Concentração de Riqueza Financeira em 2017, por Fernando Nogueira Costa

Concentração de Riqueza Financeira em 2017

por Fernando Nogueira Costa

A ANBIMA publicou seu importante Relatório de Varejo e Private para estudarmos a concentração de riqueza no Brasil. No final de 2017, o total de recursos alocados nos segmentos Private Baking (“ricaços”) e varejo, desconsiderando as aplicações em Previdência Complementar, alcançaram R$ 2,6 trilhões, um crescimento de 11,2% em relação à posição no final de 2016.

O segmento de varejo tradicional (“classe média baixa”) ainda concentra a maior parte dos recursos, com volume de R$ 916,1 bilhões e um crescimento de 7,4% em comparação ao ano anterior.

Já os segmentos de varejo alta renda (“classe média alta”) e Private alcançaram R$ 778,1 bilhões e R$ 868 bilhões1, respectivamente, mas com crescimentos mais expressivos em 2017, de 12,1% e 14,8%.

Esse movimento se justifica pela maior diversificação dos investimentos desses dois segmentos, frente a um cenário de menores taxas de juros, em comparação ao varejo tradicional, que ainda mantém expressivo volume de recursos alocado em aplicações mais conservadoras, como a caderneta de poupança.

Além disso, revela que os segmentos de varejo alta renda Private superaram a taxa de juros Selic média anual de 10,3% em 2017. A média da Selic acumulada em 12 meses atingiu 12,6%; iniciou em 14,10% em janeiro e, com queda muito lenta e gradual, terminou com 10,11% em dezembro. Os mais ricos se beneficiaram desse arbítrio do Banco Central, concentrando mais riqueza financeira.

 

Considerando os depósitos de poupança, cujo número de depositantes distorce a estratificação das classes médias de baixa riqueza e de alta riqueza, mas não a riqueza per capita dos super-ricos, que não fazem esses depósitos populares, no ano passado, os 67 milhões de clientes do varejo tradicional tinham, em média, R$ 13.561 de reservas financeiras, os 6 milhões de clientes do varejo de alta renda, R$ 128.583 (valor nominal bem inferior ao “pico” de 2013) e os 117.421 ricaços, R$ 7,4 milhões.

Após o golpe, nos dois últimos anos, cada um dos 117.421 ricaços ganhou em média quase mais R$ 1,5 milhão, beneficiando-se dos elevadíssimos juros nominais que provocou a Grande Depressão no Brasil com mais de 13 milhões de desocupados. Agora, bota a casta dos guerreiros-militares para a repressão contra a depressão! 

Per capita a classe média alta ganhou R$ 13 mil e a baixa, R$ 1,1 mil. E ainda tem gente da classe média batendo panela-vazia a favor do status-quo brasileiro de desigualdade social...

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No segmento varejo, houve crescimento de 9,5% dos recursos aplicados e de 5,9% do número de contas, que cresceram em todas as regiões do país. Confira abaixo como a proporção de ricaços é superior no Estado de São Paulotanto em relação aos demais Estados do Sudeste quanto em relação às outras Grandes Regiões. E a concentração de riqueza por região geográfica se eleva de acordo com os segmentos de clientes: dos mais pobres (VT) aos mais ricos (VAR e PB).

No que diz respeito à alocação por instrumentos, em 2017 houve uma importante alteração na distribuição dos recursos e a maior parte deles, 38,4%, passou a ser alocada em fundos de investimentos, com um crescimento de 27% em comparação a 2016. Ao mesmo tempo, houve redução de 1% das aplicações em títulos e valores mobiliários, onde também estão computadas as operações compromissadas, responsáveis por esse resultado.

As aplicações em depósitos de poupança responderam por 26% do volume total e tiveram crescimento de 9% em 2017. Continua com o maior funding (veja tabela abaixo), ou seja, os mais pobres autofinanciam suas habitações!

Embora as alocações em poupança ainda respondam pela maior parte dos recursos (39,2%) e, principalmente, do número de clientes (85%) – reflexo do perfil do varejo tradicional – houve expressivo aumento das aplicações em fundos de investimentos (32,8%), puxadas principalmente pelos fundos multimercado, que cresceram 117,1% no ano.

