Reformas, falácias e estagnação, por Emilio Chernavsky

do Brasil Debate

Reformas, falácias e estagnação

por Emilio Chernavsky*

Durante meses, analistas de mercado exibiam – e muitos ainda exibem – otimismo em relação a que a aprovação da reforma da Previdência, se não for excessivamente desidratada no Congresso, levará ao aumento da confiança dos investidores, à queda da percepção de risco e das taxas de juro e, com isso, à expansão dos investimentos privados impulsionando a retomada da economia.

Apesar de repetido à exaustão, esse raciocínio já foi empiricamente refutado no exterior e mesmo recentemente no Brasil, quando o aumento da confiança que se seguiu à aprovação do teto de gastos não aumentou os investimentos. A frustração não deveria surpreender, dada a falácia da divisão que ele carrega, atribuindo às partes uma propriedade do todo.

De fato, se o conjunto do empresariado investir, a demanda agregada cresce, absorvendo a expansão da produção resultante dos investimentos e elevando os lucros totais. Já se o empresário individual investir, mas o movimento conjunto não ocorrer, o aumento da produção resultante do seu investimento não será absorvido pela demanda, estagnada, e seus lucros cairão. Sabendo disso, o empresário tende a ser cauteloso, esperando que a demanda dê sinais de crescimento antes de investir. Mas, ao fazê-lo, torna a retomada econômica apoiada no aumento da confiança uma ilusão.

O empresariado, por sua vez, tem cultivado sua própria ilusão, aspirando a que a reforma tributária que se anuncia complemente a reforma trabalhista e reduza seus custos, impulsionando com isso a retomada do crescimento.

Ao pensar assim, contudo, ele incorre na falácia da composição, atribuindo ao todo uma propriedade das partes. De fato, se o empresário individual pagar menos salários e tributos, seus lucros tendem a crescer e podem induzi-lo a investir para expandir a produção. Já se o conjunto dos empresários pagar menos salários e tributos em um contexto de estagnação e crise fiscal, a queda da renda das famílias reduz o consumo privado e a queda das receitas do governo reduz o consumo e investimento públicos, contraindo a demanda agregada, as vendas e os lucros totais, desestimulando o investimento e bloqueando a retomada apoiada na redução de custos.

Os sistemas previdenciário e tributário no Brasil possuem numerosas disfunções e são importantes fontes de desigualdade e ineficiência. Por isso, reformas que os aperfeiçoem são certamente necessárias. Mas, ao contrário do que induzem raciocínios falaciosos, não são elas que trarão os quase 18 milhões de desempregados e desalentados de volta ao trabalho, arrancando a economia da estagnação. Sem um impulso decisivo do governo à demanda, esta não deve perdurar.

*Emilio Chernavsky é doutor em economia pela USP

Redação

Redação

View Comments

  • O reforma da previdência é o pote de ouro do arco-íris, ele está locado na terra do tio sam com acesso restritíssimo.
    A reforma da previdência cuidará do bem estar do corpo e da salvação da alma.
    A reforma da previdência......etc. etc.

Recent Posts

Copom reduz ritmo de corte e baixa Selic para 10,50% ao ano

Decisão foi tomada com voto de desempate de Roberto Campos Neto; tragédia no RS pode…

10 horas ago

AGU aciona influencer por disseminar fake news sobre RS

A Advocacia-Geral da União (AGU) entrou com ação judicial pedindo direito de resposta por conta…

12 horas ago

Assembleia Legislativa de SP celebra Dia da Vitória contra o nazismo, por Valdir Bezerra

Para a Rússia trata-se de uma data em que os russos homenageiam os mais de…

13 horas ago

Diálogo com o Congresso não impede cobertura negativa do governo pela mídia, diz cientista

Para criador do Manchetômetro, mídia hegemônica se mostra sistematicamente contrária ou favorável à agenda fiscalista

13 horas ago

Tarso Genro aponta desafios e caminhos para a esquerda nas eleições municipais

O Fórum21 comemorou o seu segundo ano de existência no dia 1⁰ de Maio e,…

13 horas ago

Desmatamento na Amazônia cai 21,8% e no Pantanal 9,2%

A redução no desmatamento ocorreu entre agosto de 2022 e julho de 2023, em comparação…

14 horas ago