Bolsonaro fomenta, mas deixa a bolsonaristas “trabalho sujo” e lava as mãos

Enquanto a base bolsonarista mais radical assume a função de sujar as mãos com ataques armados, o líder do grupo e atual presidente ensaia postura moderada e pró-democracia, mas utiliza do primeiro para desacreditar as instituições, em aceno golpista.

Foi este o cenário reproduzido no episódio da prisão e ato violento de Roberto Jefferson, a uma semana das eleições. Enquanto o ex-deputado apresentou a postura estimulada por Jair Bolsonaro e seu governo junto aos aliados, o próprio presidente lavou as mãos, tentando se dissociar do ato violento, mas aproveitou o gesto para atacar o STF.

Para o jornalista e documentarista Carlos Alberto Jr., o que o país viu ontem com o episódio da prisão de Jefferson foi a “crônica de uma armação ilimitada”. No Twitter, ele lembrou que os atos começaram ainda dias antes, quando a filha do ex-deputado usou as redes para atiçar a militância bolsonarista a atacar o STF e o TSE.

Ainda que de tom aparentemente mais brando, é o mesmo discurso proferido e fomentado por Bolsonaro nos últimos anos contra ambas as instituições. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por exemplo, tem sido o principal alvo de ataques do mandatário para tentar o aceno golpista em caso de derrota nas eleições deste domingo.

O GGN trouxe o passo a passo das estratégias da campanha de Jair Bolsonaro frente ao TSE e nas intenções de golpe. Leia aqui e aqui.

Depois do tweet da ex-deputada Cristiane Brasil, filha de Roberto Jefferson, com vídeo no qual o ex-deputado insulta a ministra Cármen Lúcia de “bruxa” e “prostituta”, é feito o mandado de prisão de Jefferson, que reage a tiros e granada aos policiais federais.

Carlos Alberto Jr. narra também que “imediatamente” após a tentativa de prisão, “a rede de apoio entra em campo”. Nos EUA, bolsonaristas como Allan Santos e outros – que já foram acusados por atos antidemocráticos – divulgam vídeo dizendo que a decisão contra Jefferson foi “ilegal” e que decisão ilegal “não se cumpre”.

Ao mesmo tempo, no Brasil, outros apoiadores de Jair Bolsonaro nas redes, como Rodrigo Constantino, radicalizam e “mobilizam a base comparando o cumprimento de decisão judicial ao nazismo”. O deputado Daniel Silveria (PTB-RJ) convoca os bolsonaistas a irem na casa de Roberto Jefferson para enfrentar os policiais.

“É dever irmos para lá”, disse no tweet, seguido de outro, minutos depois, afirmando que foi orientado a não ir mais na casa do ex-deputado. “Quem o orientou? Por qual motivo?”, reflete o jornalista Carlos Alberto.

As respostas vão de encontro aos passos dados depois pela ala mais moderada do governo e da campanha de Bolsonaro, que recomenda ao presidente se dissociar do bolsonarista Jefferson, após os ataques.

A fala de Sergio Moro, ex-juiz que prendeu Lula, ex-ministro de Bolsonaro, depois inimigo do governo “e agora novamente amigo de Bolsonaro”, descreveu o jornalista, representa essa estratégia de dissociação.

Apesar do discurso moderado, foi Sergio Moro, enquanto ministro da Justiça, que autorizou diversos decretos liberando as armas no país. “Sobre as armas na casa de Roberto Jefferson, @SF_Moro precisa vir a público explicar sua participação na portaria para armar a população”, pontua.

E então o núcleo duro do governo entra com o discurso duplo, esperado e bem aceito por seus eleitores. Hamilton Mourão “lamenta” a postura de Jefferson, de atirar e granadas nos policiais, ao mesmo tempo que afirma que o STF e o TSE passaram dos limites, e fala em “impeachment” contra o ministro Alexandre de Moraes, que determinou a prisão do ex-deputado.

Até Bolsonaro chamar o ex-deputado de “criminoso”, mas também levantando desconfianças contra o Judiciário.

A militância bolsonarista alimenta e repercute o novo discurso de Jair Bolsonaro, contra Roberto Jefferson, associando o ex-deputado bolsonarista a Lula.

Além dos ataques violentos de bolsonaristas também se propagando em outros lugares, Carlos Alberto Jr. reflete sobre a quantidade de munição dentro da casa do ex-deputado, quem fez os disparos de fuzis e lançou as granadas, a presença de pessoas como o Padre Kelmon (PTB), aliado de Bolsonaro, na casa do ex-deputado, a manifestação do ex-assessor e amigos da família Bolsonaro e protagonista das “rachadinhas”, Fabrício Queiroz, em apoio a Jefferson.

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Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

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Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

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