As semelhanças de hoje com a contrarrevolução de 32

Da Revista do Brasil

Semelhanças de hoje com aquela tentativa de contrarrevolução

Por Marcio Pochmann

Não desejam tributar o “andar de cima” da sociedade, praticamente isento, mas cortar parcela dos gastos públicos que se direciona ao “andar de baixo” do Brasil

A concretização do movimento golpista em curso de interrupção do governo Dilma, democraticamente eleito em 2014, aproxima-se, guardada a devida proporção, da reconhecida contrarrevolução ocorrida em 1932 (ou revolução constitucionalista). Naquela oportunidade, a aristocracia agrária posicionou-se como força principal do atraso, defendendo a volta da política econômica e social reinante durante a vigência da República Velha (1889-1930) e reagindo radicalmente ao novo agrupamento de classes sociais estabelecido pela ascensão de Getúlio Vargas, por meio da Revolução de 1930.

Nos dias de hoje, a emergência de um governo ­Temer encontra-se ungido pelas mesmas forças políticas do atraso que foram derrotadas continuamente nas últimas quatro eleições presidenciais (2002, 2006, 2010 e 2014). As evidências do momento apontam para o interesse no retorno do acordo de classes sociais que governou o Brasil durante os anos de 1990, quando a política econômica e social em vigor era a do neoliberalismo.

Em outras palavras, a fase dos lucros gordos e dos salários magros, da pobreza alta e consumo popular baixo, cuja liderança brasileira encontrava-se no ranking dos países de maior desigualdade do mundo. Em vez de o salário mínimo liderar o aumento real no conjunto das demais rendas verificado desde 2003, ele havia se transformado nos anos de 1990 na âncora do empobrecimento das massas trabalhadoras.

Mas os neoliberais envolvidos no atual acordo com Temer querem mais. Sem segredos, eles revelam que não há mais condições de toda a população seguir no mesmo “ônibus” do orçamento público nacional, exigindo, por consequência, a realização de reformas (trabalhista, previdenciária, entre outras) que viabilizem o desembarque dos segmentos mais pobres das contas públicas. Dessa forma, mais recursos sobrariam para agradar, como sempre, aliás, os mais ricos. Não desejam, portanto, tributar o “andar de cima” da sociedade, praticamente isento, mas cortar parcela dos gastos públicos que se direciona ao “andar de baixo” do Brasil.

Um programa econômico e social como esse dificilmente teria apoio político para ser apresentado, por exemplo, no certame eleitoral. As derrotas aos defensores do neoliberalismo nas eleições passadas são exemplos constatados. Diante disso, somente com o ingresso de um governo sem voto popular, derivado do movimento golpista que reage contrariando a mudança da realidade brasileira, cujos sinais de diminuição da miséria e da inversão da curva da desigualdade eram inquestionáveis. Para seguir a ampliação das políticas de inclusão social, o gasto público não deveria ser contido, ao contrário do que os neoliberais apontam como desajuste fiscal.

Nesse sentido, as proposições deles e o ajuste fiscal apontam, como também nos anos de 1990, para redução dos direitos sociais. Com isso, a desobrigação dos gastos nas áreas da educação, saúde, assistência e previdência social.

Também como em 1932, a maior parcela dos brasileiros poderá se posicionar melhor, tendo em vista que as mobilizações observadas até o momento no Brasil de hoje concentram-se fundamentalmente na parte dos rendimentos intermediários para cima da pirâmide social. Novos eventos apontarão para isso.

Redação

Redação

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  • "Mas os neoliberais

    "Mas os neoliberais envolvidos no atual acordo com Temer querem mais. Sem segredos, eles revelam que não há mais condições de toda a população seguir no mesmo “ônibus” do orçamento público nacional, exigindo, por consequência, a realização de reformas (trabalhista, previdenciária, entre outras) que viabilizem o desembarque dos segmentos mais pobres das contas públicas. Dessa forma, mais recursos sobrariam para agradar, como sempre, aliás, os mais ricos. Não desejam, portanto, tributar o “andar de cima” da sociedade, praticamente isento, mas cortar parcela dos gastos públicos que se direciona ao “andar de baixo” do Brasil."

