Marcelo Semer: a barbárie chega aos poucos

Sugerido por Marcelo de Sousa Nascimento

Do Terra Magazine

A barbárie chega aos poucos. E quando a gente se dá conta…

Marcelo Semer

A barbárie chega aos poucos. 
 
Ela se instala quase sempre sem alarde. 
 
Na maior parte das vezes, por trás de motivos ditos imperiosos, circunstâncias extraordinárias e outras coisas pretensamente terríveis com que nos convencem a abrir mão de direitos.
 
Ela cresce sob a batuta do medo e a suposta necessidade de reagir, gerando ainda mais medo, naquele círculo vicioso de uma profecia que se autorealiza.
 
As pessoas vão se acostumando a romper os limites do que pensam e falam e como se tratam. Jornalistas e políticos abrem mão de seus protocolos e de seus princípios. Juristas acomodam e flexibilizam os conceitos do direito. E a histeria vai comendo a todos pelas bordas.
 
Quando a gente se dá conta, está matando uma mulher à pancada em plena rua, porque alguém disse que quem sabe teria sido suspeita de um crime que ninguém nunca viu.

 
Já faz tempo que vimos nos seduzindo por um discurso irresponsável e sensacionalista que prega, a partir do eterno mito da impunidade, a necessidade de mais polícia, mais pena, mais prisão, mais tortura, mais mortes.
 
A lógica do estado policial vai se instaurando como um vírus dentro do corpo social, porque interessa a muitos que combatem, às vezes abertamente, outras de forma sub-reptícia, a preservação do estado social. 
 
Afinal, direitos são mais caros do que penas. E emancipam, não encarceram.
 
As soluções de todos os problemas passam, então, pela dinâmica criminal. Tudo é criminalizado e criminalização é cadeia e cadeia é, sobretudo, dor, sofrimento e morte. 
 
E quando o direito penal não funciona, a culpa não é atribuído ao excesso, mas à escassez, resolvendo-se, então, em mais crimes, mais penas, mais prisões, mais torturas. 
 
E o reclamo de que o estado é ineficiente, leniente, frouxo e que as pessoas tem “legítima defesa” para agir contra criminosos.
 
Quando a gente se dá conta, está matando uma mulher à pancada em plena rua, porque alguém disse que quem sabe teria sido suspeita de um crime que ninguém nunca viu.
 
Pouco importa se a cultura do bandido bom, bandido morto resulta em uma contradição inconciliável –porque matar é um crime mais grave do que a maioria dos crimes atribuídos a esses “bandidos” que são mortos.
 
O importante é aumentar o tônus criminal, porque isso dá audiência, isso dá votos, isso dá ordem e disciplina, isso confirma uma linha imaginária (e, sobretudo, racista) que separa os bandidos dos homens de bem –criminosos em muitas outras órbitas, mas homens de bem assim mesmo.
 
E na toada vamos concordando com o aumento de penas, com o encarceramento desmedido, com o senso comum de que a impunidade cresce, paradoxalmente com o inchaço da população carcerária, e que, enfim, é preciso aceitar medidas drásticas para situações excepcionais.
 
E passamos a tratar criminosos como inimigos, manifestantes como terroristas, favelados como subumanos, e vamos admitindo as violências policiais, os estados de sítio implicitamente decretados nas decisões judiciais, e compreendendo a revolta de quem se vê, ou apenas se sente, vítima da criminalidade.
 
Aí a gente criminaliza a defesa, porque só atrapalha, culpa o habeas-corpus porque atrasa a justiça, responsabiliza os próprios presos pelas violências que sofrem, e admite prender garotos no poste, quando são flagrados no crime, porque, afinal de contas, nada funciona mesmo.
 
E quando a gente se dá conta, está matando uma mulher à pancada em plena rua, porque alguém disse que quem sabe teria sido suspeita de um crime que ninguém nunca viu.
Redação

26 Comentários

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  1. Perfeito.
    Agradeço a Deus

    Perfeito.

    Agradeço a Deus todos os dias por não ter vendido minha cabeça para deixarem que pensem por mim.

