Jornal Nacional deixa Bolsonaro na zona de conforto

Sem cerimônias, o candidato repetiu em rede nacional que bandido bom é bandido morto, que não há nada a fazer pela desigualdade de gênero no mercado de trabalho e que ele não tem “nada contra os gays”, só contra a desconstrução da “heteronormatividade”. Na economia, Bolsonaro só foi questionado sobre seu “casamento” com Paulo Guedes

Jornal GGN – A bancada do Jornal Nacional abriu alas, na noite desta terça (28), para o autoritarismo e outras atrocidades que o candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSL) costuma disparar quando questionado sobre assuntos ligados a direitos humanos e segurança pública, por exemplo. 

Com uma pauta que, do começo ao fim, deixou Bolsonaro em sua zona de conforto, os apresentadores William Bonner e Renata Vasconcellos gastaram com o deputado – o segundo colocado nas pesquisas de opinião – a paciência que economizaram com Ciro Gomes (PDT), sabatinado na noite anterior. 

A exceção foi o momento em que Renata travou um embate sobre isonomia salarial, dizendo que, “como mulher”, jamais aceitaria receber menos do que um homem que desempenhe as mesmas atribuições que ela. O candidato, porém, contornou a saia justa dizendo que a CLT já garante igualdade entre homens e mulheres que exercem a mesma função. Se está na lei, disse ele, cabe ao Ministério Público do Trabalho agir quando há descumprimento, e não ao presidente da República.

Ao final, porém, Bolsonaro ainda teve tempo e disposição para constranger a Rede Globo lembrando que Roberto Marinho apoiou o golpe militar de 1964, fato registrado em editorial. “Roberto Marinho era um ditador ou um democrata?”, perguntou aos apresentadores. 

O NOVO

A entrevista começou com Bolsonaro sendo questionado sobre apresenta-se como o novo na política quando, em verdade, é político de carreira. O candidato respondeu que sua família é limpa, que seu patrimônio é fruto de seu salário e que sempre integrou o “baixo clero” e, por isso, não está envolvido em escândalos de corrupção como a Lava Jato. Ele se vangloriou de ter sido citado pelo ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, como um dos únicos políticos que não foi “comprado pelo PT” no Mensalão. “Ser honesto não é virtude, é obrigação.”

