A face oculta da ‘moderna’ terceirização na atividade fim, por Barbara Vallejos Vazquez

O discurso de ‘modernização’, de que o Projeto de Lei nº 30/2015 vai trazer as empresas do século 20 para o 21, esconde uma realidade de ilegalidades, burlas de direitos trabalhistas, fraudes, interposição de mão de obra e vínculos profundos com o trabalho escravo

do Brasil Debate

A face oculta da ‘moderna’ terceirização na atividade fim, por Barbara Vallejos Vazquez

Em entrevista recente sobre o Projeto de Lei nº 30 de 2015, que regulamenta a terceirização sem limites no Brasil e permite a terceirização na atividade fim, Hélio Zylberstajn afirmou que “A Súmula 331 proíbe nossas empresas de evoluir e se transformar em redes produtivas. Condena-as a permanecer no século 20…”

As entidades patronais, que pressionam para uma precipitada aprovação, afirmam que buscam segurança jurídica às empresas que, então, finalmente, poderiam fazer o que mais desejam: “modernizar o mercado de trabalho brasileiro”.

O que se sabe sobre a terceirização no Brasil?

Não existem estatísticas exatas sobre terceirização. No que tange às chamadas atividades meio é possível se fazer cálculos aproximados: seriam cerca de 12 milhões de terceirizados no Brasil ou um quarto do mercado de trabalho formal.

O certo é que, em estimativas de diferentes fontes, constatou-se nos setores terceirizados discriminação salarial, desrespeito a direitos, maior incidência de acidentes e relação intrínseca com a ocorrência de trabalho escravo. Isso sem falar nas inúmeras empresas fantasmas que “somem” sem pagar os direitos devidos aos trabalhadores.

Quando se trata de informações sobre as atividades fim, a despeito de uma constatação empírica da degradação das condições de trabalho, a medição global é árdua, pois envolve o desmascaramento de contratos de emprego escamoteados em relações comerciais, além de diversas formas de fraudes e burlas à legislação trabalhista.

Há, entretanto, importantes medições setoriais que nos ajudam a elucidar o impacto que a aprovação do PLC 30/2015 poderá ter no mercado de trabalho brasileiro.

Terceirização no setor financeiro: exemplo notório de fragmentação e burla de direitos

Os bancos, mestres na arte das práticas terceirizantes, “inovaram” uma vez mais nesse campo nos anos 2000, por meio da distorção de um preceito de flexibilização da prestação dos serviços bancários, contida na circular 220/1973 do Banco Central. Esta concebeu a figura do correspondente bancário, inicialmente, para possibilitar pagamento de títulos em localidades não assistidas por agências bancárias.

Correspondentes são convênios firmados entre estabelecimentos do setor de comércio e serviços – tais como estabelecimentos varejistas do setor de moda, supermercados, ou até mesmo pet shops e açougues – com uma instituição financeira para prestação de um rol de serviços bancários – como saques, extratos, encaminhamento de propostas de concessão de cartões de crédito, financiamentos e operações de câmbio.

Trata-se, portanto, da prestação de serviços bancários por trabalhadores dos setores de comércio, sem que, contudo, recebam remuneração, treinamento e aparatos de segurança adequados. O modelo é explícita terceirização de atividade fim e expressa notória piora das condições de trabalho, conforme tabela abaixo.

 

Os correspondentes cresceram 929% em dez anos e superam em quinze vezes o quantitativo de agências no país. Pode-se imaginar seu impacto para o emprego bancário e para o lucro das instituições financeiras, dado que criaram uma nova categoria de empregados – composta de quantos milhares de trabalhadores? – fora dos bancos.

Embora as justificativas para a existência dos correspondentes bancários no Brasil estejam envoltas em argumentos que ressaltam a importância da inclusão financeira, o desenvolvimento real do modelo demonstra um novo contrato de terceirização, ilícito, porque contraria a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), fere o princípio do Valor Social do Trabalho, não realiza o correto enquadramento sindical dos trabalhadores do setor financeiro e, espúrio, pois além de fragmentação, gera desemprego no setor bancário.

O projeto

A principal disputa em torno do projeto está ao redor de seu artigo 4º, que estabelece que “É lícito o contrato de terceirização relacionado a parcela de qualquer atividade da contratante…”, permitindo, portanto, a terceirização na atividade fim.

Ademais, o projeto permite que as contratadas possam ser associações ou cooperativas e possibilita a criação de outra categoria econômica, a de prestadores de serviços, o que facilita a transferência de trabalhadores formais celetistas para contratos como pessoas jurídicas (PJ), implicando perda de direitos.

O argumento da “especialização” é colocado à prova, à medida que o projeto autoriza a quarteirização, ou seja, que a empresa contratada, ou terceira, contrate, ainda, outra empresa para a execução dos serviços. No caso específico do setor bancário, há, no artigo 20, texto contrariando a premissa da especialização, pois se defende que, no caso dos correspondentes bancários, não há obrigatoriedade de objeto social único.

