O pacto nacional, a Ponte para o Futuro, e a resistência de Lula, por Luis Nassif

Vamos tentar colocar didaticamente:

  • A Lava Jato foi uma operação com clara conotação ideológica. Investiu contra o PT, não contra o PSDB. Quebrou as empreiteiras, não as instituições financeiras envolvidas em corrupção – como o BTG, com participação mais intensa que a própria Odebrecht. As empreiteiras eram as beneficiárias da visão desenvolvimentista de Dilma; as instituições beneficiárias da visão financeira de país. Foi esse viés político que determinou o destino de ambas as empresas. Os porta-vozes da Lava Jato sempre prestaram reverência ao mercado e à abertura total da economia.
  • O impeachment teve como objetivo não apenas tirar Dilma Rousseff, mas principalmente revogar os direitos previstos na Constituição de 1988. Michel Temer e Eduardo Cunha assumiram cavalgando a tal “Ponte para o Futuro”, com a missão principal de quebrar as pernas dos sindicatos. Antes do impeachment, acenou-se para a própria Dilma salvar o mandato endossando os princípios da Ponte. A Ponte foi o grande guarda-chuva divisor: quem se abrigou debaixo dela foi poupado; quem ficou de fora, se ensopou.
  • No Supremo Tribunal Federal (STF), os Ministros mais ideológicos – como Luis Roberto Barroso – empunharam a bandeira da financeirização selvagem e saíram rodando a baiana em palestras para empresas e instituições financeiras endossando as barbaridades estatísticas de Flávio Rocha. Ou seja, aceitaram os chefes do esquema político mais corrupto da época – Temer e Cunha – em nome da Ponte para o Futuro. Seguraram Cunha até que as reformas estivessem sob controle. Só então mandaram para a cadeia. A denúncia da JBS foi um acidente de percurso. Passado o momento, a releitura da mídia é que os diálogos gravados não indicavam intenção de crime, mesmo com a menção de Temer a seu intermediário, e o intermediário saindo do encontro com uma maleta de dinheiro. Foi o único caso que mereceu a indulgência do conterrâneo Luiz Edson Fachin.
  • Depois, endossaram a candidatura de Jair Bolsonaro, mediante o aval Paulo Guedes, da continuidade da desmontagem selvagem dos direitos sociais e trabalhistas.

Por tudo isso, qualquer iniciativa de pacto social tem que contemplar, se for politicamente honesta, os setores sociais e trabalhistas.

É evidente que mudanças no mercado de trabalho e nas formas de produção exigem uma revisão da legislação trabalhista e da própria função dos sindicatos. Assim como a questão da Previdência pública impõe-se não apenas na União, mas principalmente nos Estados.

Mas é evidente também que, com as tecnologias eliminadoras de emprego, tirar as centrais sindicais e as associações representativas dos funcionários públicos das discussões será um fator de desequilíbrio com profundas implicações sobre a paz social e o próprio mercado de consumo – como, aliás, ficou exposto de maneira dramática pela pandemia. Assim como ficou exposta a irracionalidade dos cortes indiscriminados de gastos públicos e da demonização generalizante do funcionário público. A Ponte para o Futuro foi de uma simplificação irresponsável.

Critique-se Lula pela dificuldade em se posicionar no atual jogo político e definir uma estratégia mais abrangente de resistência a Bolsonaro. Mas pretender que assine um cheque em branco para propostas genéricas de pacto social seria uma prova de ingenuidade inédita.

Para que o grande pacto se concretize, Rodrigo Maia precisaria dar provas robustas de que, qualquer proposta de reforma, tenha participação de sindicatos e movimentos sociais. E, do lado do PT e Lula, demonstrações de que não se furtarão a discutir reformas necessárias, modernizantes, mas sem perder o foco na proteção social e na garantia dos direitos fundamentais.

Luis Nassif

Luis Nassif

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  • Quem faz pacto com escorpiões será sempre picado pelas costas. A patética "elite" brasileira é o escorpião, e ela SEMPRE irá tratar empregados como escravos e SEMPRE irá tratar o estado como propriedade pessoal. Modelos medievais de comportamento não se corrigem com "pactos".

    • Perfeito, esse negócio de "pacto" é a velha ladainha que visa manter o status quo da elite em momento de crise do capitalismo. Ao final, sempre "o de cima sobe e o de baixo desce", como diz a música do saudoso Chico Science.

