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Luiz Eduardo Soares e o mercado de drogas

Por foo

Do mesmo Luiz Eduardo Soares: 

De O Globo

“Querer abolir o mercado de drogas é como querer abolir a lei da gravidade”

Ex-secretário de segurança e hoje famoso coautor dos livros que inspiraram Tropa de Elite e Tropa de Elite II, o antropólogo Luiz Eduardo Soares vestiu ontem o paletó de cientista social ao presidir uma mesa redonda “As Drogas na Sociedade Contemporânea”, no primeiro dia do encontro da Anpocs. No debate, um painel do especialista em direito penal Salo de Carvalho, da Universidade federal do Rio grande do Sul, mostrou como a nova Lei das drogas é confusa e, em vez de produzir uma flexibilização, acaba botando mais usuários na cadeia, com incremento da população carcerária. Depois da mesa, Luiz Eduardo concedeu a entrevista abaixo, onde defende não apenas a descriminalização do usuário, mas a liberação das drogas em larga escala. Uma declaração e tanto, três anos após o lançamento de Tropa de Elite, que punha o usuário no centro das responsabilidades pelo tráfico. 

BLOCH: No painel que você presidiu na Anpocs ficou marcada, entre os conferencistas, a visão de que o proibicionismo não tem mais lugar na sociedade contemporânea. Você partilha desta visão? 

LUIZ EDUARDO: Totalmente. Para sermos práticos e concretos, não dá mais para ficar discutindo se a população deve ou não ter acesso às drogas. Ela tem, e terá. É como imaginar que se vai abolir a Lei da Gravidade ou as leis do mercado. Os EUA ganharam a guerra fria mostrando que é impossível erradicar o mercado. É impossível, também, erradicar a demanda e o acesso a drogas. 

BlocBLOCH: Por que você chegou a essa conclusão? 

LUIZ EDUARDO: O mundo está chegando a essa conclusão. Nas democracias, os países gastam bilhões, as melhores polícias do mundo investem grande parte de suas energias para reprimir, sem nenhum resultado. A ONU já admitiu isso e as políticas de redução de danos estão se disseminando. Os próprios policiais, aqui ou nos Estados Unidos, nos bastidores, dizem que é uma loucura insistir nisso. Ora, se é impossível evitar o acesso às drogas, a questão é em que contexto institucional, normativo, legal, vamos viver. Se for assim, caminharemos muitíssimo na redução da violência e do consumo. 

BLOCH: Em geral as discussões ficam em torno da descriminalização do uso pessoal. O que você pensa sobre a liberação da produção, um assunto ainda mais tabu? 

LUIZ EDUARDO: Eu sou completamente a favor da liberação das drogas em toda a escala, da produção ao uso. Nesse sentido, sou um liberal extremado. O estado não pode arbitrar o que o indivíduo vai produzir, distribuir e consumir, desde que ele o faça responsavelmente. Se não o fizer responsavelmente, aí as forças policiais atuam, o estado controla, faz campanha, educa, trazendo para si os impostos que a atyividade gera. Do contrário, vamos ter que proibir o álcool, por sinal uma droga das mais devastadoras. Ou o cigarro, hoje tão bem controlado, apesar de permitido. Ou, num exercício de reflexão, vamos ter que criminalizar o excesso de cafeína, que produz surtos de ansiedade. 

BLOCH: Isso é uma visão sua filosófica. Mas se partirmos para o pragmatismo, como fica? 

LUIZ EDUARDO: A busca de drogas e a provisão de drogas é um fenômeno planetário. Não se erradica um mercado. Se disciplina. A Suíça discriminalizou a heroína. Houve uma redução enorme das mortes causadas pela droga. As pessoas puderam se informar melhor, consumir em contextos mais seguros, controlar a qualidade, evitar doenças associadas e procurar ajuda médica, por não se tratar mais de um crime. As experiências europeias da última geração, como as de Portugal e Espanha, estão sendo muito bem sucedidas. Repito: é um caminho sem volta.

Luis Nassif

Luis Nassif

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