     

    Eis a dura realidade. Estamos lidando com espoliadores do brasileiro mais necessitado.

  • Golpistas: transferência de renda ... para a banca

    Ora, ora, d.Aurora, vão transferir (já estão) todo o orçamento social e de investimentos publicos (essenciais para qualquer nação que se preze) para os bolsos dos financistas, privatas e o pagamento de suas comissões de corretagem e honorários de administração e "capatagem".

    Quando se tira dinheiro da saúde, da educação, da habitação, de fundos soberanos,100 bilhões do BNDES (hoje praticamente a única fonte de capital nacional deste país), as reservas do pré-sal, a paralisação da infraestrutura, estatais produtvas e lucrativas etc. e tal, para cobrir o sacrosanto superavit, que é o tabu intocável, o bezerro de ouro, que custa mais de 400 bilhões ano, vc está redistribuindo renda...

    De quem muito trabalha e pouco tem para quem tem muito e o trabalho é uma diversão social. Do dinheiro fazendo dinheiro, as custas do suor (o produtivo, não o das academias) alheio.

    São os delinquentes do governo contábil, onde há uma parte de ~45% do orçamento da nação que é sagrada, imexível, garantida e pétrea: os juros da banca.

    O resto, qcphodah, digo xplohdah!

     

  • Bom texto, mas que deveria bater mais nas elites paulistas

     

    Marcio Pochmann,

    Gostei do seu comentário e lembrei de algo semelhante que venho enfatizando há mais tempo. De imediato encontrei dois comentários meus estabelecendo relação do golpe do impeachment com a insurreição paulista de 32. É certo que há mais comentários meus que tratam de comparação semelhante, pois lembro que quando do impeachment na Câmara dos Deputados, eu comentei algo em que dizia que torcia para que na declaração de votos alguém dissesse contra o impeachment e contra o Skaf. E já mencionei várias vezes que o impeachment foi financiado por São Paulo (As elites econômicas paulistas) assim como teria sido a mesma elite econômica paulista que financiou a Emenda da Reeleição.

    Penso que cabe aqui trazer ou todo ou parte dos dois comentários ainda no mês de maio em que eu digo que o impeachment da presidenta Dilma Rousseff é a vingança paulista contra a Revolução de 30. O primeiro trata-se de um comentário meu mais antigo enviado segunda-feira, 02/05/2016 às 20:51, para Luis Nassif, junto ao post “O inquérito da PGR contra Aécio Neves é para valer” de segunda-feira, 02/05/2016 às 18:30, de autoria de Luis Nassif e aqui no blog dele e que pode ser visto no seguinte endereço:

    http://horia.com.br/noticia/o-inquerito-da-pgr-contra-aecio-neves-e-para-valer

    E vou transcrever o comentário na íntegra porque lá com problemas no computador, o meu comentário não saiu com a formatação correta. Disse eu lá:

    - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

    “Luis Nassif,

    De certo modo, São Paulo está vingando 19:30. Ali também houve um golpe que na história contada pelos vitoriosos transformou em Revolução. É o benefício da vitória.

    O golpe de agora também será vitorioso e saberá contar uma história diferente. Não me importaria a derrota do PT e da presidenta Dilma Rousseff se, como você, eu fizesse crítica à política econômica adotada no primeiro governo da presidenta Dilma Rousseff e no início do segundo governo dela. No entanto, creio que a política econômica do primeiro governo foi correta e a economia estava recuperando quando as manifestações de junho de 2013 eclodiram com força. E o governo precisava criar uma recessão para resolver o problema da queda dos preços das commodities e a valorização do real em um momento de pressão pela valorização do dólar no mundo, a menos que deixasse a inflação disparar.

