Sonhos

Enviado por Vânia

”Escrevo como se estivesse dormindo e sonhando: as frases desconexas como no sonho.

É difícil, estando acordada, sonhar livremente nos meus remotos mistérios.”

Clarice Lispector

 

Redação

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  1. Clarice Lispector gostava

    Clarice Lispector gostava muito de Chico Buarque (e vice-versa). Em algumas crônicas dos anos 60, fala do então jovem poeta e compositor que se tornaria um escritor “clariciano”, muitos anos depois. Achei essa, a primeira crônica:

    https://www.wattpad.com/106976668-cr%C3%B4nicas-de-clarice-lispector-chico-buarque-de

    E essa entrevista com Chico Buarque/Xico Buark:

    Esta grafia, Xico Buark, foi inventada por Millôr Fernandes, numa noite no Antônio’s. Gostei como quando brincava com palavras de crianças. Quanto ao Chico, apenas sorriu um sorriso duplo: um por achar engraçado, outro mecânico e tristonho de quem foi aniquilado pela fama. Se Xico Buark não combina com a figura pura e um pouco melancólica de Chico, combina com a qualidade que ele tem de deixar os outros o chamarem e lê vir, com a capacidade que tem de sorrir conservando muitas vezes os olhos verdes abertos e sem riso.

    Ele não é de modo algum um garoto, mas se existisse no reino animal um bicho pensativo e belo e sempre jovem que se chamasse Garoto, Francisco Buarque de Holanda seria da raça montanhesa dos garotos.

    Marcamos encontro às quatro horas porque às cinco Chico tinha uma lição de música com Vilma Graça. Há um ano está estudando teoria musical e agora começará com o piano. Estávamos os dois na minha casa e a conversa transcorreu sem desentendimentos, com uma paz de quem enfim volta da rua.

    Clarice Lispector: Você viveu ainda tão pouco que talvez seja prematuro perguntar-lhe se você teve algum momento decisivo na vida e qual foi?

    Chico Buarque de Hollanda: Eu sou ruim para responder. Na verdade tive muitos momentos decisivos, mas creio que ainda sou moço demais para saber se eram de fato decisivos esses momentos. No final de contas não sei se eles contaram ou não.

    CL: Tenho a impressão que você nasceu com a estrela na testa: tudo lhe correu fácil e natural como um riacho de roça. Estou certa se para você não é muito laborioso criar?

    CBH: E não é. Porque às vezes estou procurando criar alguma coisa e durmo pensando nisso, acordo pensando nisso – e nada. Em geral eu canso e desisto. No outro dia a coisa estoura e qualquer pessoa pensaria que era gratuita, nascida naquele momento. Mas essa explosão vem do trabalho anterior inconsciente e aparentemente negativo. E como é seu trabalho?

    CL: Vem às vezes em nebulosa sem que eu possa caracterizá-lo de algum modo. Também como você, passo dias ou até anos, meu Deus, esperando. E, quando chega, já vem em forma de inspiração. Eu só trabalho em forma de inspiração.

    CBH: Até aí eu entendo, Clarice. Mas a mim, quando a música ou a letra vem, parece muito mais fácil de concretizar porque é uma coisa pequena. Tenho impressão de que se me desse idéia de construir uma sinfonia ou um romance, a coisa ia se despedaçar antes de estar completa.

    CL: Mas Chico, aí é que entra o sofrimento do artista: despedaça-se tudo e a gente pensa que a inspiração que passou nunca mais há de vir.

    CBH: Se você tem uma idéia para um romance, você sempre pode reduzi-lo a um conto?

    CL: Não é bem assim, mas, se eu falar mais, a entrevistada fica sendo eu. Você, apesar de rapaz que veio de uma grande cidade e de uma família erudita, dá a impressão que se deslumbrou, deslumbrando os outros com sua fala particular. O que quero dizer é que você, ao ter crescido e adquirido maior maturidade, deslumbrou-se com as próprias capacidades, entrou numa roda-viva e ainda não pôs os pés no chão. Que é que você acha: já se habituou ao sucesso.

