Qual será o modelo de crescimento da indústria?, por Antônio Diegues

no Valor

Qual será o modelo de crescimento da indústria?

Por Antônio Diegues

A divulgação dos indicadores de desempenho da indústria brasileira nas últimas semanas parece ter fomentado a percepção por parte de alguns analistas de que enfim estaríamos nos aproximando de um ponto de inflexão, após uma longa prostração que se aprofundou nos últimos dois anos.

A tese defendida é a de que a melhora dos indicadores de confiança empresarial seria o catalisador da retomada do crescimento industrial. Essa retomada, por sua vez, seria potencializada por uma taxa de câmbio que impulsionaria a competitividade da indústria local e por algo como o destravamento do potencial de crescimento represado nos governos Dilma.

Entretanto, apesar desta percepção ter reverberado inclusive entre as entidades de classe empresariais, parece­me que há um descolamento entre a recente inflexão nas expectativas e a ausência de bases estruturais para a construção de um modelo a partir do qual se sustentaria um novo ciclo de crescimento da indústria brasileira. Assim, a crença na retomada do dinamismo manufatureiro estaria fundamentada mais na tentativa de construção de um estado de expectativas que, ao fomentar o que Keynes denominava de “animal spirits”, leve a uma profecia auto­realizável do que na criação de um sólido modelo de crescimento.

Destaco a centralidade de tal questão, pois apesar da desaceleração recente, entre os governos Lula e Dilma a indústria local foi capaz de ao menos garantir sua capacidade de acumulação em patamares bastante razoáveis por meio de dois modelos distintos, razoavelmente protegidos da intensa volatilidade das expectativas de curto prazo.

Entre 2003 e 2010 o desempenho da indústria brasileira amparou­se em um modelo de organização e acumulação denominado por este autor em outros artigos de “doença brasileira”. Essa seria caracterizada por um cenário em que se observa a coexistência de um processo de especialização regressiva da estrutura produtiva, com fortes indícios de desindustrialização, em paralelo à manutenção e até à ampliação da acumulação do capital industrial. Tal acumulação, por sua vez, estaria associada à emergência de estratégias crescentemente desvinculadas do desempenho estritamente produtivo.

Ou seja, entende­se que a indústria brasileira conseguiu se adaptar e reconfigurar suas atividades produtivas, reduzindo gradativamente o conteúdo local adicionado a sua produção. Essa redução foi acompanhada pelo crescimento da importação de produtos finais, partes, peças e componentes a baixo custo e viabilizou o aumento da massa e da margem de lucro dos setores industriais.

De maneira complementar, um elemento externo e um interno contribuíram para sustentar o modelo de crescimento industrial vigente no governo Lula. Na dimensão externa, destacam­se os impactos do boom das commodities no dinamismo dos setores intensivos em recursos naturais. Já na dimensão interna, a expansão do consumo das classes populares fomentada pelo aumento da massa salarial, do crédito e do emprego formal garantiriam a sustentabilidade do ciclo pelo menos até o final da década.

Com o esgotamento dessas fontes de dinamismo, o desafio do governo Dilma parecia ser reconfigurar o modelo de crescimento industrial a partir de transformações qualitativas que promovessem o incremento da competitividade. É neste contexto que se situa um amplo conjunto de medidas defendidas inclusive pelas entidades representativas da indústria, as quais tinham como objetivo reduzir o Custo Brasil. Dentre elas, destacam-se a desoneração da folha de pagamentos, a redução relativamente generalizada das alíquotas do IPI e do custo do crédito via diminuição dos spreads dos bancos públicos, a tentativa de redução do custo da energia elétrica, o protelamento do reajuste das tarifas públicas e dos derivados de petróleo, entre outras.

Em paralelo, a pauta industrialista de Dilma I foi complementada por medidas para garantir a desvalorização cambial, pela tentativa de redução da Selic e pela manutenção de elevados volumes de crédito concedidos a juros subsidiados pelo BNDES.