    Infelizmente a maioria adotou a doutrina do pensamento único, e tem preguiça de pensar e procurar fugir dos grandes meios de comunicação que em muito contribui por esta situação que vivemos hoje.

    Eles abandonaram sua função primordial que seria informar, para atuar como partidos políticos .. e aí eles perderam o rumo. Mas ganham muito com isto.

     

  2. Texto excelente

    Muito bom! Aplaudo de pé! Belo e moral!

    É o famigerado populismo penal. A intolerância gera violência e as fórmulas da sociedade fracassam, cada vez mais, gerando mais e mais violência, mais e mais intolerância, mais e mais medo dos abismo muitas vezes imaginados. É um círculo vicioso.

    O lema bandido bom é bandido morto é uma aberração. A necessidade de se apartar e punir implacavelmente os “bandidos” funciona muitas vezes como uma sublimação dos fracassos pessoais. As pessoas precisam encontrar culpados pelos seus fracassos.

    E, como disse Marcelo Semer, quando a gente se dá conta, está matando uma mulher à pancada em plena rua, porque alguém disse que quem sabe teria sido suspeita de um crime que ninguém nunca viu.

     

    1. Boa Argolo, concordo com o

      Boa Argolo, concordo com o que voce disse. Mas me diga uma coisa. Isso de sublimacao dos fracassos pessoais tbm nao pode ser transferido para as criticas sem fundamento em relacao aos politicos? Penso assim porque esses dias um conhecido disse que queria ver o Lula morto, debaixo da terra porque na epoca do FHC ele tinha uma poupanca de X e no Governo Lula ele nao conseguiu juntar X/100. Ai eu lembrei na minha cabeca de todos os problemas pessoais que o cara teve  e que o fizeram gastar as suas economias. Nao serah isso uma forma de sublimacao os fracassos pessoais? Ou entao, peguemos o exemplo das pessoas que sempre reclama que tem que pagar imposto de renda. As pessoas sao adultas e sabem dos valores da aliquota a anos, recebem seus salarios sabendo que o quanto de imposto tera que pagar, mas mesmo assim, quando se encontram no vermelho elas olham como primeiro culpado o imposto e nao as eventualidades  e, por que nao, alguns descontroles financeiros. Eh por essas e outras que a critica aos polticos eu veja como vc pontua no caso desse texto, simplesmente, sublimacao dos fracassos pessoais.

      1. Os políticos também sofrem com essa projeção

        Em muitas áreas isso acontece. Não seria diferente com os políticos. Muitas das críticas ao governo, aos políticos de uma forma geral, vem dessa transferência de responsabilidade pessoal. E culpar o governo é a coisa mais fácil que existe. Muita gente faz e gosta de fazer isso. Até na violência doméstica contra a mulher acontece esse fenômeno. O marido não pode fazer nada contra o chefe e termina descontando na esposa. Alguém precisa servir de saco de pancadas. É uma forma um tanto simplista de ver as coisas, mas isso existe e muito. Claro que não é uma regra geral, válida em todos os casos e situações. Mas tem a sua área de aplicação. É um fenômeno um tanto primitivo da psiquê humana. Geralmente, a pessoa fica com raiva de alguma coisa e, diante da impossibilidade de extravazar contra aquilo que lhe incomoda, termina transferindo para outro alvo. Não é raro de acontecer. Qualquer pessoa já deve ter passado por isso algumas vezes na vida.

    2. Clap clap clap clap!

      “O lema bandido bom é bandido morto é uma aberração. A necessidade de se apartar e punir implacavelmente os “bandidos” funciona muitas vezes como uma sublimação dos fracassos pessoais. As pessoas precisam encontrar culpados pelos seus fracassos.”

      Certeiro! Freud já explicava isso através dos Mecanismos de Defesa.

