Categories: Política

Apostando um pouco nas estratégias para 2014

Dos Blogs de Brasilianas

Essa discussão de conservadorismo (moral ou econômico), regionalismo, serrismo, etc. anda se alongando demais da conta. Vamos listar alguns pontos mais para aclarar as coisas… Até porque há muita gente já sonhando com 2014!

Estou convicto que:

Se a oposição acha que discurso conservador, quer em comportamento quer em economia, vai lhe ajudar em 2014, está muito enganada.

Se a situação acha que perdeu no Centro-sul (aqui consideramos Sul, SP + C-Oeste) por isso, também está enganada.

Parece estar havendo uma superestimação do que se chama voto conservador. Este atua na margem. O Norte e o Nordeste são mais fragéis economicamente e o discurso de participação do Estado será influente até alcançarem as economias do Centro-sul. Isto valia para o DEM/PMDB nos anos 80/90 e para PT/PSB desde 2002.

Já o Centro-sul é dividido entre PT/PSDB, com os demais se alinhando em torno deles. Mas o grupo mais “estatista” consegue ótimos resultados para legislativo federal, e o outro mais governos estaduais. Na eleição para presidente é 50%/50%. O que ocorre? Não há nenhum profundo sentimento anti-Estado a trabalhar. Mas uma racionalidade, que está sendo subestimada, do eleitor: este deseja a política econômica atual, com correção do câmbio e dos juros, mas também a continuidade de gestões estaduais que se revelaram adequadas.  

Desde o início da campanha eleitoral recente a oposição podia contar com 30% dos votos, os alternativos com 10% e a situação com 40-45%. Como nada de relevante se discutiu, ficamos vendo os menos informados ou menos decididos flutuando no tempo. No fim se distribuíram do modo que vimos, um pouco para cada um dos três pólos.

Preconceitos : há muita visibilidade graças aos guerrilheiros de internet, mas no estrito senso não são a base do voto. Tanto que, além da pequena oscilação relativa ao longo desta campanha e uma pequena redução do lulismo em NE, MG e RJ, os resultados eleitorais de 2010 foram parecidíssimos aos de 2006. O que ocorreu foi a bizarra tentativa de usar preconceitos desta vez (talvez até pela percepção do crescimento relativo da internet) para se ganhar votos na margem. O resultado foi pequeno porque o número de indecisos/oscilantes é pequeno (cerca de 15% do eleitorado) e ainda teria que se contar que estes fossem por demais influenciáveis. O voto preconceituoso é, felizmente, apenas um nicho, não determinante.

Serra apenas teve avanço significativo, em relação ao seu potencial inicial, justamente em MG, RJ, NE e N. Pode ser que a disseminação de preconceitos teve algum resultado, em ajudar a que tivesse 6% a mais de votos válidos que Alckmin (44% de Serra 2º turno 2010 versus 41,6% de Alckmin 1º turno 2006), mas o crescimento foi localizado justamente onde Serra era muito minoritário. As razões ficam para pesquisadores pensarem, mas talvez justamente em estados mais dependentes de ações do Estado é que se dê um peso maior à biografia do candidato a condutor do Estado (esta pode ter sido a razão, posto que Serra já era popular e nome com forte lembrança no NE já em 2002.) Outrossim, o próprio crescimento econômico relativamente maior no NE tornou-o um pouco menos dependente do discurso intervencionista. As questões para o futuro podem pesar tanto quanto um reconhecimento do passado (e isto os tucanos sabem muito bem…)

Os guerrilheiros virtuais serristas estão criticando quem justamente deu o maior crescimento relativo a Serra vis-a-vis Alckmin… (ou a maior queda de Dilma em comparação com Lula)

Um capítulo a parte deve ser concedido ao voto religioso anti-aborto. Parece que foi relativamente expressivo (por um estudo do Ibope, até 20% dos evangélicos, que são 20% da população, chegaram a oscilar.) O potencial de votos dessa questão, juntando um impacto menor entre católicos, pode ir a 5-6%. Mas não será por, pela primeira vez, isto ter sido introduzido em discussão? E isto não terá ocorrido pela ausência de problemas sócio-econômicos mais urgentes? (como a inflação, o desemprego e a subnutrição foram em outros anos.) Ao longo do 2º turno houve reversão para a normalidade desse voto que faz parte do conjunto menos informado, mas que daqui para a frente buscará se manter a par. Cabe a sociedade tirar esse esqueleto do armário e fazer com que essa manipulação não tenha espaço para se repetir no futuro.

