Cenário: a MP dos Portos e a dura realidade do governo de coalizão do PT

As derrotas sofridas pelo governo na negociação da MP dos Portos  — e igual derrota num acordo em torno da reforma do ICMS – seguem um padrão nas administrações petistas. Dada a heterogeneidade da base aliada, assuntos que envolvem interesses econômicos privados muito fortes, que transitam por vários partidos, não conseguem chegar a uma solução que se adeque às necessidades de um governo que é o centro dessa grande aliança.

Quando entram interesses privados com forte enraizamento no Congresso, ou com um grande poder de lobby, a falácia de que a coalizão é feita com base em princípios programáticos cai por terra. Vira conversa de campanha eleitoral. É nesses momentos que o preço pela incorporação de partidos com alto grau de venalidade na aliança do governo acaba sendo alto demais para o resultado obtido no plenário do Congresso em assuntos de grande interesse nacional.

No caso da MP dos Portos, que envolve um interesse premente e imediato do País, o resultado da votação em plenário foi uma conjunção de forças poderosas e pouco transparentes. Desde que a MP iniciou sua tramitação, o deputado Paulinho da Força (PDT) tem atuado pesadamente em favor da manutenção dos interesses privados que já estão colocados na área. É consenso entre todas as partes envolvidas na negociação – aquelas que têm o bom senso de achar que a realidade portuária não muda se a lei não mudar – que Paulinho fez do Congresso o palco de manobras pesadas contra a MP.  Enquanto as centrais sindicais e os partidos de esquerda no Congresso tentavam um acordo que tirasse do caminho as divergências trabalhistas, para aprovar uma lei que permitisse a modernização do sistema portuário, Paulinho, usando o nome do PDT e o da Força Sindical, fez de tudo para atrapalhá-los. Paulinho desempenhou o papel de “agente provocador” – na época da ditadura, era assim que se chamava o agente dos órgãos de segurança infiltrado nos movimentos para incitar a discórdia e impedir a ação daquele grupo.

Nas reuniões que se sucederam no gabinete do senador Eduardo Braga (PMDB-AM) com as centrais sindicais, em regra, Paulinho saía e anunciava para os jornalistas que a negociação em torno da MP havia fracassado – quando, lá dentro, o acordo continuava caminhando, com o empenho das demais centrais sindicais. A manobra de derrubar o acordo por meio da imprensa só acabou no momento em que Braga começou a gravar as reuniões, e ameaçou mostrá-las aos jornalistas, como prova de que o acordo andava. Depois, somaram-se a Paulino outros atores, e o jogo ficou muito mais pesado.

A MP dos Portos é um caso exemplar de que o custo-benefício de uma ampla coalizão deve ser avaliado, e também da necessidade de se prever, com antecedência, o tamanho da ofensiva necessária contra setores que têm um poder de lobby muito forte no Congresso. Nesse caso, houve mediação para obter o entendimento entre amplos setores da sociedade e reduzir resistências, mas todo esse esforço simplesmente caiu por terra quando encontrou a barreira dos lobbies poderosos e dos partidos com fraca convicção ideológica.

O resultado de todo o trabalho jogado fora para aprovação de uma reforma do sistema portuário remete também a mais uma reflexão: não existe habilidade política que dê conta de um Congresso hegemonizado pelo grupo que tem Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) na presidência da Câmara e Eduardo Cunha como líder do PMDB na Câmara.

 

Também quando vão à pauta interesses federativos, como a Lei dos Royalties e a reforma do ICMS, o governo também se depara com uma situação complicada. Essa equação parlamentar montada, por necessidade, por governos de esquerda, não foi feita para negociar futuro, mas presente.

Nesse caso, a parte mais importante da negociação são os governadores, que são a liderança do voto das bancadas de seus Estados no plenário. Na equação das alianças das duas últimas eleições presidenciais, o partido que tinha o candidato a presidente, o PT, fez acordos nacionais que privilegiaram os partidos aliados nas eleições estaduais. Isso é bom para ganhar eleições, mas nenhum partido, exceto o PT, tem capacidade de impor aos governadores uma diretriz nacional. Não há possibilidade de outro partido da base governista que elegeu governador de Estado concordar com uma discussão de reforma federativa que, se num momento pode prejudicar o seu Estado, pode ter, no médio prazo, o poder de reduzir as desigualdades regionais.

Além disso, São Paulo e Rio, pelas bancadas que detém no Congresso, têm um peso enorme na definição dessas questões federativas dentro do Congresso. Não existe hipótese de o tucano Geraldo Alckmin se interessar em um acordo nacional de longo prazo. E o governador do Rio, Sérgio Cabral, certamente não vai fazer nada que o prejudique – embora seja do PMDB e um dos mais beneficiados aliados do governo federal petista, não costuma fazer nenhuma discussão programática; ele é muito pragmático para isso.

Redação

1 Comentário

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  1. abertura dos portos à iniciativa privada

    Tudo começou com Fernando Henrique Cardoso. De fato, a ideia e a iniciativa de abrir, de privatizar os portos foi de Fernando Henrique não como presidente, mas, anteriormente, atuando como senador e depois como ministro da Fazenda de Itamar Franco. Todos reconhecem que a Lei 8.630, de 25 de fevereiro de 1993, inaugurou uma nova fase no sistema portuário brasileiro, e seu artífice maior se chama Fernando Henrique Cardoso. Ministro, foi o ex-presidente que na época teve a coragem de promover a privatização dos portos nacionais, enfrentando uma das maiores corporações públicas do País, para não dizer um dos seus grandes antros de corrupção. Foi dele também a iniciativa histórica de tirar da Petrobrás o monopólio de exploração, que estava inscrito na Constituição.

    Dez anos de atraso. “Mas, infelizmente, nada se fez no governo Lula, abandonando-se o Programa Integrado de Modernização Portuária. Como resultado, a administração portuária brasileira continua burocratizada e carente de agilidade, não se tendo notícia de nenhum esforço sistemático do governo a respeito desse assunto.”

    (Matéria copiada – Foi FHC que abriu os portos – 17/02/2013 | Alberto Tamer – Estadão)

     

    Portanto, o PT não está “inventando a roda” da “desburrocratização” dos portos; está, APENAS, desemperrando o que ajudou a emperrar!!!

    “IMAGINA A FESTA”!

    IMAGINA O ATRASO E O PREJU…!!!

     

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