Apesar do fracasso do modelo de industrialismo assistencialista de Dilma I no que se refere à retomada do ciclo de crescimento e investimento, os fartos benefícios fiscais e tributários concedidos à indústria local foram capazes de sustentar sua rentabilidade em patamares bastante razoáveis. Apenas a título de ilustração, vale lembrar que, segundo a Receita Federal, as desonerações de tributos concedidas pelo governo Dilma desde 2011 somarão cerca de R$ 458 bilhões em 2018.

Entretanto, com a reversão profunda do cenário econômico no período recente, a insustentabilidade da continuidade deste modelo torna­se patente. Não suficiente, agregue­se a este cenário a enorme dificuldade de se reproduzir as características do modelo de crescimento industrial que vigorou na primeira década dos anos 2000.

Assim, ao se analisar a percepção de economistas e entidades empresariais acerca da suposta emergência de um novo ciclo amparado fundamentalmente na melhora das expectativas, apresentam­se muitas incertezas sobre quais seriam as bases de demanda efetiva que sustentariam o modelo de crescimento pós­industrialismo assistencialista.

Antônio Carlos Diegues é professor Adjunto III do Departamento de Economia da Universidade Federal de São Carlos, Coordenador do Grupo de Pesquisa em Economia, Tecnologia e Desenvolvimento (GPETeD)

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

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  • A única inflexão que teremos
    A única inflexão que teremos com este governo, é a genuflexão de Serra aos interesses estrangeiros.

  • retomada da confiança ou

    será que eles finalmente ficaram com as máquinas ociosas e agora não porque reclamar.

    Sim, as medidas fiscais fizeram efeito, agora a oferta superou a demanda e os empresários tem que vender ou ... perdem o mercado para o primeiro que sair atirando!

  • Industrialismo Assistencialista é expressão crítica ou elogiosa?

     

    Antônio Diegues,

    Falo não como economista que não sou, mas como quem acompanha a economia brasileira há mais de 40 anos e que já no início da década de 70 ia na biblioteca da FACE/UFMG ler os Relatórios Anuais do Banco Central do Brasil para ter uma ideia contextualizada da realidade econômica brasileira. E que no início da década de 80 achava que a intervenção do FMI com a desvalorização de 30% não conseguiria resolver a nossa impossibilidade de pagamento da dívida externa. Surpreendi-me a ver o saldo na Balança Comercial atingir U$ 1 bilhão por mês. Até então eu acompanhava o saldo anual na Balança Comercial. E surpreendi-me com a recuperação da economia brasileira que já no segundo semestre de 1984 crescia a uma taxa de 6% ao ano, quando se considerava a taxa anualizada. A expectativa com a recuperação sustentável da nossa economia foi demolida com o Plano Cruzado.

    De todo modo, da década de 90 em diante, eu passei a acompanhar a Balança Comercial pelo seu saldo semanal. Temi o efeito destruidor do Plano Real desde o seu nascedouro, pois sabia que ele para dar certo teria que destruir a recuperação econômica brasileira via comércio exterior.

    Faço agora um preâmbulo que parecerá mais como uma fuga ao assunto. Hoje, estava lendo o post “Temer ficha-suja? Entenda como o interino pode ser candidato a presidente” de segunda-feira, 01/08/2016 às 15:43, e fiquei sem entender o post. O Jornal GGN é um jornal paulista, e, portanto, a notícia que ele transmite tem um viés paulista. O viés paulista significa em linhas gerais ficar a favor do golpe, ou dito de outro modo, ficar a favor de Michel Temer, o presidente, por ora interino, às custas do golpe. Fiquei sem entender o título. Eu já havia mencionado em dois pontos sobre o assunto que quem repercutia a notícia de Michel Temer ficha suja era a elite representativa dos interesses econômicos e financeiros paulistas que queria dar aos que tinham certo temor de uma possível candidatura de Michel Temer em 2018, uma garantia de que não haveria essa candidatura.

