Resistindo, FUP “permanece em mesa para negociar”, desde sexta, por Marcelo Auler

Nestas 48 horas ocupando a sala do quarto andar do edifício sede, na Avenida Chile, centro do Rio, foram ameaçados, tiveram a luz cortada e ficaram sem água nos banheiros por aproximadamente 12 horas.

Desde sexta-feira os sindicalistas da FUO e do Sindquímica-PR, estão em mesa para negociar. (foto: reprodução redes sociais)

Resistindo, FUP “permanece em mesa para negociar”, desde sexta

por Marcelo Auler

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O sinal de que nem tudo se deteriorou na democracia em vertigem brasileira não está apenas na iniciativa dos sindicalistas. Evidencia-se ainda na sentença da juíza Rosane Ribeiro Catrib, de plantão no Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ), ao rejeitar o pedido de reintegração de posse feito pela empresa. Uma tentativa, da Petrobras, de livrar-se do “estorvo” que a presença daqueles cinco em seu prédio lhe causa, pois caracteriza a sua falta de interesse em negociar.Desde sexta-feira (31/01), cinco diretores da Federação Única dos Petroleiros (FUP) e do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Química do Estado do Paraná (Sindiquímica/PR) – Deyvid Bacelar, Cibele Vieira, Tadeu Porto, José Genivaldo da Silva, Ademir Jacinto -, que constituem a Comissão Permanente de Negociação da FUP, aguardam, sentados à mesa onde se reuniram momentos antes com o gerente de Recursos Humanos da empresa, Fabricio Pereira Gomes, a negociação ser retomada. Nestas 48 horas ocupando a sala do quarto andar do edifício sede, na Avenida Chile, centro do Rio, foram ameaçados, tiveram a luz cortada e ficaram sem água nos banheiros por aproximadamente 12 horas. Mas não arredaram pé do local em que os negociadores da empresa os deixaram. É uma resistência pacífica e até mesmo quixotesca.

Prefaciando sua decisão com uma frase da jornalista Eliane Brum – “A tragédia brasileira é que as palavras existem, mas já não dizem” -, ela explica:

o Brasil sofre de um esvaziamento de significado das palavras e que, destituídas de significado, as palavras não agem, não materializam a ideia nelas contida. Quando a palavra já não diz, resta o gesto. Gesto simbólico: estão na mesa para negociar“.

Após receber relatório do oficial de justiça que esteve no local e constatou que os cinco não ameaçavam a segurança da empresa, tampouco dificultavam o funcionamento da estatal, a juíza Rosane registrou:

O que se vê é a legítima atuação do Sindicato no sentido de persuadir a empresa à negociação. Negociação frustrada após uma reunião para a qual foram convidados e não saíram porque, como já dito, permanecem em mesa para negociar. É um sinal de resistência, próprio do jogo democrático.”

A juíza respaldou-se em decisão pretérita, do seu colega de TRT-TJ o desembargador Gustavo Tadeu Alkmim. O acórdão surgiu de uma greve de bancários em que empregadores tentaram proibir piquetes. Ao rejeitar o pedido, o desembargador, em tom crítico, relembrou que a greve é um direito constitucional dos trabalhadores:

O empregador (…) Almeja, quem sabe, retroagir ao tempo em que, no Brasil, a greve era considerada “caso de polícia”. A norma processual exige um justo receio para a concessão de mandado proibitório (CPC, art. 932); e não se concebe receio “justo” contra expresso texto de lei que assegura aos grevistas “o emprego de meios pacíficos tendentes a persuadir ou aliciar os trabalhadores a aderirem à greve” (inciso I do art. 6° da Lei 7783/89) – em suma, o uso do piquete pacífico“. Agravo regimental improvido.” (Proc. Nº 01614-2005-000-01-00-6 (MS), (AGRAVO REGIMENTAL)SEDI, publicado em 26.04.2006).

Mesmo considerando que não se tratar de um piquete especificamente, a juíza Rosane citou a falta de resultado na negociação de sexta-feira para garantir o direito de permanência dos cinco sindicalistas na sala de reunião. Na decisão assinada às 10:22hs, ela explica:

Juiza Rosane Catrib: “o que se vê é a legítima atuação do Sindicato”. (Foto: reprodução Revista TRT-1ª Região)

E é exatamente da negociação frustrada que surge o direito da cessação coletiva do trabalho (Lei 7783/89, art. 3°). Assim, temos que permanecer, pacificamente, em uma mesa de negociação aguardando o interlocutor, é instrumento válido para forçar uma negociação ou a ela dar continuidade (…) Sob nenhum aspecto, a permanência dos ocupantes nesse espaço restrito indica risco ou ameaça à PETROBRÁS. Estamos diante de nada mais que cinco dirigentes sindicais, número que, muito provavelmente, não supera o quantitativo de integrantes da equipe de segurança do prédio sede da Petrobrás, mesmo em um final de semana (…) Afastada a alegada ameaça, temos que a controvérsia está centrada em direito coletivo do trabalho, que possui regulação específica, inclusive processual.”

Conduta antissindical

A decisão da juíza certamente desagradou à diretoria da Petrobras. Impedida de expulsar os sindicalistas, a empresa decidiu partir para o confronto. Em outras palavras, ao contrário da magistrada, não reconhecer a “legítima atuação do Sindicato no sentido de persuadir a empresa à negociação”.

A energia e a água do quarto andar do prédio foram cortadas, deixando os cinco no escuro, sem ar refrigerado, sem recarregarem os celulares e os banheiros sem descarga. Uma demonstração de desespero e falta de preparo para uma negociação sindical. Tentativa de resolver o problema à força, sem diálogo.

A juíza não gostou. Ao ser informada dos cortes, voltou aos autos do processo às 19:39 hs de sábado. Após relembrar que a greve foi decidida em assembleia da categoria e citar sua decisão anterior reconhecendo a legitimidade de atuação do sindicato, classificou a atitude da empresa como “conduta antissindical da Requerente, que deve ser reprimida, em respeito às disposições constitucionais, especialmente , art. 8º da CF, à Convenção 98 da OIT e ao art. 513 da CLT.”

Relembrando a legislação – Decreto Legislativo n. 49, de 27.8.52, do Congresso Nacional e Decreto n. 33.196, de 29.6.53 – entendeu necessário garantir “a proteção contra quaisquer atos atentatórios à liberdade sindical“. E explicou, quase que didaticamente, as regras do jogo em regime democrático:

E nessa liberdade se inclui um direito fundamental, o de greve que traz, em si, a possibilidade de atos de antijuridicidade, que são necessários para obrigar a parte contrária a aderir à negociação. Esse o intento dos dirigentes, por isso “permanecem em mesa para negociar”, repetimos (…) Caracterizada a conduta antissindical e clara afronta à decisão que indeferiu a liminar, impõe-se sejam mantidas as condições de habitabilidade do prédio sede, com o imediato restabelecimento da luz e da água, em especial nas instalações ocupadas pelos dirigentes sindicais nomeados na presente ação”.

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Redação

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