A macarronada tributária, por José Paulo Kupfer

Sugerido por Pedro Penido dos Anjos

Do Estadão

Macarronada tributária
 
José Paulo Kupfer
 
É mais do que sabido que o sistema tributário brasileiro é tão ruim que nem um colégio dos maiores tributaristas, se provocado, conseguiria produzir algo pior. Além do caráter regressivo e da indução distorcida ao desenvolvimento econômico, nos aspectos formais, nosso sistema é detalhista ao extremo, acumula camadas de leis e normas sobrepostas e reúne uma quantidade anormal de textos imprecisos.
 
Trata-se de uma indigesta macarronada tributária, que leva a um número absurdo de litígios entre contribuintes e fisco, nas esferas administrativa e judicial. Prova da anomalia do sistema, o estoque de disputas passa fácil do milhão e os valores envolvidos equivalem, por baixo, a um quarto do PIB.
 
Uma interessante aproximação desse gravíssimo problema, que afeta, de forma direta e indireta, a competitividade e o potencial de crescimento da economia, foi oferecida em artigo publicado ontem no Estado pelo ex-secretário executivo do Ministério da Fazenda Bernard Appy, hoje diretor da LCA Consultores, e pela economista da LCA Lorreine Messias. O texto ajuda a dimensionar a energia produtiva e os recursos financeiros que descem pelo ralo do ambiente tributário conturbado. Sem falar nas óbvias dificuldades, sobretudo para os investimentos, que a insegurança jurídica, bem nutrida pela malha infernal de regras e procedimentos incertos, acaba acarretando.

 
Dados da OCDE, mencionados no artigo, colocam o Brasil na terceira posição, numa comparação entre 18 países, com maior volume de recursos envolvidos em contenciosos tributários. Mas, com base em estudo de Lorreine Messias, apresentado em setembro do ano passado à Escola de Direito de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas, o País deve ocupar, com grande folga, o posto de campeão da indesejável modalidade.
 
Só em disputas administrativas, nas esfera federal, o volume de recursos envolvidos alcança 11% do PIB. Se fossem incluídas as disputas tributárias na Justiça e no âmbito administrativo regional, abarcando estados e municípios, o porcentual sem dúvida ficaria anos-luz acima do captado no levantamento da OCDE. Quando se sabe que, nos demais países analisados, a mediana do valor total dos contenciosos não passa de 0,2% do PIB, tem-se uma ideia do tamanho das distorções brasileiras.
 
Difícil escolher qual o maior problema entre tantos que povoam o mundo tributário nacional. Mas a sobreposição de normas e procedimentos é certamente um dos mais danosos. Leis, normas e regras vão sendo produzidas e empilhadas uma sobre as outras, sem que haja preocupação em adequar novos e antigos procedimentos.
 
Um bom exemplo dessa barafunda é a apuração do ganho capital em transações imobiliárias, para efeitos de Imposto de Renda. A regra manda apurar o chamado lucro imobiliário e pagá-lo até o último dia útil do mês seguinte ao da venda do imóvel. Mas a “MP do Bem”, de 2005, permite abater, no cálculo do lucro, obedecidas algumas limitações, a parcela utilizada na compra de um outro imóvel, adquirido em até 180 dias da operação que gerou o tributo.
 
OK, é um estímulo justo para quem não está mais do que trocando de residência. Se, contudo, o novo imóvel for adquirido depois dos 30 dias da regra “normal”, ainda que dentro dos 180 dias previsto na MP,  o infeliz contribuinte terá, sim, direito ao abatimento, mas terá de pagar multa, juros e correção monetária pelo prazo que ultrapassar os 30 dias da venda de sua casa. Na prática, a teoria tributária brasileira é outra.
 
Tudo isso só torna mais nítida a prioridade das prioridades, caso se queira começar, de fato, um ataque às nossas inúmeras e danosas distorções tributárias. Antes de grandes reformas, politicamente complexas porque afetam, necessariamente, o status quo fiscal, uma faxina em regra na legislação, eliminando sobreposições e simplificando procedimentos, traria uma grande e positiva contribuição ao ambiente de negócios no País.
Redação

8 Comentários

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  1. O nome disso eh favelizacao

    O nome disso eh favelizacao informacional.  Ja abordei antes nos computadores mas nao em imoveis.  Eh a mesma coisa,os mesmos principios.  (alguem vai fazer o favor de escrever a teoria da favelizacao de uma vez?)

