O processo de desenvolvimento do Brasil – 2

A intervenção do Estado na atividade econômica é um dos campos que mais influenciam o processo de desenvolvimento de um país. A opção do Estado em atuar diretamente em um mercado pode ser um fator fundamental para que determinados setores da economia se desenvolvam, como, por exemplo, os monopólios naturais. Por sinal, quanto a atuação do Estado sobre os monopólios naturais, concordo inteiramente com o comentário que o Gunter Zibell fez ao meu primeiro post sobre o tema:

“Tem andado em voga o Estado “privatizar”, sob forma de concessões de longo prazo, monopólios naturais. Exemplos são rodovias, minérios estratégicos (o ferro não, pois é abundante demais no mundo), telefonia fixa, eletricidade. Eu acho inadequada a privatização nestes casos porque somente decorrem de inapetência de gestão. Dá-se a desculpa que é para evitar improbidades administrativas, mas criando monopólios privados deixa-se a sociedade muito dependente justamente das improbidades privadas… E atividades com capital privado sempre envolvem o custo de lucro. Mas não há porque haver lucro excedente, bastaria que uma estatal fosse remunerada pelo suficiente para remunerar os juros do capital usado, por sua vez mais baixos pela total ausência de risco em um monopólio natural”. (Gunter Zibell)

Retomando, o Estado brasileiro sob o tucanato e sob o governo Lula teve duas posições absolutamente distintas acerca da intervenção direta e indireta no domínio econômico. O governo tucano, por meio do processo de privatizações, reduziu largamente a intervenção direta na economia baseando-se nos preceitos neoclássicos, em especial, na lógica do Estado mínimo. Para compensar tal conduta, o tucanato se propôs a ampliar o Estado regulador, alegando seguir o modelo regulatório norte-americano (que em nada se aplica ao nosso sistema jurídico e administrativo), o que se comprova com a série de autarquias denominadas agências reguladoras, criadas por FHC. Tais agências foram proclamadas como “independentes”, em que pese sejam autarquias de regime especial tuteladas pelos seus respectivos ministérios. FHC e seus colegas seguidores da Escola de Chicago, ao proclamarem a independência das agências, passaram a aceitar como inevitável o que Richard Posner denomina como “teoria da captura”, ou seja, o mercado acaba cooptando para as suas posições o modus operandi dos dirigentes das agências. A maneira como a diretoria da ANAC, já no governo Lula, atuou na última crise da aviação comercial ilustra tal modelo.

Em suma, sob FHC, o Brasil perdeu as condições de regular a atividade econômica em seu território, o que pode ser ilustrado com o racionamento de energia elétrica no final do período, de nefastas conseqüências para o crescimento da nossa economia.

O governo Lula atuou de maneira efetiva para valorizar o que restou de nosso parque estatal, notadamente no que diz respeito à Petrobras. Além disso, ainda que tenha sido relativamente parcimonioso com a tal independência das agências reguladoras, durante o governo Lula houve uma efetiva política de governo em prol da regulação econômica baseada não mais na “escola neoclássica”, mas sim na “escola do interesse público”. Os marcos normativos do governo Lula que dizem respeito aos ordenamentos setoriais são todos baseados no interesse público, abandonando a quase desregulação irresponsável da gestão tucana. A coroação desta nova linha política que favorece uma estratégia estrutural de desenvolvimento econômico é o modelo de partilha para o pré-sal, muito mais adequado até mesmo para o gerenciamento da exploração.

No terceiro e próximo post, seguindo com o tema do desenvolvimento econômico e social do Brasil, falarei um pouco sobre a educação formal no País, um dos temas que mais travam o avanço do nosso IDH. É notório que a educação é um serviço essencial prestado pelo Estado. Mas deixo aqui uma pergunta: educação, no Brasil, é tratada pela Constituição Federal como serviço público (artigo 175) ou como atividade econômica franqueada ao particular e que o Estado também exerce por relevante interesse coletivo (artigo 173)? Já adianto que essa resposta conduz a importantes conclusões sobre os limites da regulação da atividade no Brasil exercida pelo MEC, com especial importância para a educação superior.

Luis Nassif

Luis Nassif

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