“A face oculta da modernização”: realidade da terceirização no Brasil

O discurso de “modernização” oculta uma realidade de ilegalidades, burlas de direitos trabalhistas, fraudes, interposição de mão de obra e vínculos profundos com o trabalho escravo. A terceirização que aqui se pratica configura-se como interposição de mão de obra; vínculos de emprego escamoteados, que visam ao pagamento de menores salários, imposição maiores jornadas e fragmentação de categorias sindicais e, consequentemente, debilitar convenções e acordos coletivos de trabalho.

A classe patronal brasileira nunca foi afeita ao respeito da legislação trabalhista e viu no PLC 30/2015 a possibilidade de jogar no lixo a gama de proteção social constituída ao redor do trabalho.

A convenção coletiva nacional dos bancários, por exemplo, síntese de 20 anos de luta, é hoje burlada pela contratação dos correspondentes. Joga-se fora a jornada de 30 horas, os ganhos salariais e a proteção à vida dos trabalhadores em atividades bancárias.

Por que se tornou tão central permitir a terceirização nas atividades fim em 2015?

Em meio à crise, a política para o mercado de trabalho, expressa em nova rodada de flexibilização, com a edição das “MPs do ajuste”, e na tentativa de regulamentação da terceirização, revela o papel funcional da redução dos custos do trabalho no Brasil: a mão de obra cada vez mais explorada se configura como “vantagem comparativa”.

Se há quem afirme que a não aprovação do PLC 30/2015 prende as empresas ao século 20: devemos ser categóricos ao afirmar que, na verdade, sua aprovação pretende fazer-nos caminhar para o século 19 em termos de proteção ao emprego.

Barbara Vallejos Vazquez – É mestranda em Desenvolvimento Econômico na Unicamp, graduada em Ciências Sociais pela USP e técnica do DIEESE. Pesquisa mercado de trabalho e terceirização, com foco no ramo financeiro

Redação

15 Comentários

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  1. O único direito trabalhista

    O único direito trabalhista real é o trabalhador receber de acordo com a sua produtividade.

    O resto é conversa mole.

     

    1. trabalho por produtividade

      Advogado de usina, vi cortadores de cana, que ganham por produção até hoje, morrerem…Tomara que aocnteça o mesmo a você.

  2. só lendo e tentando aprender mais…

    porque na minha época, FHC, um funcionário terceirizado passou a custar para a empresa contratante, estatais e autarquias, quase o triplo de um funcionário efetivo

  3. O que eu sei da terceirização

    O que eu sei da terceirização são empresas que abrem e fecham de repente, de empresas que fecham as portas e somem sem pagar ninguem, de empresas que atrasam salarios dos funcionarios, ou seja, uma tragédia, é isso que eu sei da terceirização.

    1. Empresas que “somem” com as

      Empresas que “somem” com as carteiras de trabalho nas demissões, impossibilitando assim a prova de vículo trabalhista.

      Muitos terceirizados só descobrem que não recolheram o INSS tarde demais, quando dão entrada na aposentadoria.

      Um amigo meu trabalhou dez anos na mesma companhia mas em dez terceirizadas diferentes. Só seis contribuiram pro INSS e, duas tinham CNPJ laranja. Tá a tres anos brigando com a previdencia pelos anos não recolhidos.

      O que é mais fácil fiscalizar? Uma empresa com mil funcionários e um sindicato só, ou cinquenta empresas diferentes com sindicatos diferentes?

  4. A terceirização é gerada pela

    A terceirização é gerada pela extrema complexidade, custo e risco de uma legislação trabalhista que trava o desenvolvimento do Pais. Terceiriza-se ao extremo para fugir da legislação trabalhista. Nos EUA, onde não há lei trabalhista e no Japão, onde há menos ainda, há muito menos terceirização do que no Brasil.

  5. PREDADORES SOCIAIS

     

    A Terceirização, como introduzida no Brasil, por grandes grupos de mega empresas multinacionais e nacionais, não passa, de um desvio da responsabilidade social dessas mega empresas, em relação aos seus milhares de trabalhadores. Tudo pelo maior retorno aos seus acionistas controladores lá de suas matrizes no exterior.

    Essas empresas contam com um grande poder de persua$ão no judiciária, onde arrastam seus contendores ao sistema judiciário corrupto e aparelhado, num tempo à sumir de vista, suficiente parea asfixiar seus oponentes tinanceiramente no longo percurso.

    As grandes cadeias produtivas do agronegócio, hoje dominadas em mais de 40% no setor do açucar e álccol e, suco de laranja.

    Veja-se alguns casos emblemáticos nos links a seguir:

    http://www.cbnribeirao.com.br/noticias/economia/economia_internaNOT.aspx?idnoticia=938572

    http://www.valor.com.br/agro/3443696/justica-condena-biosev-por-terceirizacao-ilicita-empresa-ja-recor

    Um dos grupos useiros e viseiros da tática de arrastar seus contendores ao judiciário corrupto, através de bancas milionárias, com representantes de sobrenomes de Ministros do STF, É O GRUPO LOUIS DREYFUS.

