Recorde? Emprego com carteira assinada encolhe quase 18% desde abril de 2015, por Lauro Veiga Filho

Séries estatísticas da PNADC não corroboram números apresentados pelo Caged e mostram, sim, recorde para o total de pessoas desempregadas

Agência Brasil

Recorde? Emprego com carteira assinada encolhe quase 18% desde abril de 2015

por Lauro Veiga Filho

Você compraria um fusca usado do ministro Paulo Guedes? Reflita atentamente antes de tomar uma decisão, para não comprar gato por lebre. Pois o senhor ministro e sua equipe têm vendido ao País uma recuperação esplendorosa da economia, baseado principalmente nos números trazidos pelo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). O saldo entre contratações e demissões, na versão “turbinada” do Caged, que passou por alterações na forma de coleta dos dados e igualmente nas categorias de empregados, tornando obrigatório o registro da movimentação de temporários e empregados domésticos, escalou para 258,1 mil em janeiro e saltou para 401,6 mil em fevereiro. Dois “recordes” consecutivos para o mercado formal de trabalho.

Os recordes alegados, no entanto, parecem ter tanto valor quanto uma nota de três reais. Não parece mesmo fazer muito sentido esse crescimento vigoroso dos empregos formais num momento em que a escalada da pandemia obriga o País a conviver com recordes consecutivos de mortes, diariamente. O número igualmente não bate com o aumento da incerteza e da desconfiança empresarial anotado pelas pesquisas da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Quais empresários estariam contratando pessoal a rodo num cenário tão ameaçador?

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apresenta um cenário bem diverso e, aparentemente, mais realista. O dado mais recente, referente ao trimestre finalizado em janeiro deste ano, mostra que o total de empregos com carteira assinada, incluindo trabalhadores dos setores público e privado e ainda empregados domésticos, havia estacionado em 32,252 milhões, representando 37,5% do total de pessoas ocupadas. Em seu melhor momento, o setor formal havia registrado, nos três meses encerrados em abril de 2015, perto de 39,178 milhões de trabalhadores com carteira, o que na época representava 44,3% de todas as ocupações. Recorde de fato veio no total de pessoas desempregadas, que atingiu o mais número da série histórica iniciada em 2012, chegando a 14,272 milhões de trabalhadores, 1,5% acima do trimestre imediatamente anterior e 19,8% mais do que no trimestre terminado em janeiro de 2020.

Recorde de desempregados

Na comparação entre os dois dados, o mercado fechou 6,926 milhões de vagas com carteira assinada, numa queda de 17,7% entre abril de 2015 e janeiro deste ano, com perda de direitos para os trabalhadores, que deixaram de receber 13º salário e férias, além de perderem a cobertura da Previdência Social. O ministro e sua equipe escamoteiam a verdade, mais uma vez, quando alegam que o emprego formal estaria em forte recuperação. A PNADC indica que as contratações de pessoal com carteira assinada estão estagnadas praticamente nos mesmos níveis de novembro do ano passado, mostrando leve recuo.

A série de dados da pesquisa mostra que o total de ocupados com carteira havia desabado de 36,629 milhões no último trimestre de 2019 para 31,597 milhões entre junho e agosto de 2020, nível mais baixo desde o começo da pandemia, até aqui pelo menos. Foram fechadas, portanto, 5,032 milhões de vagas formais naquele intervalo, demonstrando redução de 13,7%.

A normalização de uma série de atividades que haviam sofrido restrições na primeira onda da pandemia permitiu que o total de empregos com carteira apresentasse ligeira reação nos meses seguintes, atingindo 32,386 milhões de trabalhadores com carteira assinada no trimestre setembro-novembro (mais 2,5%). Mas a “reação” significou a reabertura de 789,0 mil vagas de um total superior a 5,0 milhões de empregos perdidos até agosto. Até janeiro deste ano (sempre considerando os dados trimestrais aferidos pela pesquisa do IBGE), não houve mais contratações. Ao contrário, o setor formal do mercado de trabalho fechou mais 136,0 mil vagas – o que, estatisticamente, é considerado como “estabilidade”.

Desde o quarto trimestre de 2015, quando os dados sobre informalidade passaram a ser publicados integralmente, o número total de pessoas ocupadas baixou 6,3%, saindo de 91,8 milhões para 86,025 milhões no trimestre encerrado em janeiro deste ano – quer dizer, 5,775 milhões de trabalhadores foram demitidos no período. Mas o total de trabalhadores com carteira encolheu ainda mais fortemente, caindo de 38,586 milhões para aqueles 32,252 milhões, numa redução de 16,4%, com fechamento de 6,334 milhões de vagas.

O número de ocupados na economia vem sofrendo baixas desde o trimestre fevereiro-abril do ano passado, na comparação com idênticos períodos do ano anterior. Considerando um total de 94,552 milhões de ocupações geradas no trimestre final de 2019, até janeiro deste ano foram liquidados 8,527 milhões de empregos, num retrocesso de 9,0%.

Na passagem do trimestre agosto-outubro de 2020 para os três meses encerrados em janeiro deste ano, o total de ocupados avançou em torno de 2,0%, com abertura de 1,725 milhão de vagas (um quinto do total perdido desde dezembro de 2019). Ainda assim, 81,4% de todas as novas ocupações criadas no período foram destinadas a informais (categoria que inclui trabalhadores sem carteira, trabalhadores por conta própria e empregados sem CNPJ e trabalhadores que prestam serviços à própria família, sem remuneração). Esse contingente avançou de 32,714 milhões para 34,118 milhões, ou seja, em torno de 1,404 milhão a mais.

Embora o total de desempregados tenha sido recorde em janeiro deste ano, a taxa de desemprego praticamente não se moveu entre o trimestre agosto-outubro de 2020 e os três meses imediatamente seguintes, saindo de 14,3% para 14,2%. Incluindo as pessoas em desalento e aquelas fora do mercado, mas que gostariam de trabalhar, caso tivessem oportunidade, a taxa de desemprego se aproximaria de 26,8%.

Redação

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