Flexibilizar lei trabalhista é volta ao passado, por Paulo Paim

 
Jornal GGN – Em artigo publicado no Sul 21, o senador Paulo Paim (PT-RS) critica as propostas de flexibilização das leis trabalhistas e diz que elas representam uma “volta para o passado”. Ele argumenta que, sempre que há um período de queda na economia, surgem tentativas de retirar direitos trabalhistas e sociais, com a tese de que a CLT seria ultrapassada.
 
Ele cita o juiz do trabalho Jorge Souto Maior, que, em 2007, afirmou que flexibilizar as relações de emprego diminui salários e não aquece a economia. “Flexibilizar o que foi conquistado não é sinônimo de modernização e muito menos de crescimento econômico”, diz Paim, que afirma que o país só irá crescer com um novo pacto federativo, reforma tributária, a valorização do salário mínimo e o combate à sonegação tributária, entre outros pontos.

Leia mais abaixo:

Do Sul 21
 
De volta para o passado
 
Por Paulo Paim

A legislação trabalhista é uma conquista e um avanço. Podemos afirmar que há dois Brasis aí. Aquele em que antes não havia férias nem descanso remunerado, não havia salário-mínimo e muito menos licença-maternidade. As pessoas trabalhavam doze, catorze, dezesseis horas por dia. Era comum encontrar crianças com oito, nove anos em trabalhos forçados. Havia um processo em gestação que levaria a um colapso social.

Com a promulgação de novas leis a partir de 1931 e a chegada da CLT, em 1943, o país começou a mudar de rumo nas suas relações de trabalho com a incorporação das necessidades dos trabalhadores e de suas famílias. Surge o Ministério do Trabalho, a garantia da carteira de trabalho, do salário-mínimo, da jornada de trabalho, entre outros direitos.

A vida do país prosseguiu. Tivemos períodos de abertura de indústrias, com incentivo às empresas e grande geração de emprego e outros de inflação alta, recessão e milhões de desempregados. Tivemos governos de exceção e desde 1989 elegemos o presidente da República pelas urnas.

Em todas essas décadas sempre que o país não apresentava níveis concretos de crescimento surgiram tentativas de retirar direitos trabalhistas e sociais. Programas aplicavam a tese de que a CLT é arcaica, ultrapassada, que a Previdência Social é deficitária (Análise da ANFIP – Associação dos Auditores Fiscais da Receita – prova o contrário), que não há caminho fora das privatizações.

Jorge Souto Maior – juiz do Trabalho – disse em 2007, que “direito trabalhista não é custo para as empresas” e que flexibilizar as relações de emprego diminui salários e não aquece a economia. A legislação nunca foi um entrave ao desenvolvimento econômico do país. Se isso fosse uma situação válida, “o país já teria um desenvolvimento econômico invejável”.

Em 1974, veio a criação do trabalho temporário. Dizia-se que era preciso diminuir os custos, para que em determinadas épocas do ano as empresas pudessem contratar. Em 1988 surgiu a lei do banco de hora.  “O Brasil já fez de tudo que poderia ser feito do ponto de vista da flexibilização. Além disso, a economia não cresceu”.

Agora, com “Uma ponte para o futuro”, do presidente Michel Temer, e sua proposta de reformas trabalhista e previdenciária, volta à baila a terceirização da atividade-fim, o negociado acima do legislado, o aumento da jornada de trabalho das atuais 8 horas diárias para 12 horas, a redução do horário de almoço do trabalhador de 1 hora para 15 minutos, a aposentadoria aos 65 anos, ou seja, a desregulamentação das relações do trabalho. Estaremos voltando ao início do século 20?

O governo chama de “modernização”. Mas, alto lá, como assim? Vejamos a proposta do negociado acima do legislado. Ela nada mais é do que a possibilidade de uma convenção ou um acordo coletivo de trabalho de categorias econômicas e profissionais prevalecer sobre a lei vigente. Ou seja, tudo que está garantido na legislação poderá ser rejeitado pelo lado mais forte – pelo fogo do dragão.  Optar por essa proposta é negar o desemprego, o trabalho escravo e infantil, os baixos salários, as péssimas condições de segurança e as discriminações que ainda existem em muito no país.

