Agências de risco e chantagem financeira, por Guilherme Boulos

Da Folha

Chantagem financeira

Guilherme Boulos

Nesta terça (28), a agência de risco S&P (Standard & Poor’s) rebaixou a nota do Brasil e apontou a perspectiva de perda do grau de investimento para o país.

O governo Dilma reagiu docilmente, dizendo que o Congresso deveria entender o sinal da agência e agilizar a aprovação do ajuste fiscal. O medo do governo de um ataque especulativo tornou o país refém das piores chantagens financeiras.

Os bancos, fundos de investimento e outros agentes do mercado impõem uma política recessiva onde só eles ganham. Juros selvagens, cortes sem fim no orçamento e ataques a direitos sociais. O governo aplica como bom aluno, para dar sinal ao mercado de que o país cumprirá seus compromissos com o 1% de mandachuvas do planeta e, assim, manter o grau de investimento.

Nem isso adiantou. A voracidade do mercado não tem limites. E as agências de risco – a começar pela S&P – estão longe de uma análise técnica e imparcial das condições econômicas. São na verdade agentes políticos, com interesses próprios e sem credibilidade alguma, ao menos após 2008.

Antes dos jornais repercutirem em letras garrafais e acriticamente as previsões da S&P, não caberia lembrar que até a manhã de 15 de setembro de 2008, dia de sua falência, o banco Lehman Brothers contava com nota A (grau de investimento seguro) pela mesma agência?

Ou que, em 2012, a S&P foi condenada a pagar mais de US$16 milhões a prefeituras australianas que confiaram em sua análise de risco dos Fundos Rembrandt, que geraram prejuízos milionários a seus investidores?

Ou ainda que, em 2013, o governo dos Estados Unidos entrou com uma ação judicial contra a S&P pedindo indenização de US$1 bilhão por sua responsabilidade no desencadeamento da crise de 2008?

Os créditos subprime, vetores da crise, receberam nota máxima da agência AAA, incentivando investimentos bilionários, que precipitaram o estouro da bolha. Segundo o Departamento de Justiça norte-americano, a agência atuou “conscientemente e com a intenção de fraudar, participou e executou um esquema para fraudar os investidores”.

Paul Krugman, prêmio Nobel de economia, escreveu o seguinte após o rebaixamento da nota dos EUA pela S&P: “as agências de classificação de risco jamais nos proporcionaram qualquer motivo para que nós levássemos a sério as suas avaliações sobre solvência nacional. É verdade que nações que declararam moratória geralmente foram rebaixadas antes que isso acontecesse. Mas em tais casos as agências de classificação de risco estavam simplesmente seguindo os mercados, que já haviam repudiado esses devedores problemáticos”.

Ou seja, suas previsões não merecem credibilidade. Vale aqui o ditado de que “quem paga a banda, escolhe a música”. Essas agências são financiadas pelas próprias corporações que devem avaliar, tem seus patrões como clientes. Não há como falar em independência. Avaliam as empresas e os países obedecendo os interesses de quem as financia. E jogam com a ameaça de rebaixamento para favorecer esses mesmos interesses.

O nome disso é chantagem.

O governo Dilma, com sua política econômica covarde e recuos sem fim, está deixando o país refém de agiotas desmoralizados. Vale mais uma vez a advertência: buscando a governabilidade na banca – mesmo assim frustrada – está perdendo aceleradamente a governabilidade nas ruas. A cada dia diminui sua margem de manobra.

 

O mínimo a se esperar de um governo soberano, diante desta situação, seria mandar a Standard e Poor’s à merda sem meias-palavras. 

Redação

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  1. Esse acovardamento da DILMA

    Esse acovardamento da DILMA causa  essa situação toda. 

     

    Agradar Dus e ao Diabo ao mesmo tempo é impossível, e parece que a nossa presidenta já optou.

  2. As vezes eu fico na duvida se

    As vezes eu fico na duvida se a esquerda não deseja é afundar o país em uma crise permanente.

    Deve o governo gastar mais que arrecada por tempo indeterminado.

    Se é este défict que faz a necessidade de pedir financiamento privado que não é gratuito.

    Se o governo consome toda a poupança interna, os juros vão ser altos lógico.

    Reduzir o gasto estatal e a necessidade de se financiar não parece ser uma alternativa para a esquerda, e qual e a solução que a esquerda sugere? 