Centro-sul anti-lulista? Mas as pessoas esqueceram que Lula só perdeu em 2002 em Alagoas? (reduto tucano no Nordeste pela história de T. Vilela, entre outras coisas.) A clivagem anti-governo federal surgiu no Centro-sul e em bolsões do Norte por razões específicas, entre 2002 e 2006 : a) postura conciliadora em relação a questões de terra e ecológicas; b) promoção de redistribuição regional de renda através da valorização cambial, que desvaloriza os principais excedentes do Centro-sul vis-a-vis a renda urbana de serviços e pensões (mais expressiva de MG e RJ para a direção norte.)

Alguém reparou que, justamente em 2002, o câmbio era o mais desvalorizado em muito tempo e que não havia nenhuma percepção de que o governo do PT pudesse valorizá-lo?

Dos maiores colégios eleitorais apenas ES e GO mudaram de lado agora (AC e RO completam o quadro.) O relevante é que em 23 estados ganhou quem já ganhou em 2006. No conjunto apelidado de “mais conservador” (SP+RS+SC+PR), Dilma ficou apenas 1,2 pontos atrás do que Lula obteve em 2006. Não houve nenhuma virada azul, portanto. A divisão eleitoral entre PT e PSDB nos estados meridionais simplesmente não mudou em 4 anos porque também não mudou a abordagem dos partidos para as questões que interessam a esses estados. Soma zero no voto ao nível federal, mas não no estadual : em SP e RS o PT avançou pontos importantes nas suas votações para governador e elegeu um senador em cada.

Reverberação de escândalos, como Mensalão ou Casa Civil são pretexto para canalizar uma insatisfação e angariar votos de indecisos, mas os eleitores em muitos estados já estavam decididos : achavam mesmo que Serra promoveria mais rapidamente a desvalorização cambial e, eventualmente, traria mais investimentos estatais para o Centro-sul. Quem dissemina preconceitos sabe que são furados, é apenas jogo.

Desde quando pode-se chamar o eleitorado do Centro-sul de moralista, se, em pesquisas de opinião, é em seus estados que há maior apoio, ainda que mesmo assim pequeno, à descriminalização do aborto? Na Datafolha de maio/2010 (pesquisa sobre várias questões comportamentais) apenas os estados do Sul declararam maioria a favor da adoção por gays. E a mídia centro-sulista, notoriamente conservadora em questões sociais é sempre “moderninha” em questões comportamentais, pois isso agrada seu público de classe média durante os 3 anos de intervalo entre uma campanha e outra.

O Centro-sul não é, ainda, “desenvolvido”. É apenas a porção menos subdesenvolvida de um país muito injusto e subdesenvolvido em seu todo. Acreditar que discurso liberal de redução de Estado vai comover enquanto ainda há grande carência de infraestrutura é ilusório. Já um discurso de eficiência e probidade tem um bom espaço.

Os comentários de assessores do Serra sobre modelo de exploração do pré-sal foram de grande infelicidade. Permitiram que se recolocasse a pecha de privatizador (no caso dele isto seria um preconceito ou um conceito?) Mas muito provavelmente uma pesquisa qualitativa perceberia que não existe nenhum interesse real, mesmo por parte das classes médias de SP – estado que recebe proporcionalmente muito pouco em recursos federais – , de uma mudança na condução das estatais. Ao contrário, o elevado custo para o consumidor resultante das privatizações de rodovias e telecomunicações começa a ser cada vez mais questionado.

Os guerrilheiros virtuais petistas andam atribuindo um conservadorismo à porção meridional do Brasil que, simplesmente, não é verificado na prática. Os governos estaduais de PSDB/aliados se reelegem continuamente, mas em nenhum houve redução do tamanho do governo, certo? De um certo modo é o PT quem não dialoga o suficiente com os eleitores do Centro-sul, pelo menos alguns segmentos, nem ouve todas as suas demandas, ainda que isto não tenha trazido consequências eleitorais.

Minhas apostas para 2014, já que há tanta precipitação a respeito:

O PSDB precisará abrir mão do discurso conservador moral se não quiser perder votos justamente na sua base. O Centro-sul do Brasil não é nem a Califórnia sonhada nem o meio-oeste americano do Bible belt, e, aliás, nenhum país do mundo é muito parecido com os EEUU. São uma exceção mundial, imensa. Não há rejeição cultural, no Brasil, ao Estado, mas há críticas quanto a sua eficiência.

