Categories: Educação

Discurso cristalizado da Escola dificulta melhor aprendizado – Por Glenda Almeida – Agência USP de Notícias

O “discurso pronto” utilizado por diretores e professores ao falarem sobre a relação escola-família e sua influência no aprendizado dos alunos dificulta uma reformulação necessária do modelo de escola no Brasil, que vive uma “crise de sentido”. A constatação é da pesquisadora Márcia Maria Brandão Santos, a partir de entrevistas com professores e diretores de duas escolas da rede pública municipal de uma cidade da região metropolitana de São Paulo.

Márcia Brandão, pedagoga, verificou um problema no discurso dos entrevistados, que diz respeito ao conceito de família utilizado ainda nas escolas, assim como ao conceito de “participação”. Segundo a autora, “A escola precisa rever esse discurso, rever essa idealização de família”. Essa idealização é problemática porque acaba funcionando como algo sobre o qual a escola deposita uma responsabilidade na família que deveria, na verdade, ser dela.

Os dados estão em sua dissertação de mestrado, Em busca de escolas eficazes: a experiência de duas escolas em um município de São Paulo e as relações escola-família, apresentada no mês de outubro na Faculdade de Educação (FE) da USP. A pesquisadora propõe que a escola repense seu discurso, e o reconstrua buscando um caminho para que as duas instituições, a família e a escola, dialoguem com o objetivo de criar intervenções funcionais nas práticas para o aprendizado.

Segundo a autora, “É mais fácil dizer que o aluno não aprende por causa da família que enfrenta problemas e deixa a vida dele agitada, do que procurar efetivamente caminhos que façam o aluno aprender apesar das circunstâncias que o cercam, seja quanto a família ou a situação financeira. Não basta aplicar estigmas”, afirma.

Entrevistas
Márcia Maria analisou como as escolas se organizavam, do ponto de vista administrativo e pedagógico. A pesquisadora identificou nos discursos dos entrevistados alguns importantes fatores que a literatura aponta como determinantes da eficácia escolar, como a capacidade de liderança profissional, relacionamento família-escola, entre outros. Foi examinado, também, o plano de gestão das instituições e o “discurso modelo” que servia à comunidade docente quando o assunto eram os problemas na trajetória do aprendizado pelo aluno.

Ao decorrer das entrevistas, Márcia percebeu três motivos fluentes sobre os quais os profissionais colocavam a culpa pela ‘não eficácia’ nas escolas: a situação sócio-econômica do aluno, o envolvimento do trabalho pedagógico do professor e, o que chamou mais atenção da pesquisadora, a não participação dos pais, ou seja, as dificuldades na relação escola-família.

O estudo apontou que, quando perguntados sobre a influência da família no desenvolvimento do aluno, a maioria dos professores já respondia que era realmente essencial. Porém, ao serem indagados sobre o porquê dessa importância, diziam prontamente que a família era indispensável, pois quando não era “estruturada”, a criança apresentava dificuldades na hora de aprender, ou isso acontecia porque os pais não incentivavam e não completavam o trabalho dos professores em casa.

A autora reafirma, ainda, a necessidade de recontextualizar os conceitos de escola no Brasil diante da “crise de sentido” na qual se encontra. “Na atualidade, quando a escola vive o que chamamos de ‘crise de sentido’, onde os conceitos não são mais os mesmos que antigamente, deve-se olhar a família em seu movimento, vulnerabilidade e fragilidade, bem como suas forças e recursos buscando reconhecê-la como instituição que requer ‘cuidado especial’ ao ser compreendida. É necessário dar voz aos pais, percebendo o quanto são heterogêneos”.

Eficácia escolar
A pesquisadora fundamentou sua dissertação na obra “Pesquisa em eficácia escolar: origens e trajetórias”, que apresenta uma incursão histórica de diferentes estudos estrangeiros que possibilitam a compreensão das origens, trajetórias, resultados e polêmicas presentes nas pesquisas realizadas sobre a eficácia escolar, organizada pelos pesquisadores N. Brooke e J.F Soares, em 2008.

Márcia Maria escolheu duas escolas da rede pública municipal de um município da região metropolitana de São Paulo para perceber quais dos critérios de eficácia listados por Brooke e Soares elas atendiam, e quais estavam mais presentes nos discursos dos profissionais dessas escolas. A escolha foi baseada no Índice Prova Brasil de 2005 e de 2007, que é uma espécie de avaliação externa, algo recentemente aplicado no País, que tem por objetivo avaliar alunos das 4ª e 8ª séries das escolas públicas urbanas mediante testes padronizados e questionários socioeconômicos.

O trabalho foi apresentado no mês de outubro na FE, sob a orientação da professora Belmira Oliveira Bueno, da FE.

http://www.usp.br/agen/?p=37332

Redação

Redação

Recent Posts

Eduardo Leite cobra soluções do governo federal, mas destruiu o código ambiental em 2019

Governador reduziu verbas para Defesa Civil e resposta a desastres naturais, além de acabar com…

8 horas ago

GPA adere ao Acordo Paulista e deve conseguir desconto de 80% dos débitos de ICMS

Empresa soma dívida de R$ 3,6 bilhões de impostos atrasados, mas deve desembolsar R$ 794…

9 horas ago

Lula garante verba para reconstrução de estradas no Rio Grande do Sul

Há risco de colapso em diversas áreas, devido à interdição do Aeroporto Salgado Filho, dos…

9 horas ago

Privatizar a Sabesp é como vender um carro e continuar pagando o combustível do novo dono

Enquanto na Sabesp a tarifa social, sem a alta de 6,4% prevista, é de R$…

10 horas ago

Al Jazeera condena decisão do governo israelense de fechar canal

O gabinete israelense vota por unanimidade pelo encerramento das operações da rede em Israel com…

12 horas ago

Chuvas afetam 781 mil pessoas no RS; mortes sobem para 75

Segundo o Ministério da Defesa, foram realizados 9.749 resgates nos últimos dias, dos quais 402…

13 horas ago