Cultura

Relembrando ‘Sonhos e Memórias’ de Erasmo Carlos, por Fabiano Oliveira

Relembrando ‘Sonhos e Memórias’ de Erasmo Carlos, por Fabiano Oliveira

Erasmo Carlos – Sonhos e Memórias
Polydor – 1972

Após o Tremendão lançar o incrível Carlos, Erasmo… (em 1971), havia um sentimento de dever cumprido. Sua obra-prima já tinha sido concebida e seria muito difícil superar esse momento divino de inspiração. Eis que surge o Sonhos e Memórias, trabalho que é tão vibrante e maravilhoso quanto o anterior, isso se não superá-lo.

Nessa época, Erasmo estava preocupado em aprimorar sua poesia e a ideia era apresentar uma música mais elaborada e conceitual, ir além da música simples (especialmente nas letras) que ele produziu na época da Jovem Guarda. Analisando a obra num âmbito geral, podemos dizer que ele obteve êxito, pois é nítido o seu amadurecimento vocal, assim como a busca de novas influências (do Rock Progressivo, Bossa Nova e do Samba, por exemplo) e a evolução musical no quesito arranjo. Tudo isso é perceptível já na primeira audição do álbum.

Claro, essa sonoridade foi alcançada também pela inquestionável competência dos produtores Jairo Pires e Guti. Jairo tinha produzido os Vips, os primeiros álbuns do Tim Maia e estava em ótima fase. Os anos em que trabalhou na CBS foram cruciais para credencia-lo como um dos principais produtores do país. Com todo esse cartaz e com o prestígio que o Erasmo já possuía, foi possível selecionar ótimos músicos, que deram um tom imenso de grandiosidade ao disco.

Lafayette, Jorge Amiden, Zé Roberto Bertrami, Alex Malheiros e Ivan Mamão (do Azymuth), Tavito, Paulo César Barros e Luiz Paulo, são alguns dos grandes artistas que tocaram no disco. Time de primeiríssima linha!!

A belíssima arte da capa é uma legítima representação do título do disco. Alguns dos grandes momentos da humanidade são lembrados aqui por figuras ilustres, essenciais na história do mundo. Só pra citar alguns, Elvis Presley, Marilyn Monroe, John Lennon, Jimi Hendrix, Jesus Cristo, Charles Chaplin, John F Kennedy, Brigitte Bardot, Emerson Fittipaldi e Muhammad Ali.

Todas as músicas de Sonhos e Memórias foram compostas por Erasmo e Roberto Carlos. Isso só vem confirmar a genialidade dessa dupla tão especial.

Pra começar, a hipnótica “Largo da 2ª feira”, canção suave e irretocável. A seguinte, “Mané João”, tem um belo violão e uma percussão suingada, ao melhor estilo Jorge Ben. Essa versão é tão matadora quanto a do Teo Azevedo, gravada dois anos depois no clássico Grito Selvagem.

“Bom Dia Rock N Roll” é maravilhosa, talvez a principal canção do disco. Trata-se de uma explícita homenagem do Erasmo aos seus heróis, que tanto fizeram pela propagação do Rock N Roll no mundo.

Já a canção “Grilos” mostra bem a maturidade de sua música. Bela poesia e até uma guitarra havaiana. Incrível!

“Minha Gente” e “Mundo Cão” são semelhantes, com elementos do Rock Progressivo, mas de uma forma moderada.

O Lado 2 começa com “Sorriso Dela”, que se destaca pela linha de baixo e também pelos fraseados de guitarra. “Sábado Morto” tem o poder de iludir o ouvinte. Começa de uma forma suave, intimista e de uma hora pra outra, surge um solo de guitarra potente e visceral, que faz toda a diferença. Música essencial na carreira do Erasmo.

Arrisco-me a dizer que sua versão para “É Proibido Fumar” é a melhor de todas já gravada até hoje. Grande porrada!

“Vida Antiga” e “Meu Mar” também são deslumbrantes e mostram “a cara” da década de 70, talvez o melhor período da música brasileira.

Pra finalizar, “Preciso Encontrar Um Amigo”, que se não é tão genial como a versão dos Mutantes, não faz feio, muito pelo contrário. O Lafayette dá um show nessa canção!!

Após esse disco, o Tremendão ainda continuaria respirando Rock N Roll e lançaria o majestoso 1990- Projeto Salva Terra e o ótimo Banda dos Contentes, até partir para uma outra fase de sua carreira.

A história do Rock Brasileiro se confunde com a história do Erasmo Carlos. Poucos artistas se dedicaram tanto a esse estilo musical quanto ele e até por isso, qualquer homenagem ainda parece pouco. Mas vamos lá, afinal, é essencial reverenciar sua obra, até para aprendermos um pouco mais o valor da arte no mundo.

Músicas eternas, discos eternos… essa é a linda trajetória do Erasmo Carlos.

Fabiano Oliveira, músico / crítico musical

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Redação

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