    CBH: Tenho cara de bobo porque minhas reações são muito lentas, mas sou um vivo. Só que por os pés no chão no sentido prático me atrapalha um pouco. Tenho, por exemplo, uma pessoa que me explica um contrato e não consigo prestar atenção em certas coisas. O sucesso faz parte dessas coisas exteriores que não contribuem nada para mim. A gente tem a vaidade da gente, a gente se alegra, mas isso não é importante. Importante é aquele sofrimento com que a gente procura buscar e achar. Hoje, por exemplo, acordei com um sentimento de vazio danado porque ontem terminei um trabalho.

    CL: Eu também me sinto perdida depois que acabo um trabalho mais sério.

    CBH: Tenho uma inveja: meu trabalho de música está exposto a um consumo rápido e eu praticamente não tenho o direito de ficar pensando numa idéia muito tempo.

    CL: Talvez você ainda mude. Como é que Villa-Lobos criava? Seria interessante para você saber.

    CBH: Sei alguma coisa. Por exemplo, uma frase dele que Tom Jobim me contou: diz que Villa-Lobos estava um dia trabalhando na casa dele e havia uma balbúrdia danada em volta. Então o tom perguntou: como é, maestro, isso não atrapalha? Ele respondeu: o ouvido de fora não tem nada a ver com o ouvido de dentro. É isso que invejo nele. Gostaria muito de não ter prazo para entrega das músicas, e não fazer sucesso: você gostaria, por exemplo, de sair para a rua e começar a dar autógrafo no meio da rua mesmo?

    CL: Detestaria, Chico. Eu não tenho, nem de longe, o sucesso que você tem, mas mesmo o pequeno que eu tenho às vezes me perturba o ouvido interno. 

    CBH: Então estamos quites

    CL: Todas as mães com filhas em idade de casar consentiriam que casassem com você. De onde vem esse ar de bom rapaz? Acho, pessoalmente, que vem da bondade misturada com bom-humor, melancolia e honestidade. Você também tem o ar de quem é facilmente enganado: é verdade que você é crédulo, ou está de olhos abertos para os charlatões?

    CBH: Não é que eu seja crédulo, sou é muito preguiçoso.

    CL: O que é que você sentiu quando o maestro Karabtchevsky dirigiu “A Banda” no Teatro Municipal?

    CBH: Claro que gostei, mas o que me interessa mesmo é criar. A intenção de Karabtchevsky foi das melhores, inclusive corajosa. Eu quero ver ainda a coisa se repetir com outros compositores populares.

    CL: Você foi precoce em outras manifestações da vida? Fale sem modéstia.

    CBH: Não, tudo que fiz como garoto é de algum modo ligado com o que eu faço hoje, isto é, versinhos.

    CL: Você quer fazer um versinho agora mesmo? Para você não se sentir vigiado, esperarei na copa até você me chamar.

    Chico riu, eu saí, esperei uns minutos até ele me chamar e ambos lemos sorrindo:

    Como Clarice pedisse

    Um versinho que eu não disse

    Me dei mal

    Ficou lá dentro esperando

    Mas deixou seu olho olhando

    Com cara de Juízo Final. 

    CL: A banda lembra música de nossos avós cantarem: tem um ar saudoso e gostoso de se abrir um livro grosso e encontrar dentro uma flor seca guardada exatamente para durar. De onde você tirou essa modinha tão brasileira? Qual a fonte de inspiração?

    CBH: Não sei não, é uma coisa difícil de conscientizar. Lembro da banda mesmo não tendo vivido no interior, mas atrás da minha casa tinha um terreno baldio onde às vezes havia circo, parque de diversões, essas coisas.

    CL: Vi você na primeira passeata pela liberdade dos estudantes. Que é que você pensa dos estudantes do mundo e do Brasil em particular?

    CBH: No mundo é para mim difícil falar, mas aqui no Brasil eu sinto em todos os setores um apodrecimento e a impossibilidade de substituição senão por mentalidade completamente jovens e ainda inatingidas por essa podridão. Aqui no Brasil só vejo esta liderança. Um rapaz do “New York Times” entrevistou-me e perguntou: está bem, vocês não querem censura nem repressão nem os métodos arcaicos de educação: mas se vocês ganharem, quem vai substituir as autoridades? Por incrível que pareça, o mundo político está envolvido por essa decadência e acomodação. E você? Eu também te vi na passeata.

