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O lugar do jornalismo na crise brasileira: Eleonora de Lucena no Cai na Roda deste sábado

Jornal GGN – A jornalista Eleonora de Lucena fala sobre o papel da grande imprensa no cenário social atual na edição deste sábado, 17 de abril, do Cai na Roda, programa da redação de mulheres do GGN. Ex-diretora-executiva da Folha de S. Paulo e criadora do Tutaméia, ela também comenta a importância do debate promovido por veículos alternativos, principalmente, em momentos de crise como estamos vivendo, com um governo negacionista e uma pandemia que tem assolado a população brasileira. A entrevista vai ao ar às 20h, na TV GGN

A batalha editorial pelo pluralismo

Eleonora abre a entrevista explicando a necessidade da pluralidade no jornalismo, que se perdeu nos últimos tempos nos veículos brasileiros de grande circulação. Segundo ela, esse sempre foi um tema de disputa e de debate importante dentro dos jornais. 

Durante sua experiência na Folha de S. Paulo a batalha foi para levar a sério a questão do pluralismo, para que o jornal fosse uma plataforma “que desse oportunidade para várias visões se expressarem”, explicou. 

“Mas as coisas mudaram muito de lá pra cá. Eu sai do jornal já faz alguns anos e hoje nós estamos atravessando uma crise sem precedentes no país, com essa mortandade absurda que estamos vendo e vivendo. [Por isso], nós sempre esperamos mais dos jornais, de todos os meios de comunicação, porque estamos sob um governo que é mais do que negacionista, tem práticas que muitos apontam como genocida, e à imprensa cabe sim o papel de ser mais assertiva e incisiva em apontar todos os descalabros que estão acontecendo”, disparou. 

“Desde o golpe de 2016, nós vemos que muito da grande imprensa acabou tomando um lado, deixando de fora a questão plural e esse lado acabou levando a eleição de um neofascista, ajudou na criação do clima que levou essa pessoa ser eleita. E hoje nós temos um quadro dramático, no qual a imprensa também tem um papel, tanto na criação desse contexto, quanto, agora, na necessidade de ser muito mais forte no enfrentamento desse governo, um governo que diuturnamente ataca a imprensa”, disse.  

“É muito chocante ver que, muitas vezes, esses ataques são considerados rotina e a vida segue, mas não é rotina. Quer dizer, nós temos um governo que tem tendências autoritárias claríssimas, desde antes da eleição [de 2018], porque Bolsonaro nunca escondeu o seu gosto pela ditadura, a defesa da tortura, a defesa da morte, e o hoje o resultado é esse absurdo (…) Mas sempre é tempo da mídia acordar para poder defender a população brasileira desse descalabro”, completou a jornalista sobre a questão. 

A mídia alternativa na sustentação social

De acordo com Eleonora, a postura dos meios de comunicação na eleição de 2018, que reflete na crise atual, foi de condescendência. “Houve uma apresentação de uma falsa [polaridade], como se tivesse dois polos opostos, naquele momento, e que nenhum desses polos deveriam ser apoiados e isso acabou resultando em um apoio, ainda que envergonhado, à Bolsonaro”, apontou. 

“Um papel muito ruim, porque foi uma tomada de lado que acabou sendo muito prejudicial ao Brasil e não levou em conta a diversidade de pensamentos e, principalmente, a característica neofascista do Bolsonaro. Foi um erro ter havido esse apoio, ou essa posição, dita como distante. E, infelizmente, até agora nós estamos vivendo essa situação, nesse período de pandemia, de uma forma muito ruim”, explicou. 

Neste limbo, no entanto, a mídia alternativa tem um papel essencial, analisou a jornalista. “Nós já vimos isso na história, quando temos períodos de maior fechamento, de crise, a sociedade acaba criando esses canais de defesa da democracia, de experiências inovadoras (…) Mesmo no período da ditadura, eu trabalhei em alguns veículos alternativos e nós tínhamos, apesar da censura e do estrangulamento econômico que havia, alguma brecha para expor as ideias, ainda que de maneira precária e com alcance menor. Então, [a mídia alternativa exerce] um papel essencial para a democracia”, ponderou. 