    Dai a razão dos meus comentários junto aos posts “O xadrez do impeachment de Temer-2018 pela lei da ficha limpa” de terça-feira, 03/05/2016 às 23:46, aqui no blog de Luis Nassif e de autoria dele, dentro da série que ele intitulou “O Xadrez do Golpe”, “TRE confirma que Temer está inelegível por oito anos” de sábado, 04/06/2016 às 09:07, também aqui no blog de Luis Nassif e com matéria do Jornal GGN, e “Se TSE não reverter condenação em 30 dias, Temer é ficha-suja” de quarta-feira, 20/07/2016 às 17:05, também aqui no blog de Luis Nassif e contendo matéria do Jornal GGN.

    O endereço de cada um dos três posts mencionados acima e do primeiro que eu mencionara antes é:

    1) O post “Temer ficha-suja? Entenda como o interino pode ser candidato a presidente” pode ser visto no seguinte endereço:

    https://jornalggn.com.br/noticia/temer-ficha-suja-entenda-como-o-interino-pode-ser-candidato-a-presidente

    2) O post “O xadrez do impeachment de Temer-2018 pela lei da ficha limpa” pode ser visto no seguinte endereço:

    https://jornalggn.com.br/noticia/o-xadrez-do-impeachment-de-temer-2018-pela-lei-da-ficha-limpa

    3) O post “TRE confirma que Temer está inelegível por oito anos” pode ser visto no seguinte endereço:

    https://jornalggn.com.br/noticia/tre-confirma-que-temer-esta-inelegivel-por-oito-anos

    4) O post “Se TSE não reverter condenação em 30 dias, Temer é ficha-suja” pode ser visto no seguinte endereço:

    https://jornalggn.com.br/noticia/se-tse-nao-reverter-condenacao-em-30-dias-temer-e-ficha-suja

    Minha intervenção junto aos posts “TRE confirma que Temer está inelegível por oito anos” e “Se TSE não reverter condenação em 30 dias, Temer é ficha-suja” foi de censurar a visão acrítica do Jornal GGN que dera a notícia supondo que ela fosse ruim para Michel Temer, o presidente, por ora interino, às custas do golpe, quando na verdade tratava-se de uma espécie de trunfo estratégico dele, para contar com mais apoiadores para votar favoravelmente ao impeachment da presidenta Dilma Rousseff.

    Só que o último post, o primeiro da relação acima e intitulado “Temer ficha-suja? Entenda como o interino pode ser candidato a presidente” e que traz matéria do Jornal GGN, traz já no primeiro parágrafo a seguinte afirmação:

    “Seria um suicídio político do interino Michel Temer admitir, a esta altura do campeonato, que ele tem pretensão de ser candidato a presidente pelo PMDB em 2018. A atual base governista, conquistada com alianças com PSDB e DEM, entre outros, sofreria um racha e tornaria o Congresso ingovernável para o presidente em exercício. Ele sabe disso, e não à toa se esforça para desmentir os "boatos" na imprensa.”

    Tal afirmação significava que o Jornal GGN finalmente percebera que ser considerado ficha suja é trunfo de Michel Temer, o presidente, por ora interino, às custas do golpe.

    Assim, eu fiquei surpreso com o teor do post “Temer ficha-suja? Entenda como o interino pode ser candidato a presidente” que trazia a mensagem que Michel Temer, o presidente, por ora interino, às custas do golpe, poderia via TSE reverter a decisão do TER-SP.

    Enfim, a gente fica sem saber qual é o real interesse na notícia tal qual ela está sendo transmitida. Em princípio trata-se de uma notícia pró presidenta Dilma Rousseff dada em um jornal paulista que aparentemente tem um viés pró São Paulo e, portanto, pró impeachment e, portanto, pró Michel Temer, o presidente, por ora interino, às custas do golpe.

