Socióloga diz que trabalhador terceirizado ganha 50% menos que “estáveis”

Jornal GNN – Paula Marcelino, professora do Departamento de Sociologia da USP (Universidade de São Paulo) e doutora em Ciências Sociais pela Unicamp (Universidade de Campinas) concedeu uma entrevista ao Jornal GGN, para falar do processo de terceirização e seus reflexos no mundo do trabalho.

Jornal GGN – Na prática como o processo de terceirização precariza as condições de trabalho?

Paula Marcelino – Precariza de duas formas, o primeiro impacto direto é na diminuição significativa dos salários. Todos os cálculos que eu conheço com pesquisas qualitativas de determinados setores provam que em média um trabalhador terceirizado ganha 50% menos do que um trabalhador “estável”.

O segundo impacto importante é que normalmente quando os trabalhadores são terceirizados, essa categoria é desmembrada da categoria de origem que já tem um histórico de luta, ou seja, vários acordos coletivos firmados. Então, para esses trabalhadores terceirizados é como se eles recomeçassem, permanentemente, a luta pelos direitos que as categorias “estáveis” já conseguiram.

Acontece isso com metalúrgicos, petroleiros, bancários, entre outras categorias. Os terceirizados dentro da Replan (Refinaria do Planalto Paulista), por exemplo, têm uma série de 50 itens da negociação coletiva que deveria, uma vez, atingir as duas categorias: terceirizados e “estáveis”. Entretanto, os terceirizados não têm nem a metade dos itens negociados. Ou seja, eles têm que correr atrás do prejuízo, como condições de salário e de emprego, conquistado há muitos anos pelos trabalhadores efetivos.

Ainda tem o impacto da organização sindical, as categorias são desmembradas, e onde se encaixam os trabalhadores terceirizados, junto aparecem com um histórico menor de luta, cujos sindicatos, senão “pelegos” têm menos tradição de luta.

Jornal GGN – A terceirização impulsiona a fragmentação dos trabalhadores de uma mesma classe?

Paula Marcelino – Sim, fragmenta. Mas isso não é o principal fator na minha avaliação, depois de um tempo lidando com essa heterogeneidade, os trabalhadores terceirizados também se organizam, eles também têm feito greves e estão organizados.

Jornal GNN – A intensificação do processo de trabalho terceirizado pode ser influência de um movimento sindical fragilizado?

Paula Marcelino – A estrutura sindical brasileira permite essa pulverização das categorias profissionais. E a terceirização foi um impulso a mais para esse processo. Como só tem um sindicato por base territorial e por categoria profissional, a partir do momento em que você quebra uma antiga categoria e cria outra você cria a possibilidade de mais um sindicato. Então, normalmente um sindicato mais antigo é desmembrado com esse processo de terceirização e, isso evidentemente, dificulta e fragmenta a organização sindical.  

Jornal GGN – Qual a lógica do mercado que move a utilização do trabalho precário?

Paula Marcelino – É a lógica do lucro. Só se extrai lucro do trabalho vivo, não se extrai mais valia de máquina, de trabalho morto. A partir do momento que você passa a pagar a metade do salário para o trabalhador terceirizado, as empresas estão visando seus lucros. Em alguns casos, na verdade a empresa externaliza os conflitos com a força de trabalho e diminuindo o salário. Logo, esse conflito que passa a ser administrado por outra empresa, e não por ela. Então tem várias vantagens para uma empresa terceirizar os seus serviços.

Jornal GGN – Como o trabalho terceirizado pode influenciar nas lutas de classe? Ou seria o contrário?

Paula Marcelino – Vários analistas diziam que o fato do trabalhador ser terceirizado e heterogêneo, ele não faria luta, eu vejo que várias experiências no mundo e no Brasil tem demonstrado que o trabalhador terceirizado pode sim fazer luta sindical reivindicativa direcionada às empresas ou direcionada ao Estado, pra mim é luta de classes também.