Por outro lado, houve queda nas aplicações em operações compromissadas(43,8%), em LCAs (40,2%) e LCIs (10,1%), refletindo

  1. as mudanças regulatórias das compromissadas,
  2. a menor atratividade dos instrumentos de renda fixa e
  3. a menor oferta de ativos agrícolas e imobiliários, por falta de lastro.

No segmento de private banking, com a inclusão dos recursos de Previdência Complementar, o volume registrou alta de 15,3%, enquanto os grupos econômicos cresceram 4,7% em 2017. Entre os instrumentos, as variações mais expressivas foram o aumento das aplicações em fundos de ações (117,1%), em ativos de renda variável (38,8%) e em previdência aberta (27,6%), movimento que reflete a busca dos investidores por maior rentabilidade. Apenas a carteira de ativos de renda fixa teve queda em 2017, devido à menor alocação em títulos bancários (-24%) e em ativos com lastro imobiliário (-3%).

Contudo, entre os títulos e valores mobiliários, os títulos isentos com lastro agrícola (41,4%) e imobiliário (20,2%) continuam respondendo pela maior parte da carteira. Já entre os fundos de investimentos, os multimercados concentraram as aplicações do segmento Private Banking, com participação de 58,3% do total, e houve crescimento das alocações em fundos de ações, que passaram de 5% em 2016 para 8,9% em 2017, movimento que tende a se ampliar em um cenário de juros baixos e retomada do crescimento.

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1. Aqui, no volume do Private, não são considerados os recursos de previdência aberta, para efeito de comparação, já que as estatísticas de varejo ainda não contemplam esses produtos.

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Fernando Nogueira Costa é professor Titular do IE-UNICAMP

Fernando Nogueira da Costa

Fernando Nogueira da Costa possui graduação em Economia pela Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG (1974), mestrado (1975-76), doutorado (1986), livre-docência (1994) pelo Instituto de Economia da UNICAMP, onde é docente, desde 1985, e atingiu o topo da carreira como Professor Titular. Foi Analista Especializado no IBGE (1978-1985), coordenador da Área de Economia na Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP (1996-2002), Vice-presidente de Finanças e Mercado de Capitais da Caixa Econômica Federal e Diretor-executivo da FEBRABAN - Federação Brasileira de Bancos entre 2003 e 2007. Publicou seis livros impressos – Ensaios de Economia Monetária (1992), Economia Monetária e Financeira: Uma Abordagem Pluralista (1999), Economia em 10 Lições (2000), Brasil dos Bancos (2012), Bancos Públicos do Brasil (2017), Métodos de Análise Econômica (2018) –, mais de cem livros digitais, vários capítulos de livros e artigos em revistas especializadas. Escreve semanalmente artigos para GGN, Fórum 21, A Terra é Redonda, RED – Rede Estação Democracia. Seu blog Cidadania & Cultura, desde 22/01/10, recebeu mais de 10 milhões visitas: http://fernandonogueiracosta.wordpress.com/

Fernando Nogueira da Costa

Fernando Nogueira da Costa possui graduação em Economia pela Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG (1974), mestrado (1975-76), doutorado (1986), livre-docência (1994) pelo Instituto de Economia da UNICAMP, onde é docente, desde 1985, e atingiu o topo da carreira como Professor Titular. Foi Analista Especializado no IBGE (1978-1985), coordenador da Área de Economia na Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP (1996-2002), Vice-presidente de Finanças e Mercado de Capitais da Caixa Econômica Federal e Diretor-executivo da FEBRABAN - Federação Brasileira de Bancos entre 2003 e 2007. Publicou seis livros impressos – Ensaios de Economia Monetária (1992), Economia Monetária e Financeira: Uma Abordagem Pluralista (1999), Economia em 10 Lições (2000), Brasil dos Bancos (2012), Bancos Públicos do Brasil (2017), Métodos de Análise Econômica (2018) –, mais de cem livros digitais, vários capítulos de livros e artigos em revistas especializadas. Escreve semanalmente artigos para GGN, Fórum 21, A Terra é Redonda, RED – Rede Estação Democracia. Seu blog Cidadania & Cultura, desde 22/01/10, recebeu mais de 10 milhões visitas: http://fernandonogueiracosta.wordpress.com/

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