Voto castigo de Macri depende de geladeiras cheias, trabalho e salários, diz pesquisador argentino

Jornal GGN – O futuro da Argentina depende de como irá se posicionar, nos próximos dias, três peças do país vizinho: o atual governo de Mauricio Macri; a principal oposição, formada por Alberto Fernández e Cristina Kirchner, e o mercado. Juntos, eles moveram o “voto castigo, que foi um voto econômico” nas eleições primárias de agosto. A análise é do professor e pesquisador argentino, Pablo Vommaro, integrante da CLACSO, em entrevista ao GGN.

Apesar de as primárias terem servido mais como uma grande pesquisa eleitoral, faltando dois meses para os argentinos irem às urnas e decidirem se mantêm Mauricio Macri por mais quatro anos governando o país, ou se elege a chapa Fernández e Kirchner, o resultado que os argentinos mostraram no dia 11 de agosto pode se manter ou mudar, tudo depende de como Macri reage à derrocada econômica.

E essa resposta do mercado só se tornou importante porque o próprio presidente do país vizinho assim escolheu para sua agenda e pautas políticas: “Esta é a medicina que Macri decidiu tomar”, resumiu Vommaro. Para o especialista, a responsabilidade é do próprio presidente que “se fechou sozinho neste caminho”, receita na qual os cidadãos torcem para que sobreviva “dois meses mais, ou quatro meses”. “Macri se colocou nas mãos do mercado, então ele depende do humor, de um rumor, de uma ligação, de um Twitter.”

“Como Macri deposita tanta confiança em fundos, na bolsa, no mercado, no capital financeiro, no Fundo Monetário Internacional, vai depender muito do que o FMI e os mercados pensam, para ver se nestes quatro meses que faltam a Macri de governo, ou pelo menos dois meses até outubro, são meses de calma e tranquilidade econômica, ou de convulsão social, de falta de dólares, de especulação, de golpes de mercado”, analisou Vommaro.

O analista entende que a postura adotada por Macri, logo depois do resultado das primárias, disse muito sobre o pouco que o presidente ainda pode entregar de confiança ao país, questionando os resultados e até mesmo provocando novos colapsos econômicos, derrubando a bolsa de Buenos Aires e aumentando o valor do dólar em apenas 5 dias depois das eleições.

Ao passo que a reação do principal opositor e hoje consolidado como o principal postulante a assumir o comando da Argentina em 2020, Alberto Fernández, também trouxe sinais de maior legitimidade junto à população, uma vez que as declarações dadas por ele na semana seguinte às primárias foram consideradas como as responsáveis pela paralisação da subida do dólar.

“A resposta da economia será um ponto forte [nas eleições argentinas], porque o voto de castigo de Macri, muito grande, de quase 79% da população, 7 em cada 10 argentinos votaram contra ele, é um voto econômico. É um voto que diz: ‘você não cumpriu nenhuma promessa econômica, estamos mal economicamente, já não me importa seu discurso ideológico, seu discurso político, a corrupção, etc. Aqui falta comida, aqui faltam salários, aqui falta saúde, falta educação, falta trabalho’”, disse o especialista.

Nesse sentido, não é de se estranhar que, cada vez mais próximo do 27 de outubro, Mauricio Macri tente recuperar confiança de eleitorado de que ele conseguiria estabilizar a economia da Argentina. Esse foi, inclusive, o teor de seu discurso nesta quinta-feira (05): “depois das Primárias Abertas, Simultâneas e Obrigatórias, tivemos uma nova incerteza política e econômica, na qual estou muito focado como presidente em minha responsabilidade de voltar a estabilizar a economia e trazer alívio para todos os argentinos”, disse Macri, hoje.

Mas a fala também foi considerada nos bastidores políticos como uma resposta tardia do presidente, 25 dias depois das eleições primárias, o que fragiliza ainda mais a credibilidade de seu eleitorado, que hoje está mais preocupado por situações consideradas básicas, como emprego, salários e comida na mesa.

“Quando faltam coisas básicas, muito dos outros discursos que podem ser efetivos na conjuntura de crescimento, no contexto de geladeiras cheias, mesas fartas, com trabalho e salários, saúde e educação, aí se pode discutir outras coisas. Mas quando falta não se discute, e isso não é um voto menos racional ou menos importante do que o outro”, concluiu Pablo Vommaro.

 

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Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

View Comments

  • Esses pesquisadores nada dizem. Há 4 anos Cristina perdeu devido a economia e a inflação, agora Macro perde por ter se aliado ao mercado.
    Dizem que os argentinos são inteligentes, por lerem livros e terem muitas livrarias. Sei!!!

  • A direita na vespera das esleições se preocupa com o emprego do povo, mas depois das eleições só se preocupa com os bancos. O bolsonaro de lá, muito mais culto, jogou com o tal liberalismo, a Argentina no buraco em 4 anos, aqui vamos muito mais rápido.

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