Quando pressionado com a mesma pergunta, ele ainda acrescentou que nunca recebeu dinheiro de empresas investigadas para suas campanhas eleitorais. Que foi eleito mesmo sem tempo de TV e outros recursos, o que demonstra que o povo confia em sua pessoa. “(…) se não aprovei muitos projetos, impedi que péssimos projetos fossem avante em Brasília. Por tabela, elegi meus filhos.”
Sobre auxílio moradia, Bolsonaro reafirmou que o benefício é previsto em lei e disse que usou a verba para pagar com a finalidade que lhe cabe.
ECONOMIA
Quando economia veio à tona, Bolsonaro não teve de expor nenhuma proposta para seu eventual governo, e tampouco sofreu uma tentativa de desconstrução como Ciro Gomes e a promessa de tirar endividados do SPC (Serviço de Proteção ao Crédito). O deputado só teve de explicar o que faria caso fosse abandonado por Paulo Guedes, apontando como seu possível ministro da Fazenda. O candidato respondeu que confia que o economista assumirá a missão até o fim do mandato e admitiu que não tem plano B.
No embate sobre desigualdade de gênero, Bolsonaro negou que tenha dito que mulheres merecem receber menos do que homens ou que contrararia uma mulher com salário inferior porque ela engravida. Ele disse que, se salário é questão de competência e todas as mulheres são competentes, elas já estão protegidas pela CLT, que determina provimentos iguais para trabalhadores na mesma função. Em casos destoantes, cabe ao Ministério Público do Trabalho agir, disse. “É só as mulheres denunciarem, e o MP do Trabalho resolve o assunto.”
Bolsonaro tentou fazer uma comparação entre Bonner e Renata – presumindo que ela recebe salário inferior ao âncora do Jornal Nacional – e, neste momento, tomou a única invertida durante toda a entrevista, quando a apresentadora respondeu: “Eu poderia como qualquer cidadã fazer questionamentos sobre seus proventos porque o senhor é funcionário público, eu como contibuinte ajudo a pagar pago seu salário. Meu salário não diz respeito a ninguém. Eu posso garantir ao senhor, como mulher, que jamais aceitaria receber salário menor que um homem que exercesse as mesmas atribuições que eu.”
O candidato concordou e disse que o direito das mulheres já “está na lei, e quando a lei não é cumprida, compete ao Ministério Público do Trabalho.”
DIREITOS TRABALHISTAS
Na rodada seguinte, Bolsonaro foi indagado sobre quais direitos trabalhistas pretende cortar, já que ele vem afirmando que para criar mais empregos é preciso reduzir os direitos.
Ele afirmou que não cortaria nada porque os direitos trabalhistas estão em “cláusula pétrea” da Constituição. Só o Congresso, por meio de uma constituinte exclusiva, poderia alterar. O que ele pretende fazer é “desonerar a folha de pagamento, desburocratizar, desregulamentar muita coisa. Evitar que abrir empresa leve, em média, 100 dias do Brasil. Temos que fazer para ajudar [a gerar empregos].”
Bonner, então, perguntou por que Bolsonaro foi um dos únicos deputados a votar contra os direitos trabalhistas na aprovação da PEC das domésticas. Ele disse que votou contra na convicção de que os direitos devem ser garantidos, “mas de forma gradativa”. Obrigando famílias a assinar a carteira dos trabalhadores domésticos, muitos perderam o emprego, sustentou Bolsonaro.
HOMOFOBIA
O Jornal Nacional voltou-se então para outro assunto: homofobia. Na introdução, destacou que Bolsonaro há declarou que “vizinho gay desvaloriza imóvel, que prefere filho morto a filho gay, e associou pedofilia a homossexualismo.”
Em tom um pouco mais exaltado, Bolsonaro agarrou-se à desculpa de que não tem “nada contra os gays”, apenas não quer material escolar que desconstrua a “heteronormatividade”, ensinando às crianças que “homem com mulher está errado.”
“Eu estava defendendo as crianças em sala de aula. (…) Um pai não quer chegar em casa e ver o filho brincando de boneca por causa de influência da escola”, disse.
BANDIDO BOM É BANDIDO MORTO
Questionado sobre o que faria, de fato, pelos moradores de comunidades pobres que vivem em meio à guerra entre a política e o narcotráfico, Bolsonaro lançou mão da ideia mais radical de todo o debate: defendeu que policial tem que ter autorização para invadir a favela e matar. Depois, tem de ser “condecorado” pelo Estado, e não investigado e punido com base em direitos humanos.
Bolsonaro disse que bandido não tem que ser tratado como “um ser humano normal, que deve ser respeitado, que é vitima da sociedade” enquanto o policial morre em suas mãos. Para o candidato, as pessoas inocentes que moram nas favelas devem ser retiradas da “linha de tiro”. Quando Bonner reafirmou que pessoas inocentes, na prática, morrem com balas perdidas, Bolsonaro, contrariado, disse que a solução então é “muito simples”: “não vamos botar a tropa na rua. Vamos deixar a PM aquartelada também.”
“Não tem que dar florzinha para eles [criminosos]. Tem que atirar. Enquanto não atirar, não vai resolver nunca.”
DITADURA
Ao final da entrevista, Bolsonaro teve de responder pela declaração de seu vice, o general Mourão, que afirmou que os militares podem “impôr” uma solução para a crise brasileira, como aconteceu em “1964”.
Sem cerimônias, Bolsonaro respondeu que o que Mourão disse “está em consonância com o que grande parte da sociedade fala.”
Quando Bonner disse que em 64 o que ocorreu foi um golpe militar, registrado nos livros de história, e questionou se isso cabe na democracia, Bolsonaro replicou: “No meu entender, foi um alerta que ele [Mourão] deu. E, no mais, deixa os historiadores pra lá. Eu fico com Roberto Marinho, que declarou em editorial que, em 1964, participamos da “revolução democrática”, identificados com os anseios nacionais de preservação das instituições democráticas, ameaçadas pela radicalização ideológica, pelos distúrbios sociais, greves e corrupção generalizada.”
“Roberto Marinho foi ditador ou um democrata?”, perguntou Bolsonaro ao JN.
“Já houve editorial sobre isso. O senhor está informado. Vamos encerrar por causa do tempo”, finalizou Bonner, sem ter tirado de Bolsonaro nenhuma proposta ou projeto de País.
Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