     

  3. Putz. O cara vive mesmo no

    Putz. O cara vive mesmo no mundo da lua? Ou é só teatrinho para esquerda ingênua gritar seus arroubos patrióticos? Veja bem: nenhum país é obrigado a fazer qualquer coisa. Se faz, é por que precisa. Vide Grécia. O que acontece é que, desacreditados ou não, a parte fundamental do capital orientado para financiar o crescimento econômico segue as orientações destas “agências”. Então, se o país é importador de capital, ou seja, precisa de capital para financiar seu crescimento, pode falar a vontade, mas a decisão de transferência não pertence a ele. Pertence a seus financiadores que (tcahn tchan tchan tchan) vão querer saber das opiniões das agências. Para mandar as agência para “aquele lugar”, basta não precisar de capital para financiar seu crescimento. Fácil, não?

  4. Boulos tem sido um dos mais

    Boulos tem sido um dos mais competentes analistas da realidade nacional. É atacado pelo petismo-dilmismo pois se mantém na esquerda, posição da qual Dilma e o PT e Lula fogem e têm horror. A financiar a educação, Dilma prefere engordar os lucros do Bradesco, do Itaú, do Santander.  A verdadeira corrupção não está sendo investigada em Curitiba. As empreiteiras, pelo menos, fingem construir algo nesse país. Já os bancos….

  5. Banqueiros zombam da sociedade brasileira: Crise? Que crise?

    Banqueiros zombam da sociedade brasileira: Crise? Que crise? Crise pra quem?

    julho 29, 2015 11:10

    Banqueiros zombam da sociedade brasileira: Crise? Que crise? Crise pra quem?

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    Banqueiros zombam da sociedade brasileira 2: Juro do cheque é o maior desde 19950 30.julBradesco e Itaú montam esquema para deixar de pagar R$ 200 mi à Receita Federal7 07.novGanhos privatizados, perdas socializadas 0 18.jun  

    No Valor

    Os grandes bancos brasileiros caminham para mais um trimestre de crescimento expressivo na última linha do balanço, a despeito do agravamento da crise econômica e dos baixos níveis de confiança dos investidores. Juntos, os quatro maiores bancos listados em bolsa – Bradesco, Itaú Unibanco, Banco do Brasil e Santander – deverão registrar lucro líquido de R$ 14,6 bilhões, 13,7% acima do resultado do segundo trimestre do ano passado, como mostra a média das projeções de sete casas ouvidas pelo Valor.

    O resultado será sustentado, principalmente, pelo avanço da taxa básica de juros (Selic), que levou a um aumento generalizado dos spreads cobrados nas operações de crédito. O avanço da Selic também deve ajudar os ganhos com tesouraria. Além disso, analistas projetam um crescimento de provisão para devedores duvidosos um tanto menor que o mostrado no primeiro trimestre, mas ainda em um ritmo elevado.

    Se o trimestre promete lucros fortes, há quem aposte que a bonança tem data para acabar. Na visão do Goldman Sachs, as margens dos grandes bancos devem seguir “sólidas” até que a taxa básica de juros permaneça em níveis elevados, o que deve se prolongar até o fim deste ano. Com a queda na Selic e o crescimento fraco do crédito, porém, o lucro dos bancos não deve crescer em 2016, projeta o Goldman em relatório.

    A piora da inadimplência já no segundo trimestre também está no radar de analistas e de investidores de uma maneira geral, concentrada por enquanto nas grandes empresas. A cautela em conceder crédito para empresas e pessoas físicas neste cenário também será vista nos números de abril a junho e analistas não descartam que os bancos revejam algumas das previsões para o ano.

    No caso do Santander, por exemplo, analistas esperam uma redução da carteira de crédito em relação ao primeiro trimestre, especialmente por conta do recuo do crescimento dos empréstimos a empresas. A margem do banco também não deve mostrar tanto vigor, considerando que a instituição começou após os seus pares privados o processo de migração para carteiras de menor risco – com retornos menores.

    Mesmo assim, com o crescimento da receita de tarifas e reversão de provisões, o banco deve mostrar um lucro líquido recorrente de R$ 1,372 bilhão, com expansão de 18,6%. “O banco deve ter um ganho extraordinário de R$ 4,8 bilhões (após impostos) relacionado a um julgamento positivo de uma disputa relacionada ao Cofins”, destaca relatório do Bank of America. Deste total, no entanto, R$ 1,6 bilhão deve ser direcionado para o reforço de provisões de crédito.

    Já no Itaú, a expectativa dos analistas é que, embora as provisões para risco de crédito ainda sejam importantes, o montante feito no segundo trimestre seja menor. O banco deve reportar um lucro líquido 17% maior na comparação anual, de R$ 5,818 bilhões. A instituição também deve conseguir compensar os gastos com provisões com a melhora nas receitas de tarifas – que devem crescer a uma taxa de dois dígitos -, além de manter um crescimento das despesas operacionais em linha com a inflação.

