Governo Temer, a contradição em processo, por Marcio Pochmann

MARCOS CORRÊA/PR

da Rede Brasil Atual

Governo Temer, a contradição em processo

O dique da base parlamentar do presidente não mais parece ser suficiente para impedir o transbordamento do mar de lama da corrupção. Pelo visto, poucos sobreviverão

por Marcio Pochmann

Uma contradição fundamental se processa no golpismo que sustenta o governo Temer desde a sua imposição no ano passado. Quanto mais forte o seu governo maior a exposição de sua fraqueza.

Isso porque a sua fortaleza provem justamente dos responsáveis por sua própria criação. De um lado, a extensa e integrada base parlamentar no poder legislativo federal, que oferta apoio jamais observado ao longo do ciclo político da Nova República, iniciado em 1985.

O centro deste apoio não parece ser ideológico, programático ou grandioso em nome do Brasil melhor. Pelo contrário, pois fundamentado na individual e rasteira lógica da sobrevivência cada vez mais ameaçada pela contaminação proveniente do mar de lama da corrupção.

Desde o surgimento da Operação Lava Jato, sob guarida do governo Dilma, a sua aceitação pelo status quo parecia visível enquanto se mantinha concentrada na investigação seletiva e focada nos políticos petistas, bem como no plano do Executivo federal. Quando transpareceu que não mais seria possível manter as denúncias, investigações e julgamentos estritamente no leito petista, um novo corpo no interior do Llegislativo teria se formado a partir da liderança de Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

A expectativa seria a de entregar o governo Dilma como fazem os boiadeiros que, para passar pelo rio perigoso com a boiada entregam um, o “boi de piranha”. Dessa forma, o fim do governo liderado pelo PT traria consigo a perspectiva de que seria possível virar a página de todos os males do Brasil.

Com isso, a inédita constituição da unidade entre os poderes Executivo, sob direção de Temer, e Legislativo, conduzido por Cunha, faria sentido e segurança como um dique à contaminação do mar de lama da corrupção. Mesmo na queda de Cunha, a hegemonia parlamentar apresentou contida fissura frente aos sinais de convencimento, animados pelo governo Temer em oferecer resistências ao avanço das diversas operações do estamento público (policial, judicial e ministerial).

De outro lado, a base social e econômica interna e externa defensora do projeto neoliberal no país. Ao perceber que a derrota em 2014, a quarta sucessiva desde 2002, poderia vir acompanhada de não apenas mais quatro anos de Dilma, mas do acréscimo de oito anos com novamente Lula, o que poderia significar 24 anos de governos petistas (2003 – 2026), a oposição se lançou numa verdadeira aventura política sem volta.

O rompimento democrático logo se apresentou diante da não aceitação do resultado eleitoral, o que significou a instalação de inacreditável terceiro turno através da diversidade de medidas (solicitação da recontagem de votos no TSE, questionamento da prestação de contas, pautas-bomba no Legislativo e impeachment). Vinte meses após o término do segundo turno, o Senado Federal aprovou, em terceiro turno, a vitória da oposição, expressa pela ascensão de Temer, revestido do programa neoliberal para o Brasil, mesmo tendo sido derrotado democraticamente em 2014.

Assim, as medidas impopulares das reformas neoliberais que desconstituem o Estado e o país com mais desemprego e pobreza, enriquecem os já ricos, e entregam o setor produtivo nacional (estatal e privado) às corporações transnacionais vêm sendo aceitas pela base parlamentar e fartamente apoiada pela base social e econômica de oposição aos governos do PT.

Essa verdadeira fortaleza, contudo, traz embutida, a sua própria fraqueza. O dique da base parlamentar do governo Temer não mais parece ser suficiente para impedir o transbordamento do mar de lama da corrupção. Pelo visto, poucos sobreviverão.

Ao mesmo tempo, a base social e econômica encolhe diante das tragédias semeadas pelas reformas neoliberais. O sucessivo anúncio de maldades joga mais “brasas na sardinha alheia”, o que tende a tornar cada vez mais imbatível a candidatura oposicionista em 2018.

Cabe, contudo, questionar: haverá eleição presidencial em 2018? E se houver, em que condições? Ou poderá se repetir o que aconteceu em 1965, quando foi negada a expectativa de alguns democratas e candidatos presidenciais que apoiaram o golpe de 1964 na tentativa de eliminar a força do PTB da época e se tornarem viáveis eleitoralmente? A força do conservadorismo autoritário não permitiu que isso viesse a acontecer.

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

View Comments

  • Com a PEC dos gastos

    Com a PEC dos gastos aprovada, e  com a turma do Senado de 2014, não adianta nem eleger o Lênin, que ele vai ter que seguir a cartilha neoliberal.

    O Neoliberalismo está escrito a fogo na constituição.

    IMPOSSÍVEL a esquerda no Brasil conseguir os votos para cassar a PEC na câmara, e principalmente no senado.

    O Senado é caso perdido. A quantidade de Senadores eleitos em 2014 comprometidos com a manutenção da PEC até 2022 é enorme. A Situação precisas eleger no máximo uns 4 senadores de 54 para manter o Neoliberalismo na constituição até 2022.

    Esse país está morto. Eleições não resolvem nada. O que resolve é anulação do impechment e de todas as medidas dos golpista, por que no congresso e no STF, jamais serão desfeitas.

    Só que o povo BRasileiro não tem culhões para isso. Pelo contrário, até aprova.

     

  • seja qual for o processo de

    seja qual for o processo de escolha, o próximo presidente encontrará um país destroçado sob todos os aspectos: ético, econômico, tessitura social, institucional, soberania, representatividade no plano internacional, sem patrimônio, talvez sem reservas. Sinceramente não sei como recomeçaremos nem com o que. 

Recent Posts

Trump considera sanções contra países que deixem de usar dólar

Taxação cambial, tarifas e restrição a exportações estão entre punições avaliadas pela equipe do candidato…

14 minutos ago

Governo federal confirma continuidade da homologação de terras indígenas

Força-tarefa composta por ministérios, Funai, AGU e Incra busca acelerar processo; quatro processos devem ser…

1 hora ago

A conexão Nuland–Budanov–Tadjique–Crocus, por Pepe Escobar

A população russa deu ao Kremlin carta branca total para exercer a punição máxima e…

1 hora ago

Elon Musk vira garoto propaganda de golpe que pagou por anúncio no X

Golpe inventa uma nova empresa de Elon Musk, a Immediate X1 Urex™, que pretende enriquecer…

2 horas ago

Governo Milei segue com intenção de lançar ações do Banco de La Nacion no mercado

Apesar da retirada da lista de privatização, governo Milei reforça intenção de fazer banco oficial…

2 horas ago

Prêmio Zayed de Sustentabilidade abre inscrições globais

Prêmio para soluções sustentáveis passa a aceitar inscrições em português; fundos de premiação chegam a…

2 horas ago