    Então para mim o pior é a derrota das idéias. São as idéias que eu defendo que serão derrotadas com o golpe. E mesmo que eu não goste do Aécio Neves, pesa ainda mais saber que, sendo o golpe financiado pelos empresários paulistas, eles não se sacrificarão para proteger o Aécio Neves.

    E não vão proteger o Aécio Neves, ainda que o pai de Aécio Neves seja originário do partido de Arthur Bernardes que em 32 dizia "Quanto a mim fico com São Paulo pois para lá se mudou a alma cívica do povo brasileiro", porque o avo dele era um getulista de sete costados o que é mais que motivo para a elite paulista olhar para ele um tanto ressabiada.

    E a tudo se soma ver a vingança paulista contar na relatoria com um getulista. É uma pena Minas Gerais participar como figuração e ser pelos seus próprios representantes desdenhada.

    E que fique claro. A Constituição de 1988 foi feita para permitir a retirada de alguém que não conta com um terço de apoio no Congresso. Sem os crimes de responsabilidades expressamente definidos, não há governo que não pratique uma irregularidade qualquer. A Constituição foi feita para permitir que sempre possa haver um golpe legal.

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    E encontrei outro comentário meu, avaliando o impeachment como a vingança paulista à Revolução de 30 (Revolução que também quando surgiu foi um golpe como eu disse acima), e ligeiramente mais recente e que foi enviado quinta-feira, 19/05/2016 às 14:35, para Marcelo33, junto ao comentário dele enviado quinta-feira, 19/05/2016 às 11:53, lá no post “Afastada, Dilma concede entrevista a Glenn Greenwald” de quinta-feira, 19/05/2016 às 10:04, e que pode ser visto no seguinte endereço:

    https://jornalggn.com.br/noticia/afastada-dilma-concede-entrevista-a-glenn-greenwald

    O meu comentário não é longo, mas dele eu transcrevo apenas um trecho inicial que é pertinente aqui. Disse eu lá:

    - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

    “Marcelo33 (quinta-feira, 19/05/2016 às 11:53),

    Primeiro é preciso reconhecer que a luta está perdida. Ainda assim só resta lutar.

    Segundo é preciso avaliar em que a luta vai consistir. No caso, parece-me que a luta vai ficar apenas no campo das palavras. E nesse campo, para se ter idéia de quanto a luta será traiçoeira, não se pode perder de vista de que as palavras que permanecem são as dos vencedores. Em suma, lembrando Belchior, “eles venceram e o sinal está fechado para nós”.

    Assim, a luta com palavras, que é o que nos resta, será uma luta cansativa. Vamos ser repetitivos, cansativos e cansados, mas temos que insistir com as mesmas palavras. Temos que dizer, que é um golpe, que é um golpe paulista (E aqui devemos fazer o contraponto com a Revolução de 30 que a seu tempo foi um golpe, só que contra São Paulo e agora São Paulo, isto é, as elites econômicas de São Paulo fazem a vingança), que é um golpe da direita, que é um golpe contra as minorias.

    Tudo que dissermos nesse sentido nos cansará uns aos outros e a nós mesmos, mas precisamos dizer.”

    - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

    E gostei de seu texto, mas considero que por você ser paulista e em razão de suas pretensões políticas, ainda que seja técnico, não foi rigoroso nem com o golpe do impeachment nem com o levante paulista de 32. É claro que os representantes que votaram contra a Dilma Rousseff são da nossa direita espalhada em todo território nacional, mas o cerne da agitação e da deflagração do movimento contra a presidenta Dilma Rousseff veio de São Paulo e foi a elite econômica paulista que, dentro do que era possível a ela fazer, financiou o golpe.

    Clever Mendes de Oliveira

    BH, 24/05/2016

    • Eu também "cantei essa pedra"

      Eu também "cantei essa pedra" aqui no Nassif: golpe eminentemente paulista dado pelos descendentes do golpe de 1932. Esperamos que fracassem da mesma forma. Fora 1932. Fora 2016. Viva o Brasil! Fora a elite paulistana!

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