  3. MITO da impunidade?!

    O texto é bom e toca em vários pontos importantes com os quais concordo. Mas como falar em MITO da impunidade se a maioria dos homicídios do país não dão em punição alguma?!

    http://www.conjur.com.br/2012-jun-13/brasil-arquiva-80-investigacoes-homicidios

    De quase 135 mil inquéritos que investigam homicídios dolosos — quando há a intenção de matar — instaurados no Brasil até o final de 2007, apenas 43 mil foram concluídos. Dos concluídos, pouco mais de 8 mil se transformaram em denúncias — 19% dos responsáveis pelos assassinatos foram ou serão julgados pela Justiça. Ou seja, o país arquiva mais de 80% dos inquéritos de homicídio.

    Tem gente que não precisaria ou deveria estar presa por uma série de motivos. Tanto que cito 4 que vem de cabeça e me desculpo antecipadamente se me esqueci de algum outro relevante:

    – prisões de inocentes em função de apuração equivocada

    – prisões preventivas ou provisórias desnecessárias e até mesmo ilegais

    – penas que poderiam ser substituídas por penas alternativas

    – todo contigente ligado ao tráfico de drogas que seria “eliminado” em caso de legalização

    Sem falar nas condições dos presídios e na falta de mecanismos ou incentivos adequados para a (re)inserção do ex-apenado na cadeia produtiva, pois de alguma forma ele terá que se sustentar ao sair da cadeia. Até para que o mesmo não retorne ao crime.

    Mas ignorar esses 80% dos homicídios que não resultam em pena alguma é ignorar a MAIOR PARTE dos crimes graves que ocorrem. E não vejo como podemos melhorar de forma significativa o problema que é hoje a segurança pública sem considerar o todo, ou pior, fingindo que ele não existe ao alegar que impunidade é um MITO.

  4. Ora, ora…
    Se temos um

    Ora, ora…

    Se temos um justiceiro comandando o STF, com o apoio de intelectuais, políticos,  imprensa e boa parcela das classes médias e alta,  esperar o quê do resto da sociedade brasileira?

    Alguém aí viu manifestações de representantes influentes de organizações da sociedade civil ou de intelectuais e artistas contra o barbarismo em que se transformou o julgamento do mensalão? Ao contrário, tiveram manifestações contra os embargos infringentes, um recurso legal previsto no Código de Processo Civil, e com um agravante: ministros do proprio STF se manifestaram contra este recurso legal. Existe na sociedade letrada brasileira o discernimento de que defender a aplicação correta de leis não significa compactuar com ilegalidades? 

    Como sempre nestes casos a “geni” são os políticos e o governo quando na verdade a culpa é nossa que baixamos a cabeça frente ao barbarismo presente na sociedade brasileira.

     

  5. Os pilares da sociedade estão

    Os pilares da sociedade estão abalados. As igrejas com seus pecados e crises influenciam os fiéis ou seguidores. A justiça, sendo percebida como realmente é: Ambígua e iníqua. As escolas, não conseguindo absorver nem transmitir esse enorme estoque de conhecimentos que se multiplica com grande velocidade. Os mocinhos do mundo sendo percebidos como terroristas e fomentadores da desestabilização de governos não alinhados, via entidades secretas e não secretas. A Europa entristecida e quebrada pelos que se apresentam ao mundo como modelo e salvadores. A mídia, sendo percebida como golpista e braço de apoio dos bandidos unidos. Tudo isso está dando um nó em nossas cabeças. Sem contar os expoentes da esquerda de outrora mudando de lado e igualmente furibundos e desconexos perdendo crédito. Não entendo bem, mas me parece que os ingredientes são suficientes. E só não prospera o desfecho porque estamos sob o jugo dos bacharéis. E nesse jugo, tanto a cidadania como  nossas relações pessoais e institucionais como um grande mercado onde cidadão, estado ou empresas são apenas clientes.

  6. Excelente

    A demonstração clara que o problema é de cunho cultural formado à partir de um modelo que separa o todo em partes.

    Daí a justiça com as próprias mãos, a omissão de instituições democráticas, políticos representando interesses bem específicos.

    Enfim, estamos consumando a sociedade do cada um por si.

    Isso é e exatamente a sociedade policialesca, onde o direito criminal, ou melhor, a lei da porrada e da exclusão via carceragem se torna a única posição pensada e desejada por aqueles que querem se iludir, achando que “câmara de gás” resolverá o problema de uma sociedade.

