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Eficiência energética em edificações dá samba no Brasil?

Por Gustavo Haydt, do Blog Infopetro

A ideia de ter uma construção energeticamente eficiente e certificada não é nada nova, apesar do assunto ter-se tornado constante nos últimos tempos. Mas qual o objetivo da eficiência energética na edificação? Um dos objectivos gerais da eficiência energética em edifícios é economizar no uso de energia sem comprometer os níveis de saúde, conforto e produtividade. Em outras palavras, utilizar menos energia no uso diário do edifício, mas tendo construções de igual ou melhor qualidade.

Historicamente se pode indicar a Europa como sendo uma pioneira na formalização de uma regulamentação com intuito de obter redução do uso da energia nas edificações. Para tal, desenvolveu regulamentos sobre a construção das envoltórias dos edifícios no final da década de 1970 para reduzir a transferência de calor através de elementos da envoltória (e.g. paredes e janelas) e de difusão de vapor e controle de permeabilidade ao ar, seguido por regulamentos e recomendações de melhores práticas sobre o cálculo, projeto e manutenção de conforto térmico (e.g. aquecimento, ventilação e ar condicionado – AVAC e água quente sanitária – AQS) (Pérez-Lombard et al., 2009).

Entretanto, o conceito de certificação das características energéticas dos edifícios só surgiu praticamente duas décadas depois (em 1993) com a promulgação da Diretiva Europeia 93/76/CEE. Esta considerava a importância da certificação como um instrumento para prestar uma informação objetiva sobre as características energéticas dos edifícios, contribuir para uma maior transparência do mercado imobiliário, incentivar o investimento na poupança da energia, ajudar a estabilizar as emissões totais de dióxido de carbono, dado que os setores residencial e de serviços eram responsáveis por cerca de 40% do consumo final de energia da Comunidade na época (energia majoritariamente de origem fóssil), e considerando, finalmente, que os edifícios novos iriam ter repercussões no consumo de energia a longo prazo (dado que a vida útil de uma construção pode ultrapassar os 50 anos) e que, por conseguinte, importava dotá-los de isolamento térmico eficaz e adaptado às condições climáticas locais.

No mesmo ano de 1993, se formava o Green Building Council dos EUA (USGBC), um grupo diversificado formado por arquitetos, corretores de imóveis, proprietários de edifícios, advogados, ambientalistas, e representantes da construção civil, cujo objetivo principal era promover a sustentabilidade no setor de construção civil. Para tal, percebeu-se a necessidade de um sistema para definir e comparar os “edifícios verdes”. Mas o que significa “edifício verde”? Esse conceito americano de “edifício verde” seria igual ao conceito Europeu de eficiência energética na edificação? “Verde” tornou-se a designação abreviada de um conceito de desenvolvimento sustentável aplicado à construção civil. De acordo com o USGBC (U.S. Green Building Council, 2006), o conceito está relacionado com edificações ambientalmente responsáveis, economicamente rentáveis, e saudáveis para se viver e trabalhar, sendo ligeiramente mais amplo que o conceito Europeu.

Após anos de pesquisa, em 1998, o USGBC lança o Programa de Projeto Piloto LEED (Leadership in Energy and Environmental Design), também conhecido como LEED versão 1.0, e após extensas modificações finalmente consegue lançar o LEED “Green Building Rating System” (sistema de certificação para construções verdes) versão 2.0 em 2000 (U.S. Green Building Council, 2006), atingindo o objetivo de se ter um sistema para definir e comparar os “edifícios verdes”. Este sistema avalia o desempenho ambiental a partir de uma perspectiva ao longo do ciclo de vida do edifício, fornecendo um padrão definitivo para o que constitui um “edifício verde”. A certificação LEED traz a promessa de um consumo de energia até 30% menor, uma redução de até 50% no consumo de água e de até 80% nos resíduos, além da redução em média de 9% nos custos de operação (Gbc Brasil, 2012). Todas essas vantagens vêm de um custo inicial em torno de 1 a 7% maior para um empreendimento comercial, dependendo do nível de certificação, porém este custo inicial tende a ser pago rapidamente com a redução dos custos de operação.

O LEED é, até hoje, um sistema de classificação voluntária e consensual voltado para o mercado de construção. Este fato ia em linha com a certificação das características energéticas dos edifícios da Diretiva Europeia 93/76/CEE. Porém, na Europa, o fato da Diretiva 93/76/CEE não ser obrigatória resultou em uma baixa implementação dos seus requerimentos pelos Estados Membros (Pérez-Lombard et al., 2009), e em consequência, levando a uma baixa economia de energia.

Aprendendo com a história, após praticamente 10 anos da Diretiva 93/76/CEE, a União Europeia lança a Diretiva 2002/91/EC que agora integra, para além do isolamento térmico, outros fatores com influência no uso de energia, como as instalações de sistemas de aquecimento e arrefecimento, a iluminação, e a aplicação de fontes de energia renováveis. Além da maior abrangência dos fatores que influenciam o uso de energia, a certificação passou a ser obrigatória em todos os Estados Membros e os novos edifícios passaram a cumprir requisitos mínimos de desempenho energético, adaptados às condições climáticas locais.

Em 2010 a União Europeia lança a Diretiva 2010/31/EU em que reforça a aplicação dos requisitos mínimos de desempenho energético para os edifícios novos e existentes, assegura a certificação de desempenho energético dos edifícios e exige que os Estados Membros garantam que até 2021 todos os novos edifícios serão do tipo NZEB (“nearly zero-energy buildings” – edifícios com consumo de energia muito baixo e que podem balancear o consumo de energia com a produção de energia através de renováveis).

Além de história, o que isso tem a ver com o Brasil? No Brasil a noção de eficiência energética nas edificações surge com o Decreto Nº 34.979, de 23 de Novembro de 1993 com o Programa Estadual de Conservação de Energia nas Edificações do Rio Grande do Sul. Este com o intuito de promover o uso de fontes energéticas alternativas nas edificações e propor normas, padrões e outros instrumentos técnicos e legais a serem adotados para incentivar a melhoria da eficiência energética nas edificações, assim como sua conservação.

Em 1996 é feita uma tentativa de consolidar as informações referentes ao estado da arte de eficiência energética em edificações com o objetivo de definir ações do PROCEL (PROCEL Edifica) nesta área e criar referências para profissionais da área (ELETROBRAS; PROCEL, 2004). Porém, somente em 2010 (Portaria Inmetro nº 372, de 17 de Setembro de 2010) com revisão em 2012 (Portaria Inmetro nº 17, de 16 de Janeiro de 2012), os esforços do governo são efetivamente concretizados em um processo de etiquetagem de edificações para o Brasil (inicialmente para edifícios comerciais, de serviços e públicos), obtida através de avaliação dos requisitos contidos no Regulamento Técnico da Qualidade do Nível de Eficiência Energética de Edifícios Comerciais, de Serviços e Públicos (RTQ-C). (…) O texto continua no Blog Infopetro.

Ronaldo Bicalho

Pesquisador na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Ronaldo Bicalho

Pesquisador na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

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