    “Continuamos confiantes de que o Itaú será capaz de entregar um ROE [retorno sobre patrimonio] acima de 20%, sustentado pela melhoria na margem de intermediação financeira líquida e o aumento nas taxas de prestação de serviços”, avaliam os analistas do Santander. No primeiro trimestre, o ROE do banco foi de 24,2%.

    “A nossa expectativa é de uma temporada de balanços dos bancos privados muito parecida com o que vimos nos três primeiros meses do ano”, diz o analista do BB Investimentos, Carlos Daltozo, que prevê um ROE acima de 24% para o Itaú no trimestre.

    No mesmo caminho, o Bradesco deve reportar margens e retornos maiores. “A expansão dos spreads e de uma taxa Selic maior deve mais do que compensar a migração para linhas de crédito mais seguras [em que o spread do banco é menor]“, avaliam os analistas do Itaú BBA. O lucro líquido do Bradesco no trimestre deve aumentar 16,4% na comparação anual e somar R$ 4,427 bilhões e sua taxa de retorno deve ser semelhante à do primeiro trimestre, de 22,3%. Analistas também esperam que a unidade de seguros, tradicionalmente um terço do lucro da instituição, ganhe espaço no resultado.

    Quando o assunto é ROE, no entanto, os analistas não esperam um cenário de melhora para o Banco do Brasil (BB). O lucro do banco, segundo analistas, deve ficar praticamente estável em relação ao mesmo período do ano passado e atingir R$ 3 bilhões no segundo trimestre. “Esperamos que o crescimento do crédito continue a desacelerar a um ritmo ligeiramente acima dos pares privados”, dizem analistas do Santander.

    A temporada de divulgação de balanços começa quinta-feira, quando Bradesco e Santander divulgam seus resultados, antes da abertura do mercado. O Itaú reporta seus números no dia 4 de agosto, e o BB, 13 de agosto.

     

  6. Bradesco e Itaú montam esquema para deixar de pagar R$ 200 mi

    Bradesco e Itaú montam esquema para deixar de pagar R$ 200 mi à Receita Federal

    novembro 7, 2014 21:08

    Por Fernando Rodrigues, na Folha de S. Paulo

    Uma simples troca de papéis resultou numa economia de R$ 200 milhões nos impostos pagos pelo Bradesco e pelo Itaú-Unibanco, dois dos maiores bancos brasileiros. Essas operações foram concluídas em 2008 e 2009 em Luxemburgo, um pequeno paraíso fiscal europeu.

    A prática é conhecida como elisão fiscal -deixar de pagar impostos usando ao máximo todas as brechas possíveis que a lei oferece. Não se trata, em princípio, de um crime. Tampouco é algo novo, mas desta vez tudo está comprovado e detalhado em 1.028 documentos inéditos que expõem essas operações de uma forma nunca antes vista.

    Esses arquivos secretos foram obtidos pelo ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos), uma ONG com sede em Washington, capital dos Estados Unidos. O acervo contém informações de 343 empresas de diversos países. Os documentos foram produzidos pela consultoria internacional PwC (PricewaterhouseCoopers), que presta serviços de “assessoria tributária”.

    A PwC é a mesma empresa que faz a auditoria dos resultados financeiros da Petrobras. Tem assessorado a estatal brasileira em meio ao atual escândalo de corrupção descoberto neste ano pela Operação Lava Jato, da Polícia Federal.

    A Folha teve acesso aos documentos produzidos pela PwC em Luxemburgo por meio de uma parceria com o ICIJ. Durante cerca de seis meses, o jornal e veículos de comunicação de outros 25 países checaram e analisaram extensivamente as informações para publicar nesta quarta-feira (5) reportagens relatando como empresas pagam menos impostos por meio de operações contábeis em Luxemburgo. Trata-se de uma das mais amplas investigações jornalísticas internacionais a respeito desse tema.

    O processo tem peculiaridades em cada país. No caso do Brasil, os bancos usam suas operações em Luxemburgo para reduzir o valor do lucro declarado em suas subsidiárias nesse paraíso fiscal.

    O lucro de bancos brasileiros obtido no exterior é taxado tanto fora, na sede de suas subsidiárias, como dentro do Brasil.

    Em Luxemburgo, as instituições financeiras brasileiras recebem generosos descontos contábeis no momento de consolidar seus balanços. Registram assim lucros menores. O procedimento adotado está descrito nos documentos da PwC, mas tem uma linguagem hermética que dificulta a compreensão imediata.

