Atualizado às 18:29
Oi pessoal,
Fiz uma tradução livre de um post do Paul Krugman que achei bem interessante, pois trata da relação entre modelos teóricos e o senso comum. Ele mostra de modo bastante claro o sucesso preditivo da Teoria da Armadilha da Liquidez.
P.S.: Espero que as figuras abaixo apareçam no post.
Teóricos extravagantes do mundo uni-vos
Paul Krugman
http://krugman.blogs.nytimes.com/2011/08/20/fancy-theorists-of-the-world-unite/
Várias pessoas me apontaram para este notável editorial de Stephen Moore no WSJ (Wall Street Journal). O que é notável não são as opiniões específicas, mas sim a irrestrita defesa do anti-intelectualismo. Ele realmente denuncia “teorias extravagantes” e as rejeita porque elas desafiam o “senso comum”.
Puxa, se essa é a trilha por onde a direita está indo, vocês sabem que a próxima coisa que eles vão rejeitar é a teoria da evolução. Mas, espere.
Há muito a se criticar aqui, se vocês tiverem estômago – entre outras coisas estabelecer o que de fato constitui o senso comum. Algumas pessoas acham senso comum que, se o governo colocar as pessoas para trabalhar, isso contribuirá para aumentar o emprego. Então ele utiliza argumentos extravagantes bem ao gosto do WSJ para convencê-las do contrário.
Mas a principal coisa que eu gostaria de ressaltar é que os últimos três anos têm sido uma confirmação impressionante de uma teoria extravagante – a saber, a teoria da armadilha de liquidez, que é parte da construção mais ampla da economia keynesiana.
Ou seja, o senso comum – ou pelo menos o senso comum na linha do WSJ – diria que os maciços empréstimos feitos por parte do governo iriam mandar as taxas de juros para as alturas. E certamente foi isso o que o editorial do WSJ disse aos seus leitores. Somente nós, keynesianos extravagantes, ousamos dizer o contrário. E e aqui está o que realmente aconteceu:
Da mesma forma, o senso comum como ditado pelo WSJ afirmou que a triplicação da base monetária levaria a um enorme aumento nos preços. Claro, deveriam ser desconsiderados esses tipos extravagantes que ousaram afirmar que basicamente o dinheiro ficaria lá. Hmmm:
OK, alguém vai apontar que a inflação aumentou um pouco mais do que eu previ. E sim, aumentou. Mas acho que a figura acima mostra que o que de fato aconteceu foi muito mais próximo do que pessoas como eu disseram do que o que você teria esperado da leitura do WSJ.
Mas o estímulo falhou! Bem, eu lhes disse antes – baseado no mesmo modelo – que ele era de fato muito pequeno. De modo que isso não é uma evidência contra teorias extravagantes.
A verdade é que os recentes acontecimentos foram uma confirmação impressionante da utilidade do pensamento, em geral, e do modelo de Keynes-Hicks, em particular. E o WSJ esteve errado em cada passo desse caminho.
Então agora eles estão se ajustando para o anti-intelectualismo. Bem, é claro que eles estão, pois é tudo que sobrou pra eles.
Por José Lannes
Julião!
A idéia dos cabeças de planilha é simples. Em qualquer mercado, encontram-se dois agentes: um que oferta e outro que demanda, ou seja, um que vende e outro que compra. A que preço eles vão acertar um negócio de compra e venda? Os agentes possuem comportamentos racionais contrários: o ofertante (vendedor) oferta mais se o preço for cada vez maior (sua curva de oferta é positivamente inclinada); o demandante (comprador) demanda mais se o preço for cada vez menor (sua curva de demanda é negativamente inclinada).
Com essa idéia, os cabeças de planilha logo concluem que, quando aumenta a demanda de tomate, o preço do tomate sobe. O mesmo ocorreria no mercado de títulos do governo, pelos quais o governo demanda dinheiro para fechar seu caixa; é como se a gente emitisse uma nota promissória para levantar uma graninha. Quanto mais o governo quiser dinheito, vai ter que pagar mais caro por ele. O preço do dinheiro é a taxa de juros. Portanto, maior demanda de dinheiro pelo governo, maior a taxa de juros. Se o governo arrecadava 200 bilhões a 5,3% ao ano e quisesse arrecadar mais, uns 400 bilhões, então teria que pagar maior taxa de juros.
Krugman mostra que isso não ocorreu. A demanda de dinheiro do governo é Net Federal Government Savings, que é a medida da poupança do governo. Se a poupança dele é positiva, ele está emprestando para o setor privado; se for negativo, ele está tomando dinheiro emprestado do setor privado. A linha azul do primeiro gráfico mostra a queda da poupança pública: em 2001, a poupança pública era positiva, quase 200 bilhões (olhe o eixo vertical esquerdo), mas em queda; o governo estava emprestando esse valor; em 2003, a poupança é negativa, entre 200 e 400 bilhões e o governo estava tomando esse valor emprestado.
Era para a taxa de juros então subir. Porém, ela cai junto (linha vermelha, com percentagens no eixo vertical direito), o que contradiz a teoria enraizada na mente dos cabeças de planilha. Mais ainda, a partir de 2009, a poupança negativa pública estabiliza-se acima de 1,2 trilhão, e a taxa de juros flutua bastante, o que mostra, nesse período, uma desconexão entre empréstimo público e taxa de juros.
O segundo gráfico condena outra idéia dos cabeças de planilha. Existe uma identidade na contabilidade nacional que diz o seguinte: o valor das transações no mercado é igual ao volume de dinheiro em circulação multiplicado pela velocidade de circulação desse montante. Ou seja, se temos 100 bilhões em valores a serem transacionados, eu preciso de 100 bilhões em moeda, se ela passa de uma mão para outra e não mais circula. Se a moeda gira duas vezes, passando de mão em mão, com 50 bilhões em moeda se pode transacionar 100 bilhões em valores. Não há necessidade de emitir mais moeda. O valor das transações é a quantidade de ativos multiplicado pelo seu preço. A transação de 12 reais numa cervejaria é a quantidade de cerveja (4) vezes o preço (3). Assim, valor das transações = volume de moeda (M) x giro da moeda (V). O valor das transações é quantidade (Y) vezes preço (P). Desse modo, YP = MV ou MV = PY ou PY = MV (teoria quantitativa da moeda).
Os cabeças de planilha acreditam que dessa identidade existe uma relação de causa e efeito. Se a quantidade (Y) e a velocidade da moeda (V) forem constantes, um aumento da oferta de moeda (M) aumentaria o preço (P), para equilibrar a equação PY = MV.
O segundo quadro mostra que a oferta de moeda (linha azul) cresceu bastante depois de meados de 2008, período da crise, enquanto os preços (linha vermelha) mantiveram uma tendência levemente crescente, só que não acompanharam a trajetória da oferta de moeda, mais uma vez contradizendo a teoria que envolve o pensamento dos cabeças de planilha.
É isso.
Abraços!
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