  7. Desonesta é o retórica

    Desonesta é o retórica esquerdista.

    “A barbárie chega aos poucos. “

    Não ela vem precedida de leis como o ECA.O que se planta colhe.

    “Ela se instala quase sempre sem alarde. “

    Só se você vive em um mundo com segurança partiular, os indices de violência anualmente vem aumentando.

    “Ela cresce sob a batuta do medo e a suposta necessidade de reagir” 50 mil assassinatos ao ano não é motivo o basatante para reagir?

    O que será necessário para que haja uma reação, bandido colocar fogo nas vitimas, arrastar crianças,espancar, estuprar, isso já acontece.em nosso país toda espécie de maldade já foi feito pelos bandidos.

    A anomia social é o que se colhe quando se planta a ideologia esquerdista.

     

     

     

    1. Só apartir de 2003?

      “..A anomia social é que se colhe quando se planta a ideologia esquerdista…”

      Uma coisa eu não vou negar AL. Admiro sua capacidade de levar para o lado da ideologia esquerdista quaisquer assuntos. E pode acreditar que não estou sendo irônico.

       

      Antes do governo de esquerda (se é que é mesmo) atual não existia linchamentos? Não existia Gil Gomes? Não existia jornais que pingavam sangue?

      1. Aqui, mas nao eh soh o Al que

        Aqui, mas nao eh soh o Al que leva tudo para o lado da ideologia esquerdista. Exemplos aqui no Blog nao faltam. Pacheco, Mauro B. Motta, Leonidas risadinha, etc. Todos tem algo bom pra falar, mas no meio dos comentaris insistem naquilo que eles mais nos acusam: o sectarismo.

        1. Francy, o ódio é um dos

          Francy, o ódio é um dos fundamentos do proselitismo esquerdista, o ódio de classe une toda a esquerda, por isso é  mais homogênia que a direita. No fim todas as correntes se unem em volta do ódio de classe.

          O que seria da esquerda sem o ódio de classe?

          O que seria da esquerda sem o futuro utópico? 

          Não são estas as justificativas morais para as ações da esquerda. Não existe limites éticos para a defesa destes principios,a “causa” esta acima de qualquer coisa. 

           

      2. ” levar para o lado da

        ” levar para o lado da ideologia esquerdista ” eu faço o mesmo que a militância esquerdista faz, não posso ser condenado por agir da mesma forma que meu inimigo, não pode exigir de mim mais ética do que me oferecem, seria uma luta injusta.

        “Antes do governo de esquerda” e antes deste governo não existia todo um  aparato subversivo na sociedade.

        Esquerdismo e a doença infantiu do comunismo, agora e o governismo a doença da esquerda.

         

    2. DESISTO.

        Desisto de te considerar alguém minimamente sério. Você não o é e nem pretende ser.

        Está se falando de uma QUESTÃO CULTURAL. A cultura brasileira foi e é moldada pela violência desde seus primórdios, até hoje a escravização do gênero humano é aceita na zona rural (negros AINDA como principais vítimas) e mesmo na zona urbana (negros e, cada vez mais, imigrantes de paíes vizinhos) e vocÊ vem falar em “retórica esquerdista”? JUSTO VOCÊ, que sempre defendeu e defende uma visão da sociedade em que TUDO está à venda?

        Você não tem moral para falar em desonestidade.

      1. QUESTÃO CULTURAL.Mas estou

        QUESTÃO CULTURAL.

        Mas estou falando da questão cultural, quando se opta pelo esquerdismo vem um pacote completo de subversão da ordem moral, social, juridica.

        O relativismo moral, o niilismo politico, a busca da moral sem culpa, tudo faz parte do pacote esquerdista.

        A esquerda defende o banditismo pq na sua visão de mundo o bandido é um proto revolucionário, e u m alienado que apenas não sabe direcionar a sua força em quem o oprime, já que ele é mais vitima do que um agente da violência.

         

  8. Realmente a barbárie chega

    Realmente a barbárie chega aos poucos. O que vivenciamos hoje é o deslanchar de um processo complexo e com inúmeras variáveis interligadas e interdependentes, e não uma irrupção simplesmente de ira homicida por uma parte da população. 

