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ADPF 811: o novato proferiu um voto histórico, mas isso não é um elogio, por Fábio de O. Ribeiro

ADPF 811: o novato proferiu um voto histórico, mas isso não é um elogio

por Fábio de Oliveira Ribeiro

O Ministro Nunes Marques proferiu um voto que pode muito bem ser chamado de “velhaco”. Ele focou seu pronunciamento no direito de culto e não no dever que todos cidadãos têm de evitar a propagação de uma doença letal dentro e fora de sua comunidade religiosa.

Matar é crime e deixar matar, quando se pode impedir alguém de fazer isso, também é crime. O vírus COVID-19 é letal, portanto, pode ser considerado uma arma biológica de destruição em massa. O manuseio dessa arma não é permitido a nenhum cidadão, seja ele evangélico ou não.

Esse é o ponto relevante: o que se está sendo debatido não é o direito de culto e sim o privilégio dos pastores ou não de manusear uma arma de destruição em massa para causar a morte dos fiéis, dos demais cidadãos e daqueles que ficarão sem internação em razão do colapso do SUS.

Nada disso é objeto de reflexão no voto do Ministro Marques Nunes. Ele não pisa nesse terreno minado, mantendo o foco apenas no tema que lhe interessa.

O jogo dele é sujo. Ele cita e valoriza um precedente da Suprema Corte dos EUA apontando as semelhanças entre o Brasil e aquele país. Mas ele omite o principal: a vacinação em massa avança velozmente nos EUA; no Brasil ela não ocorre porque é sabotada pelos evangélicos.

Esse tipo de falácia jurídica é simplesmente nojenta. Coisa de rábula que odeia a ética e aprecia confundir verdade e inverdade para transformar o discurso jurídico numa modalidade do que o filósofo Harry G. Frankfurt chamou de “falar merda”.

Outra sujeira é dizer que o decreto proíbe qualquer atividade religiosa. Isso é mentira. Ninguém foi proibido de praticar sua religião em casa. O que religa o fiel ao seu deus não é o culto ou o templo e sim um estado de espírito, que pode ser alcançado em qualquer lugar.

Toda argumentação dele tem como foco o direito de culto. Ele não julga qualquer coisa que limite esse direito, como por exemplo o direito à vida dos cidadãos em geral e a necessidade administrativa de prevenir o total colapso do SUS. O direito de culto é tratado como absoluto.

Esse absolutismo do direito de culto é repelido pelo sistema jurídico-constitucional brasileiro. Primeiro, porque nosso regime político não é teocrático. Segundo, porque há uma imensa gama de direitos que também devem ser considerados quando se julga uma questão constitucional.

Na prática, o Ministro Nunes Marques deu aos pastores o direito de causar a morte dos fiéis e dos cidadãos em geral. Eles terão o privilégio de manusear uma arma biológica de destruição em massa. Ele já foi visto/fotografado num culto evangélico lotado na periferia de Brasília?

Redação

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