    CL: Fui pelos mesmos motivos que você. Mudando de assunto, Chico, você já experimentou sentir-se em solidão? Ou sua vida tem sido sempre esse brilho tão justificado? Chico, um conselho para você: fique de vez em quando sozinho, senão você será submergido. Até o amor excessivo dos outros pode submergir uma pessoa.

    CBH: Também acho e sempre que posso faço a minha retirada.

    CL: Na música chamada clássica, apesar dela englobar compositores aos quais o classicismo não poderia ser aplicado, nessa música o que você prefere?

    CBH: Aí não é questão de preferência, é costume para mim. Tenho sempre à mão um Beethoven.

    CL: Sua família preferia que você seguisse a vocação de outros talentos seus que em aparência, pelo menos, são mais asseguradores de um futuro estável?

    CBH: No começo sim. Logo que entrei para a arquitetura, quando comecei a trocar a régua “T” pelo violão, a coisa parecia vagabundagem. Agora (sorri) acho que já se conformaram.

    CL: Você está compondo agora alguma coisa e com letra sua mesma? Sua letra é linda.

    CBH: Estou na fase de procura. Ontem acabei um trabalho que era só de música, que exigia prazo. Para uma canção nova, eu estou sempre disponível.

    CL: No domínio da música popular, quem seria por sua vez o seu ídolo?

    CBH: Muitos, e é por isso que é difícil citar.

    CL: Seu pai é um grande pai. Quem mais na sua família eu chamaria de grande, se conhecesse?

    CBH: Minha mãe, apesar de ter um metro e cinqüenta e poucos de altura. Eu li muito e papai sempre me estimulava nesse sentido.

    CL: Qual é a coisa mais importante do mundo?

    CBH: Trabalho e amor.

    CL: Qual é a coisa mais importante para você, como indivíduo?

    CBH: A liberdade para trabalhar e amar.

    CL: O que é o amor?

    CBH: Não sei definir, e você?

    CL: Nem eu.

    **************************

    In LISPECTOR, Clarice. Entrevistas. Rio de Janeiro: Rocco, 2007, pp.99-104.  

    1. Muito legal, Jair

      Apesar de admirar os dois e também da admiração mútua entre ambos, considero que eles têm personalidades totalmente diferentes. Ela muito mais intensa, ele bem mais leve… Alguma coisa nesse sentido.

      Encontrei uma entrevista com o Chico na qual ele comenta esse encontro com a Clarice. Vou destacar o trecho aqui:

      ***

      José Arbex Jr. – A Clarice Lispector declarou várias vezes a paixão dela por você.

      Chico Buarque – Isso é com a Ana Miranda. (risos)

      José Arbex Jr. – Por que com a Ana Miranda?

      Chico Buarque – Ela sabe disso mais do que eu, ela sabe de coisas que não sei…

      José Arbex Jr. – Isso ela declarou na imprensa, publicamente, nas crônicas etc. Vejo muito ponto de contato entre as tuas personagens principalmente femininas e o universo da Clarice. Você vê isso?

      Chico Buarque – Pode ser, adoro a Clarice Lispector, não sei se os meus personagens femininos têm a ver com ela, isso eu nunca tinha pensado. Mas, naquela lista que não fiz de autores que me marcaram e marcam até hoje, a Clarice está. Há pouco tempo, inclusive, reli e notei algumas coisas, porque é o seguinte: tenho a impressão de ter lido a Clarice antes da hora, quando conheci a Clarice não entendia direito o que que era a Clarice, nem a literatura dela, e outro dia comecei a ler e li e anotei várias coisas do Água Viva. Notei coisas que esse livro que já estava manuseado, eu mesmo já tinha lido aquele exemplar com o autógrafo dela, reli e falei: “Mas que coisa! Nunca tinha percebido isso!” Que coisa maravilhosa, as observações dela sobre a escrita inclusive, coisas que anotei, tinha uma de pescar as palavras, não lembro exatamente como é que era. Aquilo anotei. E é isso, tive um contato com ela pessoal sem na verdade… se tivesse a dimensão da Clarice Lispector naquela época, teria mais pânico do que tive, porque ela era uma pessoa que me deixava um pouco assustado, gozado isso.

      Ana Miranda – Você contaria publicamente aquela história que contou pra mim, Chico?

      Chico Buarque – Eu conto! A minha versão é a versão real, a sua é que eu…

      José Arbex Jr. – Que versão é essa?

