O CASO  ESCOLA BASE

O CASO  ESCOLA BASE

Quando a imprensa se comporta como um tribunal do júri e contamina a opinião pública, vidas são devassadas e o jornalismo ganha uma cicatriz permanente 

Por Johnny Negreiros

Em 1994, a imprensa brasileira "condenou" injustamente seis pessoas investigadas por suposto abuso sexual de crianças matriculadas em uma escola infantil, a Escola Base.

Tudo começou quando duas mães estranharam o comportamento de seus filhos, estudantes da Escola Base, no bairro da Aclimação, em SP. Elas prestaram queixas à 6ª Delegacia de Polícia Civil.

A Polícia Civil passou a investigar e a abastecer a imprensa com informações do inquérito contra as pessoas suspeitas de abusar das crianças.

Spoiler:  não era nada disso

Além de Icushiro e Maria Shimada (donos da Escola Base), e Paula e Maurício Alvarenga (professora e motorista de transporte escolar), o casal Saulo e Mara Nunes eram donos do apartamento suspeito de receber as "orgias".

O delegado Edélcio Lemos obteve mandado de busca e apreensão à residência do casal Nunes. Mas nada foi encontrado no local.

Revoltadas, as duas mães reportaram o caso à TV Globo. A partir daí, o Brasil passou a dar atenção à Escola Base. O escândalo cresceu quando o laudo do IML, que era inconclusivo sobre lesões anais nas crianças, foi divulgado.

Atiçando a cobertura enviesada da imprensa, uma funcionária do IML emitiu o seguinte parecer: “Informamos que o resultado do exame é compatível para a prática de atos libidinosos.”.

Foi o suficiente para destruir a reputação dos investigados. Com a antecipação de juízo de culpa pela imprensa, a população perseguiu e hostilizou os suspeitos.

Privilegiando a versão da polícia, a imprensa produziu manchetes sensacionalistas sobre a Escola Base.  Mas logo o caso sofreu reviravolta. 

As lesões anais identificadas nas crianças pelo IML eram, na verdade, fruto de diarreia forte. Uma das mães confessou que seu filho sofria de constipação intestinal. 

O inquérito foi arquivado ainda em 1994. Em 2003, os donos da Escola Base ajuizaram ações contra o governo de São Paulo e as empresas de comunicação, em busca de indenização pelo "linchamento moral" que sofreram. 

A indenização entrou na fila de precatórios do Estado. Já a maior parte dos jornais e emissoras de TV recorreu à Justiça para reduzir os valores da indenização. 

Vítimas de erros grosseiros da imprensa, que trabalhou em conluio com a polícia, os donos da Escola Base faleceram em 2007 e 2014, de infarto e câncer, sem reparação à altura dos danos sofridos. 

Texto e criação:  Johnny Negreiros Revisão: Cintia Alves Imagens: Jusbrasil, Documentário Escola Base 20 anos depois, Unsplash, Documentário oário Trial by Media e Tenor