Braskem: a revanche de Paulo Cunha, por Luís Nassif

O Ultra assume a Braskem. E a Odebrecht definha, atingida pela Lava Jato e por um herdeiro cuja megalomania deixou de lado a prudência.

Acompanhei de perto a disputa entre a Odebrecht e o grupo Ultra, para a compra da Copene, transformando na maior central petroquímica do país.

Era amigo de Paulo Cunha e acompanhei de perto as transformações que empreendeu no grupo Ultra, a modernização da gestão, a implantação de programas de qualidade e, especialmente, o não envolvimento com questões de governo – em um momento em que a Petrobras do mensalão ganhava uma dimensão inédita.

Emílio Odebrecht deu um lance temerário, que Paulo Cunha não quis cobrir. Colocava em risco a própria existência da empreiteira. Havia um trunfo na velha Odebrecht, que Paulo Cunha valorizava: o envolvimento dos funcionários com a corporação.

De fato, desde os anos 50, o velho Norberto Odebrecht montara um modelo gerencial campeão. Cada obra era uma unidade independente de negócios, com um gestor com participação nos resultados.

Durante o período militar funcionou a contento, porque as decisões eram centralizadas e a empreiteira tinha bons contatos com os militares. Coube a ela a construção da sede da Petrobras, por exemplo.

Quando veio a redemocratização, o novo federalismo descentralizou as decisões. A preocupação de Norberto era como controlar sua estrutura se propinas não são registradas em balanço.

Certa vez a Folha me incumbiu de fazer uma entrevista com ele. Uma frase chamou a atenção:

  • O grande desafio é nossos executivos entrarem na lama sem respingar na calça.

O lance ousado foi extraordinariamente beneficiado por uma elevação imprevista nos preços de produtos petroquímicos no mundo. No primeiro ano, a Braskem teve um lucro extraordinário por conta desse aumento.

Por seu lado, o grupo Ultra continuou seu crescimento orgânico, adquirindo redes de combustíveis e aguardando o momento de voltar ao jogo.

Agora, com a Braskem à venda, o grupo Ultra é o candidato favorito. Mas Paulo Cunha não poderá comemorar. Faleceu há alguns anos, vítima de uma doença que foi travando todos seus músculos.

Antes da doença, tive um almoço com ele, para o qual levei minha filha, que tinha conseguido um estágio na Nestlé. Ela começou a descrever as formas de gestão na Nestlé, levando Paulo a concluir orgulhoso:

  • Nossas grandes empresas são muito mais bem administradas que as multinacionais.

Era um período de grandes empresários industriais, com orgulho de ser brasileiro, como Jorge Gerdau – cuja família, depois, tornou-se bolsonarista -, Emilio Odebrecht, presidentes de multinacionais que agiam como brasileiros, como Edson Vaz Musa, da Rhodia, Wolfgang Sauer, da Volkswagen, toda uma geração desalojada pela financeirização que tomou conta do país.

Tive dois contatos finais com Paulo Cunha. Uma vez ele me telefonou. Quando a secretária passou o telefone para ele, mal conseguia ouvir sua voz. Marcamos um almoço em um restaurante na Barão de Capanema. Sentei-me colado à ele, mas não conseguia entender mais que 10% de sua fala. Os olhos eram vivos, a mente funcionava, mas a fala não saía.

Depois, fui visitá-lo no Rio de Janeiro, para onde voltou a morar. No início de carreira foi funcionário da Petrobras, contratado por Pery Igel para turbinar swua empresa, de distribuição de botijões de gás.

Agora, o Ultra assume a Braskem. E a Odebrecht definha, atingida pela sanha da Lava Jato e por um herdeiro imprudente, cuja megalomania deixou de lado todas as normas de prudência.

Correção – Houve um erro/confusão quanto ao nome da empresa. Quem fez a oferta pela Braskem não foi o Grupo Ultra (ticker: UGPA3) e sim a Unipar Carbocloro (ticker: UNIP6)

Luis Nassif

5 Comentários

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  1. É preciso nunca esquecer que a Odebrecht era uma empresa privada e empresas não têm acesso ao dinheiro da arrecadação. A chave do cofre estava onde sempre esteve, no poder instituído, e esse poder era o PT, desde janeiro de 2003. É preciso dois pra dançar o tango, como dizem os americanos, e o parceiro de dança da Odebrecht por onze anos, até começar a Lava-Jato em 2014, foi o PT, foi Lula. Dilma Rousseff sabia o que acontecia e tentou parar o mecanismo, foi engolida pelo processo que ela já não podia mais controlar. A megalomania não foi só de Emílio Odebrecht, foi também do Lula e do PT. Esse Lula “Pai da Pátria” jamais me enganou.

    1. Ou Renato não leu a matéria, ou não leu e não quis entender, ou não entendeu. “Quando veio a redemocratização, o novo federalismo descentralizou as decisões. A preocupação de Norberto era como controlar sua estrutura se propinas não são registradas em balanço.” Historicamente a redemocratização no Brasil é de 1988. Cuidado pq a cegueira, fruto da ignorância ou ódio, mata!

    2. É incrível como as pessoas (principalmente Bolsonaristas) culpam Lula por todas as mezelas políticas da história do Brasil, como você mesmo citou que a redemocratização é de 88 o “PT” é que é o grande vilão? E o que se fala sobre Odebrecht e muitos outros empreteiros serem “aliados” do militarismo subentende-se o quê meu amigo??? Valei-me Deus quanta ignorância,pesquise mais a história do Brasil por favor, Lula sim foi um político corrupto, entrou no esquema de propina mas falar sobre PT culpado de tudo é de uma ignorância ou ingenuidade tamanha

  2. Acho que valeria a pena explorar mais essa história do “herdeiro imprudente”. Muito se diz sobre isso, mas de maneira genérica, sem aprofundar melhor fatos que fundamentassem essa imprudência (ou talvez, arrogância).
    Por outro lado, ele também passava a ideia de coragem e firmeza. Ao enfrentar a Lava Jato.
    Daí a confusão.

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