      Chico Buarque- Um dia, ela me convidou para jantar. Eu já tinha estado com ela algumas vezes, e ela me dizia algumas coisas meio desconcertantes, saía da sala e dizia: “Escreve aí um poema.” Ia para a cozinha e voltava, e eu que não escrevo poema tinha de escrever, ficava um pouco assustado (os versos: Como Clarice pedisse/ Um versinho que eu não disse/ me dei mal/ Ficou lá dentro esperando/ Mas deixou seu olho olhando/ Com cara de Juízo Final). Aí ela me convidou para jantar e perguntei: “Clarice, posso levar uns amigos”? (para me cercar) “Pode, mas aqui na minha casa não tem bebida.” Eu estava no Antonio’s e falei com o Vinícius e com o Carlinhos de Oliveira: “Vamos na casa da Clarice?” “Vamos.” “Só que lá não tem bebida, então vamos beber aqui.” E a gente já foi bebido, chegamos e ficamos lá, os quatro, conversando, conversando, quando deu 1 hora da manhã, a gente: “Então, Clarice, boa noite.” (ri) Não houve jantar, saímos de lá e voltamos pro Antonio’s pra comer.

      José Arbex Jr. – E qual é a versão da Ana Miranda?

      Ana Miranda – Ficcionalizei essa história deles: que tinha uma mesa já posta, e ela esperando o homem que está esperando há anos, para jantar, os olhos, aquela coisa bem ficcional, aí ele chega trazendo uma outra pessoa, então eles sentam e ela fala umas loucuras, invento coisas que a Clarice teria dito, o tempo vai passando, as horas e a conversa, e fica alternando entre o discurso interior dela e as coisas que as pessoas estão falando, até que eles vão embora e no final ela diz assim: “Esqueci de dizer que o jantar era eu!” (risos) Mas fiquei com uma dor de consciência, fiquei noites e noites sem dormir por causa disso. (risos)

      Em: http://www.chicobuarque.com.br/texto/entrevistas/carosamigos_98.htm

       

       

  2. Sonhos: Mário Quintana

    recém obtive todos os livros e coletânea,não tinha todos(direto da fonte evita frases (comuns, falsamente atribuídas ao poeta, q alcancei em vida em Porto Alegre,inesquecível uma entrevista, um dos momentos em q deixa claro q não é a águar-com-açucar desses sites de frases e pensamentos).Vânia, te cito no Multimídia do Dia de hoje.

    Fica a dica (desconfio que tb vc pode se surpreender). Não fiquei chateado,p/ ontem: corresponpodeu ao q já esperava,na imediatas postagens de músicas de ontem). Te conheço superficialmente:,sob outro Nick-Apelido já fomos amigos,vc não deve se lembrar.

    1. “a vida não é apenas pra ser vivida: tem que ser sonhada” – M.Q.

      a vida não é apenas pra ser vivida: tem que ser sonhada (q M.Quintana,se revire na tumba: tô c/ preguiça de pegar livro( MQ tinha muitos aforismos,poéticas e contundentes s/ a moral e bom costume).Teve coluna Correio do Povo,Porto Alegre-RS). “Provinciano é sair da província” (só saiu de sua cidade natal,adotando POA.Là vivi 1/2 de vida até…hoje…e acho POA hors-concours + civilizada + liberal do país,sem a fama do comportamento aberto e liberal de uma RJ ou NE,especif.PE. P/sinal,G. Freyre,pedantecito,há capít s/ um mitos da frieza do gaúcho – parecido c/ outro mito do nordestinino,especiamt pernambucano, liberal e camarada,aparências à parte)

      1. não entrou na academia brasileira de letras

        desistiu dos protocolos e de algumas companhias. (Freud q se f… herdei um jeito excessivamente brincalhão de meu pai, tb cometendo imprudências, não perdia a piada. Conto nos dedos das mãos e pés o q já tive direta agressão por aki. Dica: não siga esse meu péssimo exemplo, nem de outros e outras em usar o GGN como sites de roupa lsuja. Nunca acessei nenhum blog , e não acesso. Posso perder, mas não tenho mínima curiosidade, leio muito. Online só fica o computador desktop. GGN não tem o recurso automático de deslogar, dias, semanas, meses, anos. / E recusa minhas geniais sugestões que desisti.

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