    E fiquei surpreso quando vi ao final do post um comentário, um tanto fora do ambiente propício para ele, e de sua autoria e que dizia o seguinte:

    - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

    “Prezado Nassif,

    Sou Professor do Departamento de Economia da Universidade Federal de São Carlos, onde o Sr. participou de nossa Semana da Economia em 2011 a meu convite. A palestra versava sobre a desindustrialização.

    Neste mesmo tema, gostaria de submeter à avaliação editorial do GGN e Blog do Nassif artigo publicado na edição de hoje do "Valor" ("Além do industrialismo Assistencialista"). Tal artigo é resultado sintético de um conjunto de pesquisas acadêmicas desenvolvidas na área por mim e outros colegas do IE-UNICAMP, muitos dos quais publicados no Brasil Debate e no Valor.

    O artigo em questão se estrutura em três pilares: a) Uma análise dos distintos modelos de crescimento industrial vigentes desde o início dos anos 2000; b) Uma crítica ao modelo de "Industrialismo Assistencialista" vigente no governo Dilma e c) Uma síntese das limitações do atual modelo industrial Temer-Meirelles, fundamentando num suposto ciclo de expectativas que prescindiria - pasmem - de demanda efetiva.

    Antecipadamente grato,

    Antônio Carlos Diegues, professor Adjunto III do Departamento de Economia da Universidade Federal de São Carlos, Coordenador do Grupo de Pesquisa em Economia, Tecnologia e Desenvolvimento (GPETeD)”

    - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

    E você deixava ainda dois links no seu comentário. O primeiro link é o mesmo que consta junto ao título do seu artigo “Qual será o modelo de crescimento da industrial?” e que fora publicado no jornal Valor Econômico e o segundo link é o seguinte:

    http://l.facebook.com/l.php?u=http%3A%2F%2Fwww.valor.com.br%2Fopiniao%2F4653737%2Fqual-sera-o-modelo-de-crescimento-da-industria&h=kAQGM4m0W

    Eu interessei-me pelo seu artigo principalmente em razão da letra b) do parágrafo em que você descreve um dos três pilares em que o seu artigo se estrutura. Na letra b estava escrito:

    “b) Uma crítica ao modelo de "Industrialismo Assistencialista" vigente no governo Dilma e”

    Quando eu li a expressão “Industrialismo Assistencialista”, eu fiquei pensando qual seria a razão para que todo o esforço do governo da presidenta Dilma Rousseff orquestrado de modo o mais racional possível fosse apelidado de “Industrialismo Assistencialista”. E me entristecia mais ainda que tal apelido era dado em um trabalho técnico.

    E a tristeza era maior por saber que todo o esforço racionalmente orquestrado pela presidenta Dilma Rousseff fora totalmente destruído ali nas manifestações de junho de 2013, e que desde então o esforço tem sido criticado de modo implacável. E se a presidenta Dilma Rousseff não errou, como é que ficariam os críticos e as críticas?

    Infelizmente a moral correta é a do vencedor e o destino da presidenta Dilma Rousseff como o de toda a equipe econômica será o do ostracismo. A história não terá como mostrar que a política econômica da presidenta Dilma Rousseff no primeiro mandato fora a correta, e dado que a política fracassou, a história não terá clemência ao descrever a política econômica do primeiro governo da presidenta Dilma Rousseff. Nem do segundo governo quando dado o fracasso do primeiro governo ela não teve alternativa senão adotar uma política econômica de austeridade em que a economia seria relançada pelo mercado externo.

    Quando vi que o primeiro post na aba “Últimos Conteúdos GGN” era “Qual será o modelo de crescimento da indústria?, por Antônio Diegues” de segunda-feira, 01/08/2016 às 19:28, eu não perdi dois segundo para vir para cá. Eu ia poder descobrir por que você chamou a política industrial do governo da presidenta de Dilma Rousseff de “Industrialismo Assistencialista”.