    O Brasil tem uma cultura tributaria favelizada.  Antes fosse so a cultura tributaria!

    De tributos a policia a educacao a media a televisao, eh tudo vastamente favelizado culturalmente.  Olhem pros “pronunciamentos” de elite brasileira, por exemplo.  Dao a impressao que sao tudo nuveau lixe.  O “humor” brasileiro eh uma favela so.  Nao poderia falar da musica porque nao conheco, mas pelo que lemos de comentarios aqui no blog, ja ta la tambem.

    Tou esperando a falha de Sao Paulo publicar chamada de capa amanha, assim:  “Lula diz que Dilma eh feia e boba, de acordo com acessores”.

  2. Creio que existe um consenso

    Creio que existe um consenso sobre a complexidade do sistema tributário brasileiro. Esta questão nem deveria ser objeto de artigo. Penso que devemos ir direto ao ponto: um dos articulistas foi secretário executivo do Ministério da Fazenda (o segundo na hierarquia), e o que foi proposto na época para melhorar a barafunda? Sabemos da dificuldade em se fazer uma reforma tributária no país, pois a resistência de quem vai perder uma fatia do bolo é muito grande. Mas há outros aspectos que poderiam ser melhorados, e que não dependem do legislativo, mas que ninguém toma a iniciativa. Então continuaremos no 8 ou 80: discutindo a injusta distribuição da carga tributária brasileira (pobres pagam proporcionalmente mais que os ricos), as dificuldades políticas de se fazer uma reforma tributária profunda e eficaz, e totalmente inerte nas ações de simplificação do sistema.

  3. Silvio Meira, autor de Novos

    Silvio Meira, autor de Novos Negócios Inovadores de Crescimento Empreendedor no Brasil fiado na Casa da Palavra Dada em Garantia no Fio do Bigode foi taxativo, conclusivo, reflexivo em recente entrevista numa revista do Sistema S:

    “E as dificuldades de empreender (e competir) no Brasil são conhecidas: somos um dos países mais confusos, complicados e arriscados do planeta, para qualquer tipo de negócio, novo ou velho. O Brasil está em 116º lugar no índice global (do Banco Mundial) de facilidade de fazer negócios, 40 posições atrás da Mongólia, e atrás do Paquistão e da Guiana.

    […]

    O que atrapalha, mesmo, no Brasil, é o que se poderia chamar da “grande complicação brasileira”. Não só nossos impostos estão entre os mais altos do mundo, mas a burocracia para estar em dia com eles é a mais complicada do planeta. É quase impossível andar na linha com a carga tributária brasileira, tamanha a dificuldade de fazê-lo. Quer ver? Na África Subsaariana, uma empresa gasta 314 horas/ano para pagar impostos; na América Latina, são 369 horas/ano (incluindo o Brasil na média). No Brasil? Pasme: nada menos que 2600 horas/ano! (Os dados são do Banco Mundial). Se a gente simplificasse os processos, mantendo a mesma – e quase impossível – carga tributária, já seria uma grande mudança para melhor.

    […]

    Empreendedorismo como escola, ao invés de escola de empreendedorismo, pode ser o meio pelo qual um país, região ou empresa capacitará, de maneira bem mais eficaz, seus futuros empreendedores.”

    http://www.sescsp.org.br/online/artigo/7337_SILVIO+MEIRA#/tagcloud=lista

  4. Caro Nassif e demais
    O

    Caro Nassif e demais

    O sistema tirbutário foi sendo montado, sempre para agradar e desonerar a casa grande: “É mais do que sabido que o sistema tributário brasileiro é tão ruim”

    Bulir no sistema tributário, é bulir nos quinhentistas.

    E ele tem que ser reformulado.

