A reportagem da Época sobre a amizade entre Barbosa e Celso de Mello

Sugerido por Webster Franklin

Do Tijolaço

O mundo maravilhoso do “repórter” da Época, a fábrica de salsichas jornalísticas

Fernando Brito

 

Eu disse ontem que ia deixar passar, pela insignificância a que foi reduzido o rapaz,  que nem sequer redigiu uma resposta, limitada a um pedido de desculpas para os “erros” factuais.

Mas pensei melhor e resolvi mostrar a todos este impagável exemplo de como é a fábrica de salsichas da revista semanal que é a Época, nascida à imagem e semelhança da Veja, apenas – creia! – um pouco mais higiênica.

Vejam que meiga a romântica descrição da longa amizade entre Joaquim Barbosa e Celso de Mello, o decano do STF:

(…) ambos se encontraram em Brasília, nos anos 1990. Celso já era ministro do Supremo; Joaquim, um procurador da República pouco interessado no ofício do Ministério Público e muito envolvido com suas reflexões acadêmicas sobre igualdade racial e a Constituição brasileira. Não demorou para que ambos desenvolvessem uma relação de mútua admiração. Joaquim admirava a erudição jurídica de Celso, que já assombrava Brasília. (…) Celso admirava o vigor intelectual de Joaquim, que nunca parava de se aprofundar nos estudos.

Mas não era uma admiração puramente intelectual. Celso se impressionava com a orgulhosa altivez de Joaquim(…). Num traço que se acentuou com o avanço dos anos e a concomitante ascensão na elite do Direito brasileiro, Joaquim nunca permitia, recorrendo a gestos e a palavras duras, talvez mais do que o necessário, que o reduzissem ao papel do negro subserviente, cordial – do negro que se força a esquecer o racismo, em nome de uma igualdade racial que, infelizmente, inexiste no Brasil. No que muitos outros enxergavam um exagero, quiçá um complexo de inferioridade, Celso percebia a necessária afirmação do que Joaquim era, por inteiro. E como essa afirmação moral de indignação moldaria o juiz que Joaquim se tornaria.

Não foi por acaso, portanto, que, em 2001, Celso escreveu o prefácio de um livro em que Joaquim disseca a legalidade de medidas como cotas raciais: Ação afirmativa e princípio constitucional da igualdade. Nele, Celso defende o trabalho – e a visão de mundo – de Joaquim. Como continuou a fazer, quando os dois se encontraram no Supremo em 2003, a partir da posse de Joaquim. Votaram de modo semelhante em todos os casos que, na década passada, estabeleceram o Supremo como uma instituição progressista em questões comportamentais(…)É o que se convencionou chamar de ativismo judicial – aquilo que a Suprema Corte americana fizera nos anos 1960, e Celso e Joaquim, além de outros ministros, tanto admiravam. Autorizado pela Constituição, o Supremo começara a fazer o trabalho de que o Congresso abdicara.

Quando o caso do mensalão chegou ao Supremo, a afinidade jurídica e moral entre Celso e Joaquim estava completa. Joaquim virou relator do caso, aconselhando-se amiúde com Celso. Isolado na casa de amigos na Áustria, ouvindo música erudita e relembrando as lições de raciocínio lógico e argumentação que tivera na Alemanha, Joaquim preparou o voto de sua vida. Nele, aceitou larga parte da sólida denúncia do então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza. Ela descrevia as provas e os raciocínios legais para sustentar a tese jurídica de que os crimes contidos no mensalão envolveram a alta cúpula do governo petista. Os demais ministros concordaram com Joaquim, para satisfação de Celso.

Maravilhoso, não é? Faltou apenas a música de violinos…

Ah, e um pequeno, infimo, desprezível detalhe: nada disso aconteceu.

O Celso que escreveu o prefácio do livro de Joaquim é outro e o Celso do texto – o Ministro – Barbosa só conheceu em 2003, quando chegou ao STF.

Tudo é história da carochinha, um conto de ficção desonesto.

Teria sido o primeiro da carreira deste rapaz?

Vejam este trecho de “reportagem” do Dieguinho:

“João Augusto estava em silêncio. Permanecia inclinado à frente, apoiava-­‐se na mesa com os antebraços. Batia, sem parar, a colherzinha de café na borda do pires – e mantinha o olhar fixo no interlocutor. Parecia alheio à balbúrdia das outras mesas no Café Severino, nos fundos da Livraria Argumento do Leblon, no Rio de Janeiro, naquela noite de sexta-­‐feira, dia 2 de agosto.

A xícara dele já estava vazia. O segundo copo de água mineral, também. João Augusto falava havia pouco mais de uma hora. Até então, pouco dissera de relevante sobre o assunto que o obrigara a estar ali: as denúncias de corrupção contra diretores ligados ao PMDB, dentro da Petrobras.”

Outro romance ficcional?

E seu espelho da Editora Abril, a Veja, não escreveu outro pequeno romance sórdido com as embalagens de Mc Donald’s na cela de José Dirceu?

Se a Época, como a Veja, se anunciasse como “revista semanal de literatura”, vá lá. Seria apenas má literatura.

Mas se dizem “revistas de informação”. Imagine se nós, o que eles chamam de “blogueiros sujos” inventássemos historinhas assim?

É assim que, lá dentro, se fazem carreiras. Que podem ser de qualquer coisa, menos jornalismo.

Redação

Redação

View Comments

  • marido da Ideli Salvatti

    Falando em pseudo-jornalismo:

     

    "O subtenente músico do Exército Jeferson da Silva Figueiredo, marido da ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, aquele que foi destratado pela revista VEJA por não ser um oficial do EB e ter integrado um grupo de trabalho que foi à Rússia conferir de perto as capacidades do sistema antiaéreo russo Pantsir-S1, não foi à Rússia simplesmente por ser marido da ministra. Ele foi à Rússia justamente por ajudar nos trabalhos, uma vez que ele morou na Rússia e é autodidata em língua russa."

  • Obras de Ficção Mais Lidas na Semana

    1o. - Veja

    2o. - Estadão

    3o. - Folha

    4o. - Época

    5o. - O Globo

     

    Pelo jeito o pessoal da Época está empenhado em subir no ranking.

  • Pode-se falar tudo de Joaquim

    Pode-se falar tudo de Joaquim Barbosa mas neste caso ele acertou em cheio em contestar a revista Época. Quando é que o José Dirceu vai processar a revista Veja? E a Folha, cuja informação sem provas foi base para que o juizeco amigo de Barbosa o impedisse de trabalhar.

    • Concordo, mas...

      Neste caso, realmente o Barbosa acertou. Acredito porém que resolveu reclamar antes que o Celso de Melo (o Ministro e não o professor, já morto) detonasse com a reporcagem.

      Ele tem a prerrogativa de ser, atualmente, o Presidente do Supremo e ser ouvido por todas as mídias (a favor e contra).

      José Dirceu pode até processar as revistas (acredito que já processou a veja), mas não terá repercussão neste momento. Somente quando e SE ganhar a ação.

  • Uai JB ?!   O que é

    Uai JB ?!   O que é amplamente divulgado pela nossa imprensa não vale mais como prova ? Só quando acusam o Dirceu né ?

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