    O que eu li aqui neste post sobre a política econômica da presidenta Dilma Rousseff foram os dois parágrafos que transcrevo a seguir:

    “Com o esgotamento dessas fontes de dinamismo, o desafio do governo Dilma parecia ser reconfigurar o modelo de crescimento industrial a partir de transformações qualitativas que promovessem o incremento da competitividade. É neste contexto que se situa um amplo conjunto de medidas defendidas inclusive pelas entidades representativas da indústria, as quais tinham como objetivo reduzir o Custo Brasil. Dentre elas, destacam-se a desoneração da folha de pagamentos, a redução relativamente generalizada das alíquotas do IPI e do custo do crédito via diminuição dos spreads dos bancos públicos, a tentativa de redução do custo da energia elétrica, o protelamento do reajuste das tarifas públicas e dos derivados de petróleo, entre outras.

    Em paralelo, a pauta industrialista de Dilma I foi complementada por medidas para garantir a desvalorização cambial, pela tentativa de redução da Selic e pela manutenção de elevados volumes de crédito concedidos a juros subsidiados pelo BNDES.”

    Embora você tenha dito de modo mais técnico e completo, o que você diz não difere muito do que eu disse em comentário que eu enviei sábado, 29/08/2015 às 17:27, para Antonio Ateu junto ao post “Crise: A Troika Brasileira” de sábado, 29/08/2015 às 19:46, aqui no blog de Luis Nassif em que por sugestão de Antonio Ateu se trouxe uma matéria de Márcia Pinheiro, publicada no site Revista Brasileiros com o título “A nossa troika está aqui” em que se dava destaque a entrevista concedida por Luiz Gonzaga Belluzzo.

    O endereço do post “Crise: A Troika Brasileira” é:

    https://jornalggn.com.br/blog/antonio-ateu/crise-a-troika-brasileira

    E o meu comentário para Antonio Ateu é o seguinte:

    - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

    “Antonio Ateu,

    Gosto muito de ler os textos de Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo. Como um leigo eu tenho muito a que apreender com quem conhece bastante a história da economia mundial e brasileira.

    Agora, mesmo para um leigo, não há como não considerar sem fundamento ele comparar a situação brasileira com a grega. Talvez durante a política econômica de Guido Mantega podia-se fazer essa comparação à medida em que a Grécia e o Brasil precisaram adotar o que se convencionou chamar de desvalorização fiscal. No artigo “É o câmbio, é o câmbio...” publicado no jornal Valor Econômico, de terça-feira, 31/01/2012, Antonio Delfim Netto menciona o trabalho acadêmico “Fiscal Devaluations” (NBER - Working Paper 17.662, de dezembro/ 2011). O artigo de Antonio Delfim Netto originou aqui no blog de Luis Nassif no post “O euro e homogeneidade de interesses, por Delfim Netto” de terça-feira, 31/01/2012 às 10:03, e que pode ser visto no seguinte endereço:

    https://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/o-euro-e-homogeneidade-de-interesses-por-delfim-netto

    E, como eu abordei em comentário que enviei quarta-feira, 01/02/2012, para junto do comentário de Luiz Eduardo Brandão enviado terça-feira, 31/01/2012 às 12:47 para junto do comentário de Eduardo Ramos de terça-feira, 31/01/2012 às 10:24, é exatamente sobre a utilização da política tributária em substituição da desvalorização cambial o assunto do artigo “Fiscal Devaluations” e de autoria de Emmanuel Farhi, Gita Gopinath, and Oleg Itskhoki e que pode ser encontrado no seguinte endereço:

    http://www.nber.org/papers/w17662.pdf

    Naquele período era impossível desvalorizar a moeda dada a adoção da política de Quantitative Easing nos Estados Unidos. Até que a Zona do Euro tinha condições de fazer políticas semelhantes de Quantitative Easing e assim desvalorizar o Euro, mas o Brasil tinha que buscar mecanismos fiscais para tornar a economia brasileira mais competitiva. Essa é a origem de muitas das políticas adotadas por Guido Mantega e criticadas pelos que se dizem entendidos. Assim de imediato lembro que a redução do preço da Energia (que foi feita também para uniformizar decisões conflitantes sobre o preço de energia estabelecida por instâncias jurídicas distantes: primeira instância, tribunais superiores, Tribunal de Conta da União) e a substituição obrigatória da contribuição sobre a folha de pagamento por um imposto que pudesse incidir sobre o importador tinham esse viés de tornar a produção brasileira mais competitiva.