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  • A TV Globo foi criada pelo Regime Militar.

    O motivo do apoio da Globo ao Regime Militar

    Postado por - no dia 03 de junho de 2018

     

    Roberto Marinho e as “relações de poder”. Com os ex-presidentes Costa e Silva e Figueiredo, e o ex-governador baiano Antônio Carlos Magalhães. / Foto: Reprodução

    Quando dizem que a TV Globo apoiou o Regime Militar existe um equívoco de palavra.

    A TV Globo foi criada pelo Regime Militar.

    Não era uma rede que já existisse igual TV Tupi ou Excelsior.

    Foi uma criação do Regime Militar sob medida.

    Quando Boni e Clark foram contratados pelo Roberto Marinho pra dirigir a emissora, já encontraram ali dois coronéis e um americano que já tinham organizado a estrutura da rede e a que ela se destinaria.

    Os coronéis não vou citar os nomes mas o americano era sabido que era Joe Walash, representante de um grupo americano que tinha como fundamento colocar o dinheiro necessário pra criar a rede e desenvolver da melhor maneira possível.

    Roberto Marinho não tinha dinheiro dele pra criar o que foi criado.

    Tanto que nos momentos em que as entradas de dinheiro passaram a ser escandalosas e tiveram que dar um tempo, foi Silvio Santos que emprestou dinheiro ao Roberto Marinho pra pagar folha de pagamento.

    Silvio comprava o horário de domingo e tinha mais dinheiro que Roberto Marinho.

    Emprestou dinheiro que foi pago com horário.

    O triste da história de Silvio foi que quando terminou seu contrato de compra de horário, Roberto Marinho não o defendeu da sanha de Boni e Clark que queriam tirar Silvio da programação de todo jeito.

    Enfim, quando a família Marinho recentemente declarou que se arrependia de ter apoiado o Regime Militar, demonstrou ignorância dos fatos.

    Os filhos de Roberto Marinho jamais seriam milionários se não fosse o Regime Militar.

    Mande seu e-mail para James Akel : jamesakel@bastidoresdainformacao.com.br

    http://bastidoresdainformacao.com.br/o-motivo-do-apoio-da-globo-ao-regime-militar/

  • Resumindo, o JN foi um

    Resumindo, o JN foi um palanque para o Bolsonazi. Estava esperando perguntas em que ele ficasse mudo, sem saber o que responder, mas o que vi foi apenas jornalistas medíocres que não fazem o dever de casa, contribuindo cada vez mais para uma candidatura fascista que ameaça cada vez mais a subdemocracia brasileira.

  • Bolsonaro na GloboNews e no JN fez mais que PT em décadas

    É triste ver que as duas entrevistas do Bolsonaro para Globo, tanto no Jornal Nacional e na GloboNews fizeram estrago maior à imagem da Rede Globo do que décadas de lutas da esquerda!

    Se juntar tudo que a esquerda fez contra a Globo desde o fim da ditadura... nem arranha a lataria do tanque de guerra.