    O benefício que os bancos brasileiros têm em Luxemburgo é concedido por meio de um acordo de reconhecimento de “tax goodwill”. Uma tradução mais aproximada para o português é “direito creditório sobre uma rentabilidade prevista no futuro”, na explicação de Everardo Maciel, que ocupou o posto de secretário da Receita Federal do Brasil de 1995 a 2002.

    Dentro desse acordo de “tax goodwill”, os bancos são autorizados a lançar em seus balanços em Luxemburgo o que se chama, em inglês, “intangible tax asset”. Em português: ativo fiscal intangível.

    Nas cartas que a PwC envia ao governo luxemburguês formalizando propostas em nome dos bancos Bradesco, Itaú e Unibanco, há um pedido de reconhecimento de supostos ativos fiscais intangíveis. Os documentos analisados contêm um carimbo e uma assinatura da autoridade luxemburguesa aceitando o pedido. Dessa forma, o lucro da instituição bancária é reduzido. Em consequência, paga-se menos imposto -tanto em Luxemburgo como no Brasil.

    IMPOSTO REDUZIDO

    A lei brasileira impõe uma cobrança de 40% sobre o lucro bancário, assim divididos: 25% de IRPJ (Imposto de Renda da Pessoa Jurídica) e 15% de CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido).

    Para calcular o quanto um banco deixa de pagar de impostos quando tem uma operação em Luxemburgo, é mais fácil observar uma situação hipotética.

    Por exemplo, digamos que o lucro de um banco brasileiro em Luxemburgo tenha sido de 100 milhões de euros. Se o governo luxemburguês aceitar reduzir esse valor para 75 milhões de euros (por conta de um “ativo fiscal intangível”), a instituição financeira deixará de recolher impostos sobre a diferença, que foi de 25 milhões de euros.

    Quando esse banco do exemplo acima declarar seus lucros no Brasil, deixará de pagar o equivalente a 10 milhões de euros (40% sobre 25 milhões de euros). Tudo com base no acordo tributário secreto entre a instituição financeira e o governo de Luxemburgo.

    A Folha consultou técnicos da Receita Federal do Brasil que analisaram detalhadamente os contratos firmados separadamente por Bradesco, Itaú e Unibanco com o governo de Luxemburgo. A conclusão de todos, em entrevistas reservadas, é que foram operações contábeis para reduzir o pagamento de impostos no Brasil.

    O subsecretário de Fiscalização da Receita Federal, Iágaro Martins, também analisou os documentos da PwC a pedido da Folha. Eis sua avaliação:

    “A Receita Federal não se manifesta sobre casos concretos. Esclarece, todavia, que tem identificado e autuado operações praticadas por empresas situadas no Brasil com empresas vinculadas ou pertencentes ao mesmo grupo no exterior quando essas operações são estruturadas para gerarem, de forma artificial, perdas no país e ganhos no exterior que não serão tributados, seja por ocorrerem em paraísos fiscais ou por estarem acobertadas por acordos de não tributação. Trata-se de mais um planejamento tributário internacional abusivo, com o único propósito de gerar redução dos impostos a serem pagos no Brasil”.

     

     

     

    CONTRIBUIÇÕES OCULTAS

    O aspecto mais obscuro contido nas cartas da PwC ao governo de Luxemburgo é a descrição de como é calculado o “ativo fiscal intangível”. Não há propriamente uma fórmula. Os bancos simplesmente sugerem um valor que pretendem considerar, o que é aceito pelo governo luxemburguês.

    Os documentos preparados pela PwC para Bradesco, Itaú e Unibanco são quase idênticos: informam que o benefício deve ser concedido por conta de uma “contribuição oculta” que as instituições financeiras brasileiras fazem para suas subsidiárias em Luxemburgo.

    O termo usado em inglês é “hidden contribution”. Os bancos preferem traduzir como “contribuição não mensurável” (e não “oculta”). Mas em que consiste essa “contribuição”? Bradesco, Itaú e Unibanco informam ao governo de Luxemburgo que trabalham no Brasil (e por essa razão teriam custos) para alavancar seus negócios no paraíso fiscal.

    Nos documentos preparados pela PwC, esses gastos “não mensuráveis” são descritos de maneira genérica como propaganda dos serviços oferecidos, captação de clientes, desenvolvimento de produtos financeiros, orientação para empresas e pessoas físicas do Brasil que desejam ter contas em Luxemburgo, compartilhamento do trabalho de pesquisa feito pela matriz, oferecendo conhecimento e know-how para áreas de gerenciamento de risco e “compliance”, entre outras.

