Professor da UnB é ameaçado por curso sobre o Golpe

Foto UOL
Jornal GGN – Momentos delicados para uma frágil democracia. Se é que se pode chamar assim. O professor Luis Felipe Miguel, da Universidade de Brasília, e articulista no GGN, montou disciplina em que abordará o Golpe de 2016 e a própria democracia no país. A disciplina é intitulada ‘O Golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil’. Uma temática que pode e deve ser tratada pela Universidade, tendo em vista sua função e seu compromisso com a sociedade e a própria democracia.
O curso ganhou uma proporção nacional indecente quando um jornal de Curitiba, famoso por criar celeuma em torno de pautas de direita, deu munição para um jornal carioca, famoso por defender o Golpe, e levaram o tema adiante. Uma Universidade oferece cursos, disciplinas e tem por obrigação levar o debate para a comunidade acadêmica e a sociedade. Esqueceram disso. Uma prática normal em qualquer ambiente acadêmico vai virar caso de Justiça, pois que atiçaram o ministro da Educação, Mendonça Filho, aquele que deu espaço para o neo-intelectual Frota opinar na sua pasta.

Mendonça Filho quer acionar a Advocacia-Geral da União (AGU), o Tribunal de Contas da União (TCU), a Controladoria-Geral da União (CGU) e o Ministério Público Federal (MPF) para que seja apurada, na marra, a tão decantada ‘improbidade administrativa’ por parte da UnB. E lamenta, em nota, que uma instituição respeitada se aproprie do bem público para promoção de pensamentos político-partidários.
O ministro muito se abespinha com um curso na Universidade. Seu Ministério, o da Educação, não tem tido motivos para comemorar nada. No final de janeiro, a pasta divulgou os dados do censo escolar 2017. Pelo censo, mais de 19% de reprovação e abandono da escola no 6º ano do ensino fundamental e de 28% no 1º ano do ensino médio. Quem divulga isso é o próprio Ministério, cuja pasta Mendonça Filho capitaneia. E tem mais, a falta de estrutura reflete na diminuição de matrículas de estudantes entre 6 e 14 anos, e a consequente diminuição de 1,8 milhão de brasileiros nas salas de aula.
No Facebook, ontem, o professor Luis Felipe Miguel informou que o curso é uma disciplina normal, ‘de interpelação da realidade à luz do conhecimento produzido nas ciências sociais’, e que trazem rigor científico, sem aderir a qualquer tipo de dogmatismo. Hoje, o professor volta à rede social agradecendo centenas de mensagens de solidariedade, bem como seu especial agradecimento à UnB, que não hesitou em reafirmar compromisso ‘com a liberdade de expressão e opinião – valores fundamentais para as universidades, que são espaços, por excelência, para o debate de ideias’.
Luis Felipe recebeu, ainda, inúmeras sugestões para que ministrasse o curso online ou espaços abertos, o que não o atrai, pois que se trata de uma disciplina normal, ‘a ser ministrada normalmente na universidade’. ‘Não é um acontecimento político – exceto, claro, no sentido de que o processo de ensino e aprendizagem é sempre um ato político’.
E finaliza afirmando que o conteúdo desta disciplina não difere do que tem sido discutido por muitos outros professores interessados em compreender o Brasil atual. ‘O que causou reboliço foi o uso da palavra “golpe” já no título da matéria. Tenho razões, que creio muito sólidas, para sustentar que a ruptura ocorrida no Brasil em 2016 se classifica como golpe. Tenho discutido e continuarei discutindo essas razões com estudantes e com colegas, nos espaços do debate universitário, e com a sociedade civil, em minhas intervenções públicas. Não vou, no entanto, justificar escolhas acadêmicas diante de Mendonça Filho ou de seus assessores, que não têm qualificação para fazer tal exigência’, complementa.
O professor da PUC-SP, Reginaldo Nasser, também se utilizou de rede social para falar sobre o ocorrido. Nasser critica o argumento utilizado por Mendonça Filho, que diz que o Brasil é um país democrático e onde se vive com respeito total a todos os direitos, além de afirmar que o impeachment da presidente eleita Dilma Rousseff se deu dentro dos ‘ditames da Constituição’ e foi validado pelo STF. Diz o professor da PUC sobre a nota: ‘Em outra palavras, o ministro responsável pela educação no pais, diz que não houve golpe e que vivemos em plena democracia. E está terminantemente proibido quem nega isso!’. E conclui que o ministro acabou por justificar a disciplina oferecida pela UnB.
Fernando Horta, também da UnB e articulista do GGN, foi à rede social em solidariedade a Luis Felipe Miguel. Diz o pequeno texto: ‘Sugiro ao professor Luis Felipe Miguel que, em caso de a UnB aceitar (o que eu duvido) o disparate da censura do Mendoncinha em proibir sua disciplina, que o senhor dê ela on-line, via Facebook e permita a minha matrícula já antecipada’. Sua solicitação recebeu dezenas de pedidos de matrícula.
Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

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  • Olha só o nome:

    Olha só o nome: Mendoncinha. 

    E saber que já tivemos figuras como Paulo Freire, um dos mais lidos por estudantes dos EUA, pais modelo dos manifestoches.

    • Olha a Paraiso de Tuiuti aí gente

      Pois é, os "manifantoches", os otários que acreditam que quem defende o Brasil e condena a corja que deu o golpe são "comunistas", sabem como ninguem idolatrar os pseudos moralistas sem moral.

  • O Brasil vive um momento de

    O Brasil vive um momento de absoluta insegurança jurídica, administrativa e constitucional.

    Em várias empresas públicas o governo está plantando o terror e a baderna administrativa.

    Tem havido sim perseguição ideológica.

    Mas como brasileiro é um FDP que não luta por nada coletivo, farinha pouca meu pirão primeiro, a coisa tenderá a ficar muito feia. Quero ver quando chegar nos salários do funcionalismo público. Num instante lebrarão da Era Collor-Itamar-FHC, a época da austeridade que nada nos legou.

  • Se ...

    Se e apenas se  o curso chamado :

    A legalidade do impeachement de 2016

    Vocês estariam dando pauladas no cara como se fosse uma ratazana grávida.

    Não !?

    • Nao, até porque esse título nao implica na negaçao do golpe...

      Se um curso discute a legalidade do impedimento, tb pode chegar à conclusao de que ele foi legal ou o contrário. Mas sua capacidade de compreender é pequena, né?

  • golpe seguido de intervenção militar na segurança pública...

    podem ter certeza que vai contaminar também as áreas da educação e da, atenção, informação

  • Reação tautológica...       

    Reação tautológica...           

    Se não tivesse havido o "tal golpe", o próprio curso se desmoralizaria...

    Não seria necessário "censurar"...

    A censura torna-se, então o melhor atestado de que o que houve foi um golpe...

    Vira documento para uma tal ONU, que deve ter pessoas mais inteligentes que os coxinhas daqui...

    É só guardar e espalhar o documento...

  • Atos Terroristas

    Nassif: não que eu goste da desgraça alheia. Mas, bem feito. Cana nele. Tanto curso de interesse atual da Capital federal. "Como roubar e continuar governando". "Seja Juiz e fature alto". "Congressista que não rouba não merece os votos que teve". Dai por diante. E vem ele com esse negocio de "golpe". Que golpe? Toma tento...

  • A escola sem partido. A universidade sem pensamento plural

    Finalmente... Ainda bem que a geração de Darcy Ribeiro não esteja mais aqui para ver a indigência dessa gente no comando das instituições brasileiras. Qualquer universidade que se curvar à isso estara perdida enquanto centro de pensamento.

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