Economia

A saga judaica no Brasil

Publicado originalmente em 12/03/2007

Está firme no Rio de Janeiro, cuidando de sua ONG voltada para o meio-ambiente, a testemunha de uma das mais audaciosas experiências tecnológicas brasileiras. Trata-se de Israel Klabin, último sobrevivente -porque bem mais moço—da tentativa de consolidação da Orquima, como uma indústria química de ponta no Brasil.

Na Segunda Guerra houve o êxodo judeu da Europa. Os Estados Unidos foram extraordinariamente beneficiados pelos cérebros que foram atrás de um porto seguro. No Brasil, a migração de judeus se deveu a alguns abnegados, entre os quais um diplomata intelectualizado de nome João Guimarães Rosa.

Wolf Klabin, o patriarca da família, era casado com a filha de Arthur Haas, empresário francês cuja casa era freqüentada por Guimarães Rosa. O pai de Haas tinha sido intendente do exército francês na revolução napoleônica. Francês de nascimento, com a anexação de sua cidade à Alemanha, Haas tentou se radicar na Rússia. Acabou vindo para o Brasil, onde ajudou na construção de Belo Horizonte. Mas sempre manteve relações próximas com as lideranças judaicas no mundo.

Quando estourou a Segunda Guerra, Augusto Frederico Schmidit conseguiu atrair alguns químicos de altíssima categoria, judeus alemães e belgas, alguns recém-saídos de campos de concentração. O mais ilustre era o químico Kurt Weill.

Por insistência de Getúlio Vargas, Klabin acabou se associando à Orquima. As ligações de Getúlio com os Klabin eram antigas. Nas negociações com Franklin Delano Roosevelt, que resultaram na criação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), entrou um acordo paralelo que garantiu à Klabin o fornecimento de placas de aço (cuja produção era quase privativa do exército americano) que permitiram a construção da Klabin Paraná.

***

Wolf conseguiu atrair para o Brasil Joseph Blumenfeld um dos judeus mais ilustres do século, concunhado Chaim Weizmann, primeiro presidente do estado de Israel.

Blumfeld era a grande figura internacional da química atômica e teve papel fundamental na criação do Estado de Israel, graças a uma barganha com a Inglaterra, consubstanciada na chamada “promessa Balfour”. Na Primeira Guerra, Rod Balfour prometeu o apoio inglês ao acordo de divisão do território palestino em troca da produção de acetona sintética, fundamental para o esforço de guerra inglês.

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Junto com os químicos da Orquima, Blumenfeld desenvolveu uma tecnologia de extração do tório das areias monazíticas. Dois fatos concorreram para a Orquima não dar certo. O primeiro, a forte reação nacionalista contra a venda das areias monazíticas. O segundo, o fato da tecnologia do urânio ter saído vitoriosa sobre a do tório.

Com o tempo, a Orquima – que iniciou suas atividades produzindo cafeína – acabou absorvida pela Comissão Nacional de Energia Nuclear, presidida pelo engenheiro Álvaro Alberto.

***

Nos anos seguintes, a casa de Wolf Klabin receberia conspiradores e lideranças judaicas da fase inicial do Estado de Israel, de Golda Méier e Pinhas Safir, político influente de Israel.

Uma política racional poderia ter atraído para o Brasil um contingente enorme de cérebros judeus expulsos pelo nazismo. Mas ficou-se apenas nessa experiência. O país não estava preparado para ser grande.

Para incluir na lista Coluna Econômica

Luis Nassif

Luis Nassif

View Comments

  • NASSIF,
    Mas eu me esquecera
    NASSIF,
    Mas eu me esquecera de lembrar da sua tempestiva lembrança de João Rosa. Ele também fez sua Lista de Schlinder... Fica a dica para os cineastas brasileiros... Só a biografia do homem, de menino de roça, médico dos sertões a diplomata, daria um filme riquíssimo... VC deve saber que o João Rosa adiou por uns oito anos pós nomeação, sua posse na Academia BL, pois achava que morreria após a solenidade. Tomou posse, e me parece que uns três dias depois faleceu ou "encantou-se", como diria o próprio: " contente com sua terra, cançado de tanta guerra, crescido de coração"... Morreu com o coração grande em todos os sentidos, nem tanto pelo mal de chagas que deve ter adquirido medicando no mais profundo sertão. Fica aí também um grande exemplo para os médicos de hoje...

  • NASSIF,
    O que o Brasil
    NASSIF,
    O que o Brasil deveria aproveitar dos judeus é a metodologia milenar da educação, pois sempre vem formando gênios que revolucionaram diversas áreas da cultura. Exemplos? Einstein na Física, Freud na Psicologia, Jesus Cristo na religião... Só pra começar... Já tentei ler sobre o método de educação judeu, mas o máximo que descobri é que passam mel em livros e dão os bebês para se lambuzarem com a sabedoria... Só sei que é o maior sucesso da cultura ocidental, sem falar no dom de ganhar dinheiro que esse povo tem... Quanto a isso, Woody Allen dá uma dica... Conta ele que uma vez se atrasou no colégio e voltou tarde para casa. Chegando lá, descobriu que os pais tinham alugado seu quarto...

  • Doi o Itamarati, na época,
    Doi o Itamarati, na época, que endureceu o jogo. Havia também resistências devido ao fato de, não sei porque razões, os judeus mais abonados preferirem deixar seus bens na Argentina.

  • bem lembrado Nassif. E eu
    bem lembrado Nassif. E eu gostaria de acrescentar, que juntocom esses "cérebros", sempre vieram com corações fieis e que sabem ser gratos por apenas um pouco de tolerancia.
    antonio

  • Não, Sue. Acabei me fixando
    Não, Sue. Acabei me fixando na família Klabin, porque as pesquisas são para uma biografia que estou terminando, de Walther Moreira Salles.

  • Nem aproveitamos o êxodo de
    Nem aproveitamos o êxodo de cérebros russos no início dos anos 90, com a pereistroika.

  • Tenho a impressão que sim.
    Tenho a impressão que sim. Até os anos 80 lembro-me que era figura muito ativa sobre temas ligados à petroquímica.

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