Cidadania

O fardo do homem pardo, por Fábio de Oliveira Ribeiro

O fardo do homem pardo

por Fábio de Oliveira Ribeiro

No século XIX, o fardo do homem branco era civilizar os povos bárbaros inferiores africanos… ou pelo menos foi isso que os imperialistas racistas europeus disseram para pilhar a África utilizando armamentos sofisticados em guerras assimétricas contra povos desarmados. Na primeira metade do século seguinte, o fardo do homem branco foi sobreviver às guerras mundiais simétricas entre Estados europeus armados até os dentes com armamentos equivalentes.

Pouco depois da II Guerra Mundial, o fardo do homem brando passou a ser outro. Ele tinha que evitar uma guerra nuclear catastrófica que destruiria todos os Estados desenvolvidos. Isso perdurou até a hegemonia das Big Techs flexibilizarem tanto a verdade factual quanto a racionalidade militar.

Na fase atual, o fardo do homem branco é ambivalente. Ele é tanto querer uma guerra nuclear contra a Rússia e a China que não pode ser vencida sem uma derrota catastrófica dos EUA e de seus aliados europeus, quanto querer evitar uma guerra nuclear num contexto em que a convivência com países que não aceitam e não tem razões para aceitar uma suposta hegemonia anglo-europeia-americana está se tornando economicamente dolorosa.

No século XIX o poder das potenciais coloniais nascia na boca do canhão. No início do século XX o poder dos impérios europeus foi triturado nas bocas das metralhadoras de grosso calibre. O poder soviético apodreceu sozinho. O poder chinês foi construído com ajuda ocidental. E o poder das Big Techs está destruído o poder político em todos os países em que o Estado se recusa a regular os negócios obscuros dos barões dos dados.

A Rússia não foi destruída por represálias econômicas e está derrotando a Ucrânia. A independência de Taiwan fomentada pelos EUA apressará a invasão da ilha rebelde pela China. Fragilizado pela guerra na Europa, o comércio mundial será destruído por uma guerra na Ásia mesmo que ela não evolua para um conflito nuclear.

O Brasil se salvou do neoliberalismo autoritário bolsonarista. Todavia, se depender exclusivamente da exportação de grãos para a China nosso país afundará numa crise econômica e política monstruosa assim que a guerra sino-americana começar. O fardo do homem pardo é não conseguir se livrar de algum tipo de dependência internacional, quer o grande patrão seja o homem branco de olhos azuis quer ele seja o homem amarelo de olhos puxados.

A estratégia de reindustrializar o Brasil desempenharia um papel importante nesse contexto internacional. Todavia, ela está sendo bloqueada pelos defensores do neoliberalismo, cujos lucros de curto prazo dependem da submissão do Estado aos ataques predatórios dos especuladores. O fardo do homem pardo é a submissão política forçada pela imprensa controlada por uma sub-elite subdesenvolvida de homens brancos (ou quase brancos).

Lula não se movimenta contra a imprensa. Ele tem medo, pois sabe do que os barões da mídia são capazes. A paralisia dele, entretanto, coloca em risco tanto o futuro do país quanto um sistema democrático que não resistirá à pressão econômica da guerra na ásia que inevitavelmente interromperá as exportações de grãos brasileiros para a China.

O fardo do homem branco sempre foi uma desculpa esfarrapada para justificar sua capacidade econômica de agir e seu poder militar de se impor diante de povos mal armados. O fardo do homem pardo brasileiro é a sua inação, sua indecisão e seu desejo de conciliar interesses antagônicos que não podem mais coexistir. Ou o Brasil garroteia as Big Techs e se livra dessa imprensa neoliberal golpista ou ele deixará de existir em algumas décadas.

Fábio de Oliveira Ribeiro, 22/11/1964, advogado desde 1990. Inimigo do fascismo e do fundamentalismo religioso. Defensor das causas perdidas. Estudioso incansável de tudo aquilo que nos transforma em seres realmente humanos.

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para dicasdepautaggn@gmail.com. O artigo será publicado se atender aos critérios do Jornal GGN.

Fábio de Oliveira Ribeiro

Fábio de Oliveira Ribeiro

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