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A estratégia do grupo Ultra

Coluna Econômica – 21/03/2007

A Tríplice Aliança – Petrobrás, Ultra e Braskem – para a compra da Petróleo Ipiranga tem, por trás de cada aliado, motivações estratégicas diversas.

A operação que preservou em mãos brasileiras uma empresa de capital nacional, sem precisar recorrer ao BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social). Foi facilitada pelo fato da Ipiranga estar sendo bem administrada. Seus problemas eram decorrência exclusiva de conflito entre acionistas.

O grupo Ultra ficou com a parte da distribuição, o correspondente a 15% do mercado brasileiro. O pagamento será feito com emissão de ações do grupo, sem mexer no seu caixa. O faturamento multiplicará por cinco e a geração de caixa por dois, preservando os recursos acumulados até agora.

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Os ganhos para o grupo Ultra são da seguinte ordem.

Haverá sinergia com a distribuição de gás na parte administrativa, na logística, tanto nas bases quanto na programação, na tecnologia de distribuição e no relacionamento com revendedores.

Além, disso, o Ultra é uma das empresas que aprendeu a trabalhar com choques de gestão, programas de qualidade e ganhos de eficiência. Embora a Ipiranga estivesse sendo bem administrada, percebeu-se possibilidades de bons ganhos adicionais com melhoria de processos.

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A grande aposta do grupo é que a distribuição de combustíveis será fundamentalmente modificada com a entrada do álcool na matriz energética. Na prática, quebra-se o monopólio da Petrobrás do refino.

Além de passar a dominar 15% da distribuição, o grupo Ultra vem trabalhando na alcoolquímica, no desenvolvimento de novos processos, inclusive na hidrólise. Todos os processos petroquímicos podem ser refeitos a partir do álcool. Até a Segunda Guerra, a química era de fermentação, com o álcool desempenhando papel relevante. O petróleo a dois dólares brecou todo o desenvolvimento alternativo. No Brasil, até os anos 70, produzia-se eteno a partir do álcool, tanto pela Salgema quanto pela Union Carbide. Mas o álcool era subsidiado.

Agora, com aperfeiçoamento tecnológico, redução dos custos, nova relação de custo álcool/petróleo, esses processos estão sendo desengavetados. Os pesquisadores estão limpando as gavetas e retirando velhos projetos adormecidos.

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A nova empresa terá um novo fôlego econômico-financeiro. A aquisição quintuplicará o faturamento do grupo, dobrará a geração de caixa, e preservará os recursos que têm para investimento, mantendo o endividamento zerado.

No ano passado o grupo tentou sua primeira aquisição internacional, a Uniquema, divisão da ICI, com fábricas em quatorze países e um departamento avançado de pesquisa. Chegou a dar um lance de US$ 900 milhões, mas perdeu para um concorrente inglês que ofereceu US$ 1 bi. Com o aumento do tamanho e da geração de caixa, o Ultra já tem em mira outras compras externas.

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O último ganho do grupo é a possibilidade de entrar em um setor que tem um “hedge” natural contra eventuais futuras oscilações no câmbio. Cerca de 40% de seus ativos estarão defendidos contra vulnerabilidades futuras da política econômica brasileira.

Para incluir na lista Coluna Econômica

Luis Nassif

Luis Nassif

View Comments

  • Nassif, bom dia.

    Por falar
    Nassif, bom dia.

    Por falar em ganho, a pergunta que fica no ar é a seguinte: Como ficará a investigação sobre o vazamento de informações no caso da venda da Ipiranga, cuja ações tiveram uma alta em torno de 70% na sexta-feira, e a venda concretizada no domingo? Penso que terminará em uma suculenta pizza. Ninguém viu nada, não ouviu nada e não sabe de nada.

    abraços,

  • Nassif, bom dia.
    Ontem já
    Nassif, bom dia.
    Ontem já fiz um comentário sobre a matéria. A pergunta, já que estamos falando de ganho, é a seguinte: O que irá acontecer com a investigação sobre o vazamento de informações na venda da Ipiranga, cuja ações tiveram uma alta de quase 70% na sexta-feira, e no domingo foi anunciada a venda? Penso que irá terminar numa suculenta pizza.

    abraços

  • Nassif,
    Uma pequena correção:
    Nassif,
    Uma pequena correção: nos anos 70 produzia-se eteno a partir do álcool, e não o contrário.
    Ãbraços

  • Nassif,

    Assim também torço,
    Nassif,

    Assim também torço, mas a verdade é que os casos onde há punição, são aqueles onde as transações são feitas por amadores. Mesmo o Murat da Sadia, podia trabalhar na área, mostrou incompetência no uso de informação privilegiada.

    Basta introduzir uma offshore para a CVM ficar de mãos atadas. Eles até levantam junto a corretora quem operou no papel, mas jamais vão conseguir descobrir quem está por trás da offshore.

    Existe muito a ser feito para ter, como os americanos adoram dizer, um 'playing field' nivelado. Mesmo no caso da Ipiranga, apesar do volume elevado, o preço estava bem distinto da oferta de tag along. Isso tende a indicar que as pessoas sabiam das reuniões da empresa, mas não tinham detalhes exatos de como ocorreria a transação.

    Para uma transação ocorrer sem vazamento de informações, considerando as dezenas de pessoas envolvidas, só realmente introduzindo penas elevadas e pegando pessoas para serem exemplos. O próprio Murat, em minha opinião, deveria ter sido banido pra sempre de assumir qualquer cargo em empresa pública.

  • O mercado de distribuição de
    O mercado de distribuição de combustíveis ganha um forte concorrente, com experiência, sinergias e caixa, muito caixa. Creio que até o final do ano haverão alguns movimentos interessantes de consolidação nesse mercado.

    Nassif, fico na espera da sua análise sobre a Braskem e a Petrobras.

  • Nassif,

    Bela análise.
    Nassif,

    Bela análise. Continue com estes tópicos sobre empresas, são muito interessantes. Os grandes jornais somente fazem a mesma descrição boba dessas transações...

  • Um ponto que chamou-me a
    Um ponto que chamou-me a atenção nesta "Tríplice Aliança" é que na área de distribuição de gás o grupo Ultra e a Petrobrás são concorrentes. Há poucos anos, a Petrobras comprou a Agip e o grupo do senhor Paulo Cunha adquiriu logo em seguida o controle da Shellgás, tornado-se assim líder na distribuição de GLP com 24,5%. Lembrando ainda que em 2001, o Grupo Ultra entrou com todas as suas garras no leilão da Copene e mesmo com suporte do BNDES acabou não logrando seu intento. Caso esta empreitada fosse bem sucedida, o grupo Ultra seria uma das maiores potências mundiais do setor petroquímico. Será que com a compra do tradicional grupo Ipiranga o voraz apetite do senhor Paulo Cunha estará agora de vez saciado?

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