O Movimento pelo Passe Livre tem que receber os parabéns pela sua capacidade de organização, manter foco em uma única reivindicação, distanciar-se das sedutoras amarras partidárias oferecidas, afastar lideranças oportunistas e principalmente por fazer tudo isso com uma bandeira frágil, não tão consistente e socialmente justa como prega. Tanta força e competência deveriam ser empregadas em reforma política ou algo parecido.
Em seus discursos um dos argumentos mais usados é o de que o direito ao transporte é social, prioritariamente do trabalhador. Essa afirmação é quando muito meia verdade, pois os trabalhadores com carteira assinada, 40 milhões, imensa maioria nos dias atuais, tem acesso ao vale-transporte, custeado pelas empresas na proporção de 96%, no mínimo. Portanto, se o transporte for gratuito, quem mais ganha são os demais usuários, estudantes principalmente, além das empresas.
Por outro lado, desde os tempos da caverna o homem já devia ter claro que nada é de graça na vida, exceto algumas benesses da natureza (a vida, água, chuva, imagem do céu) e da cultura (amizade, experiência, aprendizagem). Se o transporte passar a ser de graça alguém terá que pagar, de algum lugar o dinheiro tem que vir (poupança, imposto). A isso os membros do movimento são obrigados a responder nos debates e então dizem que a resposta é simples: paga mais quem pode pagar mais.
Tomada em sua generalidade a resposta é mágica, serve para todo aumento de imposto, para suprir todas as carências sociais. Mas até onde devemos ir na cobrança de custos sociais dos que podem pagar mais? Eles poderão suprir a todos? Não haverá um limite a partir do qual a sociedade pode ser prejudicada? Não seria melhor aumentar impostos, sendo possível, para destinar os recursos à educação? Não seria injusto dirigir mais este benefício aos estudantes, já tão beneficiados e que após se formarem, vão trabalhar para benefício direto de si mesmos, com raras e honrosas exceções (uma simples sugestão da Presidente para que estudantes de medicina, muitos formados em faculdades públicas ou com bolsas, fossem obrigados a servir dois anos no SUS causaram celeuma tremenda).
Vivemos sob um regime capitalista onde o aumento da produção e melhoria dos produtos depende de investimentos e concorrência, a poupança e acúmulo privado de riqueza são fundamentais (no regime), portanto, para continuarmos seguindo adiante. O que acontecerá se as empresas pagarem tanto imposto que nada sobre no caixa para investir? Deve o Estado apreender todo o excedente social e gastar com o bem-estar da população? Ou então investir? “Tantas perguntas, nenhuma resposta”, diria o velho Brecht.
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