O tratamento pandemia pela imprensa

A comunicadora também destacou o trabalho dos jornais na cobertura da crise sanitária, principalmente, no que diz respeito às declarações do presidente da República sobre o caso. Para ela, a imprensa falhou e ainda falha nesse quesito. 

“É muito claro que a grande mídia acabou ecoando mentiras, que têm consequências de crimes (…) Por enxergar o Bolsonaro como mais um presidente, [a mídia] acabou entrando em uma rotina de reproduzir as falsidades, as mentiras que acontecem todos os dias e a todo momento. Só mais recentemente essas mentiras têm sido divulgadas com ressalvas e isso deveria ter sido a rotina desde o início, de não compactuar com as ofensas, com o charlatanismo, com a mentira, porque isso alimenta na sociedade a desinformação. Estamos vendo que no limite essas informações levam à morte, alimentam o discurso de ódio, de desagregação”, explicou

“A mídia tem que ter um papel de responsabilidade social, para não ser uma disseminadora de mentiras. É importante que, agora, muitos veículos estejam colocando que o que o Bolsonaro diz é mentira, ou sem evidências e isso tem que ser ressaltado, porque o que nós vemos é uma população que em boa medida sofre uma ‘chuvarada’ de mentiras todos os dias, então a mídia tem que ter uma responsabilidade em contextualizar, em contestar e dar o nome aquilo que realmente é mentira”, disse. 

O Tutaméia

Eleonora também falou sobre o projeto, que toca ao lado de seu companheiro Rodolfo Lucena, o Tutaméia. 

“Eu trabalho com o Rodolfo, meu marido, há muitas décadas. Nós começamos no jornalismo trabalhando juntos, lá em 1970, e quando nós dois saímos da Folha, começamos a pensar no que poderíamos fazer, qual papel poderíamos desempenhar, que tipo de contribuição poderíamos dar no debate público e aí surgiu a ideia do Tutaméia”, contou. 

“Até pela trajetória de vida que nós temos, de ter muitos interesses em muitas áreas, a ideia foi chamar as pessoas aqui em casa, que nós consideramos interessantes, para falar sobre as suas vidas, sobre o Brasil, para tentar entender o país (…) Nós optamos por construir um programa basicamente em cima de entrevistas, mas não às vezes também fazemos análises ou debates, no entanto, a nossa âncora é chamar as pessoas que pensam o Brasil em várias áreas. Nós tentamos dar voz, algum espaço, para as pessoas que achamos bacanas de serem ouvidas”,  comentou.

Um cenário para 2022

Questionada sobre um possível futuro para a crise que estamos vivendo, Eleonora afirmou que “espera que Bolsonaro seja removido”. 

“O Brasil tem que atravessar um período muito dramático de tentar derrubar essa política que não existe para conseguir começar a ser reconstruir. 2022 está muito longe, teremos um ano terrível, de muitas mortes se continuarmos com esse governo, então é muito afetivo, porque já vimos várias crises, o período da ditadura, o período da redemocratização, mas nunca vimos um desastre desse tamanho”, completou.

Participaram deste episódio as jornalistas Lourdes Nassif, Cintia Alves, Patricia Faermann, Tatiane Correia e Maria Eduarda Cambraia (estagiária). Assista:

Sobre o Cai na Roda

Todos os sábados, às 20h, o canal divulga um novo episódio do Cai Na Roda, programa realizado exclusivamente pelas jornalistas mulheres da redação, que priorizam entrevistas com outras mulheres especialistas em diversas áreas. Deixe nos comentários sugestão de novas convidadas. Confira outros episódios aqui:

Ana Gabriela Sales

Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.

Ana Gabriela Sales

Repórter do GGN há 8 anos. Graduada em Jornalismo pela Universidade de Santo Amaro. Especializada em produção de conteúdo para as redes sociais.

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