    Saudações

  5. Por que não mudar?

    Por que não mudar? Há muito o Ciro Gomes formulou uma hipótese para diminuir as resistências as mudanças propostas ao congresso. Dizia ele que as leis mais polêmicas, dentre elas a reforma tributária e reforma eleitoral, deveriam vingar duas legislatiras após aprovadas. Desta forma não atrapalharia o político que iria aconcorrer as próximas eleições e cotava nos seus planos com o status vigentem, que se modificado atrapalharia todo o planejamento e logística de sua candidatura – parece sensata e justa essa proposta.

    O Brasil português, de privilégios mil, ainda não acabou. Está incutida na cabeça de muitos ter vassalos a trabalhar por eles, que se consideram senhores melhores por julgar, através da burocrácia e dinheiro, quem tem direito de ser empreendedor ou não.

    Faça um organograma  de um dos poderes, por exemplo, da Justiça – deve dar umas dez páginas de papel A0 ( uns 10 metros de comprimento), Como pagar e arrumar trabalho “não produtivo ” para todos- só chamando o “Burócrata” ( personagem do Jô Soares que pesava os documentos e dizia sempre que estava faltando mais alguns). Para se financiar um carro tem que pagar um valor alto para registrar o financiamento ( para quê? já não existe Serasa e órgãos diversos?); qualquer documento tem que ter registro cartorial (só carimbo – para quê? Hoje se decide grandes eventos da vida no PC on line. instantaneamente). É tanta preguiça mental e funcional que contaminou o serviço público e outras instituições.

    Existem muitos que se dizem amigos de políticos e que vão arrumar uma “boquinha”. Parece verdade por conta da imprensa: Motorista de política ganhando como executivo de empresas; serviçais de gabinete em número excessivo que só trabalham uma ou duas vezes por semana,……..tá no sangue e na ética da boquinha- recentemente noticiou-se que a filha do FHC recebia do Congresso sem trabalhar e morando em Sampa, reclamar da Alstom, do mensalão do PSDB e do PT….e só punir o mais pobre que roubou um pão, lava a nossa alma !

    Esta doença está no sangue. Vá ao Detran renovar uma carteira de motorista- ligue para lá e pague a taxa, não acreditam em você e só depois de entrat na conta do órgão podem marcar um agendamento num posto para lá de uma semana depois. Aí escolhem um profissional para exame de vista daqui a 4 ou 5 dias, depois mais uma semana para apanhar a carteira nova.  Com o computador e uma WEB-câmera tudo isto poderia demorar 15 a 30 minutos. No processo atual tem trocentas pessoas, custa caro, tem cheiro de muita burocracia….tá no sangue e na ética da boquinha e do poder.

     

    Está mudando, muito lentamente que nem se percebe. Tomara que a Dilma vença e chame o Ciro Gomes e dê a ele poder de superministro para desburocratizar este país imperial.

     

  6. Zonas especiais de crescimento

    O Brasil precisa de zonas especiais de crescimento dentro do seu território e não do outro lado da fronteira, como Puerto Strossner no Paraguay.

    Cem zonas especiais de produção espalhadas por este brasilzão afora, com no mínimo 100 hectares cada, se criadas hoje fariam o Brasil ser um pais diferente nesta segunda-feira próxima.

    Vontade política, é só querer fazer.

    Esperar por reformas que tirem privilégios é extremamente ingênuo e fortemente danoso para o povo e para a nação.

    O espírito empreendedor e ganhador de dinheiro existe em nossa população e com grana na mão, todos os problemas parecem mais fáceis de serem resolvidos. Manter a população pobre e o Estado endividado é sadomasoquismo na veia.

     

  7. E a Russia que sofreu um ataque das Operadoras de Cartões
    Não bastassem recolher um imposto não votado e sem contrapartida, as operadoras de dinheiro eletrônico ainda se prestam a retaliar os países que não garantem seus privilégios.

  8. Claro!!!

    O Sistema tributário é feito para favorecer os ricos do país. E também favorecer os ladrões do país.

    A CPMF de 2% não quiseram aprovar, bateu na trave.

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