África

O inimigo agora é o Niger, por Ricardo Mezavila

O inimigo agora é o Niger

por Ricardo Mezavila

Geograficamente, o Niger é uma nação do interior da África Ocidental. Historicamente, faz parte do antigo império Songai. O Niger foi incorporado à África Ocidental Francesa em 1896. Em 1922 foi transformado em colônia. Em 1958, passa a ser uma república autônoma da comunidade francesa e, em 1960, abandona a comunidade proclamando sua independência. 

O Niger tem uma democracia frágil que sempre foi pressionada por militares descontentes, passa por graves conflitos étnicos, teve várias tentativas de golpe e derrubadas de governos por militares. 

A descoberta de urânio na década de 1970 provocou um salto no desenvolvimento, mas que declinou com a queda do preço dos produtos nas décadas seguintes. 

No dia vinte e seis de julho passado, sob a justificativa de “contínua deterioração da situação de segurança e má gestão econômica e social“, os militares derrubaram o presidente Mohamed Bazoum. 

Organizados em uma plataforma chamada Conselho Nacional para a Salvaguarda da Pátria (CLSP), os golpistas leram comunicados em rede nacional de televisão, reafirmando seu “respeito por todos os compromissos assinados pelo Níger”

“Pedimos a todos os parceiros externos que não interfiram“, acrescentaram, antes de decretarem o fechamento das fronteiras terrestres e aéreas “até que a situação se estabilize”. 

A França possuía militares no norte do Niger com objetivo de assegurar o fornecimento de urânio às centrais nucleares francesas. O presidente francês, Emmanuel Macron, disse que está pronto para “defender os interesses de Paris na África”. 

Talvez, quem sabe, a Rússia apoie a junta militar do Niger contra os antigos colonizadores franceses, em retaliação ao apoio da União Europeia à Ucrânia. Vladimir Putin pode dizer que, assim como a França, a Rússia também foi defender seus interesses quando decidiu invadir a Ucrânia. 

A França controla a soberania monetária em diversos países africanos que, embora tenham assento na ONU e acenem suas bandeiras com independência, ainda estão sob o controle disfarçado do imperialismo. 

Dificilmente a França se lançará em mais uma guerra, porque atravessa grave crise econômica e os franceses não estariam dispostos a bancar uma recessão.  

Diplomaticamente, Emmanuel Macron usa o Presidente Lula como seu ‘biscoito da sorte’ diante da opinião pública mundial. Lula tem compromissos com os países africanos e refutará qualquer pedido de apoio vindo de Paris. 

Caso a França reaja, terá como cortina, a máxima de ‘devolver a democracia’ ao povo do Niger. Então, mais um campo de guerra estará pronto para servir de palco para historiadores e afins. Séculos de colonização, expropriações, escravidão, assaltos e assassinatos estarão expostos.  

Um professor terá a chance de explicar ao seu aluno o que foi e continua sendo a colonização, usando  o exemplo da França possuir uma das maiores reservas de ouro do planeta, sem que tenha uma única mina em seu território. 

Ricardo Mezavila, cientista politico

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Redação

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  • Não creio que a França esteja realmente em condições de realizar operações militares em larga escala no Niger. Quando atacaram a Líbia, os franceses rapidamente tiveram que pedir munição e combustível de aviação para os norte-americanos. A logística de operações militares região litorânea da África é muito mais simples do que as que teriam que ser realizadas na região central do continente. O mais provável é que França e Rússia cheguem a um acordo para resolver tanto a questão do Niger quanto a da Ucrânia, porque a posição francesa em relação à questão ucraniana tem sido bastante desfavorável às ambições da Casa Branca de expandir o conflito. Isso para não mencionar algo ainda mais importante: as usinas nucleares não são francesas; elas são da General Electric, uma empresa norte-americana. O Brasil tem que ficar fora de todas essas disputas. Elas não afetam interesses brasileiros.

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