    Entretanto, mesmo como processo esse fenômeno tem um começo, uma gênese, e subjacente uma ideologia que lhe dá impulso e o sustenta que se bifurca em duas vertentes que não deveriam ser, mas são excludentes entre si em razão da nossa autossufiência e egoísmo.  São elas:

    1ª) A que categoriza de forma simplista e reducionista os seres humanos em “bons” e “maus” e desconhecem qualquer influência do meio, do ambiente físico-social, para a formação intelectual e moral de um ser humano. São os adeptos do “dar a vara, não o peixe”, e no tema em discussão, de que o crime é apenas a manifestação de uma personalidade distorcida, maléfica, e que portanto a “cura” só poderá ser a repressão nas suas variadas formas. 

    Assim, no limite , se o Estado falha ou é omisso nesse mister de punir e assim extirpar esse “tumor”, esse corpo “estranho” no tecido social, é compreensível e até aceitável a barbárie que, nesse caso, passaria a ser apenas auto-defesa ou mesmo um modo de protestar contra a inoperância de quem, institucionalmente, tem o monopólio da força. 

    Mas, eis aqui a verdadeiro horror dos horrores: se há esse impulso “natural” , atávico, de retornarmos aos tempos pré-civilização, ele só se ultima quando de certa maneira é encorajado de forma reptícia através de certas matrizes que manipulam esse caldo de revolta para tirar proveitos políticos-ideológicos. 

    Em qual estágio do processo civilizatório retornará uma população que diariamente é acossada pela violência e não acredita mais em quem deveria combatê-la? Que sentimentos terá um pai, uma mãe, um filho, um amigo, quando vê os seus serem friamente assassinados por facínoras? 

    2ª)  Na mesma equivalência em termos de visões unilaterais,  há os que a priori e a posteriori abandonam, ou minimizam, a questão do livre-arbítrio, do ato de vontade, das índoles más, ou seja, reduzem o ser humano a uma tábula rasa a ser preenchida pelas injunções do meio-social e dos diversos contextos históricos. Seríamos apenas seres manipulados e conduzidos por essas forças que se manifestam ora de forma explícita, ora implícita. 

    Deste modo, a violência, ou particularmente o crime, seria  resultado mais dessas interações do que propriamente a emanação de uma personalidade assumidamente criminosa. Seu combate, por consequência, se daria pelas “raízes”, ou seja, elidindo as suas causas – as injustiças sociais – e menos por mais repressão, encarceramentos, agravamentos de penas e , o grande debate do momento, pela redução da maioria penal. 

    O que dá força essa corrente ideológica são as estatísticas. Ou seja: os fatos “nus e crus”. Se é nas camadas dos mais carentes que há déficits, se não mesmo inexistência, do que chamamos de “bens da cidadania”, como educação, cultura, saúde, moradia digna, emprego etc que emergem a maior parcela de criminosos, não há porque se ignorar essa relação de causa e efeito. 

    O doloroso e cruel é que esses linchamentos na grande maioria das vezes se dão nesses ambientes de extrema carência exatamente porque são mais suscetíveis aos apelos das matrizes ideológicas arguidas anteriormente. Seriam os injustiçados matando, seviciando e odiando os seus iguais sob os “aplausos” e incentivos indiretos dos arautos citados no item anterior.

    Por fim, concluo que ambas as abordagens são complementares e se ajustam perfeitamente,  a partir da constatação que somos um TODO formado por injunções internas e externas. Se a capacidade de discernimento é em parte inata, do mesma maneira sofre interferências do “exterior”. Como bem escreveu Ortega y Gasset: “Eu sou eu e a minha circunstância”.

    O que está fora de qualquer cogitação é a interrupção do processo civilizatório que se concretiza tanto na condescendência com a barbárie,  como na fixação irresponsável em ideologias que procuram negar a individualidade e a capacidade do ser humano de ser o agente do seu destino.