    Este Grupo frances, além, de ser o segundo maior no setor de açucar e álcool com 13( TREZE ) USINAS DE AÇUCAR( Em 2002, possuía apenas duas Usinas) , um dos 4 maiores na fabricação e exportação de suco de laranja e um dos 4 maiores na Comercialização e Exportação do complexo soja no Brasil.

    Este grupo se utiliza de práticas das mais reprováveis no trato com seus fornecedores de soja.

    Se utiliza de Contratos de Compra e Venda Leoninos, atralados a Título sem lastro(CPR CÉDULA DE PRODUTO RURAL), que mesmo sem lastro financeiro à permite arrastar produtores ao judiciário corrupto e, lá pressificar a soja, que não conseguiu pela via negocial.

    As cadeias produtivas do Agronegócio brasileiro estão dominadas pelas multinacionais, que não só burlam os direitos trabalhistas, mas também, corropem o judiciário pelo tráfico de influência, para fazer valer seus propósitos, de aumentar os lucros dos acionistas controladores, em suas matrizes no exteriror.

    É gravíssima a atual situação de domínio do agronegócio, pelas multinacionais, um dos pilares da economis brasileira. Elas manipulam preços de commodities, direitos trabalhistas, cartórios de registro, cartórios judiciais, juízes, desmbargadores e até ministros do judiciário. Os magistrados, em larga medida são obsequiosos com essas poderosas empresas e suas bancas milionárias.

    Essas mesmas empresas corropem políticos via financiamento de campanhas, que agora, tem um marco regulador que proíbe a contribuição por pessoa jurídica.

    A omissão social dessas empresas, e volto a afirmar o Grupo Dreyfus entre elas, se estende à sonegação fiscal e/ou elisão fiscal, como acontece no CARF. Estão todas lá, com grandes processos admininstrativos representadas pelas bancas milioárias, para “recuperação fiscal”.

    Em resumo, essas fraudes, passam ao largo do conhecimento da sociedade, pela blindagem da grande mídia, que por razões financeiras tapam o sol com peneira, se omitindo a demonstrar as fraudes.

    Em resumo, em busca do lucro fácil, essas grandes corporações multinacionais e, em especial este Grupo Dreyfus, atuam sem nenhuma responsabilidade social, operando na busca do maior retorno aos acionistas, às custas das violaçòes do Ordenamento Jurídico, dos direitos dos trabalhadores, dos diretios dos produtores e em prejuízo do meio ambiente, pois, seu crescimento desenfrado, pressiona por mais terras, mais produto, mais corrupção e menos compromisso social.

    São verdadeiros PREDADORES SOCIAIS.

     

    1. O maior cliente das

      O maior cliente das terceirizadoras é o GOVERNO em todos os seus niveis, da União, Estados e Municipios, DOIS MILHÕES DE TRABALHADORES são tercerizados para entidades governamentais no Brasil, não tem nada a ver com multinacionais, as tercerizadoras são BRASILEIRAS E CONTROLADAS POR BRASILEIROS, como a CONFEDERAL (Senador Eunicio Oliveira),

      TEJOFRAN, GOCIL, BAURUENSE, EMBASE,  etc., tudo gente nossa, brasileirissimos.

      1. Terceirização

        André,

        Você se esqueceu da terceirização do setor bancário.

        Não é porque o Eunício se utiliza desta prática, que iremos ignorar o que ocorre no campo e na cadeia produtiva do agronegócio, totalmente dominado pelas multis – O domínio é vertical, elas controlam os insumos( fertilizantes, defensivos,etc…), a comercialização, o transporte e determinam os preços das commodities, especialmente os da soja e da laranja.

        Dê uma olhada no Link que indiquei. Veja os processos.

        Procure se informar sobre aquisição e especulação com compra de terras no Brasil.

        A Dreyfus já dispõe de mais de 360.000 ha de terras brasileiras.

        Procure se informar, como o Cartel da da laranja(operação fanta) expulsou os pequenos produtores de laranja, do campo, adquirindo posteriormente suas terras. Através de prática de Cartel com preços da laranja abaixo dos níveis de custo de produção.

        Procure ler um Contrato de Compra e Venda de soja verde, atrelado com CPR.

        Procure ler a Jurisprudência sobre inexigibilidade de lastro da CPR , para efeito de Execução, que se alastra so STJ.

        Jurisprudência Ad Hoc, elaborada pelos “jurisconsultos” que direta ou indiretamente estão na folha de pagamento da Dreuyfus.

        O somatório de danos ambientais, sociais e econômicos aos brasileiros, em prol de uma política agrassiva de maximização de lucros para o exterior, às custas da precarização do trabalho, da pegada ecológica mastodôntica e da sonegação fiscal disfarçada numa contabilidade criativa, eleva em muito a importância delas neste contexto.

        São PREDADORAS SOCIAIS.

        Veja o caso emblemático da MINERADORA!!! Precisa mais?

         

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