    Agora não. Agora o Brasil tem a desvalorização da moeda enquanto a Grécia não tem. Assim, o Brasil pode adotar políticas de austeridade porque a economia se recuperará pelo lado do comércio exterior. Tanto via aumento das exportações, ainda que em dólares as exportações possam ter caído, como via substituição das importações pela produção interna. Assim, até um leigo percebe que essa comparação entre o Brasil e a Grécia feita pelo Luiz Gonzaga de Mello Belluzzo é despropositada e compromete o nome dele entre os grandes economistas brasileiros. E nós temos também inflação que conseguem fazer com muito mais eficiência o acerto nos preços relativos na economia.

    E desacreditar o Joaquim Levy pela crítica às expectativas é também muito pobre porque pensar que Joaquim Levy foi indicado para gerar expectativas só entra na cabeça daqueles que imaginam que as expectativas são fundamentais para relançar a economia brasileira. E só pensam assim os cabeças ocas. E já devia ter ficado claro para quem pretende fazer análises com um mínimo de racionalidade e consistência que a presidenta Dilma Rousseff não é cabeça oca.”

    - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

    Se eu elogio a política econômica da presidenta Dilma Rousseff com um texto de leigo e você apresenta esse mesmo elogio de modo técnico e consistente, eu fiquei a imaginar qual a razão para você chamar essa política econômica de “Industrialismo Assistencialista” que me pareceu um título crítico. O jornal Valor Econômico é um jornal paulista. São Paulo é um dos pilares do golpe contra a presidenta Dilma Rousseff. Será que a expressão seria uma forma de o artigo ser aprovado para publicação. Ou será que você considera que para países em desenvolvimento o assistencialismo é necessário?

    E mudando um pouco de assunto, mas considerando o item c referente ao terceiro pilar em que sustenta o seu artigo, e que diz respeito à política econômica do governo Michel Temer, o presidente, por ora interino, às custas do golpe, creio que ela só não será exitosa se ele deixar o real valorizar. Se o real voltar ao intervalo de 3,7 a 4 dólar sem dúvida que a economia brasileira vai se recuperar.

    A grande dificuldade de defender a moeda desvalorizada é que para qualquer pessoa com formação superior, e no caso dos economistas muitos têm doutorado, é inaceitável uma moeda desvalorizada, pois essas pessoas com maior qualificação educacional perdem todo o poder de compra que eles têm no mercado mundial. O trabalhador nacional acaba pagando as regalias do nacional prestador e utilizador de serviço internacional.

    No final da década de 80, eu costumava criticar essa política de valorização da moeda defendida por pessoas com formação superior dizendo que dias virão em que a China e a Índia estarão formando gênios a preço de banana e ai os nossos doutores em economia não sentirão tão confortáveis assim nas relações internacionais.

    E aproveito o ensejo para solicitar ao professor pesquisador que realize uma pesquisa profunda sobre a Formação Bruta de Capital Fixo no primeiro governo da presidenta Dilma Rousseff. Há um bom tempo eu espero que algum professor e pesquisador econômico faça um levantamento do crescimento dos investimentos no quarto trimestre de 2012, no primeiro e no segundo trimestre de 2013, desagregue todos os componentes do investimento e depois explique qual a razão do crescimento expressivo nos três trimestres mencionados e depois a reversão no terceiro trimestre de 2013. Talvez o estudo permita concluir porque o “Industrialismo Assistencialista” não deu certo.

    Clever Mendes de Oliveira

    BH, 01/08/2016

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