Bolsonaro não abandonou plano de questionar eleições

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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O passo a passo de como as contestações preparadas foram mantidas a portas fechadas até o segundo turno

Foto: Reprodução Youtube / Edição GGN

Jair Bolsonaro não abandonou a ideia de contestar o resultado das eleições alegando suposta fraude nas urnas eletrônicas. Informações divulgadas nesta terça (11) pela colunista Malu Gaspar mostram que Bolsonaro escondeu o relatório das Forças Armadas, após não encontrar nenhuma irregularidade no processo.

A fala “tranquila” no discurso do presidente na noite eleitoral, divergindo do tom desgarrado e de arrebate já conhecido pelo público, não revelava um homem “equilibrado” que aceitava o resultado das urnas, ou “o novo Bolsonaro que nasceu no 2 de outubro” – como noticiava a Veja.

A votação expressiva em Jair Bolsonaro no primeiro turno, levando-o ao segundo com o líder das pesquisas, em uma diferença acirrada de 5 pontos percentuais, surpreendeu a própria campanha.

Somada à maior bancada eleita na Câmara, mais de 70% de bolsonaristas no Senado, ao menos seis governadores aliados e o relatório garantindo a lisura do processo pelos militares, como se soube posteriormente, bloquearam o tom agressivo e as medidas planejadas, ou como analistas e cientistas políticos temiam, uma versão nacional do atentado ao Capitólio.

O resultado seria outro se Lula tivesse ganho as eleições no 1º turno.

Mas o motor para impulsionar a desconfiança não cessou ali. Um dos importantes quadros do clã Bolsonaro, Frederick Wassef, advogado e amigo pessoal da família, e que se candidatava a deputado federal por São Paulo não conseguiu o mínimo para se eleger.

Com o resultado, assumiu o discurso acordado com o próprio presidente, e foi ao vivo no Instagram afirmar que não acreditava nos resultados das urnas eletrônicas, na noite de domingo, e que Jair Bolsonaro teria sido eleito no primeiro turno.

Não foi uma fala alheia e controversa à campanha, mas uma ponta solta do discurso trabalhado durante as semanas anteriores pelo governo.

A campanha de Bolsonaro compilou em relatórios internos e por Institutos contratados os argumentos que serviriam – ou servirão – para contestar as eleições.

O Instituto Voto Legal foi financiado pelo PL para uma apuração paralela dos boletins de urnas do Tribunal Superior Eleitoral. Ao mesmo tempo, as Forças Armadas foram acionadas para fazer também a contagem paralela de 358 boletins de urna, além de fiscalizar a biometria de 58 equipamentos.

O resultado da primeira não se soube. Horas após o fechamento das urnas, a organização afirmava que não iria emitir nenhum relatório de monitoramento das eleições presidenciais, indicando que não havia feito a apuração paralela. Não há a confirmação se o trabalho foi ou não realizado.

O das Forças Armadas resultou em atestado de segurança do sistema, sem detectar nenhuma irregularidade. Mas o relatório tampouco foi divulgado, por ordem de Jair Bolsonaro, que teria dito que os militares deveriam “se esforçar mais”, segundo a colunista Malu Gaspar.

Antes do dia 2, o Instituto Voto Legal chegou a realizar uma auditoria concluindo que as urnas não eram seguras. Sem informações confiáveis, o relatório contratado e divulgado pelo PL na semana das eleições foi rebatido pelo TSE como “mentiroso e fraudulento”, motivando ainda uma investigação contra a autoria, podendo enquadrar-se em Fake News.

Também na própria semana de sufrágio, a equipe de Bolsonaro reunia em outro relatório as medidas da Justiça Eleitoral que teriam prejudicado a campanha, em tentativa de alegar parcialidade do Tribunal.

Teriam sido elencados as decisões de proibir o uso do Palácio para realizar lives, a derrubada de Fake News e de associações do PCC a Lula e até a garantia do transporte público gratuito no dia da votação.

Na véspera, os levantamentos internos do PL davam a liderança para Lula contra Bolsonaro, um resultado que na avaliação interna foi acelerado pela campanha do voto útil. O resultado de domingo soou ainda, positivamente, com as avaliações de que o mandatário teria chances no segundo turno se a diferença de votos contra Lula fosse inferior a 10 pontos – o que se concretizou.

Além das Forças Armadas, empresários como Luciano Hang recuaram do aceno golpista, na semana posterior, afirmando confiar nas urnas.

A estratégia da campanha que se seguiu foi a de não acreditar as urnas abertamente, mas manter a portas fechadas as desconfianças, enquanto não seja necessário.

Também a de iniciar as ofensivas contra os institutos de pesquisas: objetivando um jogo no escuro, sem termômetros confiáveis, maiores chances de questionar um resultado que não se conhece, como traçamos aqui.

Os relatórios internos e os possivelmente “corrigidos” -após segunda ordem de Bolsonaro- estão a postos para presumível uso no próximo 30 de outubro.

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Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

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