    Bradesco, Itaú e Unibanco afirmam que 95% dos clientes e negócios que mantinham em Luxemburgo à época dessas operações derivavam dos esforços de suas matrizes no Brasil.

    Em resumo, os bancos prestam um serviço para si próprios no Brasil. Declaram então ao governo de Luxemburgo que esse “trabalho” deve ser lançado no balanço da subsidiária no paraíso fiscal -o tal “ativo fiscal intangível”. Assim, reduzem o lucro e pagam menos impostos.

    Não existe evidência de irregularidade nessas operações. Do seu lado, os bancos negam ter feito os contratos com Luxemburgo apenas para reduzir seus impostos devidos no Brasil. A partir da divulgação dos documentos revelados nesta reportagem, caberá à Receita Federal do Brasil decidir se abre algum procedimento formal para analisar essas operações.

    O governo brasileiro não tem uma estimativa de quanto os bancos e outras empresas deixam de pagar de impostos com base em operações em paraísos fiscais como Luxemburgo.

    A Receita Federal do Brasil tem um departamento que cuida da fiscalização de grandes contribuintes. Em 2013, a equipe dessa área fez autuações que resultaram num total de R$ 105 bilhões em autuações que incluem multas e impostos supostamente não pagos -mas esse valor raramente é pago, pois os bancos e as empresas recorrem ao Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), dando início a processos demorados e que às vezes resultam em absolvição.

    Além disso, já se tornou uma praxe o governo federal reeditar regularmente programas de perdão fiscal.

    IMPOSTOS NÃO PAGOS

    Os documentos analisados pela Folha indicam que o Bradesco conseguiu o direito de abater o equivalente a até R$ 25.258.766,40 de impostos em 2009 no Brasil -não se sabe se esse benefício foi usado de uma vez ou se parte foi “carregada” para anos seguintes.

    O benefício foi desfrutado pelo Bradesco no Brasil porque o banco recebeu autorização do governo de Luxemburgo para abater 25,2 milhões de euros de seu lucro no balanço de 2008 naquele país, a título de “ativo fiscal intangível”.

    Para calcular quanto o Bradesco ganhou com essa operação, basta aplicar o percentual de 40% (a alíquota de imposto cobrada no Brasil) sobre os 25,2 milhões de euros. Chega-se a 10,080 milhões de euros. Como o imposto é pago sempre no ano seguinte ao lucro apurado, converte-se o benefício usando a taxa de câmbio de 31 de dezembro de 2009, quando 1 euro era cotado a R$ 2,50583. Chega-se então aos R$ 25,258 milhões de impostos que o Bradesco pode não ter recolhido no Brasil.

    No caso do Itaú, usando-se a mesma fórmula, encontra-se uma redução de seus impostos no Brasil equivalente a até R$ 111.977.364,00 no ano de 2008. O Unibanco teve um abatimento de R$ 62.695.866,60 em 2009. À época, Itaú e Unibanco eram instituições separadas -fundiram-se alguns anos depois.

    Os valores dos três bancos totalizam R$ 200 milhões de impostos que deixaram de ser recolhidos ao Tesouro Nacional com base na operação de planejamento tributário acertada com as autoridades luxemburguesas.

    Os documentos da PwC aos quais a Folha teve acesso referem-se apenas aos anos de 2008 e 2009 no caso de empresas brasileiras. Não há como saber o que se passou de lá para cá. Tampouco vazaram dados de outras consultorias. Esses contratos são protegidos pelas leis de sigilo em Luxemburgo.

    As autoridades brasileiras não têm acesso aos dados detalhados sobre as operações de empresas em Luxemburgo. Trata-se de situação idêntica à verificada em vários outros paraísos fiscais nos quais as empresas do Brasil operam livremente para reduzir o que pagam de impostos aqui.

    IMPOSTOS PAGOS

    Não há dados disponíveis de todas as operações no exterior de bancos brasileiros. Por essa razão, é impossível saber com precisão o total que cada instituição economizou de impostos com os contratos em paraísos fiscais, incluindo Luxemburgo.

    O Bradesco, que fez sua operação com o governo luxemburguês em 2008, pagou à Receita Federal naquele ano R$ 1,793 bilhão de IR e CSLL, em valores da época. O direito de desconto obtido em Luxemburgo (R$ 25 milhões) equivale a apenas 1,41% do que desembolsou com tributos.

    Já no caso do Itaú-Unibano, o valor total de impostos pagos em 2008 foi de foi de R$ 1,249 bilhão. Nesse ano, o abatimento máximo obtido em Luxemburgo representou uma economia de 8,97% do total pago. Em 2009, o percentual foi de 3,75%.

     

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