia ter uns trinta anos e era especializado em agradar senhoras.

    Excetuando a dança foi agradável, porém pela primeira e última vez que tomei vinhos que diziam que eram muito bons, mas para meu paladar era igual a vinhos que custariam menos do que 5% do valor das garrafas.

    Agora isto serviu para simplesmente me tirar qualquer veleidade sobre o que é ser fino, pois cheguei a grande conclusão que grosso do Rio Grande do Sul, nasce grosso e morre grosso, porém feliz.

    1. Um dos maiores mitos sobre vinhos

      Um dos maiores mitos sobre vinhos é “vinho bom é vinho caro”. Aliás, é um dos “4 Grandes Mitos Sobre Vinhos*” que as nossas elites incultas cultivam.

      Fico escandalizado com o preço dos vinhos, inclusive nacionais, aqui no nosso Brasil. Vinhos que na Europa custam 10, 12 euros, e são excelentes, aqui são vendidos por 300, 500 reais. E não me digam que é o imposto de importação que faz custar caro. Não tem chance de o imposto junto com o frete majorar em 300% o preço do produto. É frescura mesmo, vender caro pra parecer exclusivo!

      *Os outros 3 são: “vinho bom é vinho velho”; “carnes com tintos, peixes e aves com brancos”; e “vinho bom é vinho importado”.

      1. Para mim na época em que tomava vinho, tinha um limite ….

        Para mim na época em que tomava vinho, tinha um limite superior do paladar, acima de um valor considerava a relação qualidade preço decrescente, ou seja, acima do limite acrescia a despesa e nem percebia a diferença.

        Para tomar estes vinhos caros, precisa começar a vida já bebendo-os, depois de uma determinada idade é só pedantismo e desperdício.

        O Francês geralmente gasta 10% a 20% do preço que aparece nas lojas de vinho, ele compra caixas diretamente do produtor guarda na sua adega e espera um bom tempo para beber, e bebem que nem uns loucos. No ranking de consumo per capita temos em primeiro lugar o  Vaticano 54,78 litros por ano, em 4° a França co 45,70 e o Brasil ocupa a 96ª posição com 1,79 litros por ano. Há uma injustiça com o Vaticano, pois se fossemos considerar este per capita em relação aos adultos tirando as crianças a França passaria do Vaticano com facilidade.

        Agora o que se vê, na França é um verdadeiro esporte nacional enquanto no Brasil é algo raro.

  7. Pretensão e distinção.
    A quem interessar possa, Simmel fala dessas coisas desde a virada do século XX
    Já no final do mesmo século Bourdieu e Lipovetsky deram grandes contribuições.

  8. Da revista satírica estadunidense, a MAD,

    o André Araújo me faz lembrar uma – obviamente – sátira a respeito de moda, que dizia algo assim:

    “Você é um pobre, quando quer seguir moda mas não consegue porque não tem dinheiro,

    você é um remediado, quando consegue pagar para seguir a moda, e

    você é rico, quando você faz a moda”.

     

    Isso apareceu na MAD, já há décadas atras. 

     

    É o que eu entendo por moda, por grife, etc. 

     

  9. Uma vez li o seguinte:
    Os

    Uma vez li o seguinte:

    Os pobres não seriam tão pobres se não gastassem tanto dinheiro para não parecerem pobres.

    1. E os cafonas compram as

      E os cafonas compram as grifes que eles acham que os finos acham que é chic.

      Dai o imenso sucesso de sites de aconselhamento de moda, alguns deles tem 500 mil acessos por mês,

      as peruinhas e galinhos não tem noção do que é chic porque essa noção vem de cultura e de berço, então eles dependem que alguem diga a eles o que é que deve ser comprado para parecer chic. As gurus da internet passam então a vender sua opinião para grifes que anunciam, é um sistema completamente mercenario.

       

      1. A noção de moda é simples, é se vestir com aquilo que te achas..

        A noção de moda é simples, é se vestir com aquilo que te achas bem. Eu por exemplo uso calça co suspensórios, que tando ou não tando na moda não fico com a cintura debaixo da barriga nem caindo as calças, o resto que se exploda.

  10. Pois é

    De vez em quando brinco: eu não tenho dinheiro mas tenho pedigree”. Tenho de concordar com André (mais uma vez) vestir grife é diferente de ser elegante. Mas ter uma roupa boa faz diferença (  que não tem de ser de grife). Me lembro que em priscas eras, eu, pobre mortal, mandava fazer calças e camisas. Era normal. Hoje, nem sei onde.

    E por incrível que pareça, passeio por lojas de roupas usadas aqui em BH. Encontrei uma camisa de linho que nem existe mais, e nem sei em qual loja encontraria; o preço nem é bom pensar.

  11. Tem moda e grife que é pura enganação. . .

    Tem moda e grife que é pura enganação é o caso do café da Indonésia que é comido por um marsupial  e excretado em suas fezes. As fezes sao coletadas, separam-se os grãos que “melhorariam de qualidade”, após passar pelo trato digestivo do animal e são vendidos como o melhor café do mundo e mais caro também. Ocorre que se o café é produzido normalmente em um ano bom e ensolarado, colhido adequadamente e  secado de modo correto, esse é o melhor grão de café que pode haver e não tem como melhorar sua qualidade, pelo contrário só  se pode piorá-la..

  12. Elegância não tem preço e nem marca
    Adorei a matéria! Você disse tudo!! Pessoas vazias e artificiais compram roupas de grife para se sentirem melhor. Percebo que pessoas que têm complexo de inferioridade compram coisas caras pra deixar de ser inferior. Isso é patético. Essas pessoas têm que ir se tratar e não ir à loja de grife mais próxima. Rss Elas querem ser elegantes com roupas caras. Mas ser elegante é atitude e caráter. E isso reflete nas roupas. Roupas boas têm que ter qualidade independente de preço. Primo pela qualidade do tecido. Quando gosto de uma roupa o que maise chama a atenção é a qualidade e não a marca.
    As pessoas hoje são vítimas da moda e ficam todas iguais pq só querem usar aquilo que está na mídia. Nem percebem que parecem robôs. Muitas vezes usam roupas que não combinam com seu corpo ou com seu estilo. Compram só pq está na moda. Aff

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