     

    Vamos resumir toda atuação da esquerda contra a Globo:

    1-DIREITO DE RESPOSTA DE BRIZOLA: único ataque certeiro até hoje

    2-INSERÇÕES DE MALUCOS GRITANDO DURANTE TRANSMISSÕES AO VIVO

    3-DENUNCIAS EM BLOG SEM GRANDES REPERCUSSÕES

     

    O que a direita fez contra a Globo:

    1-GAROTINHO AO VIVO EXPONDO PODRES DA EMISSORA EM ENTREVISTAS

    2-REDE RECORD ATACANDO FRONTALMENTE A EMISSORA

    3-BOLSONARO ENFRENTANDO DE PEITO ABERTO OS PITBULLS DA GLOBO

     

    Sinceramente... a direita roubou nossa pauta... fizeram nosso dever de casa... 

    Não faltaram oportunidades para os candidatos de esquerda fazerem o mesmo que Bolsonaro fez... não faltou motivo também...

    Agora é chorar o leite derramado.

     

    PARABÉNS BOLSONARO... PELA CORAGEM DE FAZER O QUE JÁ DEVERIA TER SIDO FEITO HÁ DÉCADAS!

  • Mais do que as "ideias" dos

    Mais do que as "ideias" dos candidatos, o que essa série de entrevistas do JN tem demonstrado é que o fato de alguém ganhar a vida atrás de uma mesa lendo notícias em um teleprompter não o transforma automaticamente em jornalista, muito menos em entrevistador...

    A única coisa que gostei foi ver o Bonner defendendo a PEC das domésticas e os direitos trabalhistas, algo que o JN nunca fez. Pena que foi só da boca pra fora.

  • Passando em frente a um pit

    Passando em frente a um pit dog na Praça Tamandaré, após conversar com pombos, macacos e outros bichos, tive a infelicidade de deparar-me com esse lixo tóxico...a Globo passando a bola para o torturador convencer o povo de que o poder tóxico e não o amor é a melhor saida para esse pais......eles são adeptos do poder tóxico: o poder contra o povo: ......notei que Boussonauro é, para a chefia do Poder Verbalizador, que verbaliza a realidade para as massas, o mesmo que foi Aécio Neves na eleição anterior..: morram bando de vermes rastejantes que repetem o mesmo script do golpe de 64 do qual  a Globo diz-se arrependida por ter apoiado: como assim se repete aquilo que diz ter sido um erro: transformam Lula em JK ao acusa-lo de ser corrupto por ter apartamento: e procuram um novo Castelo Branco e acharam: Boussonauro, uma mistura de bolso com dinossauro: morram, infellizes: ardam na boca do infermo....

  • Qual a relevância do Jornal

    Qual a relevância do Jornal Nacional? O papel em que ele foi impresso é macio o suficiente para ser usado no banheiro dos barracos dos milhões miseráveis criados pelo golpe com o STF com tudo?

    • É burrice

      Pois é, caro Fábio, que o populacho burro e acoxinharado (existe outra forma de ser coxinha que não populacho emburrecido e delirante?) preste atenção nesse programa e até nos produtos dessa firma, "Globo", ainda dá para entender...

      Será que alguém minimamente informado consegue acreditar que essa firma vai vender produto em algo diferente disso? Se são só coisas assim que o pessoal dessa firma produz, vão vender o quê?

  • No fim, ele falou para o seu

    No fim, ele falou para o seu público. Não sei se ele vai pegar muitos votos de indecisos... Esse radicalismo extremo tem limite.

  • Se soubessem o que é...

    ´É uma pena que o povão não saiba o que é o artifício das "PJ", privilégio que o capitão lembrou ser muito comum entre jornalistaas endinheirados. Confesso que gostei dessa manifestação do homem, embora sua rudeza notoriamente tenha deixado a questão no ar sem maior clareza - mas o suficiente para incomodar os entrevistadores (Pano rápido!). Não esperava isso: o capitão se saiu melhor que Ciro na grande janela.

    • PJ

      Pejotização é privilégio? De jornalistas endinheirados?

      Ao que eu saiba, é fundamentalmente um meio de os jornais contratarem focas sem pagar direitos trabalhistas.

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