    Entender, compreender, e principalmente, agir para redução das assimetrias sociais. Perdoar, até.  Mas também punir, reprimir, quando necessário e conveniente, mas sempre dentro dos limites delineados pela Declaração Universal dos Direitos do Homem.  Eis o legado maior do que chamamos Civilização. 

    1. JB,
      Antes de mais nada, não

      JB,

      Antes de mais nada, não sou de ficar distribuindo elogios ou estrelinhas no blog, mas seu comentário foi, de longe, um dos melhores que já vi aqui no blog abordando segurança e violência.

      O único “adendo” que ousaria fazer é que embora a “unificação” das duas vertentes possibilite uma visão mais completa e precisa, ainda assim creio que é preciso também afastar o hábito de julgar as pessoas e não suas ações, pois são elas as responsáveis por consequências positivas ou negativas que afetam a sociedade. Pois parte da barbárie está vindo do sectarismo presente em quase todos os campos de nossa vida, seja no esporte, na política, no mercado de trabalho, etc. O “outro” é tratado como inimigo, que precisa ser destruído, e não como alguém que deve ser compreendido, tratado ou inspirado.

  9. “E quando a gente se dá

    “E quando a gente se dá conta, está matando uma mulher à pancada em plena rua, porque alguém disse que quem sabe teria sido suspeita de um crime que ninguém nunca viu.”

    Isso o país aprendeu com os ministros do STF; são eles, os reponsáveis diretos por todos esses linchamentos. Sherazade é só uma entre os vários assessores de Imprensa do Tribunal de Inquisição. Ainda bem que um dos ministros deixou bem claro que se responsabilizaria pelas consequências do julgamento de Exceção. Pode começar, respondendo pelo assassinato dessa mulher, né?

  10. Não adianta filosofar.

    O autor material de nossas vidas são os EUA e as condições do mercado financeiro: o crédito. Desviados da verdade, o real, partimos do valor que nos impõem para o aluguel do país no futuro. Estamos resolvidos a passar a inversão do crescimento das riquezas para aqueles cujo juros são a testificação temporal. O que no espaço de unidade resta? – Nada.

    Embora a indignidade de dizer a nosso respeito torne-se padrão de fidelidade de igual modo deles, porque não temos valor de utilidade em movimento, as discussões internas são futeis; fiquem calados dando lhes motivos de satisfação. Alías o que o governo tem com essa difamação da violência social? – Já está justificada.

    Façamos o que é eficiente, por intermédio de pagar o investimento externo com juros: entregar o crescimento do produto interno pronto para exportação.

    Não adianta filosofar, se exportarmos os violentos, o Estado fica quites também com o crescimento das obras malignas deles.

  11. Tem mais de um ano que eu

    Tem mais de um ano que eu venho alertando neste blog que esses casos de linchamento só iriam aumentar. Falei isso muito antes do caso do rapaz no Rio, que gerou o comentário da Sheherazade e trouxe a atenção da mídia ao tema. Quem tiver paciência pode procurar no meu histórico de comentários.

    Mas os motivos não são esses elencados pelo nobre juiz. E ele sabe disso, pois estudou (ou deveria) Teoria do Estado, Sociologia Jurídica e Direito Romano.

    A razão dessa barbárie é, sim, a descrença das pessoas nas instituições. E não, não estou justificando. O que vou relatar é História, e está amplamente documentado.

    Nos primórdios da civilização, não havia Justiça, mas apenas a vingança privada. Você matou meu filho? Vou lá e mato o seu. Destruiu minha casa? Vou lá e toco fogo na sua. Eventualmente, com sua família dentro.

    Esse modelo não fazia justiça e não trazia pacificação social, por óbvio. Ao cabo, acabou estabelecendo a lei do mais forte, pois o forte (rico, poderoso) fazia o que bem entendia e não podia ser alvo da “vingança” do pobre, por ausência de meios deste último.

    Em dado momento, o estado se fortaleceu, e trouxe para si o monopólio da força. Criou a chamada juris dictio, ou jurisdição, que significa literalmente “dizer o direito”. Ou seja, o Estado proibiu que as pessoas utilizassem-se da força para resolver seus litígios. Avocou para si essa função.