A terceirização divide e fragmenta, mas essa divisão pode ser motivo para união entre os trabalhadores. Por exemplo, a luta conjunta dos trabalhadores da refinaria, por condições de trabalho, por isonomia de salário, são lutas que têm acontecido cada vez mais. A pulverização da classe pode significar em dados momentos obstáculos que não são intransponíveis. Porém, em determinadas conjunturas pode se tornar um motivo para mobilizar os trabalhadores, ou seja, para a luta de classe.

Jornal GGN – Como o trabalho terceirizado reflete na divisão sexual?

Paula Marcelino – Eu tenho uma boa hipótese sobre isso, porque faltam dados no Brasil sobre o trabalho terceirizado no geral, bem como, a divisão de gênero, raça e geração. Eu acho que nos trabalhos terceirizados, assim como nos trabalhos “estáveis” naqueles mais precários prevalecem a mão de obra feminina.

Isso é regra para o contrato celetista e eu imagino que para o trabalho terceirizado essa divisão entre homens e mulheres, brancos e negros, jovens e trabalhadores adultos permaneçam. Restando aos trabalhadores mais jovens, mulheres e negros os postos precários.

Jornal GGN – Quais às mudanças no mundo do trabalho que impulsionam o processo de terceirização?

Paula Marcelino – As mudanças não são só no mundo do trabalho, o que normalmente se entende por mundo do trabalho é o ambiente das empresas. Então os locais de trabalho, de fato, se reestruturaram, adotaram métodos flexíveis de gestão e organização da força de trabalho.

Essas mudanças dentro do processo organizativo das empresas, visam otimizar seus lucros, elas permitiram a terceirização, mas somado a isso, estamos numa conjuntura econômica desfavorável à luta dos trabalhadores.

Há também uma investida ideológica na desqualificação do trabalho enquanto um elemento fundamental para a formação do homem. Isso permite que a terceirização tenha um impulso muito grande. Então, o que dá força para terceirização são as modificações no que chamamos de mundo do trabalho. O ambiente político e ideológico.

 Jornal GGN – O que a possível regulamentação da terceirização representará para os trabalhadores e para o mundo do trabalho se for aprovada?

Paula Marcelino – Representará uma precarização total, é abrir todas as possibilidades de terceirização que até agora estavam mais ou menos abertas. A súmula 331, não impedia a terceirização das atividades no geral.

Porém, o que é entendido como atividade fim é algo muito fluido, a empresa pode mudar a qualquer momento o seu ramo, mas significava alguma referencia. No entanto, o PL 4.330 coloca situações como essa de maneira legal. O PL da Terceirização não deixará margens nem para os juízes progressistas tomarem uma decisão que seja diferente da orientação desse novo projeto de lei.

Então o PL 4.330 é altamente danoso para a população trabalhadora, legalizando a terceirização de qualquer tipo de atividade, eliminando qualquer possibilidade da responsabilidade solidária ou subsidiária para as empresas. A ampliação da terceirização no Brasil, que já é relativamente grande, ganhará passos muito mais largos com o PL da Terceirização.  

Redação

4 Comentários

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  1. O PL 4330 é um ataque

    O PL 4330 é um ataque sub-reptício a CLT. Mesmo que aprovado, deveria ser considerado inconstitucional, pelo ataque indireto e dissimulado sobre direitos trabalhistas consagrados, em cláusula pétrea, no art. 7º da Constituição.

    Só não foi aprovado ainda devido ao excelente esforço que as Centrais Sindicais estão fazendo para que não seja apreciado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara.

     

  2. Ora, 50% ate’ que nao e’

    Ora, 50% ate’ que nao e’ ruim, sejamos justos,  os medicos cubanos, semiescravos de quem os ditadores Irmaos Castro sao proprietarios, ganham menos ainda….menos de 20% do que e’ pago a “cooperativa” castrista..

  3. Isso é querer atacar o

    Isso é querer atacar o +Médico e os futuros +Professor, + Jornalista, +Segurança, que tem sido um ideia genial petista. Por que nos tempos de FHC, que foi quem imnplantou tal lei, ninguém disse nada? E vindo logo da onde? UPS do PSDB?

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