Historiador afirma que Frevo veio da África

O Frevo teria vindo da África? Sim, ao menos para o diplomata e historiador Alberto da Costa e Silva!

Da Revista de História

Frevo africano?

Para Alberto da Costa e Silva, a origem do frevo está na África. Pernambucanos, entretanto, garantem que o DNA é seu. No centenário do frevo, a polêmica volta à tona.

Ainda não se sabe ao certo o ano em que o maxixe, o dobrado e a polca amalgamaram-se para se tornar um novo estilo musical, o frevo. A data de criação da dança também não se tem com exatidão, e há controvérsias quanto ao que veio primeiro: o ritmo ou os passos. E é embarcando nessas intermináveis dúvidas que um grande mistério vem à tona: teria o frevo vindo da África?

A suposição é sustentada pelo embaixador e membro da Academia Brasileira de Letras (ABL) Alberto da Costa e Silva. Em um dos textos do seu livro Um rio chamado Atlântico, descreve uma viagem à Costa do Marfim, em 1972, em que presenciou um pequeno grupo de músicos com sansas, tambores e pífaros e rapazes vestidos de leopardos. A festa era uma homenagem ao presidente Houphouët-Boigny e o ritmo, segundo ele, indiscutivelmente um frevo. Quando perguntou o que se tratava, disseram-lhe ser uma dança de máscaras senufo. Foram acrescidos aos instrumentos taróis, metais e madeiras. O entusiasmo de Alberto e dos demais brasileiros presentes foi tanto que começaram a dançar.

Contudo, a tese do embaixador não fora bem recebida por brasileiros, especialmente pernambucanos. “Não foram poucos os meus amigos pernambucanos, a começar por João Cabral de Melo Neto, que me manifestaram o seu desacordo”, conta em trecho do livro.

A origem do frevo já tinha a sua história muito bem contada e estabelecida. Para o historiador Valdemar de Oliveira, em seuFrevo, capoeira e passo, o ritmo “foi invenção dos compositores de música ligeira, feita para o Carnaval, enquanto que o passo brotou mesmo do povo, sem regra nem mestre, como por geração espontânea.” Pernambuco tem orgulho de possuir uma dança e uma música características, e a hipótese do frevo não ter sido criado lá é, para alguns, um acinte ao povo recifense.

Apesar da polêmica , não existem dúvidas de que a palavra “frevo” foi publicada pela primeira vez, segundo o pesquisadorEvandro Rabello, no extinto Jornal Pequeno, no dia 9 de fevereiro de 1907. Em uma das notas do vespertino, eram citadas as músicas que iriam ser tocadas no ensaio do Clube Empalhadores da Feitosa, do bairro do Hipódromo, no Recife. Entre elas, “Priminha”, “Delícia”, “Amorosa” e “O Frevo”.

Nesta época, a palavra “frevo” não designava, ainda, um ritmo musical, mas a festa, a folia, um forrobodó. “Frevo” vem de “frever”, corruptela de “ferver”. No Jornal do Commercio de 1935, uma matéria dizia “realizou-se ontem, em Campo Grande, mais um ensaio do Maracatu Estrela Brilhante. O frevo foi bem concorrido.” Utilizava- se o termo para se referir, inclusive, a outros gêneros musicais, como o maracatu.

Para a folclorista da Fundação Joaquim Nabuco, Rubia Lossia, a invenção do frevo se deu em Recife e faz parte de uma tendência natural das manifestações de cada cultura. Em artigo realizado para o Seminário intitulado Frevo: Uma dança Pernambucana que ocorreu no dia 1/03/2007 na Fundação Joaquim Nabuco realizado pelo Núcleo de Estudos Folclóricos Mário Souto Maior, Rubia fala do frevo como parte do folclore pernambucano e cita um trecho da carta do Folclore, de 1951:
 
“Capítulo I – CONCEITO
1. Folclore é o conjunto das criações culturais de uma comunidade, baseado nas suas tradições expressas individual ou coletivamente, representativo de sua identidade social. Constituem-se fatores de identificação da manifestação folclórica: aceitação coletiva, tradicionalidade, dinamicidade, funcionalidade. Ressaltamos que entendemos folclore e cultura popular como equivalentes, em sintonia com o que preconiza a UNESCO. A expressão cultura popular manter-se-á no singular, embora entendendo-se que existem tantas culturas quantos sejam os grupos que as produzem em contextos naturais e econômicos específicos.”

Alberto não ignora o a hipótese de aquilo que viu na Costa do Marfim, o frevo, tenha ido do Brasil para a África com os ex-escravos retornados, assim como a burrinha ou o bumba-meu-boi, o samba, o violão, e o pandeiro. Entretanto, expõe sua desconfiança. “Não conheço, porém, exemplo de novidade brasileira que se tenha incorporado ao universo das máscaras africanas. Ninguém confunde o “boi” dançado em Lagos, na Nigéria, com uma tradição iorubana; todos sabem que é uma festa dos agudás, amarôs ou descendentes de brasileiros.”

O embaixador não está sozinho em sua teoria. Segundo o próprio, o grande africanólogo brasileiro, Paulo Fernando de Moraes Farias, examinador da University of London, ligou para ele dizendo que também presenciou o frevo na África. Por volta de 1966, em Abidjã, na Costa do Marfim, durante uma festa de casamento em Mali, uma dança o deixou “convencido de que o frevo veio da África Ocidental”.
 
Toda e qualquer manifestação cultural no início do século XX, vinda dos escravos, sofria muitos preconceitos, e, de acordo com Rubia, a dança do frevo deriva-se de muitos estilos, como a capoeira, e os passos africanos têm muita influência na coreografia. De acordo com ela, a sombrinha utilizada como acessório no figurino dos dançarinos seria para se esconderem da polícia.

Hoje, a festa do frevo atrai milhares de turistas do mundo inteiro que buscam um carnaval agitado e com muita dança. Mas o mistério que gira em torno de sua origem permanece, até que algum musicólogo brasileiro, como sugere Alberto, destine-se à Costa do Marfim e ao Mali para observar o frevo. E arriscar alguns passos, por que não?

Luis Nassif

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