Como direita sincera no Brasil é nicho (e permanecerá assim por décadas), se o PSDB quiser alçar vôos mais altos, no contexto de Nova Oposição, dependerá de recuperar algumas bandeiras social-democratas. Mas o PSB já está se posicionando bem a respeito e o PV também, e, por nunca terem sido alvo de campanhas preconceituosas podem perfeitamente acolher eleitores eventualmente anti-petistas. (Socialismo sincero também é nicho, diga-se.)

O caminho para o PT no Centro-sul, é, curiosamente, mais simples : uma desvalorização cambial expressiva (ainda que induzida pela latente crise de déficit em balança comercial) levará a uma aceitação imediata do governo, pois um conflito redistributivo estará sendo parcialmente revertido. E não é necessário retornar-se aos padrões de 2002, muito pelo contrário. As diferenças eleitorais entre PT e PSDB para presidente nos estados do Centro-sul são pequenas, da ordem de 8 pp. Assim, revertendo-se em 4% dos eleitores a clivagem eleitoral atual, o PT (com ou sem PMDB) tem grandes chances, desde já, de ser considerado o favorito para 2014. Bastará acompanhar as pesquisas trimestrais de popularidade por região e monitorar isso.

As perspectivas para a economia são otimistas. As taxas de crescimento de consumo serão menores que as dos últimos anos, mas sobre um patamar elevado. A inclusão social prosseguirá e ainda trará benefícios. Mesmo se houver crise mundial o Brasil tem vários instrumentos anticíclicos dos quais pode lançar mão. Será muito difícil contrapor qualquer discurso a um centrismo bem sucedido e o que se chama de Nova Oposição, que começa muito dividida pelo tamanho que tem, dependerá mais de muitos erros do governo para ter sucesso.

O eleitorado brasileiro é continuísta, mas nem tanto assim no nível estadual. Em apenas 5 estados não houve mudança de grupo no poder desde 2002:

Piauí (desde 2002 entre PT/PSB); Acre (desde 1998 PT); Minas Gerais (desde 1994 PSDB/Aécio/Itamar); São Paulo (desde 1994 tucano); Santa Catarina (desde 2002 entre PMDB local/PSDB/DEM)

Não será discurso sobre a economia no plano federal que alterará essa falta de alternância em alguns estados, que o PT não consegue quebrar. Em SP, por exemplo, em uma pesquisa pouco antes do 1º turno, 40% dos eleitores de Dilma declaravam voto em Alckmin. Preconceitos não vão ajudar nenhum lado.

Para seduzir as crescentes classes médias, no nível estadual, o caminho social-liberal pode ser interessante : construir uma estrutura de fornecimento de educação (especialmente esta), saúde e segurança que justamente diminua a propensão atual a recorrer a serviços privados, pois estes passaram a pesar muito no bolso. DF, RS e RJ podem ser disseminadores desta estratégia.

Luis Nassif

Luis Nassif

Recent Posts

Presídios do RS estão sem água e pedem ajuda ao Ministério da Justiça

Inundadas, penitenciárias tiveram de transferir detentos para andares mais altos e não têm condições de…

2 horas ago

Israel põe a perder acordo de cessar-fogo ao bombardear Rafah

Hamas aceitou uma proposta de cessar-fogo entre o Egito e o Catar para interromper a…

3 horas ago

Senadores republicanos ameaçam TPI após pedido de prisão contra israelenses

Em comunicado, grupo de conservadores afirma que posições do tribunal contra Israel são ‘ilegítimas e…

3 horas ago

Excesso de chuva compromete colheita de arroz no Rio Grande do Sul

Após secas causadas pelo La Niña, chuvas trazidas pelo El Niño podem afetar abastecimento da…

4 horas ago

Lula envia ao Congresso decreto para liberar verbas aos municípios atingidos pela chuva

O chefe do Executivo reiterou o desejo de fazer tudo o que estiver ao alcance…

4 horas ago

Estudo Brasil 2040 já indicava efeitos da mudança climática sentidos desde o ano passado

O governo Dilma gastou R$ 3,5 mi pelo trabalho, abandonado após reforma ministerial; inundações, secas…

5 horas ago