    Esse modelo funciona, mal ou bem, há mais de 2000 anos. Lembrem-se de que os sacerdotes não executaram Jesus, foram pedir que Pilatos, o governante (representante do Estado Romano) o condenasse. Eram, portanto, mais civilizados do que essa turba.

    Ocorre que, para que o modelo estatal funcione, AS PESSOAS PRECISAM ACREDITAR NELE. Ora, eu abdico de “fazer justiça” porque acredito que existe uma instituição que o faça com propriedade.

    A partir do momento em que a justiça é incompetente para exercer sua função primordial, as pessoas deixam de acreditar nela e reivindicam de volta seu “direito” de “fazer justiça”. É só isso, não tem nada dessa sociologia de botequim do juiz. Ele está querendo livrar a cara da classe dele, a grande responsável pelo estado atual. Dele e dos legisladores.

    Ou alguém aqui acha normal um sujeito como Pimenta Neves matar uma jovem pelas costas, responder em liberdade por 13 anos, ser condenado, passar dois anos preso e ser solto? (já está nas ruas)

    Ou alguém aqui acha normal Bruno e Macarrão sequestrarem, torturarem, matarem, esquartejarem uma jovem, deixarem um bebê órfão, em 2010, e estarem prestes a sair (Bruno já está a negociar contrato com um clube de futebol)

    Ou alguém aqui acha normal meu amigo Roberto ter sido assassinado, em frente a sua esposa e três filhos crianças, por um assaltante de 19 anos, que JÁ HAVIA MATADO outro pai de família aos 17 anos e estava legalmente solto?

    Somente militantes lunáticos como esse juiz e sua “associação de juízes para a democracia” (que nome ridículo) não enxergam que o brasileiro não aguenta mais viver em um país em que 50 MIL VIDAS SÃO TIRADAS A CADA ANO. Em 3, 4 anos dá mais gente do que o número de civis mortos na invasão do Iraque por Bush Jr!!!

    Sem contar as centenas de milhares de assaltos, estupros etc etc.

    A culpa é sim do Estado. E não, não há justificativa alguma para o que essas pessoas estão fazendo. É a barbárie.

    Estamos regredindo mais de dois mil anos, por culpa exclusiva de legisladores ignorantes, juristas alienados e governantes omissos.

     

  12. Discordo. Marcelo Semer

    Discordo. Marcelo Semer parece desconhecer história.

    O conflito não é igual a barbárie. A natureza humana impelo o homem ao conflito por diversas razões. O conflito sempre existiu e sempre existirá com maior ou menor intensidade. 

    A verdadeira barbárie só se instala quando um grupo de pessoas aceita pacificamente a brutalidade de outro. Se os judeus tivessem combatido os nazistas nas ruas nos anos 1920 provavelmente Hitler não teria chegado ao poder ou chegando lá não poderia confiná-los em campos de concentração a fim de exterminá-los.

    Os Tutsis foram massacrados pelos Hutus porque não se defenderam da agressão, que foi aumentando, aumentando, até se transformar no morticínio incontrolável.

    A julgar pelo conteúdo de seu texto, Marcelo Semer sugere que as pessoas agredidas pelos tucanos se encolham e nada façam. Caso isto ocorra a brutalidade da tucanalha não vai diminuir. Ao contrário, vai aumentar, pois eles ficarão ainda mais confiantes. Se for necessário para-los na porrada, melhor fazer isto agora. Depois poderá ser tarde demais demais.

    Um conflito de menor intensidade é melhor do que uma guerra aberta e do que o extermínio de petistas sob a bandeira do “combate ao comunismo”, do “extermínio dos sem terra”, da “cura do cancer da criminalidade” etc… De qualquer maneira, só tenho a dizer uma coisa ao Marcelo Semer. Não estarei entre as vítimas que cairão sem lutar com todos os meios necessários.

    Se me agredirem verbalmente, devolverei a ofensa. Se me derem porrada, com porradas me defenderei. Se cometerem o erro de apontar uma arma para mim por razões políticas,  não exitarei em atirar primeiro.  

     

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