A nossa legislação, queiram ou não, ainda garante padrões mínimos para uma vida digna às pessoas. Ela sensibiliza e humaniza a relação capital e trabalho. Flexibilizar o que foi conquistado não é sinônimo de modernização e muito menos de crescimento econômico.

O país só vai crescer e se modernizar a partir de um novo pacto federativo, uma ampla reforma tributária, taxa de juros que estimule o mercado sem empobrecer a população, valorização do salário-mínimo, salário descente para aposentados e pensionistas, poupança interna, combate à sonegação de impostos, que hoje chega a R$ 400 bilhões por ano, penalização de corruptos e corruptores, entre outros meios, que harmonize e gere um comprometimento entre os setores público e privado.

.oOo.

Senador Paulo Paim (PT/RS), é presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado.

 

Redação

2 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Concordo, em partes, com a

    Concordo, em partes, com a tese de sua excelência, o Senador Paulo Paim.

    Claro que retirar direitos do trabalhadores não será bom para os trabalhadores. Isso parece óbvio. Inda mais   se levarmos  em conta que não são os trabalhadores que estão propondo a “flexibilização de seus direitos”. São os empregadores.

    Mas, eu até concordaria com essa “flexibilização dos direitos dos trabalhadores”. 

    Ficaríamos assim

    Os empregadores já apresentaram sua proposta para flexibilizar o direito que  não é  o deles.

    Então, os empregados devem apresentar uma proposta para flexibilizar o direito dos empregadores.

    Em suma, cada um sugere mudanças no direito do outro.

    Ora, poderíamos “modernizar a CLT  , bem como o CÓDIGO patrimonial  CIVIL( leis civis) na parte “empresarial”.

    Estamos diante de um figura atípica do pacta sunt servanda( contrato). Cada parte contratual , na defesa de seus interesses, fará  mudanças no direito da outra.  

    Por exemplo:

    Trabalharemos  com uma mão num  tempo interjornada de 15 minutos para, em seguida, voltar ao trabalho com as duas mãos. Ah, nem usaríamos o banheiro para escovar os dentes ou fazer necessidades fisiológicas. Essas podem ser feitas no trabalho mesmo, com o uso de fraldas descartáveis no fim do dia.

    Por outro lado, não haverá mais a “mais-valia”,  vez que o “resultado” ( e não mais o lucro) será dividido entre “patrão e empregado”.

    Aliás, nem haveria mais patrão e empregado pois ambos trabalhariam com uma única mão durante o intervaldo do almoço. Ambos usariam fraldões sem fraudes e por aí vai.

    Heureca!

    Seria o fim na interminável guerra entre CAPITAL versus TRABALHO!

    Dizem que é  nos períodos de “crise” que encontramos formas para mudanças e aprimoramento. 

    Taí! 

    Encontramos!

    Que tal?

    É por isso que concordo em partes com tese do senador, isto é, concordo com a “parte” do empregador que deseja “flexibilizar” o direito do obreiro. 

    Falta agora flexibilizar a parte dele, do empregador!

     

     

     

     

     

     

  2. Gostaria de adicionar uma

    Gostaria de adicionar uma coisa ao texto do senador: Em 1964 houve o primeiro ataque à CLT. Na época, Roberto Campos sacou a estabilidade empregatícia após dez anos de serviço, ainda que tenha substituído essa garantia pelo FGTS. Tve gente na minha família que sofreu demais com a perda desse direito, pois logo depois da mudança da lei, ficou muito doente e teve de completar o tempo de serviço sem direito algum, com muita dificuldade de locomoção. Se sacasse o FGTS, teria uma quantia irrisória, pois o tempo de serviço anterior a 1964 não contava para o Fundo de Garantia. 

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador