“Marta compreende o papel da cultura digital”, diz Célio Turino

Por Bruno de Pierro, do Brasilianas.org

A presidente Dilma Rousseff anunciou, nesta terça-feira (11), a nomeação da nova ministra da Cultura, a senadora Marta Suplicy (PT-SP). Ela substituirá Ana de Hollanda, que desde o início do mandato, em janeiro de 2011, tem protagonizado episódios polêmicos de sua gestão, especialmente em torno dos direitos autorais. Marta tomará posse na próxima quinta (13), após entrar de vez na campanha do ex-ministro Fernando Haddad á prefeitura de São Paulo. O suplente de Marta, o vereador paulistano Antonio Carlos Rodrigues (PR-SP) irá substituí-la no Senado.

Assim que assumiu o MinC, Ana de Hollanda, que é irmã do cantor e compositor Chico Buarque, expôs opiniões contrárias às gestões anteriores de Juca Ferreira e Gilberto Gil, evidentemente mais abertas ao copy left e à cultura colaborativa digital. Com a mudança, a perspectiva é de que o desgaste que a pasta sofreu na última gestão seja interrompido e que a polarização entre “defensores do Ecad” e defensores da “distribuição do copy left” se dissolva. 

Para entender como a nova gestão pode ser conduzida daqui para frente, Brasilianas.org conversou com o historiador Célio Turino, um dos idealizadores do programa Cultura Viva do MinC e que, entre 2001 e 2004, trabalhou ao lado de Marta Suplicy na prefeitura de São Paulo. 

Segundo Célio, o principal problema da gestão de Ana de Hollanda foi a quebra da narrativa dos movimentos culturais que emergiram durante os dois mandatos do presidente Lula. “Houve uma quebra de diálogo e do encantamento”, disse. Entre os grupos que perderam com a descontinuidade de políticas, o ex-secretário de Cidadania Cultural do MinC entre 2004 e 2010 citou os indígenas, os terreiros e comunidades de jovens em favelas. 

“Espero que a grande primeira medida seja a retomada desse processo que se frustrou nos últimos anos”. O processo do qual Célio faz referência é o grande Programa Cultura Viva, responsável pela criação de 3.670 Pontos de Cultura (PCs) entre 2004 e 2011. Um dos problemas enfrentados pelos PCs atualmente é a interrupção dos incentivos. Para Célio, os pontos devem ser revigorados a partir do estabelecimento do fluxo que garanta a manutenção deles. “Hoje, um Ponto de Cultura recebe R$ 60 mil por ano; já é pouco, e quando isso é interrompido, por questões burocráticas, todo o trabalho de uma comunidade sofre desgaste”, explicou. 

Além disso, Célio enfatizou que o Cultura Viva não está concentrado apenas nos Pontos de Cultura. O programa envolve mestres da cultura tradicional junto com as escolas, e que recebiam bolsas; há também a importância da relação entre cultura e saúde e da Economia Viva, como ocorre no Banco Comunitário União Sampaio, no campo limpo, em São Paulo. “Tudo isso são medidas simples e que chegaram a 1.100 municípios. Isso precisa ser retomado com a mesma ênfase de antes”.

E a condição necessária para que os Pontos de Cultura funcionem com vigor é que tudo aconteça em rede e com a realização de grandes encontros. O último, que reuniu as chamadas Teias de Cultura, aconteceu em 2010, na cidade de Fortaleza. Para Célio, é nesse contato “de um com o outro”, num processo de auteridade, que ocorre o crescimento. Sinal de que este conceito deve ser considerado com atenção é a disseminação do Cultura Viva por governos da América Latina. Desde que deixou a administração pública e a vida partidária, Célio percorre pela região, difundindo a experiência brasileira. E critica: “hoje, [o programa] está mais disseminado na América Latina do que no Brasil”. Na quinta-feira, enquanto Marta Suplicy toma posse do MinC, Célio estará no Uruguai, em mais uma de suas viagens, que já contribuíram para a consolidação do Cultura Viva também na Argentina, Peru, Colômbia, Costa Rica, entre outros. Em Medelin, na Colômbia, por exemplo, foi aprovada a Lei Cultura Viva. No Brasil, país de origem do programa, a lei ainda tramita no Senado. 

De autoria da deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ), a Lei Cultura Viva (Projeto de Lei 757/2011) cria a Política Nacional de Cultura, Educação e Cidadania e consolida o Cultura Viva e os Pontos de Cultura como política permanente de Estado. O projeto foi aprovado com unanimidade na Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados em junho deste ano. Agora, espera pela aprovação na Comissão de Orçamento, para que então possa seguir para a votação no Senado.

Experiência da senadora na prefeitura

Durante a gestão de Marta na prefeitura de São Paulo, Célio Turino foi diretor do Departamento de Programas de Lazer da Secretaria Municipal de Esportes. Acompanhou de perto, portanto, a atuação da então prefeita em temas relacionados à cultura. “Tenho grande expectativa com a Marta, pois o primeiro grande movimento de inclusão digital no Brasil foi implantado por ela, com os Telecentros, equipados com softwares livres”, ressaltou.

Célio disse ainda que a nova ministra tem compreensão do papel da cultura digital no processo de desenvolvimento do povo brasileiro a partir dos softwares livres, do trabalho colaborativo, da generosidade intelectual e da gestão em rede. Todos estes elementos, explicou, estão presentes nos Telecentros e nos CEUs (Centros de Educação Unificados).

O ponto forte, portanto, da nova gestão do MinC, pode ser a integração da educação com a cultura. Exemplos disso são, também, o Recreio nas Férias, programa criado por Marta para levar atividades culturais a crianças no período das férias. “Eram disponibilizados 5 mil ônibus, uma coisa grande, que levava crianças para museus e locais de recriação. Ela [a senadora] tem esse entendimento”, afirmou.

Foto na home: Antonio Cruz/ABr

Luis Nassif

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