Apartheid à brasileira, por Gustavo Gollo

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Apartheid à brasileira, por Gustavo Gollo

A execução de Marielle foi um recado ao povo brasileiro, especialmente aos cariocas.

O recado foi claro: os que mandam têm autorização para matar, de fazer o que quiserem fazer; eles mandam, e matam qualquer um que se interponha em seu caminho. E quem se meter onde não é chamado e denunciar suas execuções elas matam também, matam e acabou. É o Brasil pós-golpe.

Marielle havia denunciado a execução de 2 moradores da favela, cometida por policiais, nas vésperas de seu assassinato.

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Embora vereadora, Marielle tinha o pior perfil segundo os critérios do apartheid à brasileira: o de favelada negra.

Foi o apartheid à brasileira que justificou o golpe, a derrubada de um governo democraticamente eleito que insistia em tratar as pessoas com igualdade, dando condições a que “favelados” como Marielle tivessem acesso a diplomas.

Os defensores do apartheid à brasileira costumam repetir o mote: bandido bom é “bandido morto”, subentendendo a crença de que “bandido” abrange apenas pessoas com um certo perfil, bem compreendido por aqui, que inclui pessoas oriundas de favelas, e pobres, de maneira geral. De acordo com o apartheid à brasileira, a palavra “bandido”, não inclui o policial assassino que executa a sentença; sob tal critério “bandido é o pobre favelado, e policial é policial, não é bandido”.

No nível nacional, os defensores desse sistema odioso têm perseguido o ex-presidente Lula, um nordestino que insiste em manter o perfil proscrito pelos usurpadores do poder central.

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O apartheid foi oficializado na África do Sul em 1948.

Nos anos 70s, uma crescente conscientização mundial sobre a desumanidade do regime de segregação resultou no isolamento do país, repudiado pelo mundo inteiro. Após a repulsa demonstrada pelo mundo às atitudes dos dominadores da África do Sul, o povo sul-africano acabou abolindo o sistema odioso, elegendo Nelson Mandela para a presidência do país, em 1994.

O apartheid à brasileira apresenta peculiaridades locais que o diferenciam do sul-africano; as similaridades para com o sistema odioso, no entanto, são consideráveis, havendo, aqui, como lá, uma distinção entre pessoas e sub-pessoas que define, por exemplo, quem pode ser assassinado.

Marielle pôde ser assassinada por ser oriunda da favela, e por ostentar, sem disfarce, seus traços negros.

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Talvez as diferenças de grau entre nosso apartheid, e o sul-africano de décadas atrás, impeçam que sejamos vistos com a mesma repugnância com que o mundo os tratou, talvez, por outro lado, a diferença de grau reduza apenas levemente o nojo que o mundo sentirá pela selvageria demonstrada pelos que enviaram o recado brutal, na forma de assassinato.

Ainda que os brasileiros possam interpretar o recado como uma demonstração de quem manda, para que nos calemos e aceitemos a selvageria, a mensagem recebifa pelo mundo será bem claro: somos selvagens e nojentos.

 

Redação

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