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Brasil S/A :: Comércio melado. Protecionismo cresce no mundo, Brasil é citado em ranking do G-20, mas outros jogam mais sujo.

Correio Braziliense – Antonio Machado

Enquanto os jogadores, árbitros e torcidas se distraem com o show da taxa cambial não só no Brasil, os governos botam a mão na massa no que lhes importa: passar a perna nos parceiros, sem sutileza na maioria das vezes, para exportar à custa dos outros.Vai do câmbio manipulado na China ao protecionismo escancarado da Europa e dos EUA.

É como admitiu, com franqueza brutal, o ministro da Agricultura da França, Bruno, em reunião com agricultores franceses: “A Europa não é o lixão de produtos agrícolas da América do Sul”.

O que foi grosseria com governos como o brasileiro, um dos mais aplicados para que saia um acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia, para as economias avançadas é realismo puro. A grande crise global as enfraqueceu mais que aos países emergentes —vistos, agora, como concorrentes a tolher em suas fronteiras e também alvos preferenciais para receber a produção encalhada.

Eles querem exportar para os “novos ricos” do mundo, países como Brasil, China, Índia, África do Sul, México, Colômbia e Indonésia, até ontem considerados emergentes ou até menos, subdesenvolvidos —e, portanto, com direitos de preferência em relação às negociações de acesso aos mercados das economias avançadas.

Isso não existe mais, pelo menos na visão dos governos do mundo rico, abalados pelo desemprego elevado, crise bancária ainda não dissolvida, dívida pública e déficit fiscal em níveis nunca vistos desde a 2ª Guerra, sistema de bem-estar social ameaçado, risco de deflação, eleitores zangados. Eles mudaram.

Até a Argentina, nossa sócia no Mercosul, mudou,com o seu protecionismo anti-Brasil.

O multilateralismo defendido pelo presidente Lula, inspirado no Itamaraty do chanceler Celso Amorim, vive na retórica dos grandes fóruns, como o do G-20 (Grupo dos 20) e o da OMC (Organização Mundial do Comércio).

Amorim ainda acredita no término da Rodada Doha, de maior liberalização do comércio mundial, que se arrasta no âmbito da OMC, e se empenha pelo acordo entre Mercosul e União Europeia.

E o que há de fato? Duas semanas atrás, outro ministro francês, Christian Estrosi, da Indústria, disse que o protecionismo econômico é legítimo, e a Europa não se deveria envergonhar de praticá-lo.Mas não era com o governo de Nicolas Sarkozy que Lula se orgulhava de ter relações preferenciais, o que levaria à escolha da França como fornecedora de 35 caças Rafale para re-equipar a Força Aérea? As falsetas da França Ah, as falsetas da vida! Em sua preleção contra o que julgou ser uma ameaça à agricultura e pecuária francesa, o ministro Le Maire fez pilhéria sobre a tal preferência brasileira.

Num dado momento, disse que “o agricultor não é moeda de troca”.

Noutro, sarcástico, avacalhou: “Não podemos trocar carne bovina por Rafales”.

Vá lá que Sarkozy esteja pressionado pelos sindicatos, irados com o aumento de 60 para 62 anos da idade de aposentadoria, e com a popularidade em queda. Tal cenário é fértil para ações populistas e a criação de inimigos imaginários.

Sarkozy já mandou deportar os ciganos, as vítimas clássicas nas crises europeias. Mas, no que se refere ao protecionismo, ele faz o que todos estão fazendo.

Até tu, Grupo dos 20!

Desde junho, quando os líderes do G-20, que reúne os países ricos e os maiores emergentes, concordaram, em Toronto, em não tomar medidas protecionistas durante três anos, o protecionismo só faz crescer.

E por todos, inclusive o Brasil, segundo o Global Trade Alert, uma pesquisa em tempo real sobre barreiras comerciais do Centre for Economic Policy Research (CEPR), organização independente, baseada em Londres, que vem dando suporte técnico às decisões do G-20.

Quando voltarem a se reunir em novembro, agora em Seul —com Lula presente pela última vez—, os líderes serão confrontados com uma verdade incômoda: o interesse nacional vem à frente dos interesses da ordem global. Desde junho, os países do G-20 impuseram 58 novas ações que prejudicam o comércio com seus parceiros.

Brasil protege menos

De novembro de 2008, primeira cúpula do G-20, até hoje, foram 746 medidas lesivas ao livre comércio no mundo, 395 delas tomadas por países do G-20. “As cúpulas vão e vêm, mas a taxa de protecionismo continua inalterada”, diz Simon Evennet, coordenador da pesquisa.

E o Brasil? No ranking do número de ações protecionistas, estáem6º, com 29 medidas. A União Europeia é a 1ª, com 154, vindo depois a Rússia (75) e a Argentina (49).Nas demais listas —por tarifas, setores afetados e países atingidos —, não está entre os 10 mais.

Incômodo com o BNDES

A pesquisa do CEPR não chega a ser tão pessimista. Ela detectou, pela primeira vem desde 2008, o aumento de ações pró-comercio. De outro lado, constatou o aumento de ações menos tangíveis, como o apoio a setores empresariais. O relatório sugere que a diplomacia envolvida em negociações comerciais reconheça que o comércio pode ser prejudicado não só pelas tarifas para reduzir importações, mas pelos subsídios e resgates seletivos de setores empresariais.

É uma crítica sutil à política industrial empregada pelos países emergentes, como China, Índia e Coreia do Sul, e ainda timidamente pelo Brasil. A ironia é que o mundo rico, sobretudo a Europa, saiu do Pós-Guerra apelando a tais práticas. Se continuar nessa linha, o Brasil vai incomodar. E o BNDES, alvejado por “balas perdida.

http://corecon-rj.blogspot.com/2010/09/correio-braziliense_17.html

Redação

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