    • O tal do manifesto #Juntos é patrocinado por Paulo Lemann (o rei das privatizações do lado privado) e Maria Alice Setúbal (Itaú). Bela dupla para atrair os trabalhadores. E para os demais cidadãos que não são ingênuos, também.

  • Para Rodrigo Maia basta aceitar a participação dos sindicatos e movimentos populares, para o presidente Lula e o PT, não se furtar a discutir reformas NECESSÁRIAS modernidades.
    A questão não é essa. O PT e o presidente Lula sempre buscaram atualizar a legislação a realidade.
    A questão é política. O presidente Lula, após aparentemente ter aceitado um fora com o sujeito que ocupa a presidência da República, viu -se obrigado o retroagir diante das pressões da base que não aceitam nada sem as desculpas públicas pelo golpe e a restituição dos direitos políticos do presidente Lula. Sem isso não há início de discussão possível.
    A mágoa, que sempre cega,é grande e Boa parte da base petista prefere aceitar o sujeito que está na presidência da República a um outro golpista enrustido.

  • Sobre um ponto fundamental ignorado no artigo, deve ser observado o seguinte.

    Celso de Mello - que, agora, pressente, contra si e até fisicamente, o perigo nazista naquele que ajudou a eleger, atuando como figura de proa na criminalização e demonização do PT e de Lula - e Gilmar Mendes, outra figura nefasta no mesmo sentido, são, de fato e de direito, não somente os ditadores que permitiram a cassação dos direitos políticos do ex-presidente, abrindo o campo para a ascensão do fascismo.

    São também, agora e pior ainda, os ditadores que mantêm cassados os direitos de Lula. Agindo desta forma criminosa, devem estar se considerando ainda 'vitoriosos' nessa ditadura judicial, ao contrário da ditadura dos gorilas estrelados, que, derrotados, assentiram com a 'anistia' dos presos e perseguidos políticos daquela época em troca das próprias impunidades, como estupradores, torturadores, assassinos e criminosos de lesa-humanidade.

    Assim, é uma piada de mau gosto ver os togas Celso de Mello e Gilmar Mendes virarem heróis de grandes frações da esquerda, enquanto, como ditadores de fato, cassam os direitos políticos de Luis Inácio Lula da Silva.

    Se querem, de fato, derrotar a ditadura milico-policial-miliciana que se avizinha, em vez de - posando de 'democratas' -emitirem tantas notas de repúdio, discursos e manifestos vazios, onde não entram os direitos concretos do povo, deveriam abdicar urgentemente deste veto ditatorial, restaurando os direitos político de Lula como um passo real para uma mudança efetiva na luta popular contra o projeto nazifascista do Genocida e dos militares delinquentes por trás deste monstro.

    • Querem normalizar o sujeito, tão sabujo ou mais que o tchutchuka só rentismo podre..... é farinha do mesmo saco, e não essa patética estorinha furada que é a voz do bom senso no congresso.....
      E Lula está certíssimo.....os interesses dos trabalhadores não são os mesmos dos banqueiros e empresários abutres-carniceiros-podres....

  • Vai mudar o preço do dólar se o Lula deixar de assinar esse manifesto. Aliás no andar de baixo ninguém sabe que isso existe.

  • Todo apoio a Lula. E quem não conhece certos elementos que pretendem liderar o suposto pacto que os compre. Por exemplo, que credibilidade tem Rodrigo Maia, um dos líderes da usurpação dos direitos trabalhistas e do adiamento das aposentadorias (só dos trabalhadores, claro - militares, MF e judiciário não, para garantirem o esbulho para as calendas e fanático das privatizações na bacia das almas? E o golpista FHC? Para ficar só nos mais destacados.

  • O Brasil que ainda existe conhece os atores canastrões , globo lava jato fhc e quanto mais, pela voz dos seus coerentes jornalista políticos juristas, não mais se encanta com os cantos das sereias.
    Nada de oba oba, aos fatos.

  • O PT não foi alvo destes bandidos que agora se dizem surpreendidos com o bolsonaro mas adoram o guedes atôa.
    A desgraça atual só mostra o acerto do PT.
    Gente muito boa atacou a dilma para conseguir uma beiradinha na ponte para o futuro que do outro lado indicava o bolsonaro.
    O PT, pode ainda ser vítima deste pessoal, mas fica cada dia mais claro sua grandeza e que era um empecilho para a desgraça que vivemos por culpa